Unidade 2  Teatro e sociedade

Fotografia. Apresentação teatral. Quatro pessoas em um tablado, todas vestidas com roupas coloridas e estampadas e adereços que remetem à vida rural no Nordeste: chapéu sertanejo, bolsas e sandálias de couro, vestido de chita. Da esquerda para a direita: mulher de cabelo longo castanho, usando um vestido de chita com motivos florais. Ela está ajoelhada segurando um cachorro de pelúcia com o braço direito. Com a mão esquerda, segura a mão de um homem. Seu rosto expressa tristeza. Homem de cabelo curto e chapéu de palha decorado com flores, vestindo calça verde e colete azul-claro com flores estampadas; ele está ajoelhado, abraçando a mulher e segurando sua mão. Homem vestindo sandálias e chapéu de couro, bolsa a tiracolo, calça jeans curta, camiseta e casaco em tons de laranja e cinza. Ele olha para a direita com expressão de curiosidade. Homem vestindo sandálias de couro e um pequeno chapéu, calça vermelha e blusa amarela com detalhes vermelhos, além de uma bolsa de couro a tiracolo. Ele está com a cabeça voltada para a direita. Ao fundo, dois banquinhos de madeira e alguns objetos coloridos espalhados pelo chão.
O grupo Teatro Experimental de Arte (téa), de Caruaru (Pernambuco), encena o espetáculo Auto da Compadecida, em Duque de Caxias (Rio de Janeiro), em 2016.

Nesta Unidade:

TEMA 1 Uma dramaturgia moralizante

TEMA 2 O teatro como retrato de uma época

TEMA 3 O teatro como ato político

Respostas e comentários

Competências da Bê êne cê cê

As competências favorecidas nesta Unidade são:

Competências gerais: 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7.

Competências específicas de Linguagens para o Ensino Fundamental: 1, 2, 3, 5 e 6.

Competências específicas de Arte para o Ensino Fundamental: 1, 2, 3, 5, 6, 7, 8 e 9.

Objetos de conhecimento e habilidades da Bê êne cê cê

As habilidades favorecidas nesta Unidade são:

Artes visuais

Contextos e práticas

(ê éfe seis nove á érre zero dois)

(ê éfe seis nove á érre zero três)

Materialidades

(ê éfe seis nove á érre zero cinco)

Teatro

Contextos e práticas

(ê éfe seis nove á érre dois quatro)

(ê éfe seis nove á érre dois cinco)

Elementos da linguagem

(ê éfe seis nove á érre dois seis)

Processos de criação

(ê éfe seis nove á érre dois sete)

(ê éfe seis nove á érre dois oito)

(ê éfe seis nove á érre dois nove)

(ê éfe seis nove á érre três zero)

Artes integradas

Contextos e práticas

(ê éfe seis nove á érre três um)

Processos de criação

(ê éfe seis nove á érre três dois)

Matrizes estéticas e culturais

(ê éfe seis nove á érre três três)

Patrimônio cultural

(ê éfe seis nove á érre três quatro)

Arte e tecnologia

(ê éfe seis nove á érre três cinco)

Sobre esta Unidade

Esta Unidade se divide em três vieses que ajudam a compreender o teatro e a sua história no Brasil. No Tema 1, os estudantes partem do exemplo do Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, para conhecer o gênero teatral auto, de origem medieval, que tem uma função moralizante no Brasil. No Tema 2, o foco é o teatro como retrato de uma época e da vida social, com ênfase no teatro moderno e na obra O rei da vela. Por fim, no Tema 3, os estudantes são apresentados a uma perspectiva política do teatro, com o foco nas experiências teatrais e nos grupos brasileiros da época da ditadura civil-militar (1965-1984), como o Teatro Arena e o Teatro do Oprimido. Ao longo da Unidade, os estudantes fazem diversas experimentações teatrais em torno desses conteúdos e realizam pesquisas bibliográficas e sobre o patrimônio cultural brasileiro.

De olho na imagem

Fotografia. Apresentação teatral. Quatro pessoas em um tablado, todas vestidas com roupas coloridas e estampadas e adereços que remetem à vida rural no Nordeste: chapéu sertanejo, bolsas e sandálias de couro, vestido de chita. Da esquerda para a direita: mulher de cabelo longo castanho, usando um vestido de chita com motivos florais. Ela está ajoelhada segurando um cachorro de pelúcia com o braço direito. Com a mão esquerda, segura a mão de um homem. Seu rosto expressa tristeza. Homem de cabelo curto e chapéu de palha decorado com flores, vestindo calça verde e colete azul-claro com flores estampadas; ele está ajoelhado, abraçando a mulher e segurando sua mão. Homem vestindo sandálias e chapéu de couro, bolsa a tiracolo, calça jeans curta, camiseta e casaco em tons de laranja e cinza. Ele olha para a direita com expressão de curiosidade. Homem vestindo sandálias de couro e um pequeno chapéu, calça vermelha e blusa amarela com detalhes vermelhos, além de uma bolsa de couro a tiracolo. Ele está com a cabeça voltada para a direita. Ao fundo, dois banquinhos de madeira e alguns objetos coloridos espalhados pelo chão.
Atores do grupo Teatro Experimental de Arte (téa) em apresentação da peça Auto da Compadecida, em Duque de Caxias (Rio de Janeiro), em 2016. Da esquerda para a direita, os atores Mandy Freire, Ícaro Rafael, Deivid Gadelha e Djéksôn Freire.

Faça no diário de bordo.

  1. Descreva a fotografia da abertura: quantos atores participam da cena, como é o figurino deles, que elementos cenográficos podem ser observados?
  2. Como os atores estão posicionados na cena retratada?
  3. Qual é a importância da expressão corporal dos atores na cena apresentada na imagem? O que o corpo deles comunica?
  4. Que personagens os atores estariam representando?
  5. A apresentação dessa peça está acontecendo em que tipo de espaço?
  6. Leia agora a legenda da imagem. Considerando o título do espetáculo, você imagina qual seria o enredo dessa peça?
  7. Você já assistiu a alguma montagem teatral ou a algum filme que se baseia na história dessa peça? Em caso afirmativo, fale sobre essa história com o professore os colegas.
Versão adaptada acessível

1. Com suas palavras descreva a fotografia da abertura: quantos atores participam da cena, como é o figurino deles, que elementos cenográficos podem ser observados?

2. Como os atores estão posicionados na cena retratada?

3. Qual é a importância da expressão corporal dos atores na cena apresentada na imagem? O que o corpo deles comunica?

4. Que personagens os atores estariam representando?

5. A apresentação dessa peça está acontecendo em que tipo de espaço?

6. Leia agora a legenda da imagem. Considerando o título do espetáculo, você imagina qual seria o enredo dessa peça?

7. Você já assistiu a alguma montagem teatral ou a algum filme que se baseia na história dessa peça? Em caso afirmativo, fale sobre essa história com o professor e os colegas.

Respostas e comentários

De olho na imagem

Aproveite o momento criado por esta seção para realizar uma avaliação diagnóstica. As questões retomam diversos aspectos possivelmente trabalhados com a turma nos anos anteriores, como cena, enredo, espacialidade, gestualidade, além de convocar os estudantes a interpretar e a compartilhar outras referências teatrais que eles tenham. Verifique como eles mobilizam o vocabulário específico da linguagem e busque reconhecer os principais anseios e interesses deles relacionados às aulas, de modo a poder adaptar as propostas para contemplá-los.

