Tema 2  A representação do corpo humano na arte

A Vênus de Willendorf

Os seres humanos produzem esculturas desde os tempos mais antigos. A obra retratada nas fotografias desta página, por exemplo, foi criada há milhares de anos. Observe as imagens e depois responda às questões propostas.

Fotografia. Três ângulos (frontal, lateral e posterior) da escultura em pedra de uma mulher nua de formas arredondadas e volumosas, sem braços e pés, sem rosto definido, com sete fileiras horizontais compostas por círculos concêntricos que envolvem todo o topo da cabeça.
Fotografia. Três ângulos (frontal, lateral e posterior) da escultura em pedra de uma mulher nua de formas arredondadas e volumosas, sem braços e pés, sem rosto definido, com sete fileiras horizontais compostas por círculos concêntricos que envolvem todo o topo da cabeça.
Fotografia. Três ângulos (frontal, lateral e posterior) da escultura em pedra de uma mulher nua de formas arredondadas e volumosas, sem braços e pés, sem rosto definido, com sete fileiras horizontais compostas por círculos concêntricos que envolvem todo o topo da cabeça.
Vênus de Willendorf. cêrca de 29500 antes de Cristo Escultura de pedra calcária e tinta ocre, aproximadamente 11 centímetros de altura. Museu de História Natural de Viena, Áustria.

Faça no diário de bordo.

Foco na linguagem

  1. Observe a escultura retratada nesta página e responda às perguntas a seguir.
    1. O que essa escultura representa?
    2. Qual foi o material usado na produção dessa escultura? Você consegue imaginar como essa peça foi produzida?
    3. Observe, na legenda, a altura dessa escultura. Em sua opinião, por que essa obra teria sido confeccionada com essas dimensões?
Respostas e comentários

Objetivos

Conhecer e identificar diferentes representações artísticas do corpo humano.

Compreender que as representações do corpo podem revelar o padrão de beleza que vigora em diferentes culturas e períodos históricos.

Interessar-se pela história da arte.

Valorizar obras de arte de diferentes períodos históricos.

Experienciar a criação de trabalhos artísticos de fórma individual.

Desenvolver a autoconfiança e a autocrítica por meio da experimentação artística.

Habilidades favorecidas neste Tema

(ê éfe seis nove á érre zero um), (ê éfe seis nove á érre zero dois), (ê éfe seis nove á érre zero três), (ê éfe seis nove á érre zero cinco), (ê éfe seis nove á érre zero seis), (ê éfe seis nove á érre zero sete), (ê éfe seis nove á érre zero oito), (ê éfe seis nove á érre três um) e (ê éfe seis nove á érre três três).

Foco na linguagem

Peça aos estudantes que observem os diversos ângulos da Vênus de Willendorf. Isso facilitará a compreensão de que se trata de uma escultura, ou seja, um objeto tridimensional.

1. a) Espera-se que os estudantes mencionem que se trata da representação de uma figura feminina. Chame a atenção para aspectos como as fórmas arredondadas, a não representação de detalhes do rosto e a textura que envolve a cabeça e que remete ao estilo de cabelo da época.

b) Possivelmente, os estudantes mencionarão que o suporte da escultura é pedra calcária, conforme as especificações da legenda. Após ouvir as considerações a respeito da técnica utilizada, comente que essa peça foi entalhada na pedra, ou seja, as fórmas foram obtidas como resultado de cortes, incisões e lixamentos feitos na pedra. Explique a eles que, quando a Vênus de Willendorf foi confeccionada, não existiam instrumentos de metal e que o entalhe provavelmente era realizado com instrumentos rudimentares feitos de ossos, marfim e até mesmo pedras mais resistentes.

c) Após ouvir as considerações feitas pelos estudantes, comente que uma das hipóteses defendidas pelos estudiosos é que esculturas como a Vênus de Willendorf eram utilizadas como amuletos pelas mulheres que desejavam ter filhos. Explique que essa hipótese é sustentada pelo fato de essas esculturas terem fórmas arredondadas. Se julgar necessário, antes de propor essa questão, utilize uma régua para mostrar aos estudantes a quanto corresponde a medida de 11 centímetros. Destaque para eles que, com essas dimensões, essa escultura pode caber na palma da mão de uma pessoa adulta.

Arte e muito mais

O corpo e a cultura

As representações artísticas do corpo humano podem revelar a percepção em relação ao próprio corpo em diferentes sociedades e em distintos períodos. Tais representações também nos revelam os critérios ou modelos que cada sociedade utilizou para definir o que é belo, ou seja, os padrões de beleza estabelecidos em cada período da história.

É provável que a primeira tentativa de padronizar um ideal de beleza para o corpo humano tenha se originado entre os gregos, na Antiguidade. Para eles, o corpo ideal devia seguir um padrão matemático, simétrico e proporcional. Com base nesse conceito de beleza, os gregos produziram uma série de esculturas que representam essa beleza idealizada, bem distinta dos corpos no mundo real. Observe a escultura reproduzida nesta página.

