Tema 2  As influências da juventude na música brasileira 

A jovem guarda

No Brasil, o rock ganhou força na década de 1960 com o surgimento da Jovem Guarda, movimento musical que recebeu influência das tendências musicais estrangeiras, como a sonoridade do rock e o uso da guitarra elétrica, e que se tornou um símbolo da modernização da música brasileira.

A Jovem Guarda teve início com um programa de auditório apresentado pelo cantor e compositor Roberto Carlos. Dividiam o palco com ele a cantora vanderléa e o cantor e compositor Erasmo Carlos, que também participaram ativamente desse movimento.

As canções da Jovem Guarda tratavam de amores e do cotidiano e embalavam a juventude brasileira. Muitas dessas canções eram versões de músicas originárias dos Estados Unidos. Com letras traduzidas ou adaptadas para o português, elas eram acompanhadas pela guitarra elétrica. Esses fatos revelam a influência da cultura estadunidense nesse movimento.

A Jovem Guarda pode ser considerada um dos primeiros movimentos de música popular no Brasil. A renovação estética promovida pela introdução de elementos que faziam sucesso no exterior influenciou a Tropicália e o pop-rock da década de 1980, movimentos que vamos conhecer nas próximas páginas.

Fotografia em preto e branco. Músicos em um palco, cantando e batendo palmas. À esquerda, uma mulher de cabelo preso, vestida com casaco e calça brilhantes, está batendo palma. No centro, um homem vestido com uma camisa e calça, canta ao microfone. À direita, um homem de cabelo curto, vestido com camisa brilhante e calça com listras verticais, também bate palmas. Ao fundo, há dois músicos vestidos com terno.
vanderléa, Roberto Carlos e Erasmo Carlos no programa Jovem Guarda, em São Paulo São Paulo, em 1967.

Por dentro da arte

Adoração (Altar para Roberto Carlos)

A Jovem Guarda ocorreu durante os anos em que o Brasil viveu sob o Regime Militar. Os integrantes do movimento da Jovem Guarda, muitas vezes, eram criticados em razão da ingenuidade de suas canções, que não estavam relacionadas às questões políticas e sociais do país. Nas próximas páginas, você vai conhecer artistas que se engajaram na resistência ao regime e criaram as chamadas canções de protesto.

Em 1966, o artista visual Nelson lêirner, motivado pela represen­tatividade de Roberto Carlos, criou a instalação Adoração (Altar para Roberto Carlos), reproduzida na imagem a seguir.

Fotografia. Obra de arte feita com uma catraca amarela. Acima da catraca, uma tela com o desenho de rosto masculino com contornos luminosos feito com lâmpadas neon. Ao redor da tela, cortinas vermelhas.
lêirner, Nelson. Adoração (Altar para Roberto Carlos). 1966. Instalação com catraca de ferro, veludo, montagem de imagens religiosas, tela pintada e néon, dimensões variadas. Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand , São Paulo São Paulo.

Faça no diário de bordo.

Foco na linguagem

  1. Observe a reprodução da instalação de Nelson lêirner nesta página. Depois, descreva-a.
  2. Em sua opinião, qual seria a crítica apresentada por Nelson lêirner nessa obra?
Versão adaptada acessível

1. Ouça a descrição da instalação de Nelson Leirner nesta página. Que detalhes chamaram mais sua atenção na descrição da instalação?

A bossa nova

Antes da década de 1950, o gênero musical muito apreciado e gravado no Brasil era o samba. No entanto, foi com a bossa nova que os jovens passaram a se expressar com maior autonomia criativa. A bossa nova é um estilo musical brasileiro que se consolidou no fim da década de 1950. O samba e o jazz foram as principais influências da bossa nova. As canções desse estilo se caracterizam pelo andamento lento e pela presença do violão. Outra característica marcante da bossa nova é a maneira delicada de cantar de seus representantes, com uma voz geralmente bem suave. Alguns cantores interpretam as canções com voz muito “baixa”, quase sussurrando.

