UNIDADEoito glossário O FEUDALISMO E A BAIXA IDADE MÉDIA

Fotografia. Vista geral de local aberto, com uma ponte de madeira, no centro, ladeada por águas verdes. A ponte leva ao pórtico de um castelo, no fundo da fotografia. O castelo é feito de pedras acinzentadas, tem uma porta central com um arco na parte superior, ladeada por duas torres proeminentes, arredondadas. À esquerda e à direita, outras duas torres proeminentes, de maior diâmetro do que as torres centrais. Há poucas janelas e, as que existem, são estreitas. Em segundo plano, local arborizado com folhas verdes. No alto, céu de cor azul-claro com poucas nuvens brancas.
Os castelos medievais abrigavam os senhores de terras e sua família. Além de moradia, tinham a função de defesa. Na fotografia, Castelo Bodiam, datado do século catorze, localizado em East Sussex, na Inglaterra. Fotografia de 2020.

Você estudará nesta Unidade:

Formação e crise do feudalismo

A sociedade feudal

As transformações na Europa Ocidental a partir do séculoonze

O poder da Igreja e as Cruzadas

A crise do século catorze na Europa

Fotografia. Vista geral de local aberto, onde há uma praça, c om piso cinza com dezenas de pessoas. No centro e em destaque na foto, uma catedral de paredes de cor bege. O pórtico central de entrada tem formato de arco e é ladeado por dois outros arcos menores. Sobre eles, um friso decorado. No pavimento superior, um vitral circular ao centro é ladeado por arcos que envolvem duas janelas longas e estreitas. Sobre ele, um friso com colunas estreitas. No terceiro pavimento, duas torres em formato retangular, na vertical, com duas janelas ainda mais longas e estreitas. Entre elas, é possível ver uma haste fina, que sai de uma cúpula localizada no centro da construção, vista apenas parcialmente. Em segundo plano, prédios menores. No alto, céu em azul com nuvens brancas.
Catedral de Notre-Dame de Paris, na França. Construída entre os séculos doze e treze, é uma das catedrais góticas mais antigas do mundo. Em abril de 2019, houve um incêndio na Catedral e grande parte de sua estrutura teve de ser reconstruída. Fotografia de março de 2019.
Fotografia. Dentro de um local fechado, sobre uma plataforma baixa em madeira escura, quatro esculturas de cavalos de cor marrom com armadura de metal de cor cinza e, montados sobre eles, soldados com armadura, em metal cinza. Na mão esquerda de cada soldado, uma lança na vertical. Ao redor, parede de cor branca com bandeiras vistas parcialmente.
Exposição de armaduras medievais de cavaleiros no Museu Metropolitano de Arte, em Nova iórque, nos Estados Unidos. Fotografia de 2017.

No início da Idade Média, muitas regiões da Europa Ocidental passaram por um processo de ruralização, ao mesmo tempo que as cidades e o comércio perderam importância. Aos poucos, um sistema social e econômico conhecido por feudalismo se formou.

O feudalismo foi predominante entre os séculos dez e treze, mas, a partir do séculoonze, a sociedade europeia passou por profundas transformações: as cidades e o comércio retomaram sua fôrça e a produção agrícola aumentou.

O que você sabe sôbre a Idade Média e o feudalismo? Sabe algo sôbreservos e senhores feudais? Esôbre peste negra, Cruzadas, burgos e burgueses?

CAPÍTULO 18  O FEUDALISMO

Com a desintegração do Império Carolíngio no século nove (se necessário, retome o Capítulo 16 deste volume), os descendentes dos servidores de Carlos Magno continuaram a praticar, em seus domínios, alguns costumes germânicos, principalmente o de doar terras a seus dependentes em troca de ajuda administrativa e militar. Esses grandes senhores de terras firmavam alianças pessoais com outros senhores de terras, que eram reforçadas pelo juramento de fidelidade entre eles.

Por meio dessa aliança, um senhor de terra transferia a outro o poder sôbre um bem seu, chamado de feudo. A fórma mais comum de feudo eram as terras. Aquele que doava o feudo passava a ser senhor de quem o recebia, chamado vassalo. Entre eles era firmado o contrato feudo-vassálico, que estabelecia obrigações e direitos recíprocos.

Gradualmente, nas regiões das atuais França e Alemanha, foi se configurando um novo sistema social que ficou conhecido como feudalismo. Entre os séculos dez e treze, esse sistema predominou na Europa Ocidental, embora o tempo de duração e as características tenham variado de uma região para a outra.

Fotografia. Vista geral de local aberto, com morros cobertos por vegetação, arbustos e árvores altas em tons verde e, no centro, um castelo. No alto, céu azul sem nuvens. O castelo tem uma estrutura mais baixa, na frente, próxima à entrada, à esquerda, paredes de tijolos de cor marrom, janelas pequenas retangulares, algumas com detalhes em vermelho, e telhado alto de cor cinza, com pináculos em cada torre. À esquerda, a entrada do castelo com um portal de entrada  de pedras em formato de arco.
O castelo de Eltz, na atual Alemanha, foi construído no séculodoze e hoje é local de intensa visitação turística. Fotografia de 2019.

A sociedade feudal

Na Europa feudal, a agricultura era a fonte de sustento da maior parte da população. No senhorio, que era a propriedade agrícola senhorial, havia terras para o cultivo, celeiros para armazenar a colheita, um moinho para triturar os grãos e fornos para assar os pães.

Em geral, o feudo era autossuficiente, isto é, ele tendia a produzir quase tudo o que era necessário à sobrevivência dos moradores, como alimentos, ferramentas, vestuário e utensílios domésticos. O comércio e o artesanato não desapareceram, mas diminuíram de importância.

Um bispo do século chamado Adalberão de Laon, resumiu em um poema a visão da Igreja a respeito da sociedade feudal: havia os que oravam (clero), os que lutavam (nobres) e os que trabalhavam (camponeses). Segundo o bispo, essa estrutura refletia a ordem celeste, representada pelo Pai, pelo Filho e pelo Espírito Santo. Alterar essa ordem seria o mesmo que ir contra a vontade de Deus.

Essa divisão, porém, não representava as relações reais estabelecidas na sociedade feudal. Atualmente, os historiadores especialistas em Idade Média tendem a caracterizá-la de acôrdo com o papel que o indivíduo ocupava na comunidade cristã. Segundo esse critério, havia os leigosglossário e os clérigos e, dentro de cada um desses grupos, outras divisões.

Iluminura. À frente e no plano inferior, local com plantações de cor verde, seis pessoas trabalhando, algumas colhendo uma planta de cor roxa e, à direita, um boi puxa um carro de madeira com roda e com dois cestos grandes e cilíndricos marrons, sem, tampa, que carregam um conteúdo de cor roxa. Em segundo plano, a plantação dá lugar a uma via de cor clara, onde há um animal quadrúpede. Além dessa via, há um muro baixo e, mais atrás, um local com grama verde. Em destaque, em terceiro plano, um castelo alto. Ele tem a cor branca e diversas torres arredondadas com telhado pontudo azul. À esquerda, há uma rampa que dá acesso à entrada do castelo por um pórtico, por onde passa um cavalo marrom. Mais ao fundo, à direita,  continuação de muro e parte do castelo. No alto, céu em azul-claro com nuvens finas esparsas. 
Na parte superior, há dois arcos espessos em branco, subdivididos por linhas e traços em amarelo, com letras e números em azul e vermelho e alguns desenhos. Esses arcos formam um semicírculo que compõe toda a parte superior da iluminura. Sob o semicírculo menor, há uma esfera amarela da qual partem raios, lembrando o sol, a silhueta de uma pessoa. Entre os dois arcos, o espaço está é preenchido pelo tom de azul e pontinhos amarelados, que lembram o céu. Há, ainda, a ilustração de uma balança com pratos amarelos, e de uma mulher de vestido longo que carrega ramos em cada uma das mãos.
. O mês de setembro.cêrca de 1410. Iluminura. Museu CondéChantilly, França. Esta iluminura faz parte do livro As riquíssimas horas do Duque de Berry. Os livros de horas tornavam acessíveis aos leigos conhecimentos importantes para a sociedade medieval, como datas de festas religiosas e preces cotidianas.

Ler a iluminura

• As iluminuras são ilustrações que decoram as páginas dos livros e dos manuscritos medievais. A iluminura O mês de setembro representa parte de um senhorio, a propriedade senhorial. Ao fundo, há uma grande construção. Você sabe que tipo de construção é essa? O que os elementos desta iluminura revelam sôbre a sociedade feudal?

Os leigos

Os senhores de terra formavam o grupo mais privilegiado de leigos das áreas rurais. Nesse grupo, havia os nobres, os grandes senhores e os senhores menores. Eles se dedicavam às atividades administrativas e militares e cuidavam da justiça e da vigilância dos camponeses. No grupo dos leigos, havia também os cavaleiros, isto é, combatentes armados.

No século onze, a cavalaria afirmou-se como uma instituição ligada à nobreza. O ritual de ingresso nessa instituição marcava a passagem do interessado para a vida adulta: um jovem de 18 a 20 anos recebia do senhor um golpe na nuca e as armas que faziam dele um integrante do grupo.

A figura do cavaleiro, no imaginário coletivo, distanciou-se da realidade e entrou no terreno da lenda. Quando surgiram os primeiros romances escritos na Europa medieval (séculos onze e doze), as chamadas novelas de cavalaria, os cavaleiros eram os protagonistas. Escritas em verso e em prosa, as novelas adaptavam antigas narrativas orais que abordavam os feitos heroicos e as guerras históricas, como as conquistas de Carlos Magno e as lendas do rei Arthur.

As novelas de cavalaria apresentavam um código de conduta no qual se destacavam o heroísmo, a honra e a lealdade, que eram os ideais da cavalaria medieval. Nas histórias, o cavaleiro agia em defesa da honra e da lealdade ao rei e à Igreja. A mulher era o objeto do amor cortês do homem. Assim, a dama deveria ser tratada e amada com respeito e delicadeza.

Ilustração. Em uma estrada de terra em campo aberto, um grupo de pessoas deixa, à cavalo, uma cidade murada, ao fundo. Em primeiro plano, um grupo de pessoas, algumas montadas à cavalo. À esquerda, em pé, mulheres com vestidos longos, coloridos e brilhantes e chapéu pontudao sobre a cabeça. Ao lado delas, homens montados sobre cavalos, com roupas coloridas e capas sobre as costas. Montada de lado em um cavalo branco, uma  mulher está de vestido marrom e azul e chapéu pontudo. No centro da imagem, dois homens à cavalo vestem roupas coloridas e de manga bufante, além de calçados pontudos. Alguns dos cavalos têm mantos azuis e selas decoradas e coloridas. À direita, Uma fila de pessoas montadas em animais percorrendo a estrada sinuosa. Em torno da estrada, há vegetação, grama verde e arbustos. Ao fundo, uma cidade murada, com um pórtico de entrada em forma de arco com duas torres. Na cidade, diversas construções em cinza com telhados azuis, incluindo um castelo. Na parte superior, céu de cor cinza, nublado.
Senhoras e senhores. Século quinze. Ilustração em manuscrito. Biblioteca Nacional da França, Paris, França.

Ler a ilustração

• Que elementos da imagem podem ser associados ao período medieval? Que características dos personagens indicam sua condição social?