Fotografia. Dois ângulos (frontal e lateral) de escultura em mármore branco de um homem nu, com as pernas abertas,  de cabelo cacheado, com músculos definidos. Ele tem braço direito esticado para a frente e o esquerdo semiflexionado em frente ao peito.
Fotografia. Dois ângulos (frontal e lateral) de escultura em mármore branco de um homem nu, com as pernas abertas,  de cabelo cacheado, com músculos definidos. Ele tem braço direito esticado para a frente e o esquerdo semiflexionado em frente ao peito.
LÍSIPO. Apoxiomeno. cêrca de 320 antes de Cristo Cópia esculpida em mármore, 2,05 métros de altura. Museu Pio Clementino, Vaticano. Essa obra foi produzida no século primeiro com base no original de bronze, que foi perdido.
Respostas e comentários

Originais gregos

Existem somente sete esculturas originais gregas feitas de bronze, pois grande parte dessas obras foi perdida ou destruída. Os romanos copiavam essas esculturas em mármore e as destruíam para aproveitar o bronze na fabricação de armas para o exército. Uma das obras originais que estão preservadas até hoje é uma escultura de Zeus ou possêidon, de autoria desconhecida.

Apoxiomeno

A escultura Apoxiomeno mostra a representação de um atleta limpando o braço direito após uma competição esportiva. A palavra apoxiomeno é de origem grega e significa raspar. Explique aos estudantes que os gregos antigos se untavam com óleo antes das competições e que a obra desta página mostra um atleta retirando esse óleo do corpo ao final da competição. Comente que a prática desportiva era uma temática frequente na estatuária grega.

Cânone

No século quinto antes de Cristo, o escultor grego Policleto sistematizou em um livro, chamado Cânone, um conjunto de regras para determinar a simetria e a proporção ideais do corpo humano. Poucos registros desse livro chegaram até nós, mas é possível identificar essas regras em obras desse escultor, como Doríforo, Diadúmeno e Discóforo. No século quarto antes de Cristo,o escultor Lísipo alterou as regras de Policleto, e os corpos passaram a ser representados mais esbeltos, esguios e elegantes, como visto na escultura Apoxiomeno. O objetivo dos escultores gregos ao estabelecer regras era alcançar a beleza, que foi forjada na simetria, na proporção, no equilíbrio e na harmonia por eles idealizados.

Arte e muito mais

Peça aos estudantes que relacionem as imagens da página com imagens da moda, das revistas, da e das propagandas. Comente que muitas imagens da arte, como essas que têm origem no ideal de beleza grego, ainda são utilizadas como referência na cultura visual para produzir, por exemplo, propagandas, por meio das quais a compra de produtos é estimulada mediante a tentativa de identificação nossa com os corpos representados. Em outras palavras, esse ideal de beleza associado ao corpo atlético é usado para que imaginemos que, ao comprar um ou outro produto, nos pareceremos com a figura retratada na propaganda. Problematize então o fato de que a imagem do corpo humano é usada para gerar desejos de consumo. Para finalizar a conversa, pergunte aos estudantes se eles compreendem essa ideia e se saberiam dar exemplos do seu cotidiano a fim de contribuir para essa discussão.

Por que se usa o termo Vênus?

Nos séculos dezoito e dezenove, pesquisadores atribuíram o nome Vênus a esculturas de figuras femininas. Existem muitas estatuetas parecidas com a Vênus de Willendorf. Observe as imagens reproduzidas a seguir.

Fotografia. Três ângulos (frontal, lateral e posterior) de escultura em argila escura de mulher nua, de formas arredondadas e volumosas, seios grandes e flácidos, sem braços e pés e sem rosto definido.
Fotografia. Três ângulos (frontal, lateral e posterior) de escultura em argila escura de mulher nua, de formas arredondadas e volumosas, seios grandes e flácidos, sem braços e pés e sem rosto definido.
Fotografia. Três ângulos (frontal, lateral e posterior) de escultura em argila escura de mulher nua, de formas arredondadas e volumosas, seios grandes e flácidos, sem braços e pés e sem rosto definido.
Vênus de . cêrca de 29000 antes de Cristo Escultura de argila, 11,5 por 4 por 2,8 centímetros. Museu da Morávia, em Bûrnô, República Tchéca.
Fotografia. Dois ângulos (frontal e lateral) de escultura do corpo de uma mulher nua, sem pés, sem rosto definido, coberto pelos cabelos, com pescoço definido, formas arredondadas e quadris largos, esculpida em relevo, em pedra avermelhada.  Seu braço esquerdo está estendido ao longo do corpo e o direito está flexionado ao lado do corpo e na mão segura um chifre
Fotografia. Dois ângulos (frontal e lateral) de escultura do corpo de uma mulher nua, sem pés, sem rosto definido, coberto pelos cabelos, com pescoço definido, formas arredondadas e quadris largos, esculpida em relevo, em pedra avermelhada.  Seu braço esquerdo está estendido ao longo do corpo e o direito está flexionado ao lado do corpo e na mão segura um chifre
Vênus de Laussel. cêrca de 25000 antes de Cristoponto Escultura de pedra calcária e tinta ocre, aproximadamente 46 centímetros de altura. Museu da Aquitânia, Bordéus, França.