Fotografia. Homem de cabelo médio liso castanho e óculos de armação arredondada, vestindo camisa azul. Ele está de perfil, tocando piano enquanto observa uma partitura disposta na parte de cima do piano.
Um dos principais representantes da bossa nova foi o cantor e compositor Tom Jobim (1927-1994). Fotografia de 1987.

O Tropicalismo

Em meados da década de 1960, tornaram-se comuns os festivais de música popular. Em um desses festivais, em 1967, os cantores e compositores Caetano Veloso e Gilberto Gil lançaram as bases do Tropicalismo, movimento cultural que influenciou, principalmente, a produção musical no Brasil.

No festival de 1967, Caetano Veloso apresentou a canção “Alegria, alegria”, e Gilberto Gil cantou “Domingo no parque”. As canções conquistaram respectivamente o quarto e o segundo lugar nesse festival. Elas foram cantadas com o acompanhamento de guitarras elétricas.

Na época, esses instrumentos eram símbolo da música e da cultura estadunidense; por isso, causaram estranhamento no público. A Música Popular Brasileira , sobretudo a bossa nova, naquela época, estava diretamente relacionada ao som do violão.

Fotografia em preto e branco. Show musical com três homens cantando no palco. À esquerda, dois cantores dividem um microfone enquanto tocam guitarra e pandeiro. Destaque para o cantor no centro da imagem, de cabelo cacheado, vestido com uma camisa de gola rolê e casaco quadriculado claro. Ao fundo, à direita, a plateia assiste ao show sentada.
O artista Caetano Veloso, no centro da fotografia, no terceiro Festival da Música Popular Brasileira, em 1967.

As principais características do Tropicalismo

A fusão de diferentes estilos musicais é uma das características marcantes do movimento tropicalista. Na segunda fotografia reproduzida na página anterior, por exemplo, Caetano Veloso é acompanhado por um músico que toca guitarra elétrica e por outro que toca uma pandeirola.

Instrumentos e ritmos característicos de estilos musicais muito diferentes, como o rock, o baião, o samba e o bolero, assim como elementos da música popular e da música erudita, misturaram-se na criação do Tropicalismo.

Ao introduzir o som da guitarra elétrica, os artistas tropicalistas desejavam incorporar e reinterpretar elementos culturais estrangeiros para, dessa maneira, universalizar a música brasileira e torná-la mais próxima dos jovens. Ao “devorar” a cultura estrangeira para recriar a cultura nacional, os tropicalistas revelaram a influência do Manifesto Antropófago, publicado em 1928, redigido pelo escritor osváld de Andrade (1890-1954). Nesse manifesto, o escritor propôs a antropofagia cultural, que consistia em devorar a cultura europeia e recriá-la de um modo brasileiro.

As letras das canções do movimento tropicalista revelam, ainda, a influência da poesia concreta, composição literária que você conhecerá no próximo Tema.

Além de Caetano Veloso e Gilberto Gil, destacaram-se no movimento tropicalista a cantora Gal Costa, os cantores e compositores Rita Li e Tom Zé, o maestro Rogério duprá (1932-2006) e os poetas Torquato Neto (1944-1972) e Capinan.

Fotografia em preto e branco. Show musical com músicos cantando e tocando no palco. Destaque para o homem de cabelo curto e cavanhaque, vestido com paletó, com o pé esquerdo apoiado em um banco, enquanto canta e toca violão ao microfone. Ao seu lado, um homem vestido com roupas escuras e uma mulher de cabelo médio, com vestido preto, também cantam.
Gilberto Gil e Os Mutantes interpretando “Domingo no Parque”, música que ficou em 2º lugar no terceiro Festival de Música Popular Brasileira, promovido pela tê vê Record, no Teatro Paramount, em São Paulo São Paulo, em 1967.

Faça no diário de bordo.

Foco na linguagem

1. Como você pôde observar pelas leituras anteriores, no Brasil, tanto no rock quanto no tropicalismo, a juventude teve importante participação nesses gêneros musicais.

Ícone. Diário de bordo.
  1. Escreva um pequeno texto em seu diário de bordo sobre o que você considera hoje como um movimento musical da juventude.
  2. Na sua opinião, qual é a importância da juventude no cenário musical hoje?