  1. A fotografia mostra quatro atores em cena. Seus figurinos lembram roupas simples, feitas de tecidos coloridos e com estampas variadas. As cores e os adereços, além dos tipos de tecido, possibilitam presumir que representam pessoas simples, do interior. As personagens masculinas usam chapéus, e a personagem feminina carrega consigo um animal de pano (pode ser um bezerro ou um porquinho). Em seu vestido, há babados e detalhes floridos. As duas personagens que estão em pé, à direita, calçam sandálias simples, remetendo a tipos populares. Já o cenário é composto apenas de dois banquinhos e alguns objetos coloridos, uma referência à cultura popular.
  2. Dois atores (à esquerda na fotografia) estão ajoelhados e outros dois (à direita) estão em pé, olhando para o lado esquerdo deles. Os atores ajoelhados estão de mãos dadas.
  3. Chame a atenção dos estudantes para as mãos e para o rosto dos atores e enfatize como o corpo de cada um deles “fala” com o público. Saliente, por exemplo, as expressões faciais da atriz (retratada à esquerda na fotografia) e pergunte a eles o que ela parece comunicar.
  4. Espera-se que, para elaborar suas hipóteses, eles considerem, por exemplo, o figurino que os atores estão usando. É possível que eles mencionem que os dois atores ajoelhados interpretam um casal.
  5. Espera-se que os estudantes mencionem que a apresentação acontece em um espaço convencional: o palco italiano. Pergunte a eles se esse é o único espaço em que podem ocorrer as apresentações teatrais. Relembre-os de que o teatro também pode acontecer em espaços não convencionais.
  6. É possível que, mesmo não conhecendo a peça, eles consigam relacionar o enredo com algo que envolva valores religiosos, uma vez que já terão feito a leitura do figurino dos atores.
  7. É possível que os estudantes já tenham assistido a alguma montagem de Auto da Compadecida feita para a televisão ou para o cinema. Peça a eles que falem sobre o que se lembram da história.

Artista e obra

Teatro Experimental de Arte

O grupo responsável pela montagem da peça Auto da Compadecida, que conhecemos no início desta Unidade, é o Teatro Experimental de Arte (téa). Fundado em 1962, em Caruaru (PE), o téa foi criado por iniciativa de atores e diretores locais, entre eles o casal Arary Marrocos e Argemiro Pascoal.

Fotografia. Grupo de treze pessoas, algumas agachadas à frente e outras em pé atrás. Há pessoas segurando instrumentos musicais, como flauta, rabeca, pandeiros e chocalhos. Eles estão sorrindo, posando para a foto.
Integrantes do Teatro Experimental de Arte (téa), em Caruaru (Pernambuco), 2016.

Ao longo de mais de cinquenta anos, o téa encenou dezenas de peças. Um dos espetáculos de maior sucesso e com o qual o grupo recebeu muitos prêmios foi a montagem de Morte e vida severina, realizada em 2001.

Além de desenvolver e apresentar peças de teatro, os integrantes do téa se dedicam à formação de jovens atores. Para isso, o grupo oferece oficinas de iniciação teatral em sua séde, o Teatro Licio Neves, e realiza anualmente o Festival de Teatro do Agreste (Fêtêági), evento criado por Fabio Pascoal, filho de Arary Marrocos e Argemiro Pascoal. Participam desse festival estudantes de escolas públicas e particulares do Agreste pernambucanoglossário .

Fotografia. Apresentação teatral em um palco. À esquerda, uma mulher está sentada no chão, com as pernas cruzadas. À direita, mulheres e homens vestidos com roupas coloridas estão em pé. Um jovem de boné bege, que veste camiseta laranja e bermuda amarela, está segurando e observando uma bandeira do Brasil. Os demais estão atrás dele. Ao fundo, brinquedos espalhados pelo tablado, como um pequeno avião e um pônei de plástico com rodinhas.
Cena do espetáculo Jogos na hora da sesta, do Teatro Experimental de Arte (téa), apresentado no 27o Festival de Teatro do Agreste (Fêtêági). Caruaru (PE), 2017.

Outra iniciativa desenvolvida pelo téa é o projeto Teatro na Comunidade, que tem o objetivo de levar o teatro para lugares habitados por pessoas que, em geral, não têm acesso a esse tipo de apresentação artística. O Auto da Compadecida, por exemplo, foi apresentado pelo grupo em cidades e em áreas rurais de diversos estados brasileiros.

Em 2008, o téa foi reconhecido como Patrimônio Vivo de Pernambuco, título concedido a artistas e grupos que contribuem para a constituição e a preservação da cultura popular e tradicional pernambucana.

Respostas e comentários

Artista e obra

Comente com os estudantes que entre os Patrimônios Vivos de Pernambuco, além do Teatro Experimental de Arte, figuram nomes como a cirandeira Lia de Itamaracá; os xilógrafos Dila, jóta. Borges e José Costa Leite; e Claudionor Germano, um dos mais conhecidos divulgadores mundiais do frevo, assim como grupos artísticos, como o Maracatu Estrela de Ouro da Aliança e o bloco carnavalesco Clube de Alegorias e Crítica Homem da Meia-Noite, de Olinda (Pernambuco). Para mais informações sobre os Patrimônios Vivos de Pernambuco, consulte o Portal da Cultura Pernambucana em: https://oeds.link/LitC6z. Acesso em: 20 fevereiro 2022.

A proposta do Teatro Experimental de Arte (téa) gira em torno da experimentação artística. Comente que esse princípio de trabalho envolve a ideia de um processo teatral não vinculado às regras do mercado (em que a produção busca satisfazer a clientela). Antes, a experimentação artística prioriza a criação de novas possibilidades estéticas e de novas soluções cênicas que dialoguem com as inquietações do seu tempo.

Esse caráter experimental se vincula diretamente ao fato de o téa, além da montagem de espetáculos teatrais, estar profundamente comprometido com as perspectivas de formação teatral de seus integrantes e das comunidades nordestinas.

Comente com os estudantes a importância do trabalho pedagógico desenvolvido pelo téa: o grupo vem fomentando a formação de público e a descoberta da linguagem teatral por pessoas que, normalmente, não teriam acesso a essas experiências.

Comente também que, ao promover apresentações em comunidades e oferecer oficinas, o téa contribui para o desenvolvimento artístico das pessoas que vivenciam suas práticas, ampliando seus horizontes e suas fórmas de olhar para o mundo.

Tema 1  Uma dramaturgia moralizante

Auto da Compadecida

Na abertura desta Unidade você viu uma imagem da montagem que o Teatro Experimental de Arte fez da peça Auto da Compadecida. O texto dessa peça foi escrito em 1955 pelo dramaturgo brasileiro Ariano Suassuna (1927-2014). Leia, na próxima página, mais informações sobre esse escritor.

A primeira montagem de Auto da Compadecida ocorreu em 1956, no Teatro Adolescente do Recife (Pernambuco). Nessa peça, são abordados elementos relacionados ao sagrado e ao profanoglossário . De um lado, estão temas cristãos, como o pecado e o arrependimento; de outro, a esperteza e a luta pela sobrevivência. Ao longo da história, diferentes personagens – um típico malandro, um covarde mentiroso, um padeiro e sua esposa, um padre e um cangaceiroglossário – envolvem-se em situações que mesclam os hábitos mundanos (ou seja, que pertencem ao mundo material) a valores sagrados e religiosos. O destino de algumas dessas personagens é decidido em um julgamento do qual participam o Encourado (o diabo), Manuel (Jesus Cristo) e a Compadecida (Virgem Maria).

Fotografia. À esquerda, mulher vestida com um manto azul-claro, que lhe cobre a cabeça, e vestes amarelo e rosa, cheias de detalhes com pedrarias. Na cabeça, há uma auréola feita com pedrarias. Ao seu lado, um homem de cabelo escuro e barba, vestindo um manto vermelho e azul, com uma túnica branca com detalhes em azul-claro e pedrarias ao centro. Em sua cabeça, há uma coroa de espinhos.
Os atores Maria Lima (a Compadecida) e Pedro Henrique Gonçalves (Manuel), do téa, em cena do espetáculo Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, em Caruaru (Pernambuco). Fotografia de 2016.
Respostas e comentários

Objetivos

  • Conhecer a obra Auto da Compadecida e entender a importância de seu autor: Ariano Suassuna.
  • Analisar a influência do auto sobre a produção teatral contemporânea.
  • Entender a origem do auto como gênero teatral.
  • Conhecer elementos da produção teatral de Gil Vicente.
  • Entender criticamente de que fórma o teatro e as artes visuais foram utilizados como instrumento de catequização durante os anos de colonização.
  • Compreender o papel desempenhado pelo padre José de Anchieta no processo de catequização dos indígenas.
  • Entender e vivenciar a experiência de realizar uma leitura dramática.
  • Experienciar a criação de trabalhos artísticos coletivamente.