Já a imagem a seguir mostra a pintura O nascimento de Vênus. Nessa nova versão do mito de Vênus, vemos uma representação do corpo feminino pintado há cinco séculos, mas baseado na noção de beleza grega: corpo atlético e com proporções específicas com uma pose – joelhos ligeiramente dobrados, corpo e cabeça levemente jogados para o lado – que busca dar naturalidade a esse corpo.

Pintura retratando quatro pessoas. No centro há uma mulher nua, magra, de pele muito clara, pescoço alongado, cabelos avermelhados, longos, ondulados e esvoaçantes. Ela está em pé dentro de uma grande concha branca sobre águas claras. O braço direito está flexionado e cobre um dos seios. A mão esquerda cobre a virilha com o seu cabelo. À esquerda, na pintura, a figura de um homem alado, segura uma mulher também nua, ambos envoltos por um tecido azul, parecem flutuar. O homem alado assopra na direção da mulher na concha. À direita,  uma mulher descalça, de cabelos avermelhados, longos, ondulados e esvoaçantes, usando vestido branco florido,  estende um manto de tecido rosado esvoaçante na  direção da mulher dentro da concha.  À direita, à beira da água, há uma faixa de terra com árvores de troncos finos e altos.
O nascimento de Vênus. cêrca de 1485. Têmpera sobre tela, 172,5 por 278,5 centímetros. Galeria dos Uffizi, Florença, Itália.

De lá para cá, o modelo de beleza do corpo feminino já mudou outras vezes. Hoje em dia, as revistas e os desfiles de moda exibem corpos femininos magros e altos, muito diferentes, por exemplo, do que eram os corpos das modelos há 50 anos.

Faça no diário de bordo.

Ícone. Tema contemporâneo: SAÚDE.

O modelo de beleza do corpo feminino, e também do masculino, corresponde necessariamente a um padrão real? O que devemos fazer para reconhecer e valorizar as nossas belezas do modo como elas são? Com a orientação do professor, em uma roda de conversa, vamos debater sobre isso?

Respostas e comentários

   Se considerar oportuno, comente com os estudantes que a escultura Vênus de foi encontrada em 1925, em , na República Tchéca. A Vênus de Laussel segura um chifre em uma das mãos. Essa escultura foi encontrada em 1911, em Laussel, na França.

Amplie a discussão sobre os modelos de beleza reproduzidos na cultura visual. Comece observando que, apesar de as imagens remeterem a Vênus, que é uma figura feminina, os modelos de beleza masculinos também podem ser problematizados. Para exemplificar, você pode usar a representação do corpo de Davi, na página 131.

Pergunte aos estudantes se há ícones de beleza que eles acompanham ou em quem se inspiram. Faça uma coleta de referências.

Depois, pergunte se há diversidade entre essas referências. Como são os corpos dessas pessoas? Por onde circulam, ou por quais meios os estudantes acessam esses ícones? Há diversidade de corpos e diversidade étnico-racial entre esses exemplos? Se não há, o que os estudantes pensam sobre isso?

É importante ressaltar que padrões de beleza podem levar as pessoas ao adoecimento. A valorização da magreza pela moda, por exemplo, pode levar as pessoas a desenvolver transtornos alimentares como a anorexia e a bulimia. Para mais informações sobre os transtornos alimentares decorrentes da imposição desse padrão, consulte o texto “Bulimia e anorexia, preste atenção!”, nas Leituras complementares na parte inicial deste Manual.

Sugestão de debate

Proponha uma conversa entre os estudantes, com o tema beleza e saúde. Essa proposta está relacionada ao Tema contemporâneo transversal Saúde, com ênfase na autopercepção dos estudantes em relação à autoestima e à saúde mental, visto que o tema pode provocar sofrimento e ansiedade entre os jovens.

Para organizar o debate, separe-os em grupos de seis integrantes. Peça a eles que conversem sobre o tema, considerando três pontos:

(A) Os modelos de beleza que acessamos na moda, na televisão e em redes sociais são saudáveis para nós? Sim ou não e por quê?

(B) Quais atitudes devemos tomar para cuidar da nossa autoestima dentro desse debate?

(C) Como a nossa saúde pode ser afetada pelos ideais severos e inalcançáveis de beleza?