Ícone. Sugestão de site.

HISTÓRIAéfe ême 074: Cavalaria Medieval: a história de uma classe guerreira europeia. Entrevistador: Icles Rodrigues. Entrevistado: Rodrigo Prates de Andrade. Leitura ObrigaHISTÓRIA, 18outubro 2021. Podcast. Disponível em: https://oeds.link/zgFxtI. Acesso em: 14 abril 2022. O episódio traz curiosidades sôbre as cavalarias medievais.

Camponeses

A maior parte da população do mundo feudal era constituída por camponeses. Entre os camponeses, havia os servos e os vilões.

Os servos estavam presos à terra para o resto da vida. Em troca de proteção e do direito de usufruí-la, eles deviam várias obrigações ao senhor. Por meio da corveia, por exemplo, eram obrigados a trabalhar duas ou três vezes por semana no manso senhorial, o lote do senhorio em que os produtos obtidos pertenciam exclusivamente ao senhor e à sua família. A talha os obrigava a entregar ao senhor cêrca de um terço do que produziam nas terras destinadas ao sustento deles e de suas famílias (o manso servil). Havia ainda as banalidades, um tipo de taxação, paga em produtos, pelo uso do forno, do moinho e de outras instalações da reserva senhorial. Além disso, os servos executavam outras tarefas, como consertar pontes e construir edifícios. Eles também tinham obrigações ocasionais. Por exemplo, nas viagens que os senhores faziam pêlas aldeias, eles deviam oferecer alimentação e hospedagem.

Os vilões eram camponeses livres que haviam adquirido pequenos lotes de terra. Com o passar do tempo, porém, muitos cederam às pressões senhoriais e tornaram-se servos. Em algumas regiões podia haver um número reduzido de escravos, que trabalhavam principalmente nos afazeres domésticos dos castelos senhoriais.

Mercadores e artesãos

As cidades medievais chamavam-se burgos. Nelas viviam os burgueses, que exerciam diferentes ocupações.

Com a crescente importância econômica das cidades a partir do século surgiram novos grupos sociais, como mercadores, banqueiros, artesãos, açougueiros e estudantes das universidades e das escolas instaladas nas catedrais.

Burgueses

Em sua maioria, os burgueses eram provenientes do meio rural: podiam ser servos fugidos ou homens livres que dependiam dos senhores de terra.

Ilustração. Três pessoas trabalham em uma plantação de trigo. À esquerda, uma mulher de vestido verde, avental branco, com chapéu marrom sobre a cabeça, tem o corpo inclinado para baixo e enfeixa o trigo colhido. À direita, dois homens trabalham com foices, ceifando o trigo. Um homem é visto de costas, de blusa branca, calça em vermelho e pano na cintura em azul. Outro mais atrás, visto de frente, com blusa de cor vermelha, calça azul. Em segundo plano, local com vegetação verde, um caminho por onde passam pessoas e um homem montado à cavalo, e outro ao lado dele. Mais ao fundo, à direita, casas e área com vegetação e duas árvores altas de folhas verdes. Acima, céu em azul com nuvens brancas.
bening sáimon . Camponeses realizam colheita de trigo. Século quinze. Ilustração. Coleção particular. Esta obra representa o mês de agosto.
Os clérigos

No mundo medieval, o papel dos que oravam era muito importante, tanto no campo quanto na cidade. No tôpo da hierarquia eclesiástica estava o papa, chefe da Igreja Católica. Entre outras atividades, ele tinha poder para julgar os clérigos, fiscalizar universidades, instituir diocesesglossário , reconhecer novas ordens religiosas, cobrar o dízimo e estabelecer um modêlo de conduta social. Abaixo do papa, havia o clero secular e o clero regular. O primeiro dividia-se em dois grupos: o alto e o baixo clero.

  • Alto clero: era composto de bispos responsáveis pêlas dioceses. Eram, em sua maioria, pessoas nascidas nas famílias nobres.
  • Baixo clero: eram os párocos, líderes de paróquia. Eles viviam frequentemente como os camponeses: cultivavam a terra e atendiam aos pobres e necessitados das vilas e regiões próximas da paróquia.

Já o clero regular era formado pelos monges, cristãos que se afastavam do mundo para glorificar e servir a Deus. Eles viviam em mosteiros afastados das cidades. Os mosteiros abrigavam grandes bibliotecas. Lá, os monges copiavam e ilustravam obras antigas dos gregos, dos romanos e dos cristãos, cumprindo, assim, um papel fundamental na preservação dos textos da Antiguidade clássica.

Iluminura. Sobre um fundo de papel amarelado, uma torre com cinco pavimentos, cada um com o formato de um quadrado. No topo da torre, há três armações coloridas, com pequenos telhados, cada uma delas com um sino. À direita, a torre tem mais um pavimento térreo, aberto e coberto por um telhado, sobre o qual há três homens sentados escrevendo No térreo, a entrada em arco é ladeada por duas colunas cor de rosa com topo preto; ali está um homem com traje preto que segura duas cordas. No primeiro andar, vermelho e com uma abertura  em arco, há um homem de vestes azuis sobre uma escada de madeira, posicionada na diagonal. No terceiro andar da torre, na cor cinza, há uma escada e duas aberturas em arco. Os andares acima são vermelhos e ali há um homem de roupa azul sobre uma escada de madeira inclinada. No topo da torre, há três armações coloridas, com pequenos telhados, cada uma delas com um sino. Eles estão enfileirados. As cordas dos sinos chega até a base da torre. À direita da torre, há uma construção térrea, marrom, com uma abertura em arco. Sobre essa construção, no segundo pavimento, dois homens maiores, sentados, estão voltados para o centro do pavimento, onde há um móvel sobre o qual há uma folha branca, na diagonal. Sobre essa folha, o homem da esquerda, que usa um traje azul com calças laranjas, manipula dois instrumentos em forma de haste. O homem da direita usa uma blusa laranja com calças pretas e manipula um instrumento similar ao compasso, também sobre uma folha branca. Uma figura de tamanho menor, com traje escuro e sem calças, também manipula um instrumento sobre uma folha branca, e está à esquerda do pavimento. Sobre eles, um telhado em forma de triângulo com cores douradas e em vermelho. O fundo da iluminura é de papel amarelado e manchado.
Monges copistas no scriptorium na tôrre do Mosteiro de San Salvador de Tábara, na Espanha. 1220. Iluminura. O Iscriptórium era o local onde os livros manuscritos eram produzidos na Europa na Idade Média.
Ícone. Sugestão de livro.

PERCIVALDI, Elena. A vida secreta da Idade Média. Petrópolis: Vozes, 2018. O livro propõe mostrar os costumes das pessoas que viveram no período da Idade Média, como o tipo de vestimentas, lazer, alimentação, relacionamentos, além de abordar como essas pessoas lidavam com o amor, a morte e as crenças.

Viver na Europa feudal

Na Europa feudal, as pessoas sentiam e registravam o passar do tempo em ritmos bastante diferentes daqueles que experimentamos atualmente em nossa acelerada sociedade. O modo de perceber a passagem do tempo (assim como os meios para marcar e contar o tempo) era bem menos rígido e mais lento do que o de hoje. A vida coletiva era ritmada pelos ciclos da natureza, como a passagem das quatro estações, e pelo conjunto de atividades exercidas pêla população.

Vida cotidiana e diferentes fórmas de entretenimento

A vida cotidiana, porém, não era a mesma para toda a sociedade medieval: as fórmas de entretenimento de um nobre, por exemplo, eram muito diferentes das de um camponês.

Os membros da nobreza divertiam-se com as caçadas e os torneios, e com diversos jogos, como o xadrez e o tarô. Além disso, distraíam-se com os jograis, artistas ambulantes que recitavam, cantavam ou apresentavam espetáculos circenses nos palácios ou nos castelos.

Os camponeses, por sua vez, divertiam-se com passatempos comunitários ao ar livre, como jogos e disputas esportivas, ocasiões em que podiam provar sua fôrça e habilidade física. Já nas áreas urbanas, uma fórma de entretenimento comum era o jôgo de dados, praticado em praças públicas ou em tavernas.

Iluminura. Na parte inferior, quatro figuras representadas em tamanho reduzido tocam instrumentos musicais. À esquerda, dois deles têm cabelos castanhos com roupa longa e amarela com mangas compridas, e corneta marrom sobre a boca. Ao centro, a figura  humana tem cabelos castanhos com roupa em verde, segura um instrumento redondo, e, à direita, a outra figura humana usa roupa marrom e segura nas mãos uma corneta na diagonal. Essa porção inferior da iluminura é separada pela cena superior por dois frisos, uma amarelo e outro rosa, com grafismos em preto. Na parte superior, duas pessoas sentadas sobre uma base horizontal cinza com tecidos claros decorados com grafismos em vermelho e bege, jogam xadrez. À esquerda, homem de cabelos castanhos, com blusa de mangas compridas em verde e manto em vermelho até os pés, com gorro da mesma cor sobre a cabeça. Ele aponta o dedo indicador para frente em direção ao tabuleiro de xadrez e tem uma peça de xadrez sobre a mão esquerda, que repousa sobre a base horizontal sobre a qual está sentado. À direita, mulher com véu branco sobre a cabeça, com vestido longa em marrom, segura uma peça de xadrez na mão esquerda e aponta para uma casa preta no tabuleiro. Na parte superior, pendurados na parede branca, um brasão marrom com detalhes em vermelho, e um outro de madeira marrom com um manto vermelho.
Nobres medievais jogando xadrez. Iluminura.
Iluminura. No centro, uma pessoa sentada, de cabelos castanhos, com vestes longas em marrom e sobre a cabeça, uma coroa em amarelo, com a mão esquerda para cima. À esquerda, ao fundo e à direita, homens tocando instrumentos musicais. À esquerda, homem de cabelos pretos, com traje de mangas longas em azul, chapéu e calça vermelha, segura dois pequenos tambores redondos e uma baqueta amarela na mão esquerda, além de um objeto amarelo na mão direita. À direita, homem de cabelos castanhos, com roupa marrom, toca um instrumento de cordas com um arco amarelo. Um homem visto parcialmente, está atrás do grupo, vestido com blusa verde. Ele tem uma corneta na boca a segura com as duas mãos, voltada para o alto. À direita dele, também atrás do grupo, um homem de cabelos curtos castanhos, com vestes vermelhas, toca um triângulo de cor cinza. Na ponta direita, um homem de roupa e chapéu azul, calça vermelha, toca um instrumento de madeira similar a um alaúde. Atrás dele, um homem de cabelos castanhos, com roupas longas amarelas, assopra uma gaita de fole verde.
Grupo de músicos com instrumentos típicos da Idade Média. 1417. Iluminura. Esta iluminura faz parte do livro Bohemian. Biblioteca da Universidade de palátski, olomouts, República Tcheca.
As vestimentas

Na Europa medieval, a túnica de mangas era a principal vestimenta utilizada por homens e mulheres. Em geral, os modelos femininos cobriam o corpo até os tornozelos, enquanto os masculinos ficavam na altura dos joelhos. Por baixo da túnica, usava-se uma camisa, e os homens também vestiam uma espécie de calção.