Habilidades favorecidas neste Tema

(ê éfe seis nove á érre zero dois), (ê éfe seis nove á érre dois quatro), (ê éfe seis nove á érre dois cinco), (ê éfe seis nove á érre dois oito), (ê éfe seis nove á érre dois nove), (ê éfe seis nove á érre três um), (ê éfe seis nove á érre três dois), (ê éfe seis nove á érre três três) e (ê éfe seis nove á érre três quatro).

Contextualização

Explique aos estudantes que a peça Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, aborda com humor questões que historicamente afligem o povo nordestino, como a seca e a fome, além de discutir a espiritualidade e evidenciar os vícios e as maldades humanos.

Comente com eles que a história dessa peça é narrada por um palhaço, que atua como um apresentador, entrando e saindo de cena, dialogando com o público.

Se julgar oportuno, ao abordar o contexto histórico da peça, informe aos estudantes que os grupos de cangaceiros formaram-se no início da Primeira República (1889-1930), período marcado pela concentração de propriedades rurais, pelas secas e pela ação dos coronéis, o que causava muitas dificuldades para os sertanejos.

No início, chefes políticos locais ofereciam a esses grupos sustento e moradia em troca de proteção nas disputas com adversários, mas, com o tempo, os cangaceiros se tornaram independentes. A formação dos primeiros grupos independentes está associada às grandes secas que devastaram a economia sertaneja e obrigaram muitas famílias a sair de sua pequena roça em busca de sustento em outras regiões. Em 1877, o sertão nordestino foi atingido por uma terrível seca. Aproximadamente 500 mil pessoas morreram em decorrência dela e mais de 3 milhões de pessoas ficaram sem moradia e precisaram buscar a sobrevivência em outras áreas. O mais conhecido dos cangaceiros foi Virgulino Ferreira da Silva (cêrca de 1898-1938), o Lampião.

Artista e obra

Ariano Suassuna

Ariano Suassuna (1927-2014) foi um dos mais importantes dramaturgos brasileiros. Nascido em João Pessoa, na Paraíba, Suassuna usou sua obra para defender e difundir a cultura nordestina. Em Auto da Compadecida, por exemplo, ele criou personagens que têm como referência a vida e os hábitos de homens e mulheres que vivem no Sertão.

Em 1947, Suassuna escreveu Uma mulher vestida de sol, seu primeiro texto teatral. Outras peças de sucesso escritas pelo dramaturgo foram O santo e a porca (1958), Farsa da boa preguiça (1960) e O casamento suspeitoso (1957). Suassuna também escreveu poemas e romances. Suas obras foram traduzidas para outros idiomas.

Fotografia. Homem idoso, calvo, vestindo uma camisa branca. Ele sorri discretamente.
O escritor paraibano Ariano Suassuna, em Caçapava (São Paulo). Fotografia de 2010.
Fotografia. Apresentação teatral. Um grupo de pessoas encena uma conversa em um tablado. Da esquerda para a direita: uma mulher com vestido claro; um homem de cabelos brancos vestido com camisa branca e colete e calças na cor rosa; uma mulher com lenço na cabeça e blusa rosa e saia branca; um padre de óculos vestido com uma batina vermelha; um homem de calça vermelha curta, colete marrom e um chapéu quadrado na cabeça. Ao fundo, cenário imitando o interior de uma casa com duas janelas abertas e alguns móveis.
Os atores Fran Dahm, Vini Ferreira, Maria Fernanda Fichel, Luciano Risalde e Bruno Yudi, da Companhia Fulano di Tal, em cena do espetáculo O santo e a porca, de Ariano Suassuna, em Campo Grande (Mato Grosso do Sul), em 2015.

Ariano Suassuna idealizou o Movimento Armorial, lançado na cidade de Recife, em Pernambuco, em 1970. Esse movimento visava valorizar a arte e a cultura popular nordestinas tradicionais em suas diferentes manifestações, como a pintura, a literatura, a música, o teatro e a dança.

Em 1989, Suassuna foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras (á bê éli), em reconhecimento por sua contribuição à arte e à cultura brasileiras.

Respostas e comentários

Artista e obra

Ao abordar a obra de Ariano Suassuna, é fundamental destacar a importância desse dramaturgo do Movimento Armorial para a cultura nacional. Mais informações a esse respeito podem ser encontradas no texto “A demanda da poética popular” nas Leituras complementares, nas páginas iniciais deste Manual.

Se possível, comente que um dos herdeiros culturais do Movimento Armorial é o pernambucano Antonio Nóbrega, ator, compositor, dançarino, coreógrafo e dramaturgo.

Nascido em Recife (Pernambuco), em 1952, Antonio Nóbrega iniciou sua trajetória artística ao aprender a tocar violino, instrumento que o acompanha até hoje. Mas foi em 1971, quando Ariano Suassuna o convidou a integrar o Movimento Armorial, que Nóbrega se aproximou definitivamente das manifestações populares, tornando-se referência do universo brincante (modo como os artistas populares se autodenominam, pois dizem que vão “brincar” de cantar e dançar).

Antonio Nóbrega desenvolveu um estilo próprio de canto, dança e artes cênicas, tendo produzido uma extensa obra de espetáculos e discografia.

Recentemente, em parceria com o cineasta Walter Carvalho, protagonizou o documentário Brincante, que apresenta ao público sua trajetória artística e sua ligação com elementos da cultura popular, como o maracatu e o frevo.

Ao lado de sua esposa, Rosane Almeida, Antonio Nóbrega também é o idealizador e diretor do Instituto Brincante, em São Paulo (São Paulo), um polo de formação e difusão da arte e da cultura popular.

Entre textos e imagens

Auto da Compadecida

Leia, a seguir, um trecho da peça Auto da Compadecida, escrita por Ariano Suassuna.

Fotograma. Mulher idosa vestida com túnica vermelha e manto azul, que lhe cobre a cabeça, além de uma auréola dourada formada por pequenos gravetos. Ao fundo, sentado em um trono dourado, está um homem de cabelo e barbas curtos, vestindo uma túnica branca com um coração exposto sobre o peito.
Fotograma do filme O Auto da Compadecida (2000), adaptação da obra de Ariano Suassuna, com direção de Guel Arraes. Os atores Fernanda Montenegro e Maurício Gonçalves (a Compadecida e Manuel).

reticências

Manuel — E agora, nós, João Grilo. Por que sugeriu o negócio pra os outros e ficou de fóra?

João Grilo — Porque, modéstia à parte, acho que meu caso é de salvação direta.

Encourado — Era o que faltava! E a história que estava preparada para a mulher do padeiro?

Manuel — É, João, aquilo foi grave.

João Grilo — E o senhor vai dar uma satisfação a esse sujeito, me desgraçando pra o resto da vida? Valha-me Nossa Senhora, mãe de Deus de Nazaré, já fui menino, fui homemreticências

A Compadecida (sorrindo) — Só lhe falta ser mulher, João, já sei. Vou ver o que posso fazer. (a Manuel) Lembre-se de que João estava se preparando para morrer quando o padre o interrompeu.

Encourado — É, e apesar de todo o aperreio, ele ainda chamou o padre de cachorro bento.

A Compadecida — João foi um pobre como nós, meu filho. Teve de suportar as maiores dificuldades, numa terra seca e pobre como a nossa. Não o condene, deixe João ir para o purgatório.

João Grilo — Para o purgatório? Não, não faça isso assim não. (chamando a Compadecida à parte) Não repare eu dizer isso, mas é que o diabo é muito negociante e com esse povo a gente pede mais, para impressionar. A senhora pede o céu, porque aí o acordo fica mais fácil a respeito do purgatório.

A Compadecida — Isso dá certo lá no sertão, João! Aqui se passa tudo de outro jeito! Que é isso? Não confia mais na sua advogada?

João Grilo — Confio, Nossa Senhora, mas esse camarada termina enrolando nós dois!

Respostas e comentários

Entre textos e imagens

Faça a leitura do texto com os estudantes a fim de que se apropriem do vocabulário e da interpretação de texto.

