UNIDADE dois  A EUROPA MODERNA EM FORMAÇÃO

Fotografia. Uma cidade vista do alto. Em primeiro plano, casas baixas com paredes de cor bege, telhado de cor marrom, umas próximas das outras e áreas com árvores de folhas verdes. Em segundo plano, uma grande catedral, com três torres à esquerda, duas em marrom, mais baixas, e uma ao centro, mais alta, de cor cinza. No centro, edificação horizontal, de cor cinza, com janelas redondas. À direita, uma enorme cúpula se ergue ao céu, com formato arredondado e cor marrom, com o topo afinado, onde há um círculo dourado com uma cruz no alto. Ao fundo, montanhas com vegetação. No alto, o céu azul claro e nuvens brancas.
Vista da cidade de Florença, na Itália, considerada um dos berços do Renascimento devido à sua intensa produção intelectual e artística nos séculos quinze e dezesseis. Ao fundo, a Catedral de Santa María de las Flores, com a cúpula projetada no século quinze por Filippo Brunelêsqui, um ícone da arquitetura renascentista. Fotografia de 2020.

Você estudará nesta Unidade:

O Renascimento

O Humanismo

A Reforma protestante

A Contrarreforma

A arte renascentista

O absolutismo

O mercantilismo

Fotografia. Vista de local fechado, com paredes em bege, contornos em cinza, e o teto abobadado, arqueado. No centro, sobre uma base branca, uma estátua grande  feita de pedra na cor branca, representando um homem, visto frontalmente. Ele tem os cabelos curtos e cacheados e o corpo nu e musculoso. A mão esquerda está encostada no ombro; a cabeça voltada para a esquerda; o braço direito, solto ao longo do corpo. Em primeiro plano, dezenas de pessoas em pé, algumas tirando fotografias e outras observando a estátua.
Estátua Deivid, de Miquelângelo, em exposição na Galeria da Academia de Belas Artes de Florença (Galeria da Academia), na Itália. Pintor, escultor, arquiteto e poeta, Miquelângelo viveu entre os anos de 1475 e 1564, na Itália, e é tido como um dos maiores nomes do Renascimento. Escultura em mármore, 517 por 199 centímetros. Fotografia de 2019.

No final da Idade Média, novas práticas e mentalidades se tornaram cada vez mais presentes na sociedade europeia. O feudalismo estava em crise e um novo grupo social surgia: a burguesia.

Esse período de transformações políticas, econômicas e sociais tomou fórma nos séculos catorze e quinze. Essas transformações se consolidaram e se integraram a uma nova visão de mundo.

Os artistas e os intelectuais da época procuravam se diferenciar do pensamento e da cultura medievais. Para isso, passaram a buscar inspiração na Antiguidade clássica, considerada por eles um período de grandes realizações. Era o início do movimento que ficou conhecido como Renascimento.

Como será que as transformações que ocorreram na Europa ocidental nos séculos catorze e quinze originaram um novo modo de pensar e de ver o mundo? Como esse novo modo de pensar se manifestou no campo das artes, no das ciências e no da religião? O que você sabe sobre esse assunto?

CAPÍTULO 3  O RENASCIMENTO

Multiculturalismo.

Na Europa da Idade Média, quem cuidava das escolas e das universidades era a Igreja católica. Para os membros do clero, havia um único caminho de compreensão da vida: o da fé e da religião. Assim, defendiam uma visão teocêntrica, segundo a qual a vida deveria ser guiada pela crença na vontade de Deus, que era considerado o centro do Universo. Mesmo os pensadores de uma corrente filosófica chamada de Escolástica, que procuraram conciliar a fé e a razão, defendiam que a verdade absoluta estava na palavra de Deus revelada nas Escrituras.

Contudo, essa fórma de contemplar o mundo já não correspondia às transformações que estavam em curso na Europa desde o século onze, como a urbanização, a intensificação do comércio e o surgimento de um novo grupo social, a burguesia, que enriquecia graças às atividades comerciais. Nesse contexto, foram surgindo ideias que pretendiam renovar os estudos tradicionais por meio da valorização de outras áreas do conhecimento, como História, Filosofia, Literatura, Retórica e Matemática.

Surgia na península Itálica, em fins do século catorze e início do quinze, um movimento intelectual e cultural que expressava o novo modo de pensar que se desenvolvia na Europa, e que ficou conhecido como Renascimento.

Pintura. Interior de um salão em formato de arco, com teto abaulado. Em primeiro plano, um arco decorado com frisos e pinturas na cor dourada. No salão, há dois patamares que estão conectados por uma escada com quatro  degraus de mármore. O salão tem colunas decoradas com frisos e esculturas. Espalhados pelo salão, tanto no patamar superior como no inferior, há pessoas reunidas. O grupo é formado majoritariamente homens. A maioria veste túnicas de diferentes cores (vermelho claro, azul claro, branco, laranja, verde claro, entre outras) e está descalça. O grupo está subdividido em grupos menores. Muitos homens estão em pé, apenas alguns estão sentados ou encostados nos pilares que sustentam as colunas. Há dois homens lado a lado, no centro da pintura. Um, de túnica vermelha, à esquerda, tem o topo da cabeça calvo, cabelos longos brancos nas laterais da cabeça, longa barba comprida branca. Ele aponta o dedo indicador para o alto, com uma mão, e com a outra, segura um grande livro, fechado, encostado junto à lateral de seu corpo. O outro homem, de túnica azul, à direita, tem cabelos cacheados, castanhos, cheios, barba espessa e cheia da mesma cor. Tem uma das mãos à frente de seu corpo, com a palma voltada para baixo, e com a outra mão, segura um grande livro fechado, apoiado em sua coxa. Logo abaixo deles, há um homem de túnica azul sentado nos degraus, lendo uma folha de papel. No patamar inferior, à direita, há um grupo de doze pessoas, entre os quais duas crianças. Alguns estão escrevendo sobre grandes livros ou sobre folhas soltas de papel. Um está sentado, apoiando um dos cotovelos sobre um bloco de mármore, uma folha de papel sobre o bloco, o olhar voltado para baixo, pensativo. No patamar superior à esquerda, há um grupo com cerca de dezesseis pessoas, a maior parte, homens vestindo túnicas coloridas. Entre eles, há uma figura usando armadura metálica e capacete militar dourado que conversa com um homem calvo de túnica esverdeada, e mais à esquerda, uma figura com o peito nu, usando apenas um tecido de cor marrom ao redor do quadril e sobre seus ombros, carregando uma pilha de pergaminhos enrolados. No patamar superior à direita, há cerca de dezoito pessoas, algumas olhando para os dois homens no centro, outras em postura pensativa. Há uma figura masculina vestindo túnica vermelha, curvada, apoiando-se sobre a base de uma coluna, com as pernas cruzadas e escrevendo sobre um caderno apoiado em seu joelho. No patamar inferior à direita, há um grupo de nove pessoas. Cinco delas, em torno de uma pequena lousa que está sobre o chão. Um homem calvo está curvado, traçando uma figura com um compasso na lousa sobre o chão. Outro, jovem, de túnica azul, está ajoelhado no chão observando. Mais à direita, um grupo de quatro homens em pé. Um deles, visto de costas, segura um globo terrestre; outro, visto de frente, segura uma esfera celeste. Ao fundo, em perspectiva, há três grupos de arcos. As estruturas são sustentadas por colunas e ocupam o centro da imagem. Ao fundo, os arcos revelam o céu azul com poucas nuvens.
Sãnzio, Rafael. Escola de Atenas. 1509-1510. Afresco, 500 por 700 centímetros. Neste afresco, foram representados importantes filósofos da Grécia Antiga, como Platão (no centro, com túnica vermelha), Aristóteles (ao lado de Platão, com túnica azul) e Sócrates (à esquerda, com túnica esverdeada). Os intelectuais da Antiguidade clássica inspiravam os artistas do Renascimento. Palácio Apostólico, Vaticano, Cidade do Vaticano.

Uma nova visão de mundo

O termo “Renascimento” era utilizado pelos próprios artistas da época para definir suas obras em contraposição à produção artística medieval.

Contudo, é importante notar que a visão de mundo divulgada pelos renascentistas contribuiu para a consolidação da ideia de que a Idade Média foi um período de atraso, um milênio de trevas durante o qual o conhecimento da Antiguidade clássica teria “desaparecido”.

Essa concepção a respeito da Idade Média é equivocada, pois a cultura greco-romana continuou presente ao longo da Idade Média, na Literatura, nas teorias políticas, na Educação, na Filosofia etcétera. Além disso, a Idade Média foi uma época marcada por importantes estudos, invenções e uma produção artística intensa.

Outro problema decorrente dessa nova visão de mundo divulgada pelos renascentistas é acreditar que qualquer expressão cultural possa surgir fóra de seu tempo. Ainda que os renascentistas desejassem fazer “renascer” a cultura greco-romana, eles criaram um estilo artístico que expressava algo novo, refletindo os indivíduos e a sociedade do final da Idade Média.