A nobreza exibia seu prestígio social pelo uso de tecidos caros como a sêda importada do Oriente, pelo refinamento dos brocados e pêla riqueza das côres. Já os camponeses usavam vestes mais simples, de tecidos grosseiros, como os feitos de fibras de cânhamo. Enquanto os nobres usavam botas de couro, de cano alto, ou sapatos de bicos longos, os mais pobres vestiam simples sapatilhas de pano.

Ilustração. Sobre um fundo de papel amarelado, à esquerda, um homem em pé, com o corpo virado para a direita. Ele tem cabelos escuros e usa um gorro branco, um traje de mangas longas roxo com listras em marrons e vermelhas, e um par de botas marrons. Pousada sobre as mãos dele, uma ave de penas de cor marrom. À direita, um homem agachado, de cabelos castanhos, com gorro branco sobre a cabeça, traje marrom de mangas longas e sapatos amarelos. Ele está com as mãos perto de suporte onde está pousado um falcão.
Dois falcoeiros. 1240. Ilustração (detalhe). Biblioteca Apostólica Vaticana, Cidade do Vaticano. Esta ilustração, presente no livro Da arte de caça com aves, de Frederico dois, retrata as vestimentas de túnicas à época.
Moradias: casas e castelos

Em geral, até o século oito, as habitações de nobres e as de camponeses eram feitas de madeira, mas a estrutura era diferente conforme o grupo social.

As casas camponesas limitavam-se a um único ambiente, que funcionava como cozinha, sala e quarto. Durante a noite, esse cômodo muitas vezes também abrigava os animais domésticos, que ajudavam a aquecer o ambiente.

Já os castelos só começaram a se multiplicar na Europa Ocidental com a afirmação do poder dos nobres. Os primeiros castelos eram de madeira e foram construídos com a finalidade de abrigar o senhor e sua família e de controlar e proteger um território. A partir do século onze, reis e senhores mais poderosos começaram a construir castelos de pedra.

Construções de pedra

O uso da pedra nas construções era mais comum onde havia pedras em abundância; caso contrário, a pedra ficava restrita às igrejas e aos palácios.

Iluminura. Sobre um fundo de papel amarelado, em destaque, no centro, um castelo alto protegido por uma muralha alta com quatro torres circulares. O castelo tem janelas diminutas, e estruturas com paredes de madeira no topo. No entorno do castelo, uma pequena vila, vegetação rasteira à esquerda e árvores à direita. À frente, uma estrada sinuosa sobre a terra, vegetação de cor verde, casas de paredes brancas e telhado marrom e uma pequena igreja, à direita.
Representação do Castelo de Clapier e da vila no entôrno, na França medieval. Século quinze. Iluminura. Biblioteca Nacional da França, Paris, França.
As mulheres no mundo feudal

A sociedade feudal era patriarcal, ou seja, os homens predominavam nas funções de liderança política e tinham privilégio social e contrôle das propriedades. A feminilidade era vista de fórma negativa, pois, segundo a tradição judaico-cristã, todas as mulheres descendiam de Eva, que era pecadora e responsável pêla perda do Paraíso. Assim, a Igreja Católica considerava as mulheres seres suscetíveis às fraquezas humanas e à maldade, e a elas era dado pouco espaço de expressão. A despeito disso, vários historiadores procuram resgatar a história das mulheres durante a Idade Média, mostrando a sua importância para essa sociedade.

As mulheres das famílias nobres eram obrigadas a circular, quase que exclusivamente, no domínio privado: na casa paterna, do marido ou no convento. Nesses espaços, contudo, tinham pesadas responsabilidades em relação à organização e às finanças da casa. Além disso, algumas delas tiveram importância política e significativa produção intelectual.

Já as mulheres não nobres viviam de maneira muito diferente. Dependentes do trabalho para sobreviver, terminavam por ter uma vida de maior liberdade.

A grande maioria das mulheres reticências trabalhava no campo, na lavoura e no lar. reticências Muitas delas na Idade Média eram trabalhadoras agrícolas Outras mulheres trabalhavam em comércios como a venda de víveres e bebidas, confecção de roupas ou em artesanatos. As esposas de mercadores e comerciantes estavam frequentemente envolvidas nos negócios dos maridos, e podiam optar por prosseguir neles quando viúvas.

lóin rênri R. (organizador). Dicionário da Idade Média. Rio de Janero: Jorge zarrár, 1997. página 405.

Iluminura. À esquerda, sentada, uma mulher com os cabelos cobertos por um tecido vermelho, usando um vestido longo azul escuro, trabalha em um tear pequeno. À direita dela, algumas agulhas grandes. À direita, uma mulher de cabelos castanhos, cobertos com um lenço branco, trajando um vestido  longo de cor rosa e de mangas compridas ,segura um fio grosso e branco, que perpassa um equipamento de madeira, similar a um fuso. Ao fundo, sentada, uma mulher de cabelos castanhos, com uma coroa dourada sobre a cabeça, usando um vestido de mangas compridas vermelho, está de frente para um tear grande de madeira clara. Ao fundo, ilustração de árvores de folhas verdes e uma parede de mosaico com ladrilhos quadrados brancos, vermelhos e azuis.
Mulheres tecendo na Idade Média. Século quinze. Iluminura. Esta iluminura está presente no manuscrito de cléris muliéribus (Mulheres famosas), de Giovanni bocátio.

Vozes femininas

No mundo medieval, poucas mulheres tinham a oportunidade de aprender a ler e escrever. Geralmente, as que sabiam eram religiosas ou damas da alta sociedade. Apesar disso, vários escritos foram deixados por elas. Maria de França, por exemplo, uma poetisa da nobreza inglesa que viveu no século doze, criou narrativas muito diferentes das novelas de cavalaria, rompendo com a ética cortês. Em suas histórias, a dama cortejada geralmente tinha um papel decisivo e uma personalidade muito marcante.

Ícone. Ilustração de três pessoas e dois balões de fala indicando a seção Em debate.

Em debate

Cidadania e Civismo

Servidão, escravidão, trabalho livre

O mundo do trabalho é um tema importante para muitos historiadores. Entender conceitos como trabalho livre, servidão e escravidão, por exemplo, pode ser fundamental para as pesquisas históricas e para compreender o funcionamento de sociedades antigas.

Ao longo do tempo, é possível encontrar a ocorrência de trabalho livre em diversas sociedades. Em diferentes períodos e sociedades da Antiguidade, os camponeses, por exemplo, eram livres, e trabalhavam em pequenas unidades familiares.

Agora, vamos estabelecer uma comparação entre os trabalhadores que não eram livres – escravizados e servos.

Texto 1

De origem e caracterização problemáticas, que geraram muitas polêmicas historiográficas, os servos eram trabalhadores dependentes. Recebiam do senhor lotes de terra, os mansos, de cujo cultivo dependia sua sobrevivência e em troca da qual realizavam o pagamento de determinadas taxas àquele senhor. Trabalhavam ainda em lugares e tarefas indicadas pelo senhor, sem nenhum tipo de remuneração. Em contrapartida, tinham a posse vitalícia e hereditária de seus mansos e a proteção militar proporcionada pelo senhor.

reticências

De qualquer fórma, ser servo implicava não gozar de muitas liberdades, ter incapacidades jurídicas. Ele reticências não podia testemunhar contra homem livre, não podia se tornar clérigo, devia diversos encargos. Contudo, ao contrário do escravizado clássico, tinha reconhecida sua condição humana, podia ficar com parte do que produzia e recebia proteção do seu senhor.

FRANCO JÚNIOR, Hilário. A Idade Média: nascimento do Ocidente. 2. editora São Paulo: Brasiliense, 2005. página 91, 186.

Texto 2

A escravidão se caracteriza por sujeitar um homem ao outro, de fórma completa: o escravizado não é apenas propriedade do senhor, mas também sua vontade está sujeita à autoridade do dono e seu trabalho pode ser obtido até pêla fôrça.

Esse tipo de relação não se limita, pois, à compra e venda da fôrça de trabalho, como acontece, por exemplo, no Brasil de hoje, em que o trabalhador fornece sua fôrça de trabalho ao empresário por um determinado preço, mas mantém sua liberdade formal. Na escravidão, transforma-se um ser humano em propriedade de outro, a ponto de ser anulado seu próprio poder deliberativo: o escravizado pode ter vontade, mas não pode realizá-las.

Pínsqui, Jaime. A escravidão no Brasil. 18. editora São Paulo: Contexto, 2001.página 11.

  1. Retome as ideias de Hilário Franco Júnior e, com suas palavras, explique em seu caderno o conceito de servidão.
  2. O texto 2 apresenta uma definição para “escravidão”. Considerando essas ideias, de que modo a escravidão pode se diferenciar da servidão?

Atividades

Faça as atividades no caderno.

  1. Com base no estudo feito nesta Unidade, crie uma frase que caracterize cada um destes aspectos da Europa feudal:
    1. Economia.
    2. Sociedade.
  2. As iluminuras estão entre as mais importantes expressões da arte medieval. Analise a iluminura a seguir, que ilustra um livro do filósofo italiano Egídio Romano, e responda em grupo às questões propostas.
Iluminura. A iluminura está dividida em três quadros. Um horizontal na parte superior, dois quadrados na parte inferior. Eles estão compostos dentro de um acro. Em torno do arco há desenhos de flores coloridas. Na primeira parte, acima, em formato retangular: no centro, uma pessoa de cabelos curtos e castanhos, com longa túnica amarela está sentada em um trono, À esquerda e à direita, há pessoas em pé. Uma delas, à esquerda, de traje longo vermelho e chapéu vermelho, segura um objeto similar a um cetro, na posição vertical, na mão direita. Atrás dela, outras pessoas com vestes coloridas. À direita do trono, há diversos aristocratas. Um deles tem cabelos castanhos curtos, com vestes longas em azul e detalhes em dourado. Na parte inferior, à esquerda, o segundo quadro representa quatro homens com roupas em um porto, diante de uma construção clara, com torres encimadas de telhados avermelhados. Eles usam roupas em azul e vermelho, sendo que um deles usa um manto escuro e tem um saco de dinheiro na mão esquerda. Perto deles, homens em embarcações de madeira sobre a água. À direita, na parte inferior, o terceiro quadro representa homens realizando o plantio na terra arada por arados puxados por animais. Os homens usam roupas de diferentes cores, sapatos pretos e instrumentos agrícolas. Há um cavalo branco atrelado a um arado no centro desse quadro. Mais ao fundo, homens plantam em local com grama verde. Em segundo plano, construções em cinza com telhados avermelhados. As pessoas, construções, animais e paisagens não foram representadas obedecendo à proporções realistas.
Os três estados da sociedade medieval. Século quinze. Iluminura. Biblioteca Nacional da França, Paris, França. Esta iluminura abre o livro de regímine printípum, do teólogo e filósofo italiano Egídio Romano, escrito em 1279, em edição do século quinze.
  1. Como as pessoas, as edificações, os objetos e os animais foram representados nessa iluminura? As representações são realistas? Há alguma relação de proporção entre esses elementos? Justifiquem suas respostas.
  2. Vocês conseguem identificar os grupos sociais representados na imagem? Quais são eles? Prestem atenção, por exemplo, nas vestimentas dos personagens, nos objetos que carregam e no que estão fazendo.
  3. Que diferenças vocês conseguem perceber entre o que dizia o bispo Adalberão de Laon sôbre a sociedade medieval, que vocês estudaram nesta Unidade, e o que mostra a iluminura?
  4. Pensem agora na sociedade em que vocês vivem. Ela também se divide em grupos sociais distintos? Se sim, quais são eles? Vocês se sentem parte de algum desses grupos sociais? Por quê? Organizem suas ideias e avaliem se seus argumentos são coerentes.