A Compadecida — Deixe comigo. (a Manuel) Peço-lhe então, muito simplesmente, que não condene João.

Manuel — O caso é duro. Compreendo as circunstâncias em que João viveu, mas isso também tem um limite. Afinal de contas, o mandamento existe e foi transgredido.

A Compadecida — Dê-lhe então outra oportunidade.

Manuel — Como?

A Compadecida — Deixe João voltar.

Manuel — Você se dá por satisfeito?

João Grilo — Demais. Pra mim é até melhor, porque daqui pra lá eu tomo cuidado na hora de morrer e não passo nem pelo purgatório, pra não dar gosto ao Cão.

reticências

João Grilo — Quer dizer que posso voltar?

Manuel — Pobre, João, vá com Deus!

João Grilo — Com Deus e com Nossa Senhora, que foi quem me valeu. (ajoelhando-se diante de Nossa Senhora e beijando-lhe a mão) Até a vista, grande advogada. Não me deixe de mão não, estou decidido a tomar jeito, mas a senhora sabe que a carne é fraca.

A Compadecida — Até a vista, João.

João Grilo (beijando a mão do Cristo) — Muito obrigado Senhor. Até a vista.

Manuel — Até a vista, João.

(João bota o velho e esburacado chapéu de palha na cabeça e vai saindo.)

Manuel — João!

João Grilo — Senhor?

Manuel — Veja como se porta.

João Grilo — Sim senhor.

(Sai de chapéu na mão, sério, curvando-se.)

reticências

SUASSUNA, Ariano. Auto da Compadecida. Rio de Janeiro: MEDIAfashion, 2008. página 133-138. (Coleção Folha Grandes escritores brasileiros).

Faça no diário de bordo.

Questões
  1. Com a orientação do professor, reúna-se aos colegas para realizar uma atividade com base no trecho de Auto da Compadecida que vocês conheceram.
    1. Caminhe pelo espaço, lendo o texto silenciosamente.
    2. Depois, siga as indicações do professor sobre: pontuações, leitura com modulação de volume e variação de entonações.
    3. Quando for indicado, volte à leitura silenciosa e forme uma roda.
    4. Selecione uma frase do texto e a diga para outro colega, olhando nos olhos dele e experimentando as variações que realizou individualmente.
    5. Ao final da atividade, compartilhe com o professor e os colegas a experiência vivenciada. Registre suas impressões em seu diário de bordo.
      Ilustração. Ícone do diário de bordo.
Respostas e comentários

A atividade da seção Entre textos e imagens propõe uma prática de experimentação vocal. Se possível, providencie cópias avulsas do texto e desenvolva a prática sugerida em um espaço amplo e sem carteiras. Durante toda a atividade, observe a ação e a expressão vocal dos estudantes. Solicite que realizem a atividade de fórma relaxada, sem forçar a garganta. Se possível, peça a eles que tenham consigo copos ou garrafas com água, para que possam hidratar a garganta ao longo de toda a atividade.

  • Caminhada: com o texto nas mãos, peça aos estudantes que caminhem pelo espaço, lendo-o silenciosamente. Dê instruções como: Observem a pontuação. Ponto-final é diferente de ponto de exclamação. Identifiquem as pausas e as vírgulas. Na sequência, proponha que a leitura seja feita em um volume muito baixo, em fórma de sussurro. Dê um tempo para que seja feita essa leitura sussurrada e, então, solicite a eles que aumentem o tom da voz. Nesse momento, oriente-os a explorar diferentes entonações na leitura do texto, brincando com velocidades, volumes e entonações: Experimentem timbres diferentes. Digam esse texto muito lentamente. Digam esse texto rapidamente! Explorem a voz em graves e agudos. Fique atento para que não forcem a voz, apenas aumentem o volume vocal de fórma saudável. Após um período de experimentação, peça-lhes que retornem à leitura silenciosa e caminhem até formar uma roda.
  • Roda: com os estudantes em roda, solicite a eles que, um de cada vez, selecionem uma frase do texto e a digam para outro colega. Nesse momento, é importante que, ao dizer a fala, aquele que a diz o faça olhando nos olhos do colega escolhido. Para isso, o estudante deve ler a frase do texto e dizê-la diretamente, após uma rápida memorização. Caso o estudante esqueça a frase, ele deverá interromper a fala, “pescar” novamente a frase do texto e só então, após restabelecer a conexão pelo olhar, dizer a frase escolhida. Nessa roda, você pode incentivar os estudantes a resgatar as experimentações da caminhada e a trabalhar novas entonações. Dê instruções como: Diga a frase olhando nos olhos! Fale a frase explorando diferentes velocidades! Explore diferentes volumes! Explore fórmas inusitadas de falar a frase escolhida!

Incentive os estudantes com dificuldades de se expressar em voz alta e de fórma coletiva. Indica-se que, na formação de duplas, sejam unidos estudantes de diferentes perfis expressivos, para que um possa auxiliar o outro no desenvolvimento da atividade.

O texto apresenta expressões populares, que se aproximam de linguagens da cultura tradicional nordestina. Observe se os estudantes identificam tais expressões e como as enunciam. Atente-os para que não reproduzam estereótipos. Após a atividade, reflitam coletivamente sobre esse tema.

Avaliação

Nessa atividade, podem-se avaliar a compreensão do texto pelos estudantes, a leitura em voz alta e a enunciação das palavras. A atividade auxilia, também, na observação da expressividade vocal dos estudantes, da criatividade nas variações das emissões de palavras e frases e da disponibilidade para o trabalho coletivo.

Por dentro da arte

Adaptações de Auto da Compadecida

As imagens reproduzidas a seguir foram extraídas de O Auto da Compadecida, filme dirigido por Guel Arraes e lançado no ano 2000. Esse filme é uma adaptação do texto original do dramaturgo Ariano Suassuna.

Fotograma. Quatro fotogramas.
1: Dois homens jovens vestindo roupas esfarrapadas com os chapéus pendurados sobre as costas. Eles estão em um lugar árido e seco. Ao fundo, observa-se vegetação retorcida e seca.
2: Homem de cabelo preto cacheado, vestindo roupas esfarrapadas e um tecido sobre a cabeça. Atrás dele, há pedras grandes.
3:  Mulher idosa vestida com  uma túnica vermelha e um manto azul, além de uma auréola dourada atrás de sua cabeça. Ela acaricia o rosto de um jovem de cabelos e barba pretos que tem uma coroa de espinhos em sua cabeça e está vestido com uma túnica clara com um coração exposto sobre o peito. 
4: Homem de cavanhaque preto longo e  penteado que forma dois chifres nas laterais da cabeça. Ele veste uma túnica cinza com detalhes em prata e está em frente a uma mesa com um grande livro aberto e diversas velas vermelhas.
Fotogramas do filme O Auto da Compadecida (2000), adaptação da obra de Ariano Suassuna, com direção de Guel Arraes. 1. Os atores Selton Mello e Matheus Náchtergále (como Chicó e João Grilo); 2. Marco Nanini (o Capitão); 3. Fernanda Montenegro e Maurício Gonçalves (a Compadecida e Manuel); 4. Luís Melo (o Diabo).

Primeiro, Guel Arraes transformou a história original em uma minissérie de quatro capítulos para a televisão. Depois, fez outras mudanças no texto até chegar ao resultado assistido no cinema.

Nessas adaptações, Arraes inseriu elementos de outras peças de Ariano Suassuna, como O santo e a porca e Torturas de um coração (1951), e elementos de Decamerão (cêrca de 1349-cêrca de 1351), do escritor italiano Diovâni Bocátiu (1313-1375).

Nas adaptações, os artistas envolvidos no processo (diretor, roteirista etcétera) estabelecem um diálogo com a obra original. Em alguns casos, opta-se por mantê-las mais fiéis ao texto que está sendo adaptado, apenas transpondo a obra para outra linguagem artística. No entanto, na atualidade, é muito comum observarmos artistas que realizam cortes ou acréscimos em suas adaptações, atualizando tempo e espaço e mantendo apenas o enredo original.