Artista e obra

Rita Li

Nascida em São Paulo São Paulo, em 1947, a cantora, compositora, instrumentista e escritora Rita Li é uma das pioneiras do rock no Brasil. Como vimos, ela integrou o Tropicalismo e, com os demais integrantes desse movimento, contribuiu para a renovação estética da Música Popular Brasileira.

Durante o movimento tropicalista, Rita Li fez parte da banda Os Mutantes, considerada até hoje uma das principais bandas de rock do Brasil. Além de Rita Li, faziam parte dessa banda os músicos Arnaldo Batista, Sérgio Dias Batista, Liminha e Dinho Leme.

Fotografia em preto e branco. Músicos se apresentam em um palco: dois homens de cabelo médio, vestidos com camisas estampadas e adereços na cabeça, tocam violão e guitarra. Entre os dois, uma mulher de cabelo longo liso, vestida de noiva, com véu e vestido branco, canta segurando um objeto em suas mãos.
Arnaldo Batista, Rita Li e Sérgio Dias Batista, integrantes da banda Os Mutantes, no terceiro Festival Internacional da Canção. Rio de Janeiro Rio de Janeiro, em 1968.

A partir de 1979, Rita Li estabeleceu uma parceria musical com o multi-instrumentista e compositor Roberto de Carvalho e lançou músicas que alcançaram grande sucesso, como “Doce vampiro”, “Lança perfume” e “Baila comigo”.

Ainda hoje Rita Li é conhecida como a “rainha do rock”.

Fotografia. Cantora se apresenta em um show. Ela tem cabelo ruivo e usa um óculos de armação e lentes em tons de vermelho; veste um chapéu escuro, um sobretudo preto e, por baixo, uma roupa colorida em tons de verde e marrom.
Rita Li durante apresentação em São Paulo São Paulo, em 2010.

Por dentro da arte

Rita Li mora ao lado

Em 2014, foi lançado o musical Rita Lee mora ao lado. Escrito por Paulo Rogério Lopes e dirigido por Débora deboá e Márcio Macena, esse espetáculo levou para os palcos aspectos da vida e da obra de Rita Li. O texto do musical é uma adaptação do livro Rita Li mora ao lado: uma biografia alucinada da rainha do rock, de Henrique bártch.

O musical abordou as trajetórias pessoal e profissional de Rita Li, da infância à atua­lidade. A montagem apresentou ao público, por exemplo, as dificuldades vividas pela artista em sua adolescência e as parcerias que estabeleceu com artistas como Roberto Carlos, Tim Maia (1942-1998), Elis Regina (1945-1982), Gilberto Gil e Caetano Veloso.

A atriz Mel Lisboa protagonizou o musical, interpretando canções clássicas do repertório de Rita Li, como “Agora só falta você” e “Esse tal de Roque Enrow”.

Ilustração. Capa de um livro que traz um desenho de uma mulher de cabelo longo liso ruivo, de perfil, com flores rosas e amarelas. No centro, o título da obra: “Rita Lee mora ao lado”. A imagem é colorida em tons de laranja, amarelo, rosa e lilás.
Capa do livro Rita Li mora ao lado: uma biografia alucinada da rainha do rock, de Henrique bártch, lançado em 2006.
Fotografia. Três pessoas cantam e tocam instrumentos em um palco. Dois homens de cabelo médio castanho, vestindo camisa branca e coletes com franjas cantam e tocam instrumentos de cordas. Entre eles, uma mulher de cabelo longo liso ruivo, vestida com uma camisa cheia de franjas e calça marrom, canta ao microfone. Nele, há um pandeiro pendurado.
A atriz Mel Lisboa em cena do musical Rita Li mora ao lado, em São Paulo em 2015.

Faça no diário de bordo.

Foco na linguagem

1. Em grupo, pesquisem nomes de mulheres da música brasileira, escolham uma delas e organizem um cartaz (físico ou digital) com as principais informações da musicista, como: gênero musical, biografia e repertório.