3. Leia o texto a seguir para responder às questões.

A sociedade feudal, além de agrária, militarista, localista e estratificada, era também uma sociedade clerical, ou seja, na qual havia contrôle eclesiástico sôbre o tempo, as relações sociais, os valôres culturais e mentais. reticências

Ocontrôle eclesiástico sôbre os valôres culturais e mentais era exercido por meio de vários canais. O sistema de ensino, monopolizado pêla Igreja até o século treze, permitia a reprodução do conjunto de ideias que ia sendo selecionado e formulado por ela. reticências

Numa época em que poucas pessoas tinham acesso [à] cultura escrita, as pinturas e esculturas das igrejas e os sermões dominicais dos clérigos funcionavam como os meios de comunicação de massa de então. reticências

FRANCO JÚNIOR, Hilário. Feudalismo: uma sociedade religiosa, guerreira e camponesa. São Paulo: Moderna, 1999. página 41, 43.

  1. Explique cada uma das características que o autor atribui à sociedade feudal:
    • Agrária.
    • Estratificada.
    • Militarista.
    • Clerical.
    • Localista.
  1. De que fórma a Igreja exercia o contrôle das ideias e dos valôres culturais difundidos naquela sociedade?
  2. Como você vê o poder das igrejas ou das religiões nos dias atuais? Que veículos atualmente transmitem valôres, ideias e preferências?

CAPÍTULO 19  A BAIXA IDADE MÉDIA

Como se aproximava o terceiro ano que se seguiu ao ano mil, viu-se em quase toda a terra, mas sobretudo na Itália e na Gália, renovar as basílicas das igrejas; embora nenhuma necessidade tivesse disso, uma emulaçãoglossário levava cada comunidade cristã a ter uma mais suntuosa do que as outras. Era como se o próprio mundo tivesse sido sacudido e, despojando-se da sua vetustezglossário , se tivesse coberto por toda a parte de um manto branco de igrejas.

Les cinq livres de ses histoires (900-1044). In: Pedrêro sãntches, Maria Guadalupe. História da Idade Média: textos e testemunhas. São Paulo: editora Unésp, 2000. página 77-78.

O texto citado que você acabou de ler é do monge raúl glabê (cêrca de 985-cêrca de 1047), que viveu por muito tempo na região francesa de Borgonha. Sua vida transcorreu em tôrno do ano 1000, data considerada um marco simbólico das transformações que ocorriam na Europa Ocidental e que é considerada o início da Baixa Idade Média. Segundo Raul, a “onda” de construção de novas igrejas e de reforma das antigas se deveu a uma espécie de “disputa sagrada”, pêla qual cada comunidade pretendia superar as outras p beleza e riqueza de seus templos.

A religião tinha enorme importância para o homem medieval. Que mudanças estavam ocorrendo na Europa, naquela época, que possibilitaram a construção de tantas igrejas? É o que vamos descobrir ao longo deste Capítulo.

Iluminura. Iluminura em formato quadrado. No centro, uma construção retangular com o topo triangular laranja com duas aberturas em arco, sobre as quais há um círculo; no topo triangular da construção, há uma pequena cruz  amarela. Diante dessa construção, agachado, um homem de vestimenta laranja trabalha com ferramenta triangular, como uma colher de pedreiro, e tem diante de si um recipiente claro, ovalado. De frente para ele, à esquerda, uma pessoa sobre uma escada de madeira. Esta usa uma touca branca e vestes longas de cor cinza, também segura uma ferramenta triangular. Na ponta da direita, um homem representado em formato maior, com coroa dourada sobre a cabeça, de cabelos brancos, com vestes longas na cor cinza e manto em marrom. Ele aponta com o dedo indicador esquerdo para a cena dos dois trabalhadores.
Construção de uma igreja no reinado de Luísseis. Século catorze. Iluminura. Biblioteca Municipal de Castres, França.
Ícone. Sugestão de livro.

LE GÓFI, Jaques. A Idade Média explicada aos meus filhos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012. O livro apresenta fatos e curiosidades da Idade Média, como as histórias de guerras e perseguições, os romances de cavalaria e as importantes descobertas e produções do período.

O crescimento da produção agrícola

Até por volta do ano 1000, a desnutrição e as frequentes crises de fome foram as principais razões das altíssimas taxas de mortalidade na Europa medieval. Após o século onze, a fome não desapareceu completamente, mas se tornou menos frequente e mais localizada. Houve um aumento da produção de alimentos que possibilitou reduzir as mortes por fome e desnutrição. O que teria proporcionado essa mudança?

Em primeiro lugar, destacam-se a ampliação das áreas cultivadas e o consequente aumento da quantidade de alimentos disponíveis. Florestas e bosques foram transformados em espaços de cultivo, e áreas pantanosas foram drenadas e usadas para a agricultura.

Uma segunda razão que explica o aumento da produção foi o desenvolvimento de novas técnicas e de instrumentos agrícolas, com o uso do ferro. O metal tornou-se mais acessível aos camponeses apenas entre os séculos onze etreze, o que foi essencial para aprimorar os instrumentos agrícolas da época. O principal exemplo disso foi a difusão de um tipo especial de arado na Europa: a charrua. As relhas desse equipamento abriam sulcos mais profundos na terra, ao mesmo tempo que misturavam as camadas do solo com o esterco, tornando-o mais fértil.

Os avanços técnicos atuavam em conjunto com outras melhorias: para puxar a charrua, os animais passaram a ser atrelados pelo peito, e não mais pelo pescoço. Isso aumentou a capacidade de tração e de transporte, favorecida também por inovações promovidas nas carroças com a introdução do segundo eixo móvel.

As técnicas agrícolas na Idade Média

Até meados do século vinte, os historiadores pensavam que os europeus dos primeiros séculos da Idade Média utilizavam apenas instrumentos agrícolas muito rudimentares, construídos basicamente com madeira endurecida ao fogo. Recentemente, contudo, alguns historiadores têm argumentado que essa ideia foi elaborada com base em preconceitos, em detrimento da análise cuidadosa das fontes escritas e arqueológicas do período. Seja como for, o aperfeiçoamento dos instrumentos agrícolas com o uso do ferro ocorreu de fórma muito mais efetiva entre os séculos onze etreze.

Ilustração. Pessoas arando a terra usando um arado puxado por bois, Sobre o solo de cor marrom, à esquerda, um homem puxa uma haste ligada aos animais. Este homem tem cabelos escuros, roupa de cor laranja e usa uma capa curta azul. No centro, há três bovinos em tons de vermelho, com par de chifres pequenos. Eles caminham para esquerda, e estão atrelados a um arado de cor azul, que sulca a terra com uma haste na ponta da direita, manejada por um segundo homem, à direita. Este tem barba em castanha, veste blusa de mangas compridas azul, calça vermelha e sapatos em preto. Perto dele, outro homem visto parcialmente, de roupa rosa e vermelha. O fundo da iluminura está esfumaçado, com a cor bege.
Camponeses utilizando a charrua. 1030. Ilustração. Biblioteca Britânica, Londres, Inglaterra. Esta ilustração faz parte de um calendário inglês.
Rotação trienal de culturas

Outra mudança que contribuiu para aumentar a produtividade da terra foi o sistema trienal de cultivo. Na Idade Média, ainda não era comum o uso de adubos. Por isso, o cultivo precisava ser planejado para possibilitar que uma parcela do terreno passasse um período em repouso, improdutiva, recuperando naturalmente sua fertilidade. Os poucos animais domésticos eram mantidos nessas áreas para que ajudassem na recuperação do solo.

Com o sistema trienal de cultivo, as terras cultiváveis eram divididas em três partes. A cada ano, enquanto duas delas eram mantidas em plena atividade, a terceira ficava em repouso. Comparativamente ao sistema bienal, em que as terras eram divididas em duas partes (uma cultivada e a outra deixada em repouso), o sistema trienal tinha a vantagem de possibilitar duas colheitas anuais, uma de cereais de inverno e a outra de primavera.

Sistema TRIENAL de cultivo

Esquema. Sistema Trienal de Cultivo. Legenda: Em laranja: Primeiro cultivo (trigo) Em lilás: Segundo cultivo (outro cereal) Em verde: Descanso Há três círculos divididos em três partes iguais. Cada círculo representa o primeiro, o segundo e o terceiro ano de plantio. Divididos em três setores de mesmo tamanho, temos a letra A à esquerda, B à direita, e a letra C  em cada setor do círculo. No primeiro ano, A está em laranja; no segundo ano, A está em lilás e, no terceiro ano, A está em verde. No primeiro ano, B está em lilás, no segundo ano B está em verde e, no terceiro ano, B está em laranja. No primeiro ano, C está em verde, no segundo ano, C está em laranja e, no terceiro ano, C está em lilás.
Fonte: FRANCO JÚNIOR, Hilário. O feudalismo. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 62-77.
O aumento populacional

Foram necessárias várias gerações para que a maior parte dos estabelecimentos agrícolas na Europa tivesse acesso às novas técnicas e instrumentos. Quando essas mudanças se disseminaram, entre os séculos onze e treze, as crises de fome diminuíram no continente e as epidemias tiveram drástica redução. O resultado foi a elevação da expectativa de vida e, consequentemente, o crescimento populacional.

Segundo o historiador Hilário Franco Júnior, entre o século onze e princípios do século catorze a população da Inglaterra teria crescido de 1,5 milhão para 3,75 milhões de habitantes; a da França, de 6,5 milhões para 16 milhões; e a de Portugal, de 600 mil para 1,25 milhão de habitantes.

Iluminura. À esquerda, um homem de cabelos brancos, com túnica verde, calça preta e sapatos pretos, segura nas mãos um instrumento fino e branco, na horizontal. À frente dele, outra pessoa de cabelos brancos, com túnica rosa, segura um cesto branco com a mão direita, junto ao corpo. À direita, dois bois marrons, cada um com um par de chifres brancos. Ao fundo, plantas com caule verde, com folhas em vermelho e outras em verde. O fundo da iluminura tem losangos azuis com os ângulos em vermelho.
érmengôu mátfrê. Camponeses arando a terra.1322. Iluminura. Real Biblioteca do Monastério de San Lorenzo de El Escorial, Espanha.

O crescimento das cidades

A sociedade medieval era essencialmente agrária. Isso não significa que as cidades e o comércio tenham desaparecido do cenário europeu. É bem verdade que, nos primeiros séculos medievais, as cidades contraíram-se, e o comércio reduziu-se em volume e em importância, mas nenhum dos dois deixou de existir naquela época. A partir do século onze, porém, as cidades e o comércio na Europa tiveram grande expansão. O que teria criado essa nova situação?

O desenvolvimento de novas técnicas agrícolas e o crescimento demográfico criaram um excedente de mão de obra nos campos, ou seja, uma quantidade maior de trabalhadores do que era necessário para o cultivo. Com isso, muitas pessoas migraram em busca de novas terras para o cultivo ou se deslocaram para as cidades.