Fotografia. Homem de cabelo curto, calvo, veste uma camisa cinza e fala segurando um microfone na mão.
O diretor Guel Arraes, em Recife (Pernambuco). Fotografia de 2010.
Respostas e comentários

Por dentro da arte

Comente com os estudantes que a adaptação é a transposição de uma obra artística para outra linguagem artística, diferente daquela em que a obra foi criada.

Na adaptação, os conteúdos narrativos são mantidos (o enredo, a fábula), mas são transformados em função das necessidades da linguagem para a qual a obra está sendo adaptada. Essas mudanças envolvem, por exemplo, alteração na ordem das cenas e nos diálogos, redução de número de personagens, concentração dramática em alguns momentos mais intensos, acréscimo de textos externos ou até mesmo a modificação da conclusão.

Algumas adaptações se mantêm fiéis à obra original, sendo feitas apenas as alterações necessárias para a transposição para outra linguagem. Por outro lado, há adaptações que recriam totalmente a obra original, operando nela alterações até mesmo de sentido.

Também chamamos de “adaptação” os processos que atualizam obras clássicas. Nesses casos, os diálogos são reescritos, e as indicações do autor são reelaboradas para que as histórias aconteçam em outro tempo e espaço.

Sugestão de atividade

Proponha aos estudantes que se reúnam em grupos de quatro integrantes e pesquisem textos clássicos do teatro que tenham sido adaptados para a televisão ou para o cinema. Eles devem pesquisar os seguintes dados: o nome do autor do texto original; o ano em que o texto original foi escrito; o nome do adaptador; o ano em que foi feita a adaptação; as mudanças que foram introduzidas na adaptação.

Outras adaptações

Antes da adaptação de Guel Arraes, o texto de Auto da Compadecida já havia sido adaptado para o cinema. O filme brasileiro A Compadecida, de 1969, foi dirigido por George Jonas (1935-2016) e roteirizadoglossário por ele e o autor, Ariano Suassuna.

No elenco dessa adaptação, atuaram figuras conhecidas por seu trabalho na televisão, como Regina Duarte, no papel da Compadecida; Armando Bógus (1930-1993), como João Grilo; e Antônio Fagundes, interpretando Chicó.

Cartaz. Na parte superior, o texto: A Compadecida: uma comédia de grande sucesso. Em primeiro plano, aparecem dois homens: o da esquerda usa chapéu de palha e camiseta listrada em vermelho e preto; o da direita tem bigode e veste uma camiseta listrada em amarelo e preto. Ao fundo,  uma mulher com um lenço azul e amarelo na cabeça. Ela sorri. Há um homem com vestimentas na cor lilás e lenço azul no pescoço. Ao lado, um personagem usando chapéu com dois chifres.
Capa de dêvedê do filme A Compadecida (1969), de George Jonas.

O filme Os Trapalhões no Auto da Compadecida é outra adaptação da obra de Ariano Suassuna para o cinema. Dirigido por Roberto Farias, foi lançado nos cinemas em 1987 e fez sucesso no Brasil e em Portugal.

O grupo de comediantes conhecido como Os Trapalhões representou os famosos personagens da obra Auto da Compadecida, fazendo uma adaptação divertida e livre da peça de Suassuna. Os protagonistas dessa adaptação foram os atores Renato Aragão, Dedé Santana, Antônio Carlos Bernardes Gomes (1941-1994), mais conhecido como Mussum, e Mauro Fátiu Gonçalves (1934-1990), o Zacarias.

Cartaz. No topo da imagem, ilustração de quatro homens e uma mulher no meio, todos batendo palmas e sorrindo. No centro, o título Os Trapalhões no Auto da Compadecida. À esquerda, ilustração de cenas do filme com atores representando cangaceiro, padre, diabo, palhaço. À direita, uma bandeira apresenta os nomes do atores envolvidos na produção.
Capa de dêvedê do filme Os Trapalhões no Auto da Compadecida (1987), de Roberto Farias.
Respostas e comentários

A Compadecida

A Compadecida é o único longa-metragem do diretor George Jonas, conhecido por seus trabalhos no cinema publicitário; no entanto, as importantes parcerias artísticas na concepção do filme lhe renderam premiações no Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro, em 1969. Foram premiados Francisco Brennand (1927-2019), pela direção de arte, e Lina Bo Bardi (1914-1992), pelos figurinos. Embora Brennand tenha assinado a direção de arte em A Compadecida, seu reconhecimento se deve a seus trabalhos como ceramista. Na década de 1970, Brennand também participou do Movimento Armorial, idealizado por Ariano Suassuna. Já Lina Bo Bardi, responsável pelo figurino no filme de George Jonas, foi uma das mais importantes arquitetas modernistas no Brasil.

Os Trapalhões

Os Trapalhões foram um grupo de comediantes que surgiu ainda na década de 1960 em um programa televisivo chamado Adoráveis Trapalhões. A formação mais conhecida desse elenco estabeleceu-se na década de 1970 com as personagens Didi (Renato Aragão), Dedé (Mânfrid Santana), Mussum (Antonio Carlos Bernardes Gomes) e Zacarias (Mauro Faccio Gonçalves) na tê vê Record e, a partir de 1977, na Rede Globo de Televisão.

Além de sua atuação na televisão, premiada no Guiness Book como programa humorístico de maior tempo de duração (cêrca de trinta anos), Os Trapalhões também se destacaram no cinema nacional. O primeiro filme, que contava apenas com a dupla Didi e Dedé, foi lançado em 1966. Já com o quarteto cômico, foram mais de 21 produções cinematográficas, entre as quais cinco constam na lista das quinze maiores bilheterias do cinema nacional, com mais de cinco milhões de espectadores. O sucesso nacional veio acompanhado de reconhecimento internacional, com participações dos filmes da trupe no Festival de Cinema de Berlim.

Em toda a sua trajetória no cinema, Os Trapalhões reuniram cêrca de 120 milhões de espectadores, além de conquistarem as plateias de casa com seus tipos cômicos clássicos, que têm como referência a comédia popular.

Sugestão de atividade

Os Trapalhões estiveram em atividade principalmente entre as décadas de 1970, 1980 e 1990. Peça aos estudantes que pesquisem com os familiares e amigos que conheceram o trabalho do grupo a quais trabalhos assistiram e a quais personagens conhecem. Peça a eles que escrevam no diário de bordo um relato sobre essa memória coletada e levem-na para a sala de aula a fim de compartilharem-na com os colegas.

A origem do auto

Em Auto da Compadecida, Ariano Suassuna resgatou elementos do auto, gênero teatral surgido na Europa na Idade Média. Esse gênero se caracterizava pelo emprego de linguagem simples, bem como pelo uso do teatro com função catequizante. Na Idade Média, a Igreja católica utilizou o auto para propagar os valores do cristianismo, por meio da representação de episódios da Bíblia e da vida dos santos.

Além dos autos, outros gêneros teatrais foram criados nesse período, e todos eles tinham a função de transmitir as crenças e os valores da Igreja. Inicialmente executadas no interior das igrejas, essas peças medievais despertaram o interesse e a participação do povo, deixaram o espaço sagrado e ocuparam as ruas e as praças com significativas inovações cênicas.

Nos autos da Idade Média, havia um diá­logo entre o bem e o mal, representados por Deus e pelo diabo. O tom cômico das apresentações cabia às personagens más. A batalha entre a salvação e a condenação, por meio de um julgamento, era a base de grande parte das peças desse período. Geralmente, o pecador alcançava a salvação após apelar para a misericórdia divina, e o diabo era enganado no final.

Essa é uma influência dos autos medievais em Auto da Compadecida. No entanto, enquanto no auto medieval os autores usavam o teatro com uma função moralizante, que reforçasse os valores cristãos, Suassuna propôs um deslocamento de função: em sua obra, a misericórdia divina tem um fundo social. Não se trata apenas de uma correção moral, mas, antes, de levar o espectador a refletir sobre as condições de vida miseráveis e as atitudes que delas decorrem.

Nas apresentações medievais, os cenários eram simultâneos, ou seja, estavam sempre visíveis para o público. Esses palcos eram montados em fórma de estações, e as cenas aconteciam uma após a outra. O público caminhava e acompanhava a sequência das cenas. Na imagem a seguir, são representados dois cenários simultâneos. O céu está representado à esquerda; o inferno, à direita.