“São coisas nossas”

Uma das canções mais marcantes do movimento tropicalista é “Tropicália”, lançada em 1967 no álbum Caetano Veloso. Em seu livro Verdade tropical, Caetano Veloso revelou que uma das referências para compor “Tropicália” foi a canção “São coisas nossas”, do cantor e compositor Noel Rosa (1910-1937). Escrita em 1932, a canção “São coisas nossas”, do cantor e compositor Noel Rosa, apresenta um retrato do Brasil nas primeiras décadas do século vinte, destacando características culturais e sociais do país.

Leia a seguir a letra dessa canção.

São coisas nossas

“Queria ser pandeiro

Pra sentir o dia inteiro

A tua mão na minha pele a batucar

Saudade do violão e da palhoça

Coisa nossa, coisa nossa


Refrão

O samba, a prontidãoglossário

E outras bossas

São nossas coisas

São coisas nossas


Malandro que não bebe

Que não come

Que não abandona o samba

Pois o samba mata a fome

Morena bem bonita lá na roça

Coisa nossa, coisa nossa


Refrão

Baleiro, jornaleiro

Motorneiro, condutor e passageiro

Prestamista e vigarista

E o bonde que parece uma carroça

Coisa nossa, muito nossa!


Refrão

[...]”

ROSA, Noel. São coisas nossas. In: VILA, Martinho da. Poeta da cidade: Martinho canta Noel. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2010.

Faça no diário de bordo.

Foco na linguagem

1. Leia um trecho da canção “São coisas nossas” e ouça o áudio “’São coisas nossas’, de Noel Rosa”. Depois, responda às questões propostas.

Clique no play e acompanhe a reprodução do Áudio.

a) Em sua opinião, o que Noel Rosa quis dizer no refrão “O samba, a prontidão / E outras bossas / São nossas coisas / São coisas nossas”?

b) Reúna-se com quatro colegas e, tendo como referência a canção de Noel Rosa, elaborem um cartaz com o título “São coisas nossas”. Representem nesse cartaz aspectos culturais, políticos e sociais do Brasil atual, desenhando ou colando imagens de jornais e revistas. Apresentem sua produção aos demais colegas no dia agendado pelo professor.

Os festivais da canção

Você viu nas páginas anteriores que o movimento tropicalista surgiu em um festival de música popular realizado em 1967. Os festivais eram eventos onde ocorria a divulgação de produções de compositores e músicos que marcaram a história da Música Popular Brasileira.

Transmitidos por emissoras de televisão, os festivais eram divididos em fases nacionais e internacionais, nas quais um júri técnico analisava as canções inscritas e escolhia a vencedora. Observe a fotografia reproduzida a seguir. Ela mostra um registro do terceiro Festival Internacional da Canção, realizado em 1968.

Fotografia em preto e branco. Homens e mulheres cantam e tocam juntos em um palco. Há homens e mulheres, que dividem três microfones. Destaque para um dos músicos que segura um violão e tem a cabeça baixa.
O cantor e compositor Geraldo Vandré (à esquerda, com o violão), as irmãs e cantoras Cynara e Cybele (ao centro) e o produtor musical, jornalista e compositor Nelson Motta (à direita, de frente), entre outros artistas, durante o terceiro Festival Internacional da Canção, no Rio de Janeiro Rio de Janeiro, em 1968.

No festival de 1968, Cynara e Cybele (1940-2014) interpretaram a canção “Sabiá”, de Chico Buarque e Tom Jobim. Essa canção conquistou o primeiro lugar no festival. A canção “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré, que você conhecerá na próxima página, ficou em segundo lugar. O resultado, no entanto, não agradou o público, que preferia a canção de Vandré.

Os festivais também foram um espaço de resistência ao Regime Militar. Artistas como Geraldo Vandré e Chico Buarque usavam esse espaço para apresentar canções em que questionavam, por meio de metáforasglossário e palavras de duplo sentido, as decisões tomadas pelo governo militar. Muitas canções de protesto foram censuradas.

“Pra não dizer que não falei das flores”

A canção “Pra não dizer que não falei das flores”, apresentada por Geraldo Vandré no festival de 1968, se tornou um hino da juventude da época. Pouco tempo após a apresentação, a canção foi censurada, e Geraldo Vandré, obrigado a exilar-se no Chile e, depois, na França.