De que fórma a arte e também a cultura visual (filmes, séries, propagandas etcétera) podem contribuir para ampliar as concepções atuais sobre o que é e o que não é belo?

A depender das respostas, faça problematizações ou crie novas perguntas. É possível que surjam conflitos ou relatos pessoais que exigirão mediação e acolhimento. Procure outras referências teóricas ou elabore propostas que ajudem os estudantes a fortalecer a autoestima e busque transformar a sala de aula em um espaço para essas reflexões, de modo que eles possam adquirir referências saudáveis e construtivas para pensar sobre isso.

Iconografias do corpo humano

Observe a imagem reproduzida nesta página. Ela foi feita na Idade Média, período marcado pelo pensamento religioso. Durante essa época, a Igreja católica encomendava pinturas de temas religiosos para disseminar e propagar sua doutrinaglossário .

Pintura. Mulher de túnica vermelha e manto azul, sentada em um trono dourado, com degraus, sobre uma estrutura com arcos e colunas. Ela segura em um dos braços um menino de cabelo cacheado, vestindo túnica vermelha e manto marrom-claro. Ambos têm uma auréola ao redor da cabeça. Ao redor do trono, há oito figuras aladas, vestindo túnicas azul e rosa, com cabelos claros e auréolas douradas sobre as cabeças. Abaixo, entre as colunas da estrutura, há quatro homens idosos, de longas barbas, que seguram pergaminhos.
tchímabuê, Giovanni. Virgem e Menino entronizados com Profetas (Santa Trinita Maestà). cêrca de 1290-1300. Têmpera sobre madeira em fundo dourado, 384 por 223 centímetros. Galeria dos Uffizi, Florença, Itália.

Para os artistas medievais, não havia a preocupação de representar fielmente um objeto, mas apenas de ilustrar temas oficiais e religiosos. De acôrdo com os preceitos religiosos da época, o corpo era fonte de pecado, por isso era representado com contornos discretos e quase total­mente coberto, como se pode notar na obra reproduzida nesta página. Figuras sacras, como as retratadas, eram pintadas não como a representação de uma pessoa comum, mas como um ícone de uma figura sagrada. É por isso que essa mesma imagem pode ser encontrada em pinturas, afrescosglossário e iluminuras de diferentes séculos sempre com as mesmas cores e a mesma posição, que representam valores daquela narrativa religiosa. A esse tipo de representação damos o nome de iconografia.

Respostas e comentários

Contextualização

Peça aos estudantes que comparem, então, essa imagem àquela da página anterior (O nascimento de Vênus). Eles devem perceber como os valores em torno da representação humana mudaram entre essas duas épocas: se na Antiguidade Clássica, na Grécia, o corpo nu era representado como marco do ideal de beleza, na Idade Média a representação da nudez era intensamente reprimida.

Agora, peça aos estudantes que leiam a legenda da obra. Pergunte a eles se sabem como ela foi feita.

Explique a eles que a técnica da têmpera é muito antiga e que utiliza a clara ou a gema do ovo como aglutinante para fazer tinta, somando a ela algum elemento químico que impeça a formação de bactérias e fungos e, também, corantes coloridos. A têmpera pode ser aplicada sobre vários tipos de material, entre eles a madeira, como no exemplo desse painel pintado por tchímabuê.

Leia o texto a seguir com eles para situar quem foi esse artista.

tchímabuê

Cenni di Petro (Giovanni) tchímabuê (cêrca de 1240-1302) é con­siderado o último grande pintor italiano a seguir a tradição bizantina, que foi um dos primeiros estilos da arte cristã, surgida no século Na pintura reproduzida nesta página é possível identificar alguns dos principais elementos da produção de tchímabuê: o fundo da pintura feito em dourado, a representação das auréolas planificadas em círculo, as dobras da roupagem de Maria bem marcadas e a representação dos pés que se apoiam em uma espécie de escada de trono, ensaiando a representação de profundidade.

O nu

O Cristianismo não tolerava a representação do nu, exceto em imagens de conteúdo religioso. Nesses casos, alguns temas eram justificados pelas Sagradas Escrituras, como a representação de Adão e Eva, a crucificação de Cristo ou a representação das almas no inferno. Essa lógica atendia ao ideário cristão, segundo o qual o corpo era considerado um apêndice da alma.

Idade Média

A Idade Média, segundo uma divisão da história em quatro períodos, tomando por base a história europeia, corresponde ao período que se estende do ano 476 ao ano 1453. Esse período foi marcado pelo Teocentrismo, doutrina ou crença que considera Deus o centro de tudo. As pessoas que viveram na Idade Média acreditavam que a ordem do mundo e as ações humanas provinham e se justificavam em Deus, relegando a vontade da humanidade e a materialidade das coisas – entre elas, o corpo humano – ao segundo plano.