Pintura. À esquerda e ao centro, pequenos palcos de teatro um ao lado do outro. Esses palcos estão sustentados por colunas e estão um pouco acima do nível do solo. À direita, montagem com um monstro de boca aberta e animais com corpos humanos cuspindo fogo pela boca. Ao fundo,  uma prisão em chamas com alguns homens atrás das grades.
CAILLEAU, Hubert. Cenário da peça A Paixão e a ressurreição de nosso salvador e redentor Jesus Cristo. 1547.Ilustração, guache e tinta. Biblioteca Nacional da França, Paris, França.
Respostas e comentários

Contextualização

Comente com os estudantes que, além do auto, outras fórmas teatrais desenvolvidas ao longo da Idade Média foram: milagres, mistérios, paixões e moralidades. Essas peças tinham uma linguagem facilmente compreendida pelo povo e eram representadas em palcos (estrados) ou em carroças (carros-palco).

Em alguns casos, os cenários eram simultâneos (como o da ilustração apresentada na página), ou seja, ficavam visíveis ao público o tempo todo e prontos para a utilização; em outros, os palcos eram móveis e, em alguns casos, a encenação poderia percorrer a cidade toda.

Os milagres (séculos onze ao catorze) narravam intervenções milagrosas na salvação de pecadores arrependidos. Os mistérios (séculos catorze ao dezesseis) apresentavam episódios da Bíblia e da vida dos santos, e poderiam durar vários dias. As paixões (séculos quinze e dezesseis) eram baseadas, em sua maioria, nos textos dos Evangelhos. Nas moralidades (cêrca de 1400), as personagens eram abstrações e alegorias dos vícios e das virtudes humanas.

Curiosamente, em algumas fórmas teatrais, as personagens que representavam o mal e os demônios davam o tom da comédia às representações.

Leve os estudantes a refletir sobre as influências dos autos medievais em Auto da Compadecida, bem como sobre as diferenças principais propostas por Ariano Suassuna. Enquanto os autos da Idade Média tinham uma declarada função moralizante, Suassuna utiliza essa estrutura dramatúrgica para deslocar os centros de poder e a misericórdia divina para os fracos e flagelados pelas condições sociais desumanas e desiguais.

Além disso, em seu texto, o autor não poupa críticas àqueles que detêm o poder e que reproduzem a miséria da fome e da seca no Nordeste.

Ao apresentar aos estudantes a imagem dos cenários simultâneos, convide-os a relacionar essa fórma cênica a manifestações culturais, teatrais ou circenses que conheçam. O Carnaval de escolas de samba e o Festival Folclórico de Parintins são ótimos exemplos do uso de cenografia simultânea. Comente com eles que, atualmente, também, muitos grupos de teatro utilizam essa concepção em suas apresentações. Você encontrará mais informações a esse respeito no texto “O espaço teatral na Idade Média” nas Leituras complementares, nas páginas iniciais deste Manual.

O teatro de Gil Vicente

Um dos grandes representantes do auto teatral foi o dramaturgo Gil Vicente (cêrca de 1465-c. 1537), considerado o criador do teatro português. A imagem é de seu retrato pintado no teto do Salão Nobre dos Paços do Conselho de Lisboa, em Portugal. Em seus autos, Gil Vicente criticava os costumes da sociedade portuguesa do século dezesseis. Ele também é autor de Auto da barca do inferno (1517), Auto da alma (1518) e Auto da Lusitânia (1532), entre outros.

Pintura. Retrato de um homem de cabelo e cavanhaque pretos, com uma camisa vermelha e um casaco preto por cima. Na parte superior, o nome: Gil Vicente.
JÚNIOR, António Nunes. Gil Vicente. 1882. Arquivo Municipal de Lisboa, Portugal.

O Auto da barca do inferno é uma das peças mais conhecidas desse autor e, ainda hoje, é montada e adaptada em todo o mundo. Nessa história, todas as personagens estão mortas e chegam a um porto onde há duas embarcações: a do Anjo, que as leva para o paraíso, e a do Diabo, que as conduz para o inferno.

Cada personagem se apresenta para o julgamento e, com base em seus atos durante a vida, o Anjo e o Diabo decidem a barca na qual a pessoa deve entrar. Os autos teatrais sempre apresentam situações nas quais as personagens são levadas a rever seus comportamentos, modificando-os e se aproximando de uma conduta moralmente aceita.

A fotografia mostra o espetáculo A barca do inferno, do Grupo Athos, que teve como referência a peça Auto da barca do inferno, de Gil Vicente.

Fotografia. Grupo de teatro de rua se apresenta em uma praça com muitas árvores. Em primeiro plano, há dois atores caracterizados como padre (com uma batina marrom e um crucifixo no pescoço) e diabo (com roupas brancas e um colete vermelho, chapéu de palha com dois chifres vermelhos); atrás deles, há uma mulher de blusa branca e saia vermelha, meias listradas na cor branca e preta, maquiada com duas bolas vermelhas nas bochechas. Ao fundo, músicos também maquiados tocam instrumentos como berimbau, tambor e pandeiro.
Os atores Adilson da Silva, João Paulo, Aline Rosilei Vanin, Bianca Guelere, Ricardo Silva e Luis Fernando, do grupo Athos, em apresentação do espetáculo A barca do inferno, em Curitiba (Paraná), em 2014.
Respostas e comentários

Contextualização

Comente com os estudantes que Gil Vicente é considerado o criador do teatro em Portugal e que, em mais de trinta anos, produziu 44 peças.

Sua abordagem era inovadora para a época e suas peças impressionavam os espectadores, pois, ao mesmo tempo que conservavam características medievais, como a presença de religiosidade e o uso de alegorias, apresentavam as figuras mitológicas e a crítica social, características do período em que viveu.

Auxilie-os na leitura da fotografia da montagem A barca do inferno, destacando a caracterização das personagens por meio dos figurinos e das atitudes corporais. Comente a presença da maquiagem carregada, que também contribui para a criação dos tipos retratados na peça.

Se julgar oportuno, comente que a personagem Diabo apresenta-se de modo elegante, denotando seu poder diante das situações. Enquanto o frade e a alcoviteira apresentam-se com uma atitude suspeita, revelada por suas posturas corporais.

Ressalte também que, nessa fotografia, a cena retratada parece acontecer em um momento com música, pois a postura do ator que representa o diabo é de um passo de dança, enquanto, ao fundo, uma das atrizes toca um instrumento de percussão.

Se julgar oportuno, comente que a primeira montagem de O auto da barca do inferno data de 1531 e que a peça é um retrato da sociedade de Lisboa, Portugal, nesse período. São mais de quinze personagens, por meio das quais Gil Vicente alcança o tom de sátira social em um julgamento sumário que as leva ao céu ou ao inferno.

Por dentro da arte

Mesa dos pecados capitais

O julgamento final – tema do Auto da barca do inferno, de Gil Vicente – foi a referência para o pintor holandês iêrônimus bós (cêrca de 1450-1516) produzir obras artísticas visuais, como a pintura Mesa dos pecados capitais, reproduzida a seguir.

Pintura. Quadro com diferentes cenas apresentadas em um grande círculo central e quatro círculos menores, nos cantos da imagem. À esquerda, no topo, um enfermo encontra-se acamado, rodeado por pessoas, entre elas, um padre que realiza uma prece de joelhos; abaixo, a segunda cena mostra torres caindo e pessoas no chão sofrendo e sendo atacadas por demônios. À direita, no topo, Jesus Cristo flutua no ar, rodeado de anjos que tocam trombetas; pessoas emergem do chão; abaixo, a quarta cena (que é destacada para observar melhor os detalhes) mostra Jesus Cristo ao centro, sentado em um trono rodeado de anjos. Há uma entrada para esse palácio, e um santo com uma auréola dourada examina as pessoas uma a uma. À frente, anjos tocam instrumentos musicais.
Ao centro, uma imagem circular mostra Jesus Cristo ao centro e sete cenas do cotidiano.
bóchi, Hieronymus. Mesa dos pecados capitais. 1505-1510. Óleo sobre madeira, 119,5 por 139,5 centímetros. Museu Nacional do Prado, Madri, Espanha.