Fotografia em preto e branco. Homem de cabelo curto, vestido com paletó, segura um violão e canta ao microfone.
Geraldo Vandré durante apresentação no terceiro Festival Internacional da Canção, em 1968.

Leia, a seguir, a letra dessa canção e ouça o áudio “Trecho de ‘Pra não dizer que não falei das flores’, de Geraldo Vandré”.

Clique no play e acompanhe a reprodução do Áudio.

Pra não dizer que não falei das flores

“Caminhando e cantando

e seguindo a canção

Somos todos iguais

braços dados ou não

Nas escolas, nas ruas,

campos, construções

Caminhando e cantando

e seguindo a canção


Refrão (2×)

Vem, vamos embora

que esperar não é saber

Quem sabe faz a hora

não espera acontecer


Pelos campos há fome

em grandes plantações

Pelas ruas marchando

indecisos cordões

Ainda fazem da flor

seu mais forte refrão

E acreditam nas flores

vencendo o canhão


Refrão


Há soldados armados,

amados ou não

Quase todos perdidos

de armas na mão

Nos quartéis lhes ensinam

Uma antiga lição

De morrer pela pátria

E viver sem razão


Refrão


Nas escolas, nas ruas,

campos, construções

Somos todos soldados,

armados ou não

Caminhando e cantando

e seguindo a canção

Somos todos iguais

braços dados ou não

Os amores na mente,

as flores no chão

A certeza na frente,

a história na mão

Caminhando e cantando

e seguindo a canção

Aprendendo e ensinando

uma nova lição


Refrão

VANDRÉ, Geraldo. Pra não dizer que não falei das flores. In: SIMONE. Ao vivo no Canecão. Rio de Janeiro: 1980. Lado B. Faixa 9.cópiráiti 100% EDITORA MÚSICA BRASILEIRA MODERNA LTDA. (Fermata do Brasil).

Faça no diário de bordo.

Foco na linguagem

1. Escolha um tema social e crie um poema de protesto sobre algo que lhe cause incômodo. A sua criação também pode, futuramente, se tornar a letra de uma canção.

Chico Buarque e a censura

O cantor e compositor Chico Buarque também teve canções censuradas. A primeira obra do artista a ser censurada foi “Tamandaré”, canção que integrava, em 1966, o show Meu refrão. Chico teve de retirar a canção do repertório, considerada ofensiva à memória de Joaquim Marques Lisboa (1807-1897), o almirante Tamandaré, patrono da Marinha brasileira.

Diante das pressões dos militares, em 1969, Chico Buarque mudou-se para a Itália. Em 1973, já de volta ao Brasil, Chico produziu, em parceria com o cantor e compositor Gilberto Gil, a canção “Cálice” (que sugere a imposição “cale-se”), que teve a letra vetada pela censura.

Em 1978, ao retornar para o Brasil, Chico Buarque foi detido pelo Departamento de Ordem Política e Social órgão criado para reprimir as manifestações contra a ditadura militar. Chico Buarque também participou ativamente do movimento Diretas Já, na década de 1980, pelas eleições diretas para presidente da República.

Fotografia. Cantor se apresenta em um show, tocando violão e cantando ao microfone. Ele é grisalho e veste uma camisa e casaco escuros.
Chico Buarque em apresentação no Rio de Janeiro Rio de Janeiro, em 2012.

Faça no diário de bordo.

Foco na linguagem

1. Você conhece alguma canção de Chico Buarque? Em caso afirmativo, cante um trecho dessa canção para os colegas.

“Apesar de você”

Em 1970, Chico Buarque voltou da Itália, após ser informado de que a situa­ção política no Brasil tinha melhorado. No entanto, ao ver que o cenário político do país continuava o mesmo, ele compôs a canção “Apesar de você”. Leia, a seguir, a letra dessa canção.