Renascimento na arte

Em meados dos séculos quinze e dezesseis (entre 1400 Depois de Cristo e 1500 Depois de Cristo), sobretudo na Itália, houve um resgate do pensamento e da estética da Grécia antiga. O corpo humano representado como marco para a relação entre proporção e beleza voltou ao centro da cena artística. Esse período é conhecido como Renascimento. Os artistas renascentistas também se dedicaram à produção de esculturas. As esculturas renascentistas eram feitas com a intenção de imitar a realidade. Esses artistas buscavam reproduzir as expressões e as proporções do corpo branco, já que o Renascimento aconteceu na Europa.

Uma das mais expressivas esculturas renascentistas é Davi, produzida por Miquelângelo Buonarroti (1475-1564) e reproduzida nesta página. Essa obra revela a influência da arte greco-romana e mostra a representação do corpo em posição semelhante àquela que vimos na obra Apoxiomeno. Essa peça foi esculpida em um bloco de mármore de mais de 5 metros de altura e mostra Davi, o herói bíblico que venceu o gigante Golias.

Fotografia. Escultura em mármore branco, de um homem nu, apoiado sobre uma estrutura de pedra. Ele está apoiado sobre a perna direita e a esquerda está levemente afastada, com o calcanhar levantado. Ele tem cabelos curtos e  cacheados, músculos definidos e mãos grandes. O braço esquerdo dele está semiflexionado, segurando  uma funda apoiada no ombro. O braço direito está estendido ao longo do corpo e com a mão ele  segura uma pedra.
BUONARROTI, Miquelângelo. Davi. 1501-1504. Escultura de mármore, 4,10 métros de altura. Galeria da Academia de Belas Artes, Florença, Itália.

Um dos detalhes que mais chamam a atenção nessa obra é o fato de as mãos de Davi terem sido esculpidas intencionalmente enormes pelo artista Michelangelo. Em sua opinião, por que Miquelângelo teria esculpido mãos tão grandes? Comente com os colegas.

Respostas e comentários

Contextualização

A escultura de Davi é uma das mais conhecidas da história da arte, que é uma vertente do estudo da História, com foco na transformação das ideias e tecnologias da arte, interpretando também as mudanças na história que a arte documentou ou sobre as quais exerceu algum papel. Portanto, a representação humana no centro da cena artística foi, na época da produção de Davi, símbolo de uma mudança do pensamento, em que a humanidade e certa ideia de racionalidade ganhavam centralidade.

Diferentemente das representações do corpo humano da Idade Média, a representação de Davi enfatiza aspectos terrenos, pois a postura e a fisionomia são de um jovem real. Davi, apesar de ser um herói bíblico, é um ser humano na obra de Miquelângelo: ele procura Golias com seu olhar, escondendo em sua mão direita a pedra que vai arremessar contra o tirano gigante. Miquelângelo iniciou essa escultura aos 26 anos e tinha 29 quando a finalizou (1501-1504). Ele usou um bloco de mármore, extraído na cidade de Carrara, região da Toscana, com mais de 5 metros de altura, o qual nenhum artista se dispôs a esculpir. A obra foi originalmente produzida para ser exposta em uma praça de Florença. Em 1873, no entanto, foi levada para a Galeria da Academia de Belas Artes de Florença. Uma réplica foi colocada na praça em 1910.

Muitos acreditam que o artista tenha feito as mãos de Davi grandes para representar o homem renascentista, que constrói sua história e carrega seu destino nas mãos.

Outros defendem que Miquelângelo teria usado essa obra para exaltar os artistas cujo instrumento de trabalho são as mãos. Destaque que, além das mãos, o tamanho da cabeça é desproporcional ao do corpo. Explique que, com base nessas características, estudiosos acreditam que Michelangelo pretendeu representar a necessidade do fazer (mãos) e do raciocinar (cabeça), ações importantes para o pensamento renascentista.

Por dentro da arte

O renascimento do Rárlem

O termo renascimento é muito associado aos séculos catorze e quinze na Europa, com a retomada dos valores culturais e estéticos da Antiguidade clássica. No entanto, ele já foi aplicado a outros contextos, com outras finalidades culturais.

O assim chamado Renascimento do Rárlem foi um período, posterior à Primeira Guerra Mundial (1914-1918), de grande florescimento político-cultural negro na região do Rárlem, em Nova iórque. Ali, houve uma profusão de experiências culturais no campo da música, da literatura, das artes visuais, da dança, da moda, do teatro e da política. O grande marco para esse movimento foi o livro O novo negro: uma interpretação, de alãn lóqui. Essa época inspirou muitos outros movimentos civis negros, como o Black power e o Black is beautiful.