Hieronymus bóchi foi contemporâneo do escritor português Gil Vicente. Em suas obras, bóchi representou a maneira de pensar de homens e mulheres que viveram no final da Idade Média.

Note que, nos cantos superiores e inferiores da tela, o pintor holandês representou dois momentos que, de acordo com os valores cristãos, são definitivos para os seres humanos: a morte (nos dois cantos da parte superior) e o juízo final (reproduzido no detalhe). bóchi também representou nos cantos da tela duas dimensões destinadas à humanidade após a morte: o paraíso e o inferno.

Respostas e comentários

Por dentro da arte

Estimule os estudantes a elaborar hipóteses sobre as relações entre a pintura Mesa dos pecados capitais e a peça Auto da barca do inferno. Destaque as características da pintura e sua fórma de retratar figuras da Idade Média. Se possível, incentive os estudantes a traçar paralelos entre a imagem da montagem teatral do grupo Athos e as imagens da pintura.

Comente que iêrônimus bós tinha um estilo muito peculiar de pintar, empregando intensamente o colorismo (uso da cor sem matizes ou sombreamento), e que seus temas sempre diziam respeito ao universo religioso, embora, por vezes, tivessem uma abordagem satírica.

Ainda assim, a pintura de bóchi é de teor altamente moralizante, revelando um universo misterioso que, para muitos críticos de arte, o torna um dos precursores do Surrea­lismo, com imagens fantásticas, repletas de figuras diabólicas e não humanas.

Se julgar adequado, comente com os estudantes que as duas faixas que ficam acima e abaixo do círculo central do quadro contêm textos em latim extraídos do Deuteronômio e tratam das consequências do pecado.

Indicação

O Museu de Arte de São Paulo Assis Cheateubriand (maspi) tem uma das versões da pintura As tentações de santo Antão (cêrca de 1500), de Hieronymus bóchi. Na página do acervo do museu, você pode acessar mais informações sobre a obra e visualizá-la em alta resolução. Disponível em: https://oeds.link/YTa9eF. Acesso em: 10 maio 2022.

O auto como instrumento de catequização

Na época da chegada dos europeus às terras que hoje constituem o Brasil, muitos religiosos foram enviados para o local com a missão de catequizar, ou seja, transmitir valores religiosos cristãos e converter os povos aqui encontrados. Chamados jesuítas, esses padres compunham uma ordem religiosa denominada Companhia de Jesus.

O teatro foi um dos instrumentos de catequização utilizados pelos jesuítas. As peças sempre eram acompanhadas de danças e de músicas. Um dos gêneros mais adotados por esses religiosos era o auto. Colonos e indígenas participavam das montagens teatrais e, assim, os autos sofriam diversas influências culturais, como o acréscimo de personagens da mitologia indígena, o uso da língua nativa nos diálogos e a utilização de máscaras, plumagem e instrumentos musicais, como chocalhos e apitos. Nas apresentações, além das narrativas hagiográficas (da vida dos santos), eram abordados temas relacionados à realidade local.

O padre José de Anchieta (1534-1597) teve influência de Gil Vicente e se tornou um dos grandes responsáveis pela difusão da linguagem teatral entre os indígenas. Ele foi o organizador da primeira gramática considerada brasileira, escrita em língua tupi. Esse conhecimento da cultura indígena facilitava o contato com os nativos e também a dominação e a catequização desses povos. Mesmo com as influências culturais dos indígenas, o teatro de Anchieta impunha a cultura do colonizador aos povos nativos do Brasil. Em decorrência desses processos, muitas das manifestações cênicas, de canto e de dança dos povos indígenas foram sendo substituídas, e algumas delas deixaram de existir.

Pintura. Homem vestido com uma batina marrom escreve na areia de uma praia com um bastão de madeira. Observando ele, há duas pessoas mais distantes, uma sentada na pedra e a outra em pé. Há um crucifixo no topo de um banco de areia. Há pássaros na praia, próximos ao padre, e outros voando no céu.
CALIXTO, Benedito. Poema à Virgem Maria. 1901. Óleo sobre tela, 68 por 96 centímetros. Colégio São Luís, São Paulo (São Paulo).
Respostas e comentários

Contextualização

Reflita com os estudantes sobre a importância de reconhecermos o processo de catequização dos povos nativos do Brasil como um processo de aculturação, em que o teatro foi usado não com finalidade artística, mas como instrumento de dominação.

A presença do canto e da dança facilitava a comunicação com os povos indígenas, fazendo com que o teatro fosse uma ferramenta bastante efetiva nas missões de catequização jesuíticas. É importante destacar que, mesmo que as peças dos jesuítas incorporassem elementos da cultura indígena, seu objetivo central eram a conversão ao cristianismo e a aceitação do processo de colonização.

Os padres jesuítas tiveram um papel fundamental na constituição da cidade de São Paulo, à época chamada São Paulo de Piratininga. Seus dois principais expoen­tes são padre Manoel da Nóbrega e padre José de Anchieta. O primeiro, português, deu origem à missão catequética no Brasil. Já Anchieta, espanhol, chegou para auxiliar nas missões e foi uma das figuras mais importantes entre os jesuítas.

Anchieta foi historiador e gramático, e é considerado o primeiro teatrólogo da história do Brasil. Sua obra teatral é marcada pelo objetivo evangelizador e possui as mesmas limitações das tentativas cênicas da Idade Média: princípios religiosos organizados de fórma mais didática do que poética.

Arte e muito mais

A arte missioneira

Para facilitar a catequização, os jesuítas instalaram na colônia diversos aldeamentos chamados missões. Neles, os religiosos impunham o modo de vida cristão, obrigando os indígenas a abandonar suas crenças e seus valores.

As ruínas apresentadas na fotografia são da igreja de São Miguel Arcanjo, localizada no sítio arqueológico de São Miguel das Missões, que foi um aldeamento fundado no século dezessete por jesuítas espanhóis que se instalaram nas terras que correspondem ao atual estado do Rio Grande do Sul. Na missão de São Miguel, viviam os Guarani, indígenas que atual­mente habitam diversas regiões do Brasil, da Bolívia, do Paraguai e da Argentina.

Fotografia. Ruínas de uma igreja antiga com paredes grandes e uma janela central acima da porta. À esquerda, há uma grande torre. Não há mais telhado sobre a construção. Há alguns tijolos espalhados no terreno onde se encontra a igreja.
Ruínas da igreja de São Miguel Arcanjo, em São Miguel das Missões (Rio Grande do Sul). Fotografia de 2017.

Para disseminar os valores católicos, além do teatro, os jesuítas utilizaram outros elementos da arte em suas diversas manifestações. Nas missões jesuíticas, por exemplo, os prédios e as imagens sacras tinham função catequética. Para alcançar esse objetivo, os padres jesuítas introduziram elementos do Barroco europeu nas construções e nas esculturas missioneiras, consideradas as mais antigas influências do Barroco no Brasil.

Como uma das características da arte barroca era o forte apelo emocional, a utilização dessas referências contribuía para os objetivos de dominação dos povos colonizados.

Ícone. Tema Contemporâneo Transversal. Multiculturalismo.

Faça no diário de bordo.

Forme um grupo com os colegas e faça uma pesquisa sobre outros exemplos de patrimônio cultural originários do período barroco no Brasil. Vocês encontrarão esculturas, pinturas, edifícios e até vilas inteiras. Façam uma roda de conversa para refletir sobre a influência da religião nesse período, com base nos exemplos escolhidos pelos grupos.

Respostas e comentários

Arte e muito mais

Comente com os estudantes que a missão de São Miguel fez parte de um conjunto de aldeamentos construídos na região do atual estado do Rio Grande do Sul entre o final do século dezessete e o início do século dezoito.

Diga-lhes que constituíam os “Sete Povos das Missões” os aldeamentos de São Miguel Arcanjo, São Nicolau, Santo Ângelo Custódio, São Lourenço Mártir, São João Batista, São Luís Gonzaga e São Francisco de Borja. Seguindo o modelo determinado pelos colonizadores espanhóis, cada um desses aldeamentos foi criado em torno de uma praça central quadrangular. Nessa praça eram instalados a igreja, o colégio, o cemitério e as moradias dos indígenas.