Nas cidades, tradicionalmente muradas, os sinais mais evidentes dessa mudança foram o surgimento de novas habitações em tôrno das muralhas. Essas aglomerações foram inicialmente chamadas de burgos, e seus habitantes, de burgueses. Nesse período, as maiores cidades do Ocidente, como Londres, Veneza e Paris, chegaram a reunir 100 mil, 150 mil e até 200 mil habitantes, respectivamente.

Fotografia. Vista geral de lugar aberto, No centro, uma muralha cor de areia, com dezenas de torres arredondadas, de cor bege. Ao fundo, a cidade, com casas baixas e uma igreja alta no ponto mais alto do relevo. No alto, céu azul claro, sem nuvens.
A cidade de Ávila, na Espanha, considerada Patrimônio da Humanidade pêla unêsco, preserva até hoje suas muralhas do período medieval. Fotografia de 2020.
Ícone. Sugestão de vídeo.

O INCRÍVEL exército de Brancaleone. Direção: Mario monitiéli. França/Itália/Espanha, 1966. Duração: 116 minutos. No filme, um exército liderado pelo atrapalhado Brancaleone percorre diversas localidades da Europa medieval em busca de um feudo. Na fórma de comédia, a obra explora os costumes e os valôres dos cavaleiros medievais.

Mercados, feiras e produtos do comércio

A partir do século onze, as atividades comerciais tiveram grande impulso na Europa medieval, crescendo tanto o volume quanto a variedade de produtos negociados.

O comércio medieval desenvolveu-se em tôrno de dois grandes eixos marítimos: o eixo do Mediterrâneo, que se estendia até o mar Egeu e o mar Negro, controlado pêlas cidades italianas de Gênova e Veneza; e o eixo nórdico, situado entre o canal da Mancha e o mar Báltico, dominado principalmente por mercadores flamengos.

Os locais de encontro de vendedores e compradores eram de dois tipos: os mercados, lugares públicos onde eles se encontravam semanalmente, e as feiras, realizadas normalmente uma vez ao ano. Tanto os mercados quanto as feiras passaram a acontecer com mais frequência, e vários deles se tornaram, com o tempo, permanentes.

As principais feiras cresceram ao longo do eixo nórdico-mediterrâneo. A lã bruta, por exemplo, comercializada em feiras da Inglaterra, era manufaturada na região de Flandres, situada no norte da atual Bélgica. Os tecidos, depois, eram vendidos por comerciantes flamengos nas regiões das atuais Alemanha, Rússia e França, de onde seguiam para o Mediterrâneo.

No sul, mercadores genoveses e venezianos, a partir do século doze, assumiram o contrôle do comércio de produtos vindos da Ásia, da África e do leste da Europa. Navegando pelo Mediterrâneo, esses mercadores levavam para a Europa Ocidental especiarias, , ouro, marfim, tintas, perfumes e escravos.

Principais rótas comerciais no século treze

Mapa. Principais rotas comerciais no século 13. Legenda: Área comercial Em lilás: Hanseática Em rosa: Genovesa Em verde: Veneziana Em amarelo: Catalã Em marrom: De Champagne Rota comercial Linha em vermelho: Terrestre Linha em azul: Marítima Bolinha em vermelho: Feira A área comercial Hanseática corresponde às regiões a sudeste da Ilha da Grã-Bretanha, onde estava a cidade de Londres. A região de Flandres, onde estavam as cidades de Amberes (onde havia uma uma feira), Bruges, Brêmen, Hamburgo, Lübeck, Leipzig (onde também havia um feira). Correspondia também à Península da Dinamarca e ao sul da península Escandinava, onde estavam as cidades de Oslo e Estocolmo. Correspondia também às áreas do nordeste europeu, onde estavam as cidades de Novgorod e Moscou. A área comercial genovesa corresponde às áreas próximas à cidade de Gênova, a Ilha da Córsega e parte do litoral do Mar Negro. A área comercial veneziana corresponde à área próxima à cidade de Veneza e ao litoral oriental do Mar Adriático, ao sul da Península Balcânica, à Olha de Creta e ao litoral ocidental da Ásia Menor. A área comercial catalã corresponde ao litoral oriental da Península Ibérica e ao norte da África, do estreito de Gibraltar até a cidade de Túnis. A área comercial de Champagne corresponde à região central da França atual, onde estava a cidade de Paris e as feiras de Lagny, Provins, Bar-sur Aube e Troyes. Cidades importantes não marcadas sob o controle de nenhuma área comercial: Santiago de Compostela, Lisboa, Toledo e Sevilha, Medina do Campo (que também abrigava uma feira), na Península Ibérica. Kiev era uma cidade importante no leste da Europa, além de Constantinopla, Antioquia na Ásia Menor, e Trípoli ao sul de Antioquia, no litoral oriental do Mediterrâneo. Frankfurt e Augsburgo (que também abrigavam feiras), eram cidades importantes no centro da Europa. Na Itália, estavam as cidades de Nápoles, Roma, Pisa e Florença, também não assinaladas como parte de nenhuma área comerciais no mapa. As rotas comerciais terrestres ligavam as cidades de Sevilha, Toledo, Medina do Campo, Lisboa, Santiago de Compostela. De Medina do Campo, partia uma rota comercial que a ligava a Paris, Bruges, Hamburgo, Leipzig, Augsburgo, Veneza, Kiev, Moscou, Novgorod, e, dali, para o norte. De Augsburgo também partia uma rota para Constantinopla. Nápoles, Roma, Pisa, Florença também estavam interligadas por rotas comerciais. De Moscou, Kiev, Antioquia e Trípoli, partiam rotas rumo ao leste. As rotas marítimas ligavam Antioquia à Ásia Menor, à Ilha de Creta, ao litoral oriental do Mar Adriático e às cidades italianas, a Túnis e ao litoral oriental da Península Ibérica, atingindo todo o litoral ocidental da Europa até Londres e Oslo. Rotas marítimas também existiam no mar Báltico, ligando Estocolmo e Lübeck e a costa oriental do Mar Báltico. Há rotas marítimas que saem do litoral norte do Mar Mediterrâneo e atingem a África, cujo litoral norte não aparece no mapa. No canto inferior esquerdo, rosa dos ventos e escala de 0 a 310 quilômetros.

Elaborado com base em dados obtidos em: Quínder, Rírman; Rilgamán, Véarná; Rért, Mânfred. Atlas histórico mundial: los orígenes a nuestros días. Madri: Akal, 2007. página 188.

Mestres, companheiros e aprendizes

O artesanato rural existiu praticamente durante toda a Idade Média. Nos domínios do senhorio, os camponeses cuidavam das lavouras, enquanto os artesãos, em pequenas oficinas, produziam peças de vestuário, artigos de couro, instrumentos de trabalho, armas de metal, peças de mobiliário, entre outros objetos. Também havia artesãos ambulantes, vindos de muito longe, que faziam seu trabalho em troca de algumas moedas, abrigo e produtos do senhorio.

A partir do século onze, com o crescimento populacional e urbano, multiplicaram-se os artesãos nas cidades da Europa Ocidental. Eles se organizavam em grupos e produziam artigos variados em pequenas oficinas. Cada oficina era comandada por um mestre de ofício. Ele administrava o trabalho dos companheiros e dos aprendizes.

Os companheiros eram trabalhadores especializados, que já tinham concluído a aprendizagem do ofício. Eles trabalhavam em troca de um salário, que podia ser pago em dinheiro ou na fórma de abrigo, vestuário e alimentação.

Os aprendizes iniciavam o ofício quando tinham entre 10 e 12 anos de idade. Escolhidos entre os familiares do mestre, esses jovens em geral não recebiam salário, apenas abrigo e alimentação diária.

Muitas vezes, pessoas que praticavam o mesmo ofício se organizavam em corporações de ofício, associações que controlavam, com rigor, a qualidade e o preço dos produtos e protegiam os artesãos da concorrência.

Ilustração. De baixo para cima: Na parte inferior, piso quadriculado branco e azul. Sobre ele, há dois edifícios simétricos em três pavimentos, divididos entre si por cenas ao centro. No primeiro pavimento, à esquerda, cômodo de cor cinza, com duas pessoas manipulando partes de armaduras em cinza, diante de dois recipientes redondos e marrons. Há peças penduradas em uma haste horizontal, no teto. À direita, um homem manipula tubos cinzas, e, atrás dele, um órgão com tubos cinza e madeira. Na porta da entrada desse comércio, um homem entra, vestindo roupa de mangas longas e chapéu em marrom e calça em vermelho. No centro, um homem visto de costas caminha para frente, com roupa verde, gorro e calça em vermelhos. Na segunda camada, à esquerda, duas pessoas usam ferramentas, construindo relógios. No centro, outros dois homens trabalham diante de um forno de cor rosa, com instrumentos de cor verde. Eles são cozinheiros. À direita, outro comércio onde há um homem trabalhando com ferramentas e fazendo uma escultura, de cor amarela. Na terceira camada, à esquerda, um homem sentado de frente para mesa de madeira, escrevendo em papeis de cor branca. No centro, um homem visto de costas, com capa de cor azul, blusa branca, calça vermelha e gorro da mesma cor serve seus senhores que estão em volta de uma mesa com toalha branca. Sobre essa cena, uma estrutura em arco rosa encimada por um friso com três círculos marrons em cima, como ornamento. À direita, um comércio onde há um homem sentado de frente para um objeto grande em três partes em marrom, como um retábulo, que ele está pintando.
PREDIS, Cristoforo de. As profissões. Século quinze. Ilustração. Biblioteca Estense Universitária, Módena, Itália.

Ler a ilustração

• Observe a imagem, que mostra algumas profissões exercidas em uma cidade medieval. Quais delas você consegue identificar? Quais indícios possibilitaram reconhecer essas profissões?

O poder da Igreja

Muitas igrejas passaram a ser construídas na Europa Ocidental entre os séculos onze e treze. Esse contexto é importante para compreendermos o fortalecimento da Igreja Católica como instituição dominante na sociedade medieval. Também é interessante notar que a construção de igrejas, bem como de catedrais e basílicas, foi realizada graças às doações generosas da nobreza.

As igrejas construídas a partir do século onze seguiam o estilo românico, caracterizando-se por uma arquitetura mais simples, com paredes maciças, colunas grossas e pouquíssimas janelas. A ideia era fazer desse espaço a “fortaleza de Deus”. No final do século doze, começaram a ser erguidas as primeiras catedrais no estilo gótico. Elas apresentavam uma estrutura verticalizada e leve, com arcos ogivais, paredes estreitas e repletas de ornamentos e grandes vitrais. Esse novo estilo inspirava-se na religiosidade e na crescente valorização da vida terrena.

Fotografia. Uma igreja térrea com grossas paredes de pedra em bege. Nas extremidades, torres arredondadas, com janelas estreitas em forma de arco.
Igreja de San Martín de Tours, em Frómista, na Espanha, construída entre 1066 e 1110.
Fotografia. Uma catedral alta com três portas em forma de arco no centro e fachada com diversos ornamentos, esculturas representados figuras de santos e  janelas com vitrais em fomato de arcos nas laterais. No centro da construção, um grande vitral redondo. No alto, à esquerda e à direita, torres com vitrais compridos na vertical.
Catedral de Reims, na França, construída entre 1210 e 1310.