Em geral, esse termo compreende um período aproximado entre 1918 e 1930, no qual se formou um ideário em todas essas frentes de atuação, baseado em orgulho racial, expressão criativa e valorização da intelectualidade negra. Tudo isso aconteceu porque naquela época e naquela região houve um grande fluxo migratório de famílias negras de outras regiões dos Estados Unidos e do Caribe.

Além da circulação da arte e da literatura, havia a luta por direitos civis para a população negra – como trabalho, participação política, acesso digno à educação etcétera – e a produção de jornais, que circularam pelo mundo e que, aliás, realizaram intercâmbios com jornais produzidos por negros do Brasil.

Nas artes visuais, muitos artistas, homens e mulheres, representaram a figura das pessoas negras com muita criatividade e dignidade. A artista UÍLER é uma delas.

Fotografia em preto e branco. Músicos se apresentam em conjunto, todos de trajes claros. À esquerda, um homem de cabelo escuro toca piano. Ao redor, há diversos homens que tocam instrumentos de sopro e uma mulher em pé. À frente, à direita, um homem toca bateria.
A Duke Ellington Orchestra executa Take the ‘A’ train com a cantora Bette Roche, no filme Reveille with Beverly, lançado em janeiro de 1943.

O Brasil, assim como os Estados Unidos, é um país com um grande percentual de população negra, além de uma forte influência das culturas de origem africana na língua, na arte, na culinária e nos modos de organização social. As pessoas negras sempre produziram arte, reconhecendo que ela é um modo de contar as suas histórias, manter tradições e ganhar representatividade no mundo. Por isso e pela qualidade dessa produção artística, os museus e outros espaços de arte têm se revisado criticamente para criar o devido espaço a essa produção artística.

E você, conhece artistas negros e negras? Como o trabalho deles ajuda a ler melhor o mundo em que você vive?

Pintura. Homem negro, calvo, de bigode e cavanhaque brancos, vestindo camisa branca, gravata azul e paletó marrom, está sentado, com o antebraço esquerdo apoiado sobre uma mesa e na mão segura um papel, enquanto o braço direito está semiflexionado e na mão segura um par de óculos de aros arredondados sem hastes.
, UÍLER. Uilian . . buá (1868-1963). Óleo sobre tela. 81,9 por 63,5 centímetros. Galeria Nacional de Retratos, Londres, Reino Unido.
Respostas e comentários

Por dentro da arte

Embora a associação com a ideia de renascimento aqui faça um grande salto histórico, o objetivo é discutir representação e autorrepresentação na arte. Se, nas páginas anteriores, a ideia tradicional europeia retoma a estética e o pensamento da Antiguidade greco-romana para reconstruir a sua arte, aqui neste exemplo artistas negros se encontram e fazem de uma época o apogeu das ideias, da experimentação e das estéticas negras nos Estados Unidos.

Por muito tempo, as pessoas negras não tiveram espaço para a sua representação na arte, sendo ocasionalmente pintadas por pessoas brancas. No entanto, não é preciso pesquisar muito para identificar como, tanto nos Estados Unidos como no Brasil, a produção artística e intelectual de pessoas negras é fundamental para a formação da identidade cultural: Machado de Assis, Lima Barreto, Mário de Andrade, Abdias do Nascimento, os irmãos Timótheo na pintura, Gilberto Gil, Dona Ivone Lara, Itamar Assumpção, Zezé Mota, Rosana Paulino, Ayrson Heráclito e tantos outros nomes, de tantas linguagens artísticas.

Pergunte aos estudantes se eles conseguem fazer uma relação entre a ideia de renascimento da página anterior e esta seção.

Pergunte a eles por que poderia ser importante para artistas negros e negras se autorrepresentarem na arte.

Comente que é um modo de fazer com que as pessoas negras sejam vistas, valorizadas e reconhecidas pelas grandes contribuições que deram e ainda dão às artes, à cultura e à sociedade no Brasil.

É preciso construir um repertório estético e um vocabulário para que, com o tempo, os estudantes identifiquem os problemas em torno da questão racial – a saber, o fato de o Brasil ser um país em que ainda há racismo, reverberando não apenas no campo simbólico, mas também nas desigualdades materiais e de trabalho. Eles precisam reconhecer essa questão e conseguir ferramentas, que a arte apresenta, para transformar esse imaginário e realidade social desde as suas relações humanas, pessoais, que começam em casa e na escola.

Leve referências de artistas negros para a sala de aula.

Indicações

Conheça a plataforma Projeto Afro, que divulga a produção de artistas negros contemporâneos, disponível em: https://oeds.link/ZV6ndF. Acesso em: 24 maio 2022.

Entre textos e imagens

Histórias afro-atlânticas

O Brasil também tem muitos artistas negros e negras proeminentes, atuantes em diferentes momentos históricos. Atualmente, muitas exposições, conteúdos on-line e publicações têm conquistado o devido espaço para a expressão das ideias e da arte desses artistas e pensadores.