Apesar de você

“(Amanhã vai ser outro dia

Hoje você é quem manda

Falou, tá falado

Não tem discussão, não

A minha gente hoje anda

Falando de lado

E olhando pro chão, viu

Você que inventou esse estado

E inventou de inventar

Toda a escuridão

Você que inventou o pecado

Esqueceu-se de inventar

O perdão


Apesar de você

Amanhã há de ser

Outro dia

Eu pergunto a você

Onde vai se esconder

Da enorme euforia

Como vai proibir

Quando o galo insistir

Em cantar

Água nova brotando

E a gente se amando

Sem parar

Quando chegar o momento

Esse meu sofrimento

Vou cobrar com juros, juro

Todo esse amor reprimido

Esse grito contido

Este samba no escuro

Você que inventou a tristeza

Ora, tenha a fineza

De desinventar

Você vai pagar e é dobrado

Cada lágrima rolada

Nesse meu penar


Apesar de você

Amanhã há de ser

Outro dia

Inda pago pra ver

O jardim florescer

Qual você não queria

Você vai se amargar

Vendo o dia raiar

Sem lhe pedir licença

E eu vou morrer de rir

Que esse dia há de vir

Antes do que você pensa


(Apesar de você)


Apesar de você

Amanhã há de ser

Outro dia

Você vai ter que ver

A manhã renascer

E esbanjar poesia

Como vai se explicar

Vendo o céu clarear

De repente, impunemente

Como vai abafar

Nosso coro a cantar

Na sua frente


(Apesar de você)


Apesar de você

Amanhã há de ser

Outro dia

Você vai se dar mal

etcétera e tal, la, laiá, la, laiá

BUARQUE, Chico. Apesar de você. In: BUARQUE, Chico.Chico Buarque. Rio de Janeiro: Philips: Polygram, 1978. Faixa 11.

Faça no diário de bordo.

Foco na linguagem

  1. Em sua opinião, quem seria “você” a que Chico Buarque se refere na canção “Apesar de você”?
  2. Ouça o áudio “’Apesar de você’, de Chico Buarque de Hollanda” e responda: em sua opinião, essa canção pertence a que estilo musical? Comente sua resposta com os colegas.

Clique no play e acompanhe a reprodução do Áudio.

  1. Que diferenças você percebe entre o ritmo dessa canção e o de “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré?
  2. Atualmente, há artistas brasileiros que usam a música para protestar contra situações de violação dos direitos humanos? Faça uma breve pesquisa sobre o assunto, registre os resultados no diário de bordo e compartilhe-os com os colegas.
    Ícone. Diário de bordo.

O rock na década de 1980

Nos anos 1980, o rock nacional adquiriu a característica de representar os ideais de protesto e descontentamento político e social. Nessa época, as letras desse estilo musical passaram a refletir sobre a situação política e econômica do país. Foi nesse contexto que surgiram bandas como Barão Vermelho, Titãs, Os Paralamas do Sucesso e Legião Urbana.

Barão Vermelho

A banda Barão Vermelho foi formada no Rio de Janeiro em 1981 e lançou os músicos Cazuza (1958-1990) e Roberto roberto frejá, principais compositores e intérpretes das canções desse grupo. As canções “Bete Balanço” e “Maior abandonado”, por exemplo, dois dos maiores sucessos do Barão Vermelho, são de autoria da dupla.

Com a saída de Roberto roberto frejá do Barão Vermelho, em 2017, o grupo passou a contar com Guto Goffi (baterista), Maurício Barros (tecladista), ambos da formação original, Rodrigo Suricato (vocalista), Rodrigo Santos (contrabaixista) e Fernando Magalhães (guitarrista).

Fotografia. Cinco homens em uma sala de paredes verdes. Eles fazem pose para a foto. Quatro deles usam bonés ou chapéu. À esquerda, há uma escada de madeira apoiada na parede.
Os músicos Guto Goffi, Maurício Barros, Rodrigo Suricato, Rodrigo Santos e Fernando Magalhães, do Barão Vermelho, em fotografia no Rio de Janeiro Rio de Janeiro, em 2017.