Ler as fotografias

• Qual das igrejas observadas nas fotografias foi construída no estilo românico? Qual delas é gótica? Justifique.

Ícone. Sugestão de livro.

páuil ráuárd. Rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda. Rio de Janeiro: Clássicos zarrár, 2015. Na obra, as famosas lendas do rei Arthur e seus cavaleiros são recontadas pelo escritor e ilustrador ráuárd páuil.

Os poderes político e espiritual

A fôrça da Igreja na sociedade medieval também se estabelecia pelos poderes político e espiritual. Ao colocar-se como intermediária entre os homens e Deus, a Igreja declarava que o poder espiritual, mantido pelo papa, era superior ao poder temporal, exercido pelos reis. Para afirmar sua autoridade, garantir a autonomia eclesiástica e limitar as interferências dos leigos nos assuntos religiosos, a Igreja adotou uma série de iniciativas, como a Reforma Gregoriana.

As bases dessa reforma foram estabelecidas em 1075, no díctatus papaê, documento elaborado provavelmente pelo papa Gregório sete, que reunia 27 determinações as quais sintetizavam os principais objetivos da Igreja no período. O item 3, por exemplo, afirmava que apenas o pontífice romano podia depor ou nomear os bispos; o 9 estabelecia que todos os príncipes deviam beijar os pés do papa; e o 12 atribuía ao papa o poder de destituir os imperadores.

As transformações vividas pêla Igreja entre os séculos onze e treze também se manifestaram na criação de novas ordens religiosas. Entre elas é possível destacar a ordem dos franciscanos, fundada em 1209. Ao contrário das ordens mais antigas, em que seus membros viviam reclusos em mosteiros, as novas ordens se integravam ao mundo, auxiliando a Igreja a dialogar com a nova realidade urbana que se expandia.

Pintura. À esquerda, uma pessoa com um camisolão marrom, semelhante a que os monges usam, tem o braço direito flexionado na altura da cintura e a mão direita espalmada. Perto dele, um homem um pouco calvo, cujo cabelo circunda a cabeça na altura das têmporas, tem auréola branca sobre a cabeça, e usa as mesmas vestes longas da pessoa à esquerda, indo até os joelhos e em marrom. Ele está com as mãos para frente, olhando para baixo em direção a dezenas de pássaros de penas de cor bege. À esquerda e à direita, árvore de tronco em marrom, com folhas de cor verde. Em segundo plano, parte em azul com um pássaro branco em sobrevoo.
BONDONE, djôto di. São Francisco pregando aos pássaros. 1299. Afresco. Basílica Superior de São Francisco de Assis, Úmbria, Itália. Além de decorar o interior das igrejas, os afrescos tinham uma função pedagógica: ensinar os preceitos cristãos à população, visto que a maioria dela não era alfabetizada.

A Escolástica: entre a fé e a razão

Desde a queda de Roma, diversos padres da Igreja Católica tentavam colocar a razão a serviço da fé. Um dos principais representantes dessa corrente foi Santo Agostinho, nascido no século Essa questão tornou-se mais importante na Baixa Idade Média, quando filósofos como São Tomás de Aquino, do século treze, passaram a acreditar que era possível explicar a existência de Deus por meio da razão. A nova corrente filosófica ficou conhecida como Escolástica.

A Escolástica era ensinada nas universidades europeias. Essas instituições eram frequentadas principalmente pelos membros da burguesia, que desejavam se apropriar do conhecimento produzido pêla sociedade ocidental.

Segundo o pensamento da Escolástica, a autoridade do conhecimento residia na Bíblia e em obras de antigos pensadores, como Aristóteles. Cabia ao mestre indicar o verdadeiro sentido presente nesses textos. Eram realizadas, também, intensas disputas intelectuais, nas quais os mestres tinham de defender suas ideias e responder às perguntas de uma assembleia de professores e estudantes.

As Cruzadas

No século onze, com a ideia de unificar a cristandade na luta contra os inimigos de Cristo, dentro e fóra da Europa, a Igreja lançou o movimento da guerra santa, mais tarde conhecido como Cruzadas.

O chamado para a “guerra de Deus” foi anunciado pelo papa Urbano segundo em 1095, no Concílio de Clermont-Ferrand, na França. O objetivo era convocar os cristãos para retomar a cidade sagrada de Jerusalém. Desde o século sete, ela estava em poder dos árabes e, em 1076, foi tomada pelos turcos. Além do objetivo religioso, interesses políticos e econômicos impulsionaram o movimento. Os nobres buscavam terras e riquezas, que também interessavam aos clérigos. Os trabalhadores pobres buscavam melhores condições de vida. E os comerciantes, principalmente de Gênova e Veneza, tinham interesse em controlar os portos do Oriente.

A primeira expedição oficial em direção a Jerusalém, que reuniu pessoas de diferentes regiões da Europa, partiu em 1096. Conhecida como Cruzada dos Nobres, fundou Estados cristãos no Oriente e, em 1099, conseguiu retomar Jerusalém. Outras oito Cruzadas oficiais foram organizadas, sem, contudo, obter o sucesso da primeira. No séculotreze, Jerusalém foi novamente tomada pelos muçulmanos e os Estados cristãos desapareceram.

Apesar de não alcançar o objetivo religioso, as Cruzadas contribuíram para acelerar as mudanças sociais que já estavam ocorrendo na Europa desse período. Entre elas estão:

  • o enfraquecimento do sistema feudal, visto que, de um lado, os senhores endividaram-se para montar seus exércitos e, de outro, muitos servos que partiram para as Cruzadas não retornaram;
  • a recuperação da importância do Mediterrâneo, pois, com as Cruzadas, cresceu o número de embarcações que transitavam por ele;
  • o aumento do comércio entre o Oriente e o Ocidente, principalmente pelos portos de Gênova e Veneza.
Iluminura. À esquerda, dezenas de soldados com armaduras de cor cinza, com lanças na vertical e, à frente deles, dois homens com vestes longas, um em azul-escuro e outro em vermelho, com uma capa sobre o corpo da mesma cor. Mais à frente, diversos objetos ao chão. Perto deles, outros três soldados saem da construção à direita, carregando baús e outros objetos. À direita, cidade com fortificações, torres, muralhas, de paredes em cinza e vermelho, e telhado em marrom-claro e cinza. Em segundo plano, construções grandes e casas, umas ao lado das outras, onde há inúmeros soldados entrando e carregando objetos. Em segundo plano, à esquerda, tendas coloridas sobre a grama.
de. A tomada de Jerusalém pelos cristãos em 1099. Século quinze. Iluminura. Biblioteca Nacional da França, Paris, França. Apenas em meados do século treze, quando o movimento cruzadista declinou, é que o termo “cruzada” apareceu. O nome surgiu em razão das cruzes costuradas nas roupas dos guerreiros cristãos.
Ícone. Ilustração de uma lupa sobre uma folha de papel amarelada com a ponta superior direita dobrada, indicando a seção Documento.

Documento

As Cruzadas na visão de cristãos e de árabes

Na visão da Europa cristã, as Cruzadas representavam a luta pela retomada da terra santa, em especial do Santo Sepulcro, local onde Jesus Cristo teria sido enterrado. No mundo muçulmano, as Cruzadas eram vistas como campanhas de invasão. Leia a seguir dois textos que representam cada uma dessas visões.

Texto 1

Os turcos e os árabes reticências penetram mais a cada dia nos países dos cristãos; eles os venceram sete vezes em batalha, matando e fazendo grande número de cativos, destruindo as igrejas e devastando o reino.reticências

Por isso eu vos apregoo e exorto, tanto aos pobres como aos ricos – e não eu, mas o Senhor vos apregoa e exorta – que como arautos de Cristo vos apresseis a expulsar esta vil ralé das regiões habitadas por nossos irmãos, levando uma ajuda oportuna aos adoradores de Cristo. Eu falo aos que estão aqui presentes e o proclamo aos ausentes, mas é o Cristo quem convocareticências.

Se os que forem lá perderem a sua vida durante a viagem por terra ou por mar ou na batalha contra os pagãos, os seus pecados serão perdoados nessa hora; eu o determino pelo poder que Deus me concedeureticências.

charrtre fuchêr de apud Pedrêro sãntches, Maria Guadalupe. História da Idade Média: textos e testemunhas. São Paulo: editora Unesp, 2000.página83-84.

Texto 2

Foi de fato, na sexta-feira 22 do tempo de chaá bân, do ano de 492 da Hégira, que os franjglossário se apossaram da Cidade Santa, após um sítio de quarenta dias. Os exilados ainda tremem cada vez que falam nisso reticências como se eles ainda tivessem diante dos olhos aqueles guerreiros louros, protegidos de armaduras reticências degolando homens, mulheres e crianças, pilhando as casas, saqueando as mesquitas.

Dois dias depois de cessada a chacina não havia mais um só muçulmano do lado de dentro das cidades. reticências Os últimos sobreviventes forçados a cumprir a pior das tarefas: transportar os cadáveres dos seus, amontoando-os, sem sepultura, nos terrenos baldios para em seguida queimá-los. reticências

Malúf, Amin. As Cruzadas vistas pelos árabes. 4. editoraSão Paulo: Brasiliense, 2007. página 12.

  1. O texto 1 é parte de um discurso feito pelo papa Urbano segundo, em 1095. A quem ele se dirige? Qual é a missão para a qual ele convoca os ouvintes?
  2. Que recursos Urbanosegundo utilizou para convencer as pessoas a participar da missão?
  3. Que acontecimento é mencionado no texto 2? Qual é a importância desse acontecimento para o calendário muçulmano?
  4. Comparando os dois textos, é possível dizer que a tarefa anunciada pelo papa em 1095 foi cumprida? Justifique com base no estudo feito nesta Unidade.
Saúde.

Fome, peste, rebelião

No século catorze, o crescimento econômico que vinha ocorrendo desde o século onze na Europa Ocidental foi gradualmente dando lugar à estagnação.

Já por volta de 1270 começaram a surgir os primeiros sinais de queda da produção agrícola. A contínua ampliação das áreas de cultura ocorrida nos séculos anteriores terminou por atingir áreas de pastagens e terrenos menos apropriados ao cultivo. Com a redução do adubo natural, antes fornecido pelo gado, e o cultivo de solos menos férteis, o resultado foi a retração das colheitas e a queda dos rendimentos de senhores e de camponeses.

Entre 1309 e 1323, por exemplo, as fortes chuvas em quase todas as regiões da Europa destruíram muitas plantações. O período mais crítico durou de 1314 a 1319. Como consequência, houve um rápido aumento dos preços dos alimentos, principalmente do trigo. Assim, o temido fantasma da fome voltou a ameaçar a população europeia.

A fome entre a população

Em Winchester, na Inglaterra, as mortes ocorridas em 1317 atingiram o dobro das registradas em 1310. Na região do Baixo Reno, na França, um cronista relatou que as populações chegaram a se alimentar de cadáveres de animais vitimados por enfermidades, o que teria dado origem a epidemias tão graves que várias aldeias ficaram desoladas. Em algumas cidades da Europa, covas coletivas foram abertas para enterrar os “mortos de fome”.