Leia a transcrição de trechos da entrevista com Hélio Menezes na revista O 2º ato, publicada em 2019.

“O 2º ato esteve no Instituto tômi ôtáque para conversar com Hélio Menezes, um dos curadores da mostra Histórias afro-atlânticas, que marcou a cena das artes visuais em 2018.

Nestes tempos em que setores conservadores da sociedade brasileira hostilizam as comunidades e saberes negros, vale abrirmos a percepção para a potência encantadora de uma arte que moveu e move o mundo. reticências

[Hélio Menezes:] há muitos anos não se via uma produção artística negra tão potente e tão numerosa. Não só no Brasil, mas especialmente partindo do Brasil, a gente fez uma espécie de percurso da produção artística e intelectual negra, pelas Américas, pelo Caribe, pela África, especialmente pela África Atlântica, colocando em diálogo, em tensão, os diferentes períodos, artistas de diferentes táticas, suportes, temas, inspirações e poéticas, para recontar algumas histórias afro-atlânticas que no geral não aparecem nos nossos livros reticências.

Então era necessário dar um novo impulso, uma nova linguagem, trazendo essa exposição que ocupou dois museus, duas grandes instituições da cidade de São Paulo para tematizar as questões negras por um viés especialmente elaborado pelo olhar e produção de artistas negros do Brasil, das Américas, das Áfricas e do Caribe.”

No vídeo da entrevista, o curador e pesquisador caminha pela exposição, comentando algumas obras em sua singularidade e em relação com o todo.

“A gente começa essa seção, por exemplo, tomando a releitura que Abdias do Nascimento faz da bandeira brasileira. Ele verticaliza a nossa bandeira. Ele retira as palavras ‘ordem e progresso’ e substitui pela palavra ‘Okê’, do iorubá, que é uma saudação ao orixá Oxossi. Ele aparece aqui representado pelas suas insígnias; um arco e flecha que estruturam essa bandeira. É uma leitura que ele fornece para o nosso próprio país. Vale lembrar, ele fez essa obra durante o regime militar. Em 1970, Abdias do Nascimento já não estava aqui no Brasil; ele já estava vivendo como um exilado nos Estados Unidos.”

Para a entrevista, Hélio Menezes escolheu destacar alguns artistas e obras, como Abdias do Nascimento e Rosana Paulino. Eles podem ser um marco para iniciar na escola uma discussão sobre a produção artística e o pensamento negro no Brasil. Observe como ele apresenta os artistas ao mesmo tempo que descreve as imagens.

Fotografia. Homem jovem negro, de cabelo longo com dreads, barba e bigode pretos, sorri amplamente. Ele veste camisa branca com alguns botões e sem colarinho.
Hélio Menezes é antropólogo, atua como curador, crítico e pesquisador. Fotografia de 2020.
Respostas e comentários

Entre textos e imagens

A revista O 2º Ato é uma plataforma de difusão e pensamento artístico focada na produção de artistas e intelectuais negros. Por meio dela, é possível mobilizar vários conteúdos de Arte para serem trabalhados em sala de aula. Essa entrevista é uma transcrição do vídeo original. Se desejar, exiba o vídeo para que os estudantes possam ver o espaço da exposição e as obras comentadas na entrevista, disponível em: https://oeds.link/zCaT80. Acesso em: 18 fevereiro 2022.

Ao ler a entrevista com eles, primeiro destaque alguns elementos do gênero textual entrevista.

No caso dessa entrevista, vale destacar que o curador escolheu descrever as obras destacando os seus elementos visuais ou os procedimentos de sua feitura para promover uma interpretação ou reflexões que contribuam para o tema da exposição. Isso revela um aspecto importante do trabalho do curador: pesquisar e divulgar a produção dos artistas. No caso dessa exposição, o tema geral eram os assim chamados fluxos e refluxos das trocas que se realizaram entre as Áfricas e as Américas, intermediadas pela distância e pelo trajeto pelo Oceano Atlântico.

Questão

Espera-se que os estudantes digam que o curador é a pessoa que pesquisa arte para organizar exposições.

Em uma exposição como essa, por exemplo, faz-se uma ampla pesquisa de obras, pensa-se todo o espaço da exposição, considerando quais obras ficarão ao lado de quais outras obras e por quê. Também é feito um catálogo, que reproduz a imagem das obras e traz textos de especialistas sobre o tema.

Sugestão de atividade

Se considerar oportuno, proponha uma prática interdisciplinar com Língua Portuguesa. Os estudantes poderão acessar a revista O 2º ato virtualmente para identificar os diferentes tipos de conteúdo da revista, isto é, para reconhecer categorias multimodais de textos – ensaios visuais, entrevistas em áudio, artigos etcétera Eles devem identificar diferentes tipos de conteúdo apresentados e opinar sobre as suas preferências em relação a eles, justificando a sua opinião. Ao final da proposta, vocês poderão fazer uma roda de conversa para que eles conversem sobre a experiência.