Esses artistas eram pessoas de seu tempo, ou seja, viviam em um mundo em que as ideias religiosas do cristianismo ainda tinham muita fôrça, enquanto novos valores se desenvolviam rapidamente. Uma das concepções que começou a ser construída nessa época foi a de modernidade. Porém a passagem para o "novo mundo", o mundo moderno, tinha como centro a história da Europa e desconsiderava os processos históricos e culturais vivenciados por diversos povos.

Pintura. Vista de um local aberto representado em uma pintura de formato retangular e vertical. No centro da pintura, sobre águas verdes, uma pequena embarcação de madeira com um mastro sem velas atado por cordas, e dez pessoas à bordo. Nas águas, junto ao costado da embarcação, há mais duas pessoas, imersas e nuas. Uma delas, tem apenas a cabeça e os braços para fora da água. Ela ergue uma tigela para o alto com as duas mãos. A outra pessoa, vista de costas, está com o torso fora da água e toca no costado da embarcação, observando o que está disposto sobre uma tábua. No centro da embarcação, quatro pessoas estão em volta de uma mesa improvisada, feita com uma tábua de madeira sobre a qual há um prato com algumas frutas pequenas de cor vermelha e um copo de prata. À mesa, posicionados um de frente para o outro, à direita, um monge de túnica cinza, com o topo da cabeça com os cabelos raspados e apenas uma coroa de cabelos ao redor da cabeça tem as mãos apoiadas no tampo da mesa; e à esquerda, uma freira  de trajes de cor cinza, que toca uma pequena viola; ambos estão com a boca aberta e são acompanhados por outros dois personagens: um homem que segura um remo e está com a boca aberta e uma pessoa de olhos fechados, vista apenas parcialmente. No centro desse grupo, há um círculo, uma espécie de pão ou de grande hóstia, que está amarrado, suspenso por uma corda atada ao mastro da embarcação. Atrás deles, à direita, atrás de um barril de madeira, um homem de cabelos castanhos e curtos, vestido com traje cinza, se debruça para fora da embarcação para cuspir algo na água. No fundo da embarcação, ao lado do barril, à direita, há uma grande árvore. O homem que cospe sobre o costado se apoia no tronco da árvore. Em um de seus galhos, há um peixe preso por um anzol; em outro galho, há um homem sentado, vestido com traje verde com capuz da mesma cor, segurando um copo junto à boca, como se bebesse um líquido. Em meio à copa da árvore, subindo no mastro da embarcação ao qual se agarra com uma das mãos, um outro homem parece querer cortar algo com uma faca. Ele dirige seu olhar e uma faca para o alto, na direção de um frango depenado que está encaixado no topo do mastro. Na parte mais alta da copa da árvore, no alto da pintura, há uma cabeça com feições humanas, que parece ser de pedra. Na embarcação, à esquerda, há um homem de traje vermelho deitado sobre o convés e olhando para o alto; uma freira de vestes de cor cinza toca o ombro dele com uma mão e  segura uma espécie de vaso com a outra. Atrás deles, um homem de chapéu e vestes vermelhas, ergue uma das mãos para o alto e tem os olhos fechados e a boca aberta, como quem canta. Sobre a cabeça, ele carrega um copo de prata. Atada ao mastro da embarcação, tremulando ao vento, uma flâmula longa, vermelha, com uma lua amarela desenhada. Ao fundo, águas esverdeadas e o céu azul claro.
bóchi, Hieronymus. A nau dos loucos. cêrca de1500. Óleo sobre madeira, 58 por 33centímetros. Nesta pintura, h critica, de maneira alegórica, fórmas de comportamento da sociedade medieval. Museu do Louvre, Paris, França.
Ícone. Sugestão de livro.

PROENÇA, Graça. Descobrindo a história da arte. São Paulo: Ática, 2019. Nesta obra é possível encontrar um vasto panorama da história da arte, incluindo informações e imagens de obras de artistas do Renascimento.

O Humanismo

O período de grandes transformações pelo qual passava a Europa propiciou o desenvolvimento do Humanismo, movimento intelectual do Renascimento que surgiu nos centros urbanos mais prósperos da península Itálica. O Humanismo voltava-se para a busca do conhecimento sobre o ser humano e a natureza por meio da investigação, da observação e da crítica, valorizando a razão e o raciocínio lógico.

Os humanistas questionavam a submissão das pessoas e também a devoção religiosa como centro da existência e a vida contemplativa, que eram características da época medieval. O movimento buscava, então, apoiar uma postura mais ativa, inventiva, observadora e capaz de usufruir do seu mundo e de seu tempo.

Assim, em substituição à visão teocêntrica, os humanistas defendiam o antropocentrismo, que colocava o ser humano no centro do Universo. O homem, no lugar de Deus, deveria ser a medida de todas as coisas.

Vale considerar, no entanto, que os humanistas não eram ateus, embora defendessem a busca da verdade por meio da investigação e da reflexão racional.

Observe, por exemplo, como o poeta inglês Uíliam Xêiquispíer, em sua famosa obra Hamlet, expressou essa nova visão sobre o ser humano:

Que obra-prima, o homem! Quão nobre pela razão! Quão infinito pelas faculdades! Como é significativo e admirável na fórma e nos movimentos!

Nos atos quão semelhante aos anjos! Na apreensão como se aproxima aos deuses, adorno do mundo, modêlo das criaturas!

Xêiquispíer, Uílliam. A trágica história de Hamlet. [sem local]: Ridendo Castígat Mores, 2000. E-book.

Pintura. Sob um fundo azul claro, dois homens; um à esquerda, outro à direita, vistos de lado, um de frente para o outro. Ambos esticam um dos braços em direção ao outro e tentam encostar as pontas dos dedos indicadores, em evidência no centro da pintura. O homem à esquerda é musculoso, tem cabelos curtos e castanhos e está nu, recostado sobre uma rocha de cor marrom esverdeada, com uma perna flexionada e a outra estendida. Um de seus braços está flexionado com o cotovelo apoiado sobre a rocha; o outro está estendido para a direita, com o cotovelo apoiado sobre seu joelho flexionado. À direita, há um grupo disposto em um formato circular envolto por um tecido de cor rosa. Neste grupo, em destaque, à frente, há um homem musculoso, com cabelos longos e grisalhos e barba longa grisalha, vestido com uma túnica curta em tons de rosa claro, de mangas curtas e a altura até os joelhos. Ele tem o corpo estendido voltado para a esquerda e as pernas esticadas. Atrás dele, há algumas figuras de formas humanas, homens e mulheres, todos nus, com os corpos envoltos por tecidos coloridos em tons de verde e vermelho. Essas figuras estão amontoadas e apoiam o homem de barba longa, como se eles estivessem suspensos no ar. Um dos braços do homem está estendido à frente de seu corpo; com o outro, ele abraça uma figura feminina loira, de cabelos presos, à direita dele.
BUONARROTI, Miquelângelo. A criação de Adão (detalhe). cêrca de1511. Afresco, 2,8 por 5,7 métros Capela Sistina, Vaticano, Cidade do Vaticano.

É possível conhecer um pouco mais a obra desse famoso dramaturgo, Uíliam Xêiquispíer, assistindo à montagem do cineasta Franco Zefiréli da comédia A megera domada.

Ciência e Tecnologia.

O espírito científico

Os estudiosos renascentistas buscavam explicar o mundo por meio da observação e da experimentação, do cálculo, do método e do rigor científico, contribuindo para o desenvolvimento do que chamamos de pensamento moderno. Com base nessas concepções, realizaram muitas descobertas e inovações técnicas. Nos campos da Matemática, da Física e da Astronomia, destacaram-se:

• Nicolau Copérnico (1473-1543): astrônomo polonês, contestou a teoria geocêntrica, elaborada pelo grego Ptolomeu e reafirmada pela Igreja católica, segundo a qual a Terra era o centro do Universo. No lugar, defendeu a teoria heliocêntrica, de acôrdo com a qual o Sol era o centro de tudo, e a Terra e os demais planetas giravam em tôrno dele.

(1571-1630): astrônomo e matemático alemão, dedicou-se à observação do planeta Marte e descobriu que os planetas descrevem órbitas elípticas em vez de circulares, como se acreditava até então. Também elaborou as leis sobre o movimento dos planetas.

• Galileu Galilei (1564-1642): astrônomo, matemático e filósofo italiano, aperfeiçoou a luneta, instrumento que lhe permitiu descobrir as luas de Júpiter, os anéis de Saturno, as fases de Vênus e as dimensões da Via Láctea e do sistema solar. Por meio de suas observações, confirmou a teoria heliocêntrica elaborada por Copérnico.