Pintura. Em primeiro plano, embaixo, um homem sentado no chão de cabelos e barba grisalhos, com um gorro sobre a cabeça, roupa comprida em tons de marrom, perna direita enfaixada em branco e descalço. Ele olha para baixo, a 45 graus. Ao lado dele, vê-se parcialmente dois cestos, um deles sobre uma banqueta vermelha contendo alimento em forma de pequenos pães marrom-amarelados. O outro cesto está sobre o chão, com a abertura voltada para baixo. À direita dele, em destaque, uma mulher de vestido vermelho, camisa branca de mangas compridas e calçada com sapato vermelho e preto, carreta uma criança nua e um cesto com alimentos na mão direita, e dá a mão esquerda a uma criança loira de camisolão verde. Atrás dela, em segundo plano, aglomeração de pessoas. Em terceiro plano, à direita, outra aglomeração de pessoas. Um homem visto parcialmente, de chapéu preto e vestes em rosa, oferece pão a uma criança com vestes em vermelho. Diversas outras pessoas estão atrás dela, entrando no lugar por uma porta aberta de duas folhas, marrom com detalhes em preto.
BARTOLO, Domenico di. Padre distribuindo pão aos pobres. 1443. Afresco (detalhe). Hospital Santa Maria della Scala, Siena, Itália.
Ícone. Sugestão de livro.

A Idade Média passo a passo. São Paulo: Claro Enigma, 2014. A obra apresenta um panorama sôbre a Idade Média, com texto leve e agradável, conteúdos atualizados e ilustrações que cativam o jovem leitor.

A peste negra

A escassez de alimentos e a consequente deficiência nutricional que ela provocou nas pessoas deixaram a população europeia vulnerável a uma epidemia devastadora, conhecida como peste negra.

A peste negra é uma doença de caráter infectocontagioso provocada pêla bactéria . Transmitida aos humanos por meio de pulgas que se contaminam ao parasitar roedores que alojam a bactéria, como os ratos, a peste se manifesta de duas fórmas principais: a bubônica e a pulmonar.

No primeiro caso, o bacilo entra no indivíduo percorrendo suas vias linfáticas até ficar retido nos gânglios do pescoço, sob os braços e nas virilhas, gerando um inchaço muito doloroso chamado bubão. A incubação da doença é rápida e seus sintomas, como manchas escuras na pele, aparecem entre dois a cinco dias após o contágio.

A peste pulmonar é mais grave. Isso porque as bactérias se alojam no pulmão, facilitando o contágio pelo ar por meio da tosse ou do espirro. Foi essa fórma da doença que matou mais de um terço da população europeia entre 1348 e 1352, o período mais crítico da pandemia, e reduziu ainda mais a produção econômica da Europa feudal.

Os caminhos da peste

Acredita-se que a peste teve origem na Ásia Central, de onde viajou ao longo da Róta da sêda, alcançando a região da Crimeia em 1343. De lá, foi provavelmente transportada por pulgas que viviam nos ratos que viajavam nas embarcações e se espalhou por toda a região do Mediterrâneo, chegando à Europa através da península Itálica.

Iluminura. Dezenas de pessoas à esquerda, levam caixões de madeira fechados sobre os ombros. Outras carregam um caixão na altura da cintura. À direita, pessoas cavam a terra e, outras, empilham os caixões. Elas estão com o olhar cabisbaixo, com roupas de mangas compridas e calça em cores variadas: vermelho, azul, bege e amarelo. Ao redor da imagem, bordas em tons de marrom e azul com estampas de grafismos variados.
Cidadãos de Tournai: enterrando as vítimas da peste. cêrca de 1353. Iluminura (detalhe). Biblioteca Real da Bélgica, Bruxelas. Esta iluminura está presente no manuscrito Crônicas de gíle lí misí. Devido ao grande número de vítimas da peste e da fome, os mortos eram jogados em valas cavadas às pressas.
As revóltas populares

O contexto de fome, epidemias e guerras, somado aos tributos devidos à Igreja e aos senhores feudais, impeliu muitos camponeses à rebelião. Na década de 1350, explodiram várias revóltas camponesas na França, conhecidas como jacqueries, nome que deriva de uma expressão francesa semelhante a “joão-ninguém”. Para alguns autores, essas revóltas contestavam os altos tributos cobrados pelos senhores. Para outros, teriam sido motivadas por uma crise de fome no norte da França. Outros, ainda, as interpretam como levantes contra o poder da nobreza. Essas revóltas foram duramente reprimidas, deixando mais de 20 mil camponeses mortos.

As rebeliões populares não se restringiram à Europa continental. Em 1381, uma revólta aglutinando trabalhadores do campo e da cidade explodiu na Inglaterra, motivada pêla cobrança de um novo imposto. Os trabalhadores chegaram a tomar Canterbury e a constranger o rei em Londres, que se viu forçado a atender às demandas do movimento. Porém, a rebelião acabou massacrada.

Nas cidades também ocorreram várias revóltas. Na região de Auvergne e Languedoc, no sul da França, entre 1366 e 1384, camponeses e trabalhadores urbanos formaram bandos armados que ficaram conhecidos como Tuchins. Eles lutavam principalmente contra a cobrança de impostos. Na região de Flandres, trabalhadores urbanos se voltaram contra as oficinas artesanais formadas por camponeses vindos das áreas rurais. Para os rebeldes, essas oficinas eram responsáveis pelo aumento da concorrência e pêla redução dos seus salários.

Gravura em preto e branco. À frente, à esquerda, um homem sobre um cavalo e, perto dele, outro homem em pé, fincando uma espada sobre o corpo de uma pessoa à frente dele. À direita, homens com chapéu e capa estão sobre cavalos e, mais atrás, outros em pé à direita. Mais ao fundo, prédio em dois andares com janelas e telhados, ladeado por duas vias. Ao fundo, na via à direita, multidão de pessoas em pé perto de diversas construções de tamanhos e formatos variados.
réris. O rei Ricardo segundo, da Inglaterra, é desafiado pelos camponeses rebelados. Século dezenove. Esta gravura representa a revólta camponesa inglesa de 1381.

A Guerra dos Cem Anos

A Guerra dos Cem Anos teve início em 1337, principalmente em virtude das disputas comerciais entre a França e a Inglaterra e do interesse dos ingleses na sucessão do trono francês, e terminou em 1453, com a vitória dos franceses.

Nesse conflito, surgiu a figura de Joana Dárc, uma camponesa francesa analfabeta, mística e com fama de visionária. A jovem teria comandado um exército que libertou a cidade de Orleans. Em 1430, aos 18 anos, foi presa e entregue aos ingleses. No ano seguinte, acusada de heresia, Joana foi queimada viva. Inocentada em 1456, foi santificada pêla Igreja Católica em 1920.

O mêdo da morte

O cenário de mêdo, destruição e morte vivido no final da Idade Média foi representado à exaustão por muitos artistas da época.

Na pintura, por exemplo, a morte era representada na figura de esqueletos humanos, de corpos em decomposição e, em especial, nas danças macabras, como você pode observar na imagem a seguir. Essas danças mostravam a morte personificada em um esqueleto parcialmente coberto por um manto e carregando uma foice, seguida por indivíduos dos mais variados segmentos sociais.

Nas representações da morte, as diferentes camadas sociais da Europa medieval apareciam, enfim, igualadas pêla finitude da existência humana.

Pintura. Na parte inferior, pergaminho na horizontal de cor bege com letras em preto. Acima, quatro homens e uma mulher com vestes típicas da nobreza em branco e vermelho. À esquerda, um homem de barba branca segura um cetro; à direita, um homem de coroa segura um orbe encimado por uma cruz, uma espada e uma coroa; à direita, uma mulher com um chapéu branco e véu; ainda mais à direita, um homem de chapéu vermelho com manto vermelho; na extrema direita, um homem com vestes de rei em vermelho escuro e coroa dourada sobre a cabeça. Entre essas pessoas, caveiras em pé, fazendo passos de dança, com túnicas brancas. Em segundo plano, local com vegetação verde e árvores de folhas verdes.
nutke bêrn. Dança macabra. Século xis vê. Óleo sôbre tela (detalhe), 160 por 750 centímetros. Museu de Arte da Estônia,Tálim, Estônia.

Ler a pintura

• Você consegue identificar os grupos sociais representados no fragmento da pintura Dança macabra? Como?

O fim do feudalismo

A crise do século catorze fez com que muitas famílias nobres perdessem suas terras, devastadas pêlas revóltas e pêla doença, e se deslocassem para as cidades ou para as côrtes reais. Outras casaram as mulheres da família com ricos burgueses. O clero também perdeu parte de seus poderes, pois, aos poucos, deixou de ser constituído apenas por homens da nobreza.

A burguesia foi, em geral, o grupo mais favorecido. Apesar das dificuldades, muitos burgueses compraram terras dos nobres e passaram a ocupar cargos administrativos nas côrtes.

As mudanças também atingiram os camponeses. Depois da peste, das revoltas e do declínio demográfico, muitos adquiriram terras e se livraram da servidão. Outros migraram para as cidades e se tornaram trabalhadores livres.

Ícone. Sugestão de livro.

massárdiê gil. Contos e lendas da Europa medieval. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. O livro reúne contos, histórias e lendas pertencentes à tradição medieval, reescritos pêlo historiador francês gíle massárdiê.

A centralização monárquica

Apesar de as transformações ocorridas entre os séculos onze e catorze terem favorecido o enriquecimento de uma nascente burguesia, havia muitos obstáculos para a expansão desse novo grupo social.

O transporte de mercadorias de uma cidade para outra, por exemplo, obrigava os comerciantes a cruzar vários feudos. Cada um deles, porém, estava sob a autoridade de um senhor feudal, que estipulava as próprias leis e taxações. Essas restrições, que variavam em cada feudo, levaram a burguesia a apoiar a transferência de poder para as mãos de um rei; assim, ele poderia unificar a moeda, as leis e os impostos e estabelecer um sistema de pesos e medidas único, facilitando os negócios.

Oapôio aos monarcas também partiu de alguns nobres. Enfraquecidos com as Cruzadas e as fugas de servos para as cidades, muitos nobres acabaram se aliando aos reis em troca de benefícios e privilégios. A centralização do poder real, contudo, sofreu resistência da Igreja Católica e da maior parte dos senhores feudais. O alto clero receava que reis muito poderosos se tornassem politicamente mais fortes que o papa. Já os senhores feudais temiam que a centralização monárquica diminuísse seu prestígio e poder.

Apesar desses entraves, os reis conseguiram impor sua autoridade sôbre os habitantes de um território e estabelecer os chamados Estados modernos. Esse processo não foi igual em toda a Europa, e ocorreu em diferentes momentos. Na península Ibérica, por exemplo, o Reino de Portugal se organizou ainda no século doze, enquanto o Reino da Espanha se consolidou apenas ao final do século quinze. Na Inglaterra, o processo de centralização do poder se completou logo no início do século treze, e o Reino da França se estabeleceu no século quinze.