Titãs

A banda Titãs foi criada em 1982 e gravou seu primeiro álbum em 1984. Ao longo dos anos, diversos cantores e compositores foram lançados pelos Titãs, como Arnaldo Antunes e Nando Reis, que seguiram carreira solo após saírem da banda. A formação original dos Titãs contava ainda com os músicos Charles Gavin e Marcelo Fromer (1961­-2001). Atualmente, os Titãs contam com os seguintes artistas: Tony Bellotto toca guitarra; Branco Mello faz o vocal e toca baixo elétrico; Sérgio Britto faz o vocal, toca teclados e baixo elétrico; Mario Fabre toca bateria; e Beto Li toca guitarra.

Fotografia. Cinco homens vestidos com roupas pretas estão posicionados em uma escada, e todos se apoiam no corrimão, fazendo pose para a foto.
Mario Fabre, Tony Bellotto, Beto Li, Branco Mello e Sérgio Britto, dos Titãs, em São Paulo em 2016.

Os Paralamas do Sucesso

Formada em 1982, a banda Os Paralamas do Sucesso conta com o guitarrista e cantor rérbert Vianna, o baixista Bi Ribeiro e o baterista João Barone como seus integrantes. Ao longo dos anos, essa banda lançou canções de muito sucesso, como “Óculos”, “Meu erro” e “Uma brasileira”.

Fotografia. Três homens sentados. Da esquerda para a direita: homem de cabelo curto grisalho e barba, vestido com camiseta cinza; homem calvo, de óculos, vestido com uma camisa vinho, está em uma cadeira de rodas; e homem de cabelo loiro e barba longa, vestindo camiseta lilás.
João Barone, rérbert Vianna e Bi Ribeiro, integrantes dos Paralamas do Sucesso, no Rio de Janeiro Rio de Janeiro, em 2014.

Legião Urbana

Em Brasília Distrito Federal , em 1982, Renato Russo (1960-1996) se reuniu com três amigos e criou uma das bandas de maior expressividade da história do rock brasileiro, a Legião Urbana. Nessa década, o Distrito Federal foi o berço de diversas bandas de rock, como Capital Inicial e Raimundos. Em 1985, além do cantor e compositor Renato Russo, a banda contava com Marcelo Bonfá na bateria, Dado Villa-Lobos na guitarra e Renato Rocha no baixo elétrico, e foi com essa formação que eles lançaram o primeiro álbum intitulado Legião Urbana. A banda permaneceu em atividade até 1996, ano de falecimento de Renato Russo.

Fotografia. Três homens na varanda de um apartamento com vista para outros prédios. Da esquerda para a direita: homem de cabelo curto preto e óculos escuros, vestido com camiseta branca; homem de óculos e barba curta, vestido com camiseta branca e camisa estampada vermelha por cima; homem de cabelo curto loiro, vestido com camiseta vermelha.
Os músicos Dado Villa-Lobos, Renato Russo e Marcelo Bonfá no Rio de Janeiro Rio de Janeiro, em 1993.

Faça no diário de bordo.

Foco na linguagem

  1. Você conhece canções das bandas apresentadas nesta página e na página anterior? Em caso afirmativo, fale sobre elas com os colegas.
  2. Forme um grupo com cinco colegas. Pesquisem e registrem, no diário de bordo, as bandas de rock nacionais que fazem sucesso hoje. Na data agendada pelo professor, apresentem os resultados aos colegas.
    Ícone. Diário de bordo.

A obra de Cazuza

O cantor e compositor Agenor de Miranda Araújo Neto, o Cazuza, foi vocalista da banda Barão Vermelho até 1985, quando deu início à sua carreira solo.

Mesmo após deixar o Barão Vermelho, Cazuza manteve sua parceria musical com Roberto roberto frejá, coautor de muitas canções gravadas por Cazuza em seus discos solo. Entre as canções de sucesso gravadas por Cazuza estão “Codinome Beija-flor”, “Ideologia”, “O tempo não para”, “Faz parte do meu show” e “Brasil”.

Fotografia. Cantor se apresenta em um show. Ele tem cabelo curto castanho e uma faixa amarela amarrada na cabeça, vestido com uma camiseta regata lilás e gravata vermelha.
Cazuza em show no Rio de Janeiro Rio de Janeiro, em 1985.