As ruínas da igreja de São Miguel Arcanjo constituem um dos mais importantes registros da arquitetura jesuítica missioneira. Em 1938, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (ifãn) reconheceu o sítio arqueológico de São Miguel das Missões como bem material do patrimônio cultural brasileiro.

Quando os colonizadores europeus chegaram à América, os Guarani formavam um conjunto de povos que tinham a mesma origem, falavam a mesma língua e tinham valores culturais parecidos. Atualmente, os indígenas da etnia Guarani que vivem no Brasil dividem-se em três grandes grupos: o dos Êmibiá, o dos Kaiowá e o dos Nhandêva.

Esta seção oferece um importante aporte historiográfico sobre um patrimônio cultural material do Brasil, além de permitir uma abordagem orientada sobre o Tema contemporâneo transversal Multiculturalismo (Educação para valorização do multiculturalismo nas matrizes históricas e culturais brasileiras).

É importante que os estudantes pesquisem outras referências sobre o Barroco, que lhes permitam identificar outros exemplos, situados em outras regiões do país, formando, assim, um repertório imagético que contribuirá para que reflitam e problematizem sobre o papel que a arte cumpriu, em íntima relação com a religião, na dominação dos povos originários do Brasil e no apagamento dos seus modos de vida e traços culturais. Oriente a pesquisa de acordo com os seguintes passos:

  • Separe os estudantes em grupos e peça que pesquisem imagens do Barroco, na arquitetura e na escultura, em outras regiões do país.
  • Com as imagens em mãos, peça que teçam relações entre elas e as imagens do livro.
  • Converse com eles sobre outras imagens que conheçam em que arte e religião se relacionam.
  • Converse com eles sobre as relações entre arte, religião e dominação dos povos originários.

Os estudantes poderão ser avaliados por suas reflexões e contribuições no debate.

A igreja de São Miguel Arcanjo, por exemplo, foi construída de acordo com os padrões da arquitetura barroca. Acredita-se que a construção da igreja tenha começado por volta do ano 1735 e tenha durado cêrca de dez anos. O projeto da igreja é atribuído a Gian Battista Primoli (1673­-1747), arquiteto que atuou em diversos agrupamentos jesuítas na América.

Além da igreja, havia outras construções em São Miguel das Missões, como uma praça, um colégio, um cemitério e casas em que moravam os indígenas. Ao longo dos anos, em decorrência de diversas disputas e do abandono, as construções do aldeamento foram destruídas.

Hoje, restam apenas ruínas no local. O interior da igreja era ornamentado com pinturas e esculturas sacras. Muitas dessas peças, ao longo dos anos, foram roubadas ou destruídas, mas algumas esculturas e alguns fragmentos de antigas construções missioneiras foram preservados e estão no Museu das Missões, que fica nesse sítio arqueológico.

Fotografia. Parte da coluna de uma obra arquitetônica de estilo barroco, com detalhes em alto relevo em destaque.
Detalhe das ruínas da igreja de São Miguel Arcanjo, em São Miguel das Missões (Rio Grande do Sul). Fotografia de 2008.
Fotografia. Escultura de um homem que veste uma batina marrom e segura um pequeno bebê em seus braços.
Escultura sacra de madeira (século dezessete), produzida por indígenas Guarani na Missão Jesuítica de São Miguel. Museu das Ruínas de São Miguel, São Miguel (Rio Grande do Sul).

Faça no diário de bordo.

Experimentações


Em grupos de oito estudantes, vocês apresentarão uma leitura dramática da cena de Auto da Compadecida, que vocês conheceram na seção Entre textos e imagens. Lembre-se de que, no teatro, a leitura dramática é voltada a explorar o texto, mesmo que ele ainda não tenha sido decorado (memorizado) pelos atores. Com o texto em mãos, os atores devem atribuir à fala as intenções e as características das personagens.

Procedimentos

  1. Com a orientação do professor, estudem coletivamente a cena e registrem suas características: onde ela ocorre; quais são os assuntos tratados; quais são as principais características de cada personagem.
  2. Em cada grupo, conversem sobre a cena, distribuam as personagens e dividam-se em funções: atores, diretor, leitor das rubricas, sonoplasta, iluminador, diretor de arte (cenografia, figurino, maquiagem e adereços).
  3. Ensaiem a leitura dramática, com os elementos que integrarão a apresentação (som, luz, cenografia, figurino, maquiagem e adereços).
  4. Seguindo as orientações do professor, apresentem a leitura dramática aos colegas. Eles serão sua plateia, e vocês serão a plateia deles.

Avaliação

  1. Por fim, sob a orientação do professor, organizem-se em uma roda de conversa para compartilhar suas impressões e experiências. Conversem sobre como foi encenar as personagens com o texto em mãos, expressar oralmente as intenções delas, quais soluções cênicas os colegas apresentaram e como foi sua participação.
  2. Em seu diário de bordo, registre um relato pessoal sobre como você acha que se desenvolveu expressivamente na atividade.
    Ilustração. Ícone do diário de bordo.
Respostas e comentários

Sobre o Barroco

O Barroco foi um movimento artístico que surgiu na Europa por forte influência da Contrarreforma promovida pela Igreja católica. Entre seus pressupostos estava a reafirmação da autoridade da Igreja de Roma, por meio de construções monumentais, com o objetivo de causar admiração e reforçar seu poder.

No Brasil, o estilo barroco está diretamente associado à Igreja católica, inicialmente trazido pelas missões jesuíticas com o objetivo de catequização e conversão.

Com o desenvolvimento econômico, nas regiões enriquecidas pelo comércio do açúcar e pela mineração do ouro, o estilo barroco ganhou fórmas mais elegantes e um requinte decorativo.

Um dos grandes expoentes do barroco brasileiro foi Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1730-1814).

Experimentações

Ao orientar a leitura, peça aos estudantes que conversem sobre o que entenderam da cena. Estimule-os a criar a própria interpretação do acontecimento retratado nesse trecho e das intenções das personagens e a organizar uma leitura dramática orientada pela interpretação que fizeram do texto. Assim, a escolha de cenários, figurinos etcétera deve estar de acordo com o entendimento que tiveram da situação retratada. Diga-lhes que este é um momento de criação e que, portanto, eles têm liberdade para fazer escolhas que remetam a leituras particulares desse texto.

Comente com eles que a voz é um importante recurso de expressividade do corpo, e, para a leitura dramática, é fundamental que todos tenham consciência das possibilidades da própria voz. Com as expressões faciais e corporais, a voz constitui um importante recurso expressivo para caracterizar aspectos relacionados a idade, personalidade, sentimentos e peculiaridades de cada uma das personagens.

Relembre-os de que as rubricas são uma fórma de texto secundário, que trazem indicações aos artistas sobre possíveis intenções das personagens ou quanto à ambientação da cena, proposições cenográficas etcétera

Avaliação

É importante destacar as diferentes leituras e interpretações que o texto recebeu por parte de cada grupo. Estimule-os a identificar essas diferenças e a reconhecer a expressão e as entonações vocais empregadas por outros grupos. Nesse sentido, é importante avaliar com eles se os objetivos e entendimentos que tiveram ao longo do planejamento da leitura dramática foram percebidos pelos espectadores.

É importante que cada caso seja observado conforme os desafios e as soluções encontradas e conforme o desenvolvimento individual dentro da prática coletiva: disponibilidade, criatividade, desenvoltura, erros e acertos.

Glossário

Agreste pernambucano
: uma das cinco regiões em que está dividido o estado de Pernambuco. Caruaru é a maior cidade do Agreste pernambucano.
Voltar para o texto
Profano
: aquilo que não é sagrado.
Voltar para o texto
Cangaceiro
: integrante de bandos armados que perambulavam pelo Sertão nordestino entre o século dezenove e a primeira metade do século vinte.
Voltar para o texto
Roteirizar
: escrever o roteiro de uma peça ou de um filme.
Voltar para o texto