Ilustração. À esquerda e à frente, um homem de cabelos castanhos, com gorro sobre a cabeça, vestes longas em verde e sapatos em vermelho, tem o corpo reclinado sobre uma mesa de madeira, sobre a qual ele se apoia com os punhos. Ele segura um objeto claro com as mãos. O corpo dele está voltado para a esquerda da ilustração, e a cabeça, para a direita. Ele observa três homens ao redor de uma mesa. Ela é de madeira, e há inúmeras moedas douradas sobre ela. Um homem de roupa cinza joga mais moedas douradas de dentro de um saco de cor bege. Ao centro, dessa cena, há um homem de cabelos castanhos, com roupa azul e vermelha e, ao lado dele, um outro homem com roupas azuis e mãos estendidas sobre as moedas. Atrás deles, azulejos laranjas com grafismos coloridos em azul e verde. Em segundo plano, à esquerda, atrás do homem de verde, dois outros homens conversam. À esquerda, o homem veste vermelho e, o outro, à direita, veste marrom. Ao fundo, atrás deles, parede com azulejos coloridos e um texto à esquerda. Acima e ao centro, a figura de Jesus Cristo, com uma auréola amarela e laranja e um livro na mão esquerda estende o braço direito e aponta para a esquerda da ilustração.
Banqueiros. Século catorze. Ilustração. Biblioteca Britânica, Londres, Inglaterra. A centralização do poder nas mãos dos reis favoreceu as atividades da burguesia.

Atividades

Faça as atividades no caderno.

  1. Várias mudanças marcaram a Europa medieval a partir do século onze. Cite e explique três delas.
  2. Escreva um pequeno texto sôbre os objetivos das Cruzadas, quem participou delas e seus resultados.
  3. Ao longo do século catorze, ocorreram diversas revóltas nos campos e nas cidades da Europa Ocidental. Na Inglaterra, um dos líderes da rebelião de 1381, o padre djón ból, declarou:

Boas gentes, as coisas não podem ir bem na Inglaterra e elas só irão quando os bens forem possuídos em comum, quando não mais haverá nem vilãos [“plebeus”] nem gentis-homens [“nobres”] e quando formos inteiramente iguais.

ból djón apud ESPINOSA, Fernanda. Antologia de textos históricos medievais. Lisboa: Livraria Sá da Costa, 1981. página 287-288.

  1. Qual era a condição social de djón ból? Suas críticas eram dirigidas a que camada social da Inglaterra?
  2. Segundo o padre, “as coisas” não estavam indo bem na Inglaterra. O que seriam essas “coisas”? O que ele pretendia dizer com isso?
  3. Qual era a proposta do padre djón ból para acabar com esses problemas? Você acha que essas ideias eram consideradas revolucionárias para a época? Por quê? E hoje, como você imagina que as ideias dele seriam vistas?

4. A pintura gótica desenvolveu-se entre os séculos doze e catorze. Um exemplo desse novo estilo é a obra Cristo no caminho do Calvário, de Simone Martini (cêrca de 1284-1344). A pintura, como você pode notar ao lado, ainda conserva o dourado da arte bizantina, tanto no cenário quanto nas pregas que realçam as roupas dos personagens. No entanto, já é possível perceber nela a terceira dimensão na perspectiva criada no cenário e a tentativa de romper com a rigidez das figuras, dando-lhes uma expressão mais humana e natural. Observe.

Pintura. Diante do portão da muralha de uma cidade, em cor cinza, uma fila de pessoas seguindo um homem de túnica vermelha que carrega uma cruz de madeira em seus ombros. A muralha deixa ver apenas a ponta dos telhados das construções da cidade. A muralha tem uma porta central e uma rampa, por onde saem dezenas de pessoas, mulheres e homens, alguns com lenço sobre a cabeça em tons de azul, amarelo e vermelho, outras com auréolas douradas. A muralha da cidade está mais distante, em segundo plano e as pessoas, mais próximas, em primeiro plano. Uma mulher está em destaque na multidão que desce a rampa; ela tem as mãos para cima, o cabelo loiro muito comprido. Mais à frente, na parte inferior da pintura e em primeiro plano, Jesus Cristo, com uma  túnica vermelha, ajudado pela multidão, carrega uma cruz de madeira escura. Ele tem cabelos e barba castanhos e uma auréola sobre a cabeça. Perto dele, um homem visto de costas, com armadura dourada e com um pequeno cetro na mão. Atrás da cruz, outras dezenas de pessoas, alguns homens com roupa de soldado e com lanças finas na vertical, duas crianças pequenas na frente, uma de roupa azul e outra em verde-claro, vista de costas, de cabelos em castanho-claro. Algumas  pessoas têm expressão de angustiada, outras estão cabisbaixas, tristes. Há jogo de luz e sombra sobre as figuras, que parecem estar, de fato, em movimento.
Martini, Simone. Cristo no caminho do Calvário.cêrca de 1340. Têmpera e folha de ouro em painel, 30 por 20,5 centímetros. Museu do Louvre, Paris, França.
  1. Que elementos da pintura mostram características mais humanas e naturais nos personagens representados?
  2. Por que podemos dizer que essa pintura já apresenta certa perspectiva, isto é, a ilusão de profundidade e volume das figuras?
  3. Observe que a cruz carregada por Jesus também está apoiada sôbre a multidão. O que esse detalhe pode indicar?
  4. Tendo em vista o que você estudou sôbre a Igreja medieval, qual teria sido a função de imagens como essa?
Ícone. Ilustração de cabeça humana com engrenagem cinza no lugar do cérebro, que se conecta com outra engrenagem menor e azul, indicando a seção Para refletir.

Para refletir

Multiculturalismo

O mundo árabe e o mundo ocidental são, realmente, incompatíveis?

Com base nos estudos desta Unidade, você já percebeu que o mundo árabe e o mundo ocidental há muito tempo estão ligados. O jornalista e estudioso djónatân láions fez uma ampla pesquisa sôbre esse assunto e lançou, no ano de 2011, um livro sôbre o mundo árabe. O título da obra é A Casa da Sabedoria: como a valorização do conhecimento pelos árabes transformou a civilização ocidental.

Esse livro surpreendeu o público ao trazer uma nova visão sôbre a história dos povos árabes e mesmo sôbre o Ocidente. Em sua pesquisa, láions mostra a influência que os conhecimentos árabes exerceram durante a Idade Média, afirmando que, sem a difusão dos seus estudos, o mundo ocidental como conhecemos hoje seria bem diferente.

Mas em que medida o conhecimento construído pelos árabes influenciaram o Ocidente? Bom, só para começar, os árabes, na Idade Média, conseguiram medir a circunferência da Terra, descobriram e desenvolveram a álgebra, praticavam a astronomia, desenvolviam conhecimentos científicos na área da saúde e da medicina. Segundo láions e vários outros pesquisadores e historiadores, esses saberes não eram conhecidos pelos europeus, que só tiveram contato com eles durante a expansão árabe em partes da Europa, conforme você estudou no Capítulo 17. Além disso, os árabes traduziram e complementaram os textos de filósofos gregos antigos, o que possibilitou aos ocidentais ter acesso a esses textos.

Iluminura. Uma moldura vertical com bordas em marrom claro e uma pintura no centro, com céu noturno em azul-escuro, estrelas em pontos amarelos e uma lua branca com o formato de um C invertido. Abaixo, à esquerda, em uma construção azul de dois andares, dois homens observam o céu. O que está na parte alta da construção usa turbante branco e vestes azuis; ele observa o céu com uma espécie de luneta marrom fina e longa. Um outro homem está na sacada dessa construção, aponta para o céu, usa turbante branco e  traje cor de laranja. No solo, um outro homem, este com traje amarelo e vermelho também observa o céu com a ajuda de um instrumento marrom, longo e fino.  À frente dele, há um homem sentado sobre os calcanhares, com traje laranja e verde e turbante, segurando uma esfera azul e verde com a mão direita e repousando a mão esquerda sobre uma folha branca, com inscrições sobre seu colo. Ao fundo, morros azulados e e vegetação em verde.
Astrônomos estudando a Lua e as estrelas em manuscrito otomano. Século dezessete. Biblioteca da Universidade de Istambul, Turquia.
Página de livro. Página de  livro manuscrito de cor bege claro com ilustrações em tons de vermelho e laranja representando órgãos do corpo humano como ossos, pulmões, face e outros. Entre as ilustrações, linhas em vermelho, e inscrições com o alfabeto árabe, em vermelho e e preto.
Página do Tratado de Medicina, de Avicena (980-1037). Museu Nacional da Síria, Damasco, Síria.

Leia a seguir um trecho do livro A Casa da Sabedoria.

Os nomes de ál rauárizimi, Avicena, al ídrisi e Averróis – gigantes da cultura árabe e figuras dominantes na Europa medieval durante séculos – provocam hoje pouca ou nenhuma reação do leitor leigo instruído. A maioria está esquecida, não passa de lembrança distante de uma era passada. Contudo, eles foram apenas alguns dos protagonistas de uma extraordinária tradição científica e filosófica árabe que jaz escondida sob séculos de ignorância e franco preconceito antimuçulmano do Ocidente. Uma recente pesquisa de opinião pública mostrou que a maioria dos americanos vê “pouco” ou “nada” para admirar no islã ou no mundo muçulmano. Mas, se voltarmos nas páginas do tempo, veremos que é impossível imaginar a civilização ocidental sem os frutos da ciência árabe: a arte da álgebra de ál rauárizimi, os abrangentes ensinamentos médicos e a filosofia de Avicena, as duradouras geografia e cartografia de al ídrisi, o rigoroso racionalismo de Averróis. reticências

O esquecimento intencional do legado árabe pelo Ocidente teve início há séculos, quando a propaganda antimuçulmana criada à sombra das Cruzadas começou a obscurecer qualquer reconhecimento do profundo papel da cultura árabe no desenvolvimento da ciência moderna. reticências

Láions, Diônatan. A Casa da Sabedoria: como a valorização do conhecimento pelos árabes transformou a civilização ocidental. Rio de Janeiro: Jorge zarrár, 2011. página 19-20.

  1. No trecho do livro de láions que você acabou de ler, ele diz que “Uma recente pesquisa de opinião pública mostrou que a maioria dos americanos vê ‘pouco’ ou ‘nada’ para admirar no islã ou no mundo muçulmano”. Logo depois, ele nos mostra fatos que possibilitam discordar totalmente dessa opinião. Que fatos são esses? Responda em seu caderno.
  2. Para láions, quando começou, possivelmente, o esquecimento que a influência cultural árabe teve no mundo ocidental? Baseando-se em seus conhecimentos de História, você diria que a hipótese de láions é possível? Por quê?
  3. Em sua opinião, uma pesquisa como a de djónatân láions, que fala sôbre os conhecimentos árabes durante a Idade Média e sua influência no mundo ocidental, é importante para a atualidade? Por quê?
Página de livro.  Página de livro manuscrito de cor cinza, com ilustrações de formas geométricas em vermelho, há: cubos, pirâmides, paralelepípedos entre outras.  Entre as formas, texto de cor preta em caracteres do alfabeto árabe.
Página de livro árabe sôbre Geometria. Século treze. Biblioteca da Mesquita de Solimão, Istambul, Turquia.

Glossário

Leigo
Cristão comum, ou seja, aquele que não faz parte do clero; laico.
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Diocese
Unidade administrativa e religiosa que, entre os séculos quatro e nove, correspondia aos limites de uma cidade.
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Emulação
Rivalidade.
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Vetustez
Qualidade de vetusto, isto é, muito velho, antiquíssimo.
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Franj
Termo utilizado pelos árabes para se referir aos ocidentais, especialmente franceses.
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