A avaliação da proposta pode considerar a capacidade de identificar e inferir sobre as diferenças entre os gêneros textuais e de formular uma opinião com base em sua autopercepção como leitores desses textos multimodais. As contribuições na roda de conversa final deverão ser consideradas.

“Temos, por exemplo, Rosana Paulino, que aparece com uma obra de uma série mais ampla chamada Bastidores. Ela fez uma pesquisa nos arquivos da própria família, arquivos fotográficos – os documentos de sua família – e, por sobre fotografias de mulheres parentes suas, nesse instrumento que também se chama bastidor. E o título da obra também tem esse duplo sentido: o bastidor, que é tanto esse instrumento oval onde se faz a costura, como os bastidores, que é o que está por detrás da cena. Ela brinca com essa dualidade e faz uma sutura por sobre a boca [da fotografia] dessas mulheres. reticências A partir de questões do presente, volta a imagens do passado para problematizar questões que não só dizem respeito ao nosso passado escravocrata, que ainda se mantém de alguma maneira, que se reconstrói no nosso cotidiano atual.”

O 2º ato. Entrevista Hélio Menezes sobre impulsos, horizontes e tensões – visita mediada à expo Histórias afro-atlânticas. Disponível em: https://oeds.link/zCaT80 Acesso em: 18 fevereiro 2022.

Questão

1. Você sabe o que é curador?

Faça no diário de bordo.

Experimentações

 

Ao longo do Tema 2, a representação da figura humana foi trabalhada em diferentes suportes artísticos. Agora, você fará representações da figura humana em seu diário de bordo, desenhando os seus colegas.

Ilustração. Ícone Diário de bordo.

Material

  • Canetinhas
  • Lápis de cor
  • Lápis grafite

Procedimentos

a) Para iniciar a atividade, você e seus colegas devem sentar-se em uma área aberta da escola, como o pátio, a quadra ou o jardim.

b) Vocês poderão usar lápis de cor, lápis grafite e canetinhas para desenhar.

c) Procure desenhar no papel exatamente aquilo que você vê, como em um desenho de observação. É uma tentativa de fazer um desenho realista, agregando sombra, movimento e proporções próximas do real.

d) Depois de fazer algumas tentativas, troque de posição e busque outros modelos.

e) Ao final da atividade, vocês podem formar rodas e olhar os diários de bordo uns dos outros.

f) Para finalizar a atividade, conversem sobre essa experiência. Considerem falar sobre as dificuldades que tiveram, sobre como tentaram solucioná-las e busquem destacar os pontos fortes e de maior interesse nos desenhos que os colegas apresentaram.

Fotografia. Duas meninas adolescentes sentadas sobre um gramado, com as pernas cruzadas. A da esquerda tem cabelo longo, cacheado e castanho e veste camiseta amarela e calça azul-escuro. A da direita tem cabelo médio, ondulado e castanho e veste camiseta amarela e calça azul-claro. A menina à esquerda segura nas mãos lápis e caderno. A outra olha na direção dela e sorri. Ao fundo, um prédio escolar e árvores.
Estudante desenhando retrato da amiga. São Paulo, 2022.
Respostas e comentários

Experimentações

Oriente os estudantes a tentar desenvolver o hábito de desenhar no diário de bordo. Conte para eles que a figura humana é uma das mais difíceis de desenhar e que, por isso, esse exercício desenvolve essa habilidade.

É importante que você esteja atento para garantir que a observação mútua entre os estudantes seja respeitosa. Eles devem escolher desenhar quem eles quiserem, mas sem coibir ou constranger a pessoa que será desenhada em hipótese nenhuma. Esse exercício requer muita confiança e segurança entre o grupo.

Se perceber que estão envergonhados, lembre-os de que todos estão desenhando e sendo desenhados; observando e sendo observados. Uma possibilidade é levar uma caixa de som e colocar uma música agradável e do gôsto de todos, mas que não os distraia da tarefa de desenhar.

Durante a condução, circule livremente, dê sugestões e faça observações sobre as soluções gráficas de desenho que mais chamarem a sua atenção.

Durante a conversa final, você pode fazer algumas relações entre os desenhos, destacar coletivamente as soluções gráficas que mais chamaram a atenção; pode contar sobre as dificuldades que observou os estudantes enfrentarem durante o exercício e destacar as soluções que eles criaram.

Avaliação

Os estudantes poderão ser avaliados pela sua colaboração e respeito com os colegas e pelas soluções gráficas produzidas com o desenho.

Glossário

Doutrina
: conjunto de ideias de uma religião.
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Afresco
: a pintura feita sobre paredes ou tetos de gesso, quando a massa ainda está úmida.
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