Gravura. A gravura tem formato quadrado, com quatro figuras em cada uma das pontas, sobre um fundo composto de nuvens e de azul celeste; há, no centro do quadrado um círculo com borda clara e fundo bege. No centro do círculo, em dourado, o Sol, representado com dois olhos, uma boca e um nariz, cercado de quatro globos terrestres: um acima, um à direita, um abaixo e outro à esquerda do Sol. Ao redor, tendo o Sol como centro, há linhas contínuas ovaladas, em elipse, com textos em latim, representando a órbita dos planetas: Saturno, Júpiter, Marte, Terra e Mercúrio. Pequenos círculos contendo estrelas de oito pontas coloridas representam os planetas, (exceto pela terra representada pelos quatro globos). Em torno das órbitas dos planetas, há uma faixa com ilustrações coloridas representando os signos do zodíaco: no alto, câncer (com a ilustração de um caranguejo), gêmeos (com a ilustração de dois homens), touro (com a ilustração da parte superior do corpo de um touro) e Áries (com a ilustração de um carneiro). Na parte inferior, libra, escorpião (com a ilustração de um escorpião), sagitário (com a ilustração de um centauro) e capricórnio (com a ilustração de uma criatura com a parte superior do corpo de cabra e a parte inferior de dragão). No globo acima do Sol, a porção norte da Terra está coberta por sombra, e a porção sul, representada pela América Central e do Sul e pela África, iluminada. No globo à direita do Sol, a porção leste da Terra está coberta por sombra, e a porção oeste, representada pela América, iluminada. No globo abaixo do Sol, a região do Círculo Polar Ártico está iluminada, e o restante do planeta está coberto por sombra. No globo à esquerda do Sol, a porção oeste da Terra está coberta por sombra, e a porção leste, representada pela Ásia e pela África, iluminada. No quatro cantos da obra há diferentes representações. Nos dois superiores há seres de aspecto angelical, com asas, segurando faixas com textos em latim. No inferior esquerdo, há uma mulher sentada, com uma coroa sobre a cabeça, vendada, com um globo terrestre à sua frente e duas crianças à seus pés, sentadas no chão brincando com um relógio mecânico. À direita, há uma mulher sentada, segurando uma tocha e mostrando livros para três crianças que estão ao redor dela, lendo.
Cellarius, Andreas. Sistema cosmológico concebido por Copérnico, publicado na obra Atlas celestial ou a harmonia do Universo. 1660. Gravura, 44 por 51,5 centímetros. Biblioteca Britânica, Londres, Inglaterra.

Ler a gravura

• Esta imagem representa a teoria geocêntrica ou a teoria heliocêntrica? Explique.

De olho na Medicina

A Medicina desenvolveu-se bastante nos séculos quinze e dezesseis. O químico e médico suíço-alemão Paracelso, por exemplo, propôs a cura da sífilis pelo mercúrio. O médico espanhol Miguel Servet descobriu o funcionamento da pequena circulação sanguínea, mostrando que o sangue é levado aos pulmões para ser oxigenado, retornando depois ao coração. Já o inglês uíliãm rárvei descobriu o funcionamento da grande circulação sanguínea e afirmou que o coração funciona como uma bomba para manter o fluxo sanguíneo.

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Transcrição do áudio

[LOCUTOR]:Carta do cardeal Roberto Belarmino

[LOCUTORA]: O movimento humanista e o Renascimento promoveram inovações científicas muito importantes na Europa entre os séculos XVI e XVII. Uma dessas inovações foi a teoria heliocêntrica do universo, defendida por Galileu Galilei. Essa nova visão provocou duras reações de membros da Igreja, por acreditarem que o teocentrismo seria uma verdade inquestionável da religião cristã. Na carta escrita pelo religioso Roberto Belarmino no século XVII, cuja leitura de alguns trechos você ouvirá a seguir, o problema da oposição da Igreja às ideias humanistas e à postura de Galileu é abordado.

[LOCUTOR 2]: Roberto Belarmino a Paulo Antônio Foscarini. Roma, 12 de abril de 1615. Ao Mui Reverendo Padre Mestre Frei Paulo Antônio Foscarini, Provincial dos Carmelitas da Província da Calábria meu Mui Reverendo Padre, li com prazer a carta em italiano e o escrito em latim que Vossa Paternidade me enviou. Agradeço-lhe por uma e outro e confesso que estão ambos cheios de engenho e de doutrina.

Primeiro. Digo que me parece que Vossa Paternidade e o Senhor Galileu ajam prudentemente, contentando-se em falar por suposição e não de modo absoluto, como eu sempre cri que tenha falado Copérnico. Porque dizer que, suposto que a Terra se move e o Sol está parado, salvam-se todas as aparências melhor do que com a afirmação dos excêntricos e epiciclos, está mencionado muitíssimo bem e não há perigo algum. Isto basta para o matemático. Mas querer afirmar que realmente o Sol está no centro do mundo e gira apenas sobre si mesmo sem correr do Oriente ao Ocidente e que a Terra está no Terceiro Céu e gira com suma velocidade em volta do Sol é coisa muito perigosa não só de irritar todos os filósofos e teólogos escolásticos, mas também de prejudicar a Santa Fé ao tornar falsas as Sagradas Escrituras.

Segundo. Digo que, como o senhor sabe, o Concílio proíbe explicar as Escrituras contra o consenso comum dos Santos Padres. Se Vossa Paternidade quiser ler, não digo apenas os Santos Padres, mas os comentários modernos sobre o Gênesis, sobre os Salmos, sobre o Eclesiastes, sobre Josué, verá que todos concordam em explicar literalmente que o Sol está no céu e gira em torno da Terra com suma velocidade e que a Terra está muitíssimo distante do céu e está imóvel no centro do mundo. Considere agora o senhor, com sua prudência, se a Igreja pode tolerar que se dê às Escrituras um sentido contrário aos Santos Padres e a todos os expositores gregos e latinos. Nem se pode responder que esta não é matéria de Fé, porque, se não é matéria de Fé por parte do objeto, é matéria de Fé por parte de quem fala. Assim, seria herético quem dissesse que Abraão não teve dois filhos e Jacó doze, como quem dissesse que Cristo não nasceu de uma virgem, porque um e outro o diz o Espírito Santo pela boca dos Profetas e Apóstolos.

Terceiro. Digo que, se houvesse verdadeira demonstração de que o Sol esteja no centro do mundo e a Terra no Terceiro Céu e de que o Sol não circunda a Terra, mas a Terra circunda o Sol, então seria preciso proceder com muita atenção na explicação das Escrituras que parecem contrárias e dizer, antes, que não as entendemos, do que dizer que é falso aquilo que se demonstra. Mas não crerei que há tal demonstração até que me seja mostrada. Nem é o mesmo demonstrar que, suposto que o Sol esteja no centro e a Terra no céu, salvam as aparências, e demonstrar que na verdade o Sol esteja no centro e a Terra no céu. Porque a primeira demonstração creio que possa haver, mas da segunda tenho dúvida muitíssimo grande e, em caso de dúvida, não se deve abandonar a Escritura Sagrada, explicada pelos Santos Padres.

Com o que saúdo afetuosamente Vossa Paternidade e peço a Deus que lhe conceda toda a satisfação.

Ícone. Ilustração de um círculo de quatro cores, montado como um quebra-cabeça, sobre uma mão, indicando a seção Integrar conhecimentos.

Integrar conhecimentos

História e Ciências

Ciência e Tecnologia.

A vida de Galileu

O texto a seguir apresenta um diálogo fictício entre Galileu Galilei e seu aluno e amigo Andrea, em que o cientista explica de maneira experimental a teoria heliocêntrica. Trata-se de uma adaptação da peça A vida de Galileu, escrita pelo poeta e dramaturgo alemão bértold Brécht entre 1938 e 1939.

Galileu – Veja o que eu trouxe para você, ali atrás dos mapas astronômicos.

Andrea – O que é isso?

Galileu – É uma esfera armilar; mostra como as estrelas se movem à volta da Terra, segundo a opinião dos antigos.

Andrea – E como é?

Galileu – Vamos investigar, e começar pelo começo: a descrição.

Andrea – No meio tem uma esfera pequena.

Galileu – É a Terra.

Andrea – A bola embaixo é a Lua, é o que está escrito. Mais em cima é o Sol.

Galileu – E agora faça mover o Sol.

Andrea (movendo as esferas) – É bonito. Mas nós estamos fechados lá no meio.

Galileu – É, foi o que eu também senti, quando vi essa coisa pela primeira vez. Há dois mil anos a humanidade acredita que o Sol e as estrelas do céu giram em tôrno dela. Pois onde a fé teve mil anos de assento, sentou-se agora a dúvida. Todo mundo diz: é, está nos livros – mas nós queremos ver com nossos olhos.

Galileu – Você acabou entendendo o que eu lhe expliquei ontem?

Andrea – O quê? Aquela história do Copérnico e da rotação?

Galileu – É.

Andrea – Não. Por que o senhor quer que eu entenda? É muito difícil!