A música “Brasil” foi lançada por Cazuza em 1988, no álbum Ideologia. Nessa época, após anos de ditadura, o país passava por um processo de redemocratização, período em que foram restituídos os direitos de cidadania. Nesse mesmo ano, foi promulgada a Constituição de 1988, que ficou conhecida como “Constituição cidadã”. Esse panorama político e social vivido pelos brasileiros após mais de vinte anos de Regime Militar está presente na letra da canção “Brasil”. Na próxima página, você realizará atividades com base nessa letra.

Fotografia. Capa de CD. Ilustração colorida com muitos símbolos nas letras que formam o título da obra: "Cazuza – Ideologia". Há símbolos de paz, anarquismo, socialismo etc.
Ideologia foi o terceiro álbum lançado por Cazuza em carreira solo. “Brasil” está entre as canções que fazem parte desse álbum.

Faça no diário de bordo.

Experimentações

Leia, a seguir, a letra da canção “Brasil”, ouça o áudio “’Brasil’, de Cazuza, George Israel e Nilo Romero” e responda às questões.

Clique no play e acompanhe a reprodução do Áudio.

Brasil

“Não me convidaram

Pra esta festa pobre

Que os homens armaram

Pra me convencer

A pagar sem ver

Toda essa droga

Que já vem malhada

Antes de eu nascer…


Não me ofereceram

Nem um cigarro

Fiquei na porta

Estacionando os carros

Não me elegeram

Chefe de nada

O meu cartão de crédito

É uma navalha…


Refrão

Brasil!

Mostra tua cara

Quero ver quem paga

Pra gente ficar assim

Brasil!

Qual é o teu negócio?

O nome do teu sócio?

Confia em mim…


Não me convidaram

Pra essa festa pobre

Que os homens armaram

Pra me convencer

A pagar sem ver

Toda essa droga

Que já vem malhada

Antes de eu nascer…


Não me sortearam

A garota do Fantástico

Não me subornaram

Será que é o meu fim?

Ver TV a cores

Na taba de um índio

Programada

Pra só dizer ‘sim, sim’


Refrão


Grande pátria

Desimportante

Em nenhum instante

Eu vou te trair

Não, não vou te trair…


Refrão


Confia em mim

Brasil!!”

CAZUZA; ISRAEL, George; ROMERO, Nilo. Brasil. In: CAZUZA. Ideologia. Rio de Janeiro: PolyGram, 1988. Faixa 6.

  1. Qual seria a intenção dos autores ao usar a expressão “Brasil! Mostra tua cara” no refrão da canção? Dê a sua opinião e ouça a dos colegas.
  2. Pesquise outras canções da música brasileira desse período que também buscavam colocar em discussão alguma questão política ou social. Depois, apresente-as aos colegas na data previamente agendada pelo professor.
  3. Que elementos do rock podem ser identificados nessa canção?
  4. Com a orientação do professor, forme um grupo com quatro colegas. Escrevam uma paródia da música “Brasil” para retratar algum tema escolhido pelo grupo. Para isso, vocês devem substituir a letra original pela letra escrita pelo grupo. Para os ensaios e para a apresentação, utilizem o áudio “Versão instrumental de ‘Brasil’, de Cazuza, George Israel e Nilo Romero”. Ensaiem e, na data agendada pelo professor, apresentem-na aos colegas de turma.

Clique no play e acompanhe a reprodução do Áudio.

Avaliação

Nessas atividades, você teve oportunidade de conhecer alguns músicos brasileiros que procuravam, em suas canções, discutir questões políticas e sociais do país. Reflita sobre as questões propostas a seguir e registre essas reflexões em seu diário de bordo.

Ícone. Diário de bordo.
  1. Na sua opinião, a atitude desses músicos foi uma característica exclusiva daquele período no qual o Brasil estava sob o Regime Militar?
  2. Conhece algum artista atual que tenha esse tipo de proposta? Em caso afirmativo, quais são as questões políticas ou sociais abordadas por esse músico em sua obra?

Glossário

Prontidão
: falta de dinheiro.
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Metáfora
: designação de um objeto ou característica mediante uma palavra que designa outro objeto ou característica que tem com o primeiro uma relação de semelhança.
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