Andrea – eu vejo que o Sol de tarde não está onde estava de manhã. Quer dizer que ele não pode estar parado! Nunca e jamais!

Galileu – Você vê! O que é que você vê? Você não vê nada! Você arregala os olhos e arregalar os olhos não é ver. (Galileu põe uma bacia de ferro no centro do quarto.) Bem, isto é o Sol. Sente-se aí. (Andrea se senta na única cadeira; Galileu está de pé, atrás dele.) Onde está o Sol, à direita ou à esquerda?

Andrea – À esquerda.

Galileu – Como fazer para ele passar para a direita?

Andrea – O senhor carrega a bacia para a direita, claro.

Galileu – E não tem outro jeito? (Levanta Andrea e a cadeira do chão, faz meia-volta com ele). Agora, onde é que o Sol está?

Andrea – À direita.

Galileu – E ele se moveu?

Andrea – Ele, não.

Galileu – O que é que se moveu?

Andrea – Eu.

Galileu (berrando) – Errado! A cadeira!

Andrea – Mas eu com ela!

Galileu – Claro. A cadeira é a Terra. Você está em cima dela. Esta aqui é a Terra; seus pés estão sobre ela Você entendeu isto?

Andrea – Sim.

LISBOA FILHO, Paulo N.; LAVARDA, Francisco C. Galileu. [Adaptado da obra de] . [sem local, sem nome], [2012]. Disponível em: https://oeds.link/PZKw18. Acesso em: 3 fevereiro. 2022.

  1. Você acabou de ler um texto teatral. Que elementos do texto confirmam essa afirmação? Reescreva em seu caderno a alternativa correta.
    1. Presença de um narrador e texto organizado cronologicamente.
    2. Presença de personagens e texto em fórma de diálogo.
    3. Linguagem formal e exposição de informações de modo objetivo.
  2. Galileu Galilei afirma que “há dois mil anos a humanidade acredita que o Sol e as estrelas do céu giram em tôrno dela [a Terra]”. Essa afirmação diz respeito a qual teoria? Ela foi defendida por quem?
  3. Que teoria Galileu está tentando explicar a seu aluno Andrea?
  4. As palavras de Galileu apresentam algumas das principais características do Humanismo. Quais são elas? Justifique com passagens do texto.
  5. Galileu expõe uma teoria a Andrea por meio de um experimento, feito com uma cadeira e uma bacia de ferro. Forme um grupo com seus colegas e, juntos, pensem em outra fórma de explicar essa teoria. Em seguida, apresentem o resultado para a turma.
Pintura. Vista de local fechado. No centro da pintura, há dois homens, um sentado e o outro de pé. Entre eles, um globo terrestre na cor bege apoiado sobre uma pequena mesa de madeira. O homem que está sentado tem cabelos longos brancos e barba longa branca, veste roupas escuras e tem a mão esquerda sobre o globo. Com a mão direita, ele gesticula com o dedo indicador levemente curvado. O outro homem, em pé, tem os cabelos do topo da cabeça raspados, formando apenas uma coroa de cabelos curtos e castanhos em torno de sua cabeça, um corte típico dos monges. Ele veste uma túnica de frade, na cor marrom, com capuz. O homem em pé observa aquele que está sentado com atenção, apoiando suas mãos sobre livros que estão sobre a mesa, ao lado do globo terrestre. Ao fundo da sala pouco iluminada, cadeiras com acolchoado em vermelho-escuro.
Parra, Felix. Galileu Galilei ensinando suas concepções na Universidade de Pádua. 1873. Óleo sobre tela, 166,9por 184,5 centímetros. Museu Nacional de Arte, Cidade do México.

A difusão de novas ideias

Até a primeira metade do século quinze, os livros eram manuscritos (ou seja, escritos ou copiados à mão, geralmente por monges copistas), mas eles não eram acessíveis a grande parte da população. O fato de serem manuscritos acabava por limitar e encarecer a sua produção. Além disso, grande parte dos livros ficava guardada nas bibliotecas de mosteiros, o que dificultava a difusão do conhecimento.

Essa situação começou a se modificar em 1450, quando o alemão Iorranes Gutembergue desenvolveu, a partir de um modêlo chinês, a prensa de caracteres móveis feitos de chumbo. A prensa era uma máquina que comprimia, em uma superfície, os tipos alfabéticos, que eram embebidos em tinta e, assim, formavam um texto. O invento permitiu agilizar a reprodução de livros em grandes quantidades, barateando os custos e permitindo difundir as ideias humanistas para várias regiões da Europa. Vale ressaltar, porém, que o uso da prensa somente se tornou hegemônico no século dezenove, com a produção industrial de livros.

Gravura em preto e branco. Sobre um fundo branco, a representação de uma prensa, mecanismo fabricado em madeira. Uma de suas peças é similar a uma mesa, onde repousa uma placa retangular com caracteres metálicos organizados formando uma página. Já a parte superior do equipamento é a prensa propriamente dita, uma peça similar a um grande carimbo com um cilindro metálico no centro, suspensa por duas colunas de madeira. À direita, no chão, dois livros abertos com textos à mostra.
Primeira prensa, inventada por Iorranes Gutembergue. Século dezesseis. Gravura.
Fotografia. Vista de local aberto. Fotografia vertical. Em primeiro plano, sobre um caminho de pedras, algumas esculturas feitas de madeira, em formato de cubo, com caracteres grandes gravados em alto relevo na parte superior do cubo. Os cubos estão dispostos em uma fila sobre o chão, que corta a fotografia verticalmente no centro. Um cubo representa a letra 'a' minúscula; outro representa a letra 'D' maiúscula; outro representa a letra 'L' maiúscula; entre outros caracteres representados.  Ao fundo, entrada de museu com paredes de concreto e  de vidro, onde está escrito, originalmente em alemão, 'Museu Gutenberg'.
Na entrada do Museu Gutembergue, em , na Alemanha, esculturas representam os tipos móveis inventados por Gutembergue. Os tipos móveis são estruturas com relêvo de letras e símbolos, semelhantes a moldes. Fotografia de 2008.

Perseguições e redes de apôio

Apesar de todas essas inovações, a criação e a difusão de novas fórmas de pensar foram tarefas difíceis nesse período. Isso porque muitas dessas ideias, como a teoria heliocêntrica, eram consideradas subversivas em relação à doutrina da Igreja.

Ao questionar as “verdades” estabelecidas, muitos pensadores e cientistas foram excomungados, perseguidos, torturados e, até mesmo, condenados à morte. Giordano Bruno e Miguel servêt, por exemplo, foram queimados vivos pela Inquisição; Galileu foi repreendido pela Igreja e teve de negar suas descobertas para escapar da condenação à fogueira.

Mas, mesmo com a censura da Igreja, as novas ideias continuaram a florescer. Entre os pensadores renascentistas, estabeleceu-se uma rede de apôio, de troca de ideias, de descobertas, de formação de discípulos e de incremento do ambiente universitário.

A arte do Renascimento

Como você pôde perceber, o pensamento humanista teve importantes expressões nas mais diversas áreas do conhecimento, como nos estudos de Astronomia de Galileu e de Copérnico, na Literatura de Xêiquispíer, na Química e na Medicina de Paracelso, entre outras. Contudo, foi principalmente nas artes visuais produzidas no Renascimento que o humanismo manifestou o potencial sensível do ser humano e sua capacidade de representar o mundo.

A península Itálica foi o berço desse movimento e também o local onde ele atingiu o esplendor. A riqueza proveniente das atividades comerciais e bancárias permitiu a formação de uma burguesia próspera e orgulhosa do seu poder, que passou a financiar o trabalho de pintores, escultores e arquitetos.

Ao atuar como mecenas, ou seja, como protetores e patrocinadores dos artistas, esses ricos burgueses tinham um duplo objetivo: exibir sua riqueza e seu prestígio e imortalizar sua figura.

A pintura mitológica

A obra Baco e Ariadne, do italiano Ticiano Vetiéli, é considerada a obra-prima da pintura mitológica do Renascimento. Ela mostra Baco (ao centro), deus do vinho, encontrando Ariadne (à esquerda), filha do rei de Creta e sua futura noiva.

No lado direito da pintura, observamos também a figura mítica de Laocoonte lutando contra uma serpente. Sacerdote de Troia, Laocoonte tentou convencer os troianos a recusar o cavalo de madeira oferecido como presente pelos gregos. Como castigo, os deuses gregos enviaram serpentes marinhas, que mataram Laocoonte e seus filhos.

Pintura. Em um campo aberto, sob um céu azul com algumas nuvens, à beira de um penhasco com vista para o mar, há, à direita, um grupo de pessoas seguindo uma carruagem puxada por dois leopardos sobre a qual há um homem em pé, nu, que usa uma coroa de folhas de uva; e, à esquerda, uma mulher, vista de costas. A mulher à esquerda, está em pé. Ela tem cabelos castanhos e longos, colocados ao lado da cabeça. Veste uma túnica azul com detalhes brancos que deixa um dos ombros e parte das costas à mostra; tem uma faixa de tecido vermelho sobre os ombros e ao redor do corpo. Ela está descalça. Um dos braços está flexionado à frente do corpo, a mão com a palma espalmada em direção às nuvens; o outro braço está atrás de seu corpo, a mão sobre a parte de trás de sua túnica, segurando-a. No centro da imagem, sobre a carruagem puxada por dois leopardos, há um homem nu, em pé, com o corpo flexionado em direção a mulher à esquerda. Sua cabeça está flexionada para a esquerda. Um de seus pés está sobre o assento da carruagem; o outro, está no ar, diante de uma das rodas, que é feita de madeira. Esse homem veste apenas um tecido cor de rosa ao redor de sua cintura, passando pelo alto de suas costas e esvoaçando em direção ao céu. Ele tem cabelos cacheados, claros e olhos claros, e usa uma coroa feita de folhas de uva ao redor de sua cabeça. Atrás dele, à direita, uma multidão de pessoas, homens, mulheres, sátiros. Eles estão em pé, dançando em diferentes posições. À frente do grupo, há um pequeno sátiro, um menino com pernas e cauda de bode, cabelos curtos, coroa de flores brancas sobre a cabeça, vestindo apenas um tecido vermelho sobre suas costas e arrastando uma cabeça de animal, que ele puxa com uma corda. Logo atrás dele, um homem de cabelos castanhos, curtos e cheios, com barba comprida, nu, com serpentes verdes enroladas ao redor de seu corpo. Atrás do homem, duas mulheres: uma mulher com os cabelos castanhos soltos, usando uma veste azul, marrom e branca, com uma parte do peito, um ombro, as pernas e os braços à mostra. Ela toca um címbalo: em uma de suas mãos, há um prato elevado acima de sua cabeça; o outro prato, é segurado por ela na altura da quadril. A outra mulher, mais ao fundo, tem os cabelos em tranças enroladas ao redor da cabeça e usa uma veste azul clara, com o peito nu. Ela toca um pandeiro, que segura no alto com uma das mãos, ao lado da cabeça. Ao fundo, mais figuras compõem o grupo: à frente, um homem visto de lado. Ele tem cabelos curtos e castanhos cobertos por folhas uva verdes. Usa um cinto feito de folhas de uva, tem pelos de animal, longos e brancos, sobre as coxas, segura uma haste de madeira com ramos de videira enrolados em uma das mãos, e uma pata de animal, elevada acima de sua cabeça com a outra. Ao fundo, um homem nu, com uma coroa de vinhas sobre a cabeça, montado sobre um burro e amparado por um homem ao seu lado. Ao lado dele, uma figura tocando uma espécie de corneta e um homem curvado carregando um barril em suas costas. No centro da pintura, na parte inferior, há um cachorrinho preto, visto de lado, observando o grupo. À esquerda, sobre um tecido claro no chão, uma taça grande e dourada gravada com o nome do pintor: Ticiano. Em segundo plano, o mar, à esquerda, e uma paisagem montanhosa com densa vegetação, à direita.
Vetiéli, Ticiano. Baco e Ariadne. 1520-1523. Óleo sobre tela, 176,5 por 191 centímetros. Galeria Nacional, Londres, Inglaterra.
Ícone. Sugestão de livro.

Xêiquispíer, Uílliam. Romeu e Julieta. São Paulo: Moderna, 2016. Essa obra conta uma história de amor envolvendo dois jovens de famílias rivais que viviam na cidade de Verona: Romeu, filho dos Montéquio, e Julieta, herdeira dos Capuleto.

Inovações da arte renascentista

Os artistas renascentistas inspiraram-se nos valores humanistas e, dessa fórma, passaram a destacar em suas obras a natureza, os animais e, principalmente, o ser humano. A mitologia e os personagens bíblicos, que mostram a síntese da religiosidade cristã com a cultura pagã greco-romana, eram temas que apareciam muito em suas obras.

Para os renascentistas, a função principal da obra de arte era recriar a realidade e a natureza, proporcionando prazer ao observador por meio da beleza e da perfeição na representação das fórmas. Para isso, introduziram a paisagem e desenvolveram estudos para reproduzir a expressividade das figuras humanas. Os avanços técnicos da arte renascentista foram obtidos graças aos estudos de Matemática, Física, Geometria e Óptica. Dessa fórma, o artista passou a assumir, progressivamente, o papel de “cientista das artes”.

A valorização do mundo terreno e natural também levou os artistas do Renascimento a retomar, na edificação de palácios e igrejas, as linhas retas, as colunas e os arcos, características das construções greco-romanas.

Fotografia. Uma escultura feita de metal de cor dourada, representando um homem sentado tocando uma espécie de gaita de fole. A estátua está apoiada sobre uma base redonda de cor preta. O músico está sentado, tem cabelos curtos, usa um chapéu de abas sobre a cabeça, tem as bochechas infladas e a boca sobre um pequeno tubo conectado ao instrumento musical. Nos pés, ele usa botas de cano alto.
Giambolonha. Flautista. Século dezesseis. Estátua de bronze, 12 centímetros de altura. Museu Nacional de Bargello, Florença, Itália.

Universalismo

A aliança entre humanismo e ciência definiu uma característica geral do Renascimento: o universalismo, que tinha como base a visão de que o ser humano deveria desenvolver todas as áreas do saber, assumindo a atitude de um sábio capaz de se posicionar ativamente em um mundo dinâmico e em transformação.

A pintura renascentista

Na pintura, os renascentistas desenvolveram diversas técnicas inovadoras para atingir a beleza, o realismo e a perfeição. A composição em pirâmide, por exemplo, foi utilizada para transmitir harmonia e equilíbrio e para direcionar o olhar do observador. Ao destacar a paisagem em suas obras, os artistas empregaram a técnica da perspectiva, que criava a sensação de profundidade e volume ao representar os objetos em uma superfície plana. O aumento ou a diminuição do tamanho do objeto representado transmitia a ilusão de estar mais próximo ou mais distante do observador, conferindo à pintura uma realidade tridimensional.

Outra inovação foi a técnica de luz e sombra, que permitiu o uso das cores, dos tons e dos meios-tons para representar cenas, emoções e movimentos.

Ler a pintura

Vários artistas renascentistas se destacaram e são admirados até os dias de hoje. Um deles é Sandro Botitcheli, que entendia a arte como representação espiritual, religiosa e simbólica e dedicou-se aos nus e aos temas religiosos e mitológicos, além de pintar quadros e retratos encomendados por famílias burguesas.

Observe a seguir uma de suas obras.

Pintura. Vista de uma floresta com muitas árvores de folhas verdes e frutos redondos cor laranja. Ao fundo, o céu azul. À frente, seis mulheres e um homem dispostos em uma linha horizontal; no alto, no centro da pintura, a figura de um cupido, um bebê com asas, voando, vendado, segurando um arco e mirando uma flecha; no canto direito da pintura, uma figura de formas humanas em tons de azul, que se confunde com a coloração escura da floresta e tenta segurar uma das mulheres do grupo principal. À esquerda, o único homem na pintura. De cabelos castanhos, cacheados, até os ombros, ele está vestido com um tecido de cor vermelha cruzado sobre seu corpo, tem o peito nu, as pernas à mostra e usa sandálias de cano alto de cor marrom. Ele tem uma espada presa em sua cintura, uma das mãos na cintura e a outra, erguida para o alto, busca alcançar um fruto em uma árvore. À direita dele, três mulheres em roda. Uma é vista de costas, as outras duas são vistas de lado. As três são loiras e tem cabelos compridos arrumados em penteados com tranças. Elas estão estão usando vestidos longos, leves, esvoaçantes e transparentes na cor branca. Estão descalças e com as mãos dadas, os pés em posição de dança. À direita delas, no centro da pintura, há uma mulher em posição mais elevada que as demais figuras da pintura. Ela é vista de frente, é loira, tem olhos claros, usa um véu cobrindo a cabeça e os cabelos, um vestido longo, branco e com pregas e um manto vermelho. Usa sandálias baixas douradas e está com uma das mãos flexionadas ao lado de seu corpo (à esquerda). Com a outra mão, segura seu manto à frente de seu corpo (à esquerda). No alto da pintura, acima da figura dessa mulher, está o cupido: um bebê loiro de cabelos cacheados, alado, com numa aljava às costas, vendado, mirando uma flecha antes de dispará-la. À direita da mulher no centro, outra mulher se destaca. Ela é loira, tem olhos claros e usa um vestido leve e esvoaçante de fundo branco com muitas folhas e flores estampadas. Ela usa uma coroa de flores sobre a cabeça, enfeitando seus cabelos presos, está descalça e segura muitas flores agrupadas na barra de seu vestido, que ela segura com as duas mãos. À direita dela, vista de lado, uma mulher loira com os cabelos soltos, o corpo voltado para a esquerda, segurando com uma mão um dos braços da mulher com a coroa de flores ao lado dela. Ela tem a cabeça voltada para a direita, para o alto, surpreendida. Está com o olhar assustado, a boca aberta, segurando entre seus dentes com alguns ramos de plantas verdes com flores cor de rosa. Ela veste uma espécie de vestido longo, esvoaçante e transparente e está descalça. À direita dela, a última figura do quadro, saindo da floresta, em meio aos troncos das árvores.  É uma figura de formas humanas, longos cabelos ondulados, toda em tons de azul, que veste um tecido azul em volta de seu corpo, e segura com as duas mãos a mulher de vestido esvoaçante ao seu lado, que olha para ele assustada. No solo, flores coloridas contrastam como a cor escura do chão da floresta.
Botitcheli, Sandro. Primavera. cêrca de 1482. Têmpera sobre madeira, 203 por 314 centímetros. Galeria Uffizi, Florença, Itália.

1. Que características do Renascimento você consegue identificar na pintura de Botitcheli?

2. Que impressões essa pintura provoca em você?

Outros expoentes do Renascimento

Entre os expoentes da arte renascentista na península Itálica, além de Botticelli, destacamos:

  • Leonardo da vinti (1452-1519): considerado o maior exemplo do homem universal, foi pintor, escultor, matemático, arquiteto, engenheiro e inventor. Por meio da dissecação de cadáveres, realizou diversos desenhos anatômicos. Entre suas invenções, que quase nunca saíam do papel por não haver tecnologia disponível na época para a sua concretização, estão o salva-vidas, o paraquedas, a bicicleta e o protótipo de helicóptero.
  • Miquelângelo Buonaróti (1475-1564): entre suas obras, destacam-se os afrescos no teto da Capela Sistina, no Vaticano, que contam a história bíblica da criação do mundo. Também teve imensa expressividade na escultura.
  • Rafael Sãnzio (1483-1520): conhecido como o “pintor das Madonas” pela série de representações que fez da Virgem Maria com o Menino Jesus.

fóra da península Itálica, destacaram-se El Greco (1541-1614), pintor e escultor de origem grega radicado na Espanha; o pintor flamengo iân van êiqui (cêrca de 1390-1441), cuja obra foi marcada pelos detalhes e pelo uso de cores vivas; e os alemães Albrechi Durrár (1471-1528) e Rans Rúlbaim (1498-1543).

Pintura. Retrato de uma mulher sentada, com o corpo ligeiramente voltado para a esquerda e o rosto para a frente. Ela tem cabelos castanhos, longos, cacheados, divididos ao meio. Usa um véu escuro, muito fino e transparente sobre a cabeça, cobrindo os cabelos. Tem as sobrancelhas apagadas, os olhos fundos, um sorriso muito discreto nos lábios. Veste um vestido escuro de mangas longas, decote quadrado, deixando o colo à mostra, e tem um tecido escuro sobre os ombros. Um de seus braços está cruzado à frente do corpo, segurando o punho do braço oposto, que está sobre o apoio da cadeira. Em segundo plano uma paisagem formada por uma estrada sinuosa e um rio cercado de árvores em desfoque.
DA vinti, Leonardo. Mona Lisa (ou Gioconda). 1503-1506. Óleo sobre madeira, 77 por 53 centímetros. Museu do Louvre, Paris, França.
Ilustração. Desenhos na cor preta sobre folha de papel de cor bege, envelhecido. À esquerda, maior que as demais figuras, uma circunferência cortada ao meio. Dentro dela, um feto humano, com o  corpo encolhido: a cabeça sem cabelos, baixa, apoiada sobre os joelhos dobrados que o feto segura com as mãos, os cotovelos flexionados. À direita, outros desenhos em tamanho menor e, ao redor das ilustrações, textos manuscritos ilegíveis.
DA vinti, Leonardo. Estudo anatômico de feto no útero materno. 1510-1512. Ilustração, 30,4 por 22 centímetros. Coleção Real, Londres, Inglaterra.
Ícone. Sugestão de livro.

TUFANO, Douglas. Leonardo da vinti e sua época. São Paulo: Moderna, 2019. Com linguagem atraente para os jovens leitores, esse livro apresenta a vida e a obra de Leonardo da vinti.

Ícone. Ilustração de um círculo de quatro cores, montado como um quebra-cabeça, sobre uma mão, indicando a seção Integrar conhecimentos.

Integrar conhecimentos

História e Arte

Multiculturalismo.

A cultura greco-romana na arte renascentista

O triunfo de Galateia, obra do pintor renascentista Rafael Sãnzio, representa uma cena da mitologia grega, na qual Galateia, ninfa dos mares, foge das investidas amorosas do ciclope Polifemo. A obra foi encomendada por um rico banqueiro italiano, Agostino Quídi, para decorar sua residência em Roma.

Pintura. Cena em alto mar com figuras míticas. Pintura em formato retangular vertical. Sobre águas calmas de cor clara, azul esverdeada com espuma branca muito leve, no centro, em pé sobre um grande concha em formato de vieira, maior que as demais figuras, uma mulher de cabelos loiros, longos, soltos ao vento, voando para a esquerda, vestida apenas com um longo tecido vermelho ao redor de seu quadril, que cobre sua pelve, suas pernas e um de seus ombros,  voando para a esquerda com seus cabelos, atrás de suas costas. Com o corpo seminu, a cabeça voltada para a esquerda e os braços para a direita, ela segura rédeas atadas a dois golfinhos de cor cinza, pulando acima da linha da água. Do lado esquerdo da concha, há uma espécie de  hélice de madeira, a concha representa uma  espécie de carruagem puxada pelos golfinhos. Ao lado dos golfinhos, uma seta verde apresenta o seguinte texto: 'Uma versão popular do mito de Galateia conta que ela teria fugido em uma carruagem puxada por dois golfinhos'. Abaixo da carruagem de concha, sobre as águas, deitada de lado com os braços esticados, estendidos para a esquerda, a figura de uma criança de cabelos loiros, ondulados e curtos, com um tecido cor de rosa em volta do corpo nu, um par de pequenas asas de cor branca, que segura um dos golfinhos com as mãos, como se estivesse pegando carona. À esquerda, na parte inferior da pintura, visto de lado, com as pernas submersas nas águas, um homem musculoso de cabelos curtos e castanhos ornamentados por folhas  verdes, usando barba e com o torso nu, segura no alto, pela cintura, uma mulher à direita dele. Ao lado dele, fora da pintura, uma seta verde apresenta o seguinte texto: 'É provável que para pintar Tritão, o mensageiro do mar, Rafael tenha se baseado em estátuas da Antiguidade clássica'. A mulher que Tritão segura tem a pele muito branca, os cabelos longos e castanhos, soltos, decorados com uma faixa sobre a testa. Ela está nua e segura atrás de si, com os braços elevados, uma faixa de tecido dourado.  Atrás deles, sobre as águas, um cavalo branco empinado, com a expressão assustada e as patas traseiras submersas. Atrás do cavalo, visto parcialmente, um homem de cabelos castanhos e curtos, de torso nu, com as bochechas infladas, sobrando uma espécie de bolsa de tecido ou de couro na cor marrom. À direita, também sobre as águas, há três figuras: uma feminina, duas masculinas. No canto mais à direita, vista de lado, uma  das figuras masculinas tem o corpo de homem, cabelos curtos e castanhos cobertos por folhas verdes, e pelos longos e espessos, como os de um animal, crescendo em suas coxas. Ele está nu, com os braços elevados, soprando um instrumento musical erguido para o alto. Atrás dele, a outra figura masculina tem a parte superior do corpo com a de um homem, com o torso nu, e a parte inferior do corpo é formada por patas marrons, como as de um cavalo. De cabelos curtos, cobertos por folhas verdes, essa figura olha para trás assustada e segurando um remo com as duas mãos, rema para a direita. Há uma figura feminina montada sobre seu dorso de animal. Vista de costas, a figura feminina tem a parte superior do corpo como a de uma mulher, os cabelos são longos, estão soltos, voando sob efeito do vento. Ela segura pelo pescoço a figura masculina com o remo sobre a qual está montada. Na parte inferior do corpo dela, ao invés de pernas, há uma longa cauda de cor bege. No alto, sob um céu azul com nuvens brancas, há quatro figuras de crianças com asas, nuas e de cabelos loiros. Três delas, estão sobrevoando, a mulher com o tecido vermelho, no centro da pintura, Galateia. As três crianças voam formando um triângulo no céu, e seguram arcos com flechas apontadas para Galateia, no centro da pintura. À direita, fora da pintura, em destaque, o seguinte texto: 'Se traçarmos uma cruz na pintura, tendo como centro Galateia, perceberemos a simetria e as proporções equilibradas da obra'. No canto superior esquerdo da pintura, a quarta criança está escondida atrás de uma nuvem segurando um feixe de flechas com uma expressão aborrecida no rosto. À esquerda, fora da pintura, no alto, há o seguinte texto: 'O rigor em representar a anatomia humana, os movimentos e as expressões que demonstram os sentimentos dos personagens proporciona realismo e naturalidade à cena.'
Sãnzio, Rafael. O triunfo de Galateia. 1512. Afresco, 295 por 225centímetros. Villa Farnesina, Roma, Itália.
  1. Após observar as imagens, responda às questões a seguir.
    1. Que elementos míticos da Grécia Antiga você identifica nessa pintura?
    2. Cite exemplos do realismo renascentista presentes na pintura.
    3. Que conhecimento foi utilizado por Rafael para criar proporções equilibradas e simetria na obra?
    4. De que maneira Rafael harmonizou os diferentes elementos da pintura?
  2. Como as mulheres foram representadas nessa pintura? O ideal de beleza do corpo feminino representado por Rafael é semelhante ao de nossa sociedade, nos dias atuais? Por quê?

Atividades

Faça as atividades no caderno.

  1. Por que os artistas e os intelectuais renascentistas utilizaram o termo “Renascimento” para definir suas produções? Por que esse conceito é polêmico?
  2. A ideia dos renascentistas de criação de um "novo mundo" contribuiu para a construção da concepção de modernidade. Essa visão que começava a se desenvolver considerava os processos históricos de diversos povos?
  3. Hamlet é uma das mais importantes obras do dramaturgo inglês Uíliam Xêiquispíer. Em diversos momentos da obra, Hamlet, o personagem principal, reflete sobre a existência humana. Em um dos monólogos mais célebres da peça, o personagem pronuncia o famoso trecho “Ser ou não ser, eis a questão. Será mais nobre sofrer na alma pedradas e flechadas do destino feroz ou pegar em armas contra o mar de angústias?” (Hamlet. Pôrto Alegre: Ele e Pê ême, 2014. página 249). Considerando as informações apresentadas nesse enunciado e o que você estudou nesta Unidade, responda.
    1. O que você entendeu ao ler esse trecho de Hamlet?
    2. Que relação pode ser estabelecida entre o trecho e os valores do Renascimento?
  4. Observe a charge para responder às questões.
Charge em preto e branco. Formada por apenas um quadro. No interior de um local fechado há uma grande janela em arco, à esquerda, aberta para um céu noturno com estrelas, uma lua crescente e, na parte inferior, ao longe,  o topo da Torre de Pisa. De frente para janela, à esquerda, há um tripé com uma luneta apontada para o céu. À direita, um calendário preso à parede, com o ano, '1610' e, em inglês, a indicação do mês: 'junho'. No centro, há dois homens conversando. À esquerda, visto de frente, um homem de barba longa branca, usando uma boina sobre a cabeça e vestido com uma túnica longa. Ele representa Galileu Galilei. Com o braço estendido, Galileu aponta na direção da luneta. Diante dele, à direita, visto de costas, um homem com vestimentas religiosas, usando um chapéu alto,  vertical, com a ponta formando uma dobra triangular. Essa figura representa o Papa. Sobre a cabeça de Galileu, há um balão de fala com uma ilustração da superfície lunar coberta de crateras. Sobre a cabeça do Papa, há um balão de pensamento, com uma ilustração do próprio Papa batendo na cabeça de Galileu com a luneta.
Médem, Cris. Galileu descreve suas descobertas para a Igreja. 2011. Charge.
  1. O que Galileu e o papa representariam nessa charge?
  2. Relacione o pensamento de Galileu representado nessa charge ao contexto cultural, científico e religioso dos séculos quinze e dezesseis.
  3. Que instrumento criado pela Igreja católica pode ser associado ao pensamento do papa nessa charge?
  1. Os e-readers, aparelhos de leitura de livros digitais, e os tablets, computadores em fórma de prancheta e com tela sensível ao toque, começaram a se popularizar por volta de 2010. Com seus colegas, debata as questões a seguir.
    1. Você lê mais frequentemente textos impressos ou eletrônicos? Para você, quais são as vantagens e as desvantagens de cada um?
    2. Na sua opinião, qual revolução foi mais importante: a revolução impressa, atribuída à invenção da prensa de tipos móveis metálicos por Gutembergue, no século quinze, ou a revolução digital, que possibilitou a criação de livros digitais e de aparelhos leitores de mídias digitais? Por quê?

CAPÍTULO 4  A REFORMA PROTESTANTE E A CONTRAREFORMA

As transformações políticas, econômicas e sociais na Europa Ocidental e o novo modo de pensar e ver o mundo do homem moderno, que se manifestaram no campo das artes e no das ciências, também afetaram a religião.

Com o fortalecimento das monarquias nacionais, o poder papal passou a rivalizar com o poder dos reis. Assim, a Igreja, que antes ocupava um papel importante na política, começou a perder espaço nas decisões dos Estados. Além disso, os interesses da burguesia chocavam-se com o que a Igreja pregava, como a condenação do lucro e da usura (cobrança de juros abusivos ao conceder um empréstimo a alguém).

Para agravar a situação, o poder da Igreja católica foi abalado por uma série de críticas surgidas dentro da própria instituição. Isso porque, desde o final da Idade Média, a Igreja vinha se desviando de seus princípios e seus valores iniciais, usufruindo, por exemplo, do luxo, da riqueza e da ostentação. Além disso, boa parte do clero desrespeitava as regras religiosas, como o celibato, e tratava com descaso os cultos e os ritos religiosos.

Esse quadro de enfraquecimento do poder da Igreja católica e de críticas à instituição gerou um amplo movimento reformista que deu origem a novas igrejas cristãs: a Reforma protestante.

Xilogravura. Cena em um local fechado com uma cruz alta de madeira no centro, um púlpito à esquerda, uma mesa de madeira à direita e, ao fundo, arcos decorados por estandartes com brasões dourados. À direita e à esquerda, vista parcial de janelas em forma de arco com vitrais coloridos nas cores azul, vermelho, verde e branco. À esquerda, no púlpito de madeira, elevado, há um homem de túnica longa longa marrom, como a de um monge, usando um gorro de cor marrom sobre a cabeça e segurando nas mãos uma folha branca com texto. Logo abaixo, perto dele, pessoas vistas de costas, ajoelhadas, vestidas com capas nas cores azul e vermelho, com os cabelos cobertos por tecidos, alguns por tecidos cor verde, outros de cor amarela. No canto direito, uma mesa de madeira marrom. Sobre ela, há papeis brancos e um prato com pequenas moedas amarelas. Há três montinhos de moedas sobre a mesa, ao lado do prato. Atrás da mesa, há um homem sentado, de cabelos brancos, com um gorro azul e vestes longas vermelhas. Diante dele, há uma fila de pessoas em pé: um homem com um traje em azul e calças marrons; à direita dele, um homem e uma mulher, o homem com um manto de pele amarelo, a mulher com os cabelos cobertos por um tecido bege; à direita deles, um homem com um casaco marrom. O homem de azul, o primeiro em pé na fila, recebe um papel branco, dobrado, fechado por um selo vermelho, que é entregue à ele pelo homem sentado de traje vermelho e boina azul. Atrás deles, há três pessoas em pé, conversando. No centro desse grupo, há um homem com uma túnica marrom como a de um monge. à esquerda e à direita dele, dois  homens vestidos com trajes verdes e chapéus vermelhos.
Panfleto de Martinho Lutero que denuncia a venda de indulgências (perdão dos pecados) pela Igreja católica. 1525. Xilogravura, 20 por 15 centímetros.

Lutero e o início da Reforma

O movimento protestante iniciou-se na Saxônia, região da atual Alemanha, e foi dirigido pelo monge Martinho Lutero. Em 1517, ao saber da venda de indulgências autorizada pelo papa Leão décimo com o objetivo de arrecadar fundos para a reconstrução da Basílica de São Pedro, Lutero resolveu se manifestar publicamente. Em um encontro de eruditos religiosos da cidade de Wittenberg, o monge teria apresentado suas 95 teses, nas quais denunciava a venda de indulgências e criticava o comportamento do clero e do papa.

Depois disso, seguiram-se debates teológicos entre Lutero e sábios da Igreja, os quais refutaram (ou seja, rejeitaram) todas as teses. Em 1520, três anos após o início da crise, uma bula papal foi enviada a Lutero ameaçando-o de excomunhão caso não se retratasse; o monge, porém, não só manteve suas críticas, como queimou a bula papal em praça pública. O ato simbolizou a ruptura de Lutero com a Igreja e iniciou a Reforma protestante.

A doutrina luterana

A doutrina luterana foi formalizada no documento intitulado Confissão de Auguisbúrgo, de 1530. Nele, Lutero afirmou que a salvação era obtida pela fé; rejeitou a hierarquia eclesiástica; estabeleceu que todo crente é livre para interpretar a Bíblia, sem necessitar da mediação de sacerdotes da Igreja; aboliu o celibato dos padres e os sacramentos, mantendo apenas o batismo e a eucaristia; e determinou a substituição do latim pelo idioma nacional nos cultos religiosos.

Muitos apoiaram a nova doutrina. A nobreza viu nela a oportunidade de tornar-se independente da autoridade da Igreja católica e de confiscar suas terras e seus bens. Já os camponeses viram na nova doutrina a possibilidade de se livrar dos tributos devidos ao clero.

Por que protestantes?

Em 1529, o imperador romano-germânico Carlos quinto, que governava uma região que hoje faz parte da Alemanha, convocou uma reunião com os nobres locais para reafirmar que Lutero não cumpria as leis da Igreja católica. Por isso, além de ser escomungado, Lutero foi expulso do império.

No entanto, um grupo de nobres que apoiavam o monge protestou contra a declaração de Carlos quinto. Em decorrência desse episódio, mais tarde, os seguidores de Lutero passaram a ser chamados de protestantes.

Fotografia. Sob o fundo de um céu azul e desfocado, uma escultura representando um homem.  Vista da cintura para cima, a escultura é de cor cinza escuro. O homem retratado está em pé, é visto de frente, tem cabelos curtos, uma uma boina sobre a cabeça. Uma uma espécie de túnica longa de mangas compridas. Segura, na mão direita, uma folha de papel dobrada e, na mão esquerda, um livro grosso apoiado sobre seu peito. Ele olha para frente com o cenho franzido.
Zímerrim, Rudólf. Monumento em homenagem a Martinho Lutero em praça da cidade de Eisleben, na Alemanha, onde o monge nasceu. 1883. Escultura. Fotografia de 2017.
Ícone. Ilustração de um círculo de quatro cores, montado como um quebra-cabeça, sobre uma mão, indicando a seção Integrar conhecimentos.

Integrar conhecimentos

História e Arte

Multiculturalismo.

A arte do luteranismo

O renascentista Lucas cránar, o Velho, nascido na Baviera, região da atual Alemanha, é considerado o pintor oficial da doutrina luterana. Amigo de Martinho Lutero, cránar expressava em suas obras as ideias luteranas com base na reinterpretação de temas tradicionalmente católicos.

Na pintura a seguir, por exemplo, o artista representou a ideia de salvação pela fé, defendida por Lutero. Ao centro, podemos ver um homem nu sendo orientado por dois profetas. À esquerda, notamos um homem morto e, no canto mais ao fundo, Adão e Eva com o fruto proi­bido. As duas situações representam o pecado e a morte. No lado esquerdo superior, obser­va­mos Moisés recebendo de Deus os Dez Mandamentos. À direita, em contrapartida, observamos Jesus Cristo morto na cruz e, ao lado, a representação de sua ressurreição.

Pintura. Vista de um local aberto. O centro da pintura é cortado verticalmente pelo tronco de uma árvore com as folhas verdes, à direita, e sem folhas, à esquerda. No centro da pintura, na parte inferior, em primeiro plano, há três homens vistos de frente. No centro do grupo, um homem de cabelos curtos, claros e cacheados, sentado sobre o tronco cortado de uma árvore. Ele está nu, com o corpo voltado para a esquerda e com a cabeça voltada para a direita. Ao lado dele, há outros dois homens. À direita, um homem de cabelos longos e brancos e barbas longas e brancas, vestido com uma roupa vermelha coberta por um longo colete preto, calçado com botas de cano alto vermelhas. Com o corpo curvado em direção ao homem sentado no centro, o homem de barbas brancas segura um pano azul com uma das mãos, e com a outra, aponta para o alto e para a direita, na mesma direção para qual mira o olhar do homem sentado, que parece implorar por algo, com as mãos unidas e elevadas na altura do peito. Para essa mesma direção também aponta o outro homem, à esquerda do rapaz sentado. Em pé, esse homem tem cabelos cacheados e claros, barba comprida de mesma cor e está vestido com uma túnica curta e vermelha sobre a qual usa um manto vermelho brilhante. Ele está descalço, segurando um livro grande junto ao seu corpo com a mão esquerda e apontado para a direita com sua mão direita. No canto direito inferior da imagem, no mesmo plano da cena anterior, há uma espécie de pequena caverna rochosa, dentro da qual há um caixão branco destampado e, na entrada da caverna, um homem em pé, de cabelos e barbas longos e castanhos, com um halo de luz ao redor da cabeça,  o peito nu, um tecido  vermelho ao redor da parte inferior do corpo, um bastão com uma cruz no topo em uma das mãos, apontando para cima com a outra mão, com os dedos indicador e médio elevados. Acima da caverna, caminhando sobre grama verde, um cordeiro branco. No chão, aos pés desse homem, há uma ossada humana parcialmente enterrada e um animal rastejante com chifres, ambos são pisados pelo homem de barba longa castanha, uma representação de Cristo. Na parte esquerda da pintura, em primeiro plano, na parte inferior, há um túmulo aberto no chão, com o corpo de um homem deitado, pálido, vestido com uma túnica branca. Pelos traços e pelos cabelos (curtos, claros e cacheados), parece ser o mesmo homem que  sentado sobre o toco de árvore no centro da pintura. Ainda à esquerda, em segundo plano, logo acima do túmulo, há um casal nu, em pé sobre a relva verde, um de frente para o outro sob uma árvore frutífera. Uma serpente está enrolada no tronco da árvore frutífera. A mulher, loira de cabelos longos, entrega ao homem um fruto, que ele pega com uma das mãos. Atrás e acima deles, ainda  esquerda, no alto de uma rocha, há um homem ajoelhado, visto de costas, vestido com uma túnica vermelha e um manto azul, com as mãos estendidas e as palmas abertas voltadas para o céu. Acima dele, por detrás de nuvens escuras, abre-se um pedaço de céu noturno com estrelas. De lá, saem duas mãos segurando um livro enorme, duas tábuas brancas gravadas com textos. Em volta dessas tábuas, há raios de luz e pontos brilhantes. Ainda à esquerda, entre a rocha alta e o tronco da árvore, há  um acampamento formado por tendas brancas. As pessoas estão fora das tendas, algumas em pé, outras caídas sobre o solo. Em segundo plano, à direita, atrás da caverna com o caixão aberto, na direção em que os personagens do centro apontam, há um morro elevado, em cuja base há um rio em cujas margens pastores cuidam de ovelhas pastando, mais à frente, uma enorme cruz de madeira. Pregado na cruz, há um homem crucificado, nu, tendo apenas um pano branco enrolado na cintura e um halo de luz ao redor da cabeça, representação de Cristo. No alto do morro, há a figura de uma mulher loira de cabelos longos vestida com um vestido azul escuro. Ela tem um halo de luz ao redor da cabeça e as mãos unidas e elevadas na altura do peito. Acima dela, no céu, há duas nuvens com o centro em amarelo, como se fossem aberturas ou portais, para passar ao céu. Ao redor das nuvens, há figuras de anjos, com asas de cores variadas. Ao fundo, há morros e penhascos rochosos, alguns deles com castelos e cidades, que se estendem até o limite do horizonte. Saindo de uma construção na cidade ao fundo, à direita, há um feixe de luz amarela e brilhante tendo, em seu centro, um pequeno anjo de ponta cabeça, voando e segurando uma faixa com suas mãos. No alto, no centro, o céu em tons azuis e brancos.
cránar, Lucas. Lei e graça. 1529. Têmpera sobre madeira, 72 por88,5 centímetros. Galeria Nacional, Praga, República Tcheca.
  1. Os elementos que compõem a pintura de Lucas cránar foram representados em um único plano? Por quê? Qual é o nome dessa técnica típica da arte renascentista?
  2. Quais outras características da arte renascentista estão presentes nessa pintura?
  3. Como a ideia luterana de salvação pela fé foi representada nessa pintura?
  4. De acôrdo com a doutrina luterana, a única fonte da verdade é a Bíblia, e não a tradição ensinada pela Igreja. Que elementos da pintura mostram a importância do livro sagrado para o luteranismo?

Os seguidores de Calvino

Com a ajuda da prensa de Gutembergue, as ideias de Lutero se difundiram rapidamente pela Europa e abriram caminho para novos movimentos reformadores. O francês João Calvino, por exemplo, foi perseguido na França, no século dezesseis, por converter-se ao protestantismo, refugiando-se em Genebra, na Suíça.

Aos poucos, Calvino se distanciou do luteranismo, criando uma doutrina religiosa baseada na ideia da predestinação absoluta. Segundo Calvino, Deus já havia escolhido, desde o princípio, os indivíduos abençoados com a vida eterna e os condenados à perdição. Os bens materiais e a riqueza deviam ser vistos como bondades concedidas por Deus aos seres humanos.

Após a morte de Calvino, seus seguidores fizeram reinterpretações da doutrina da predestinação. A riqueza e a prosperidade passaram a ser vistas como sinais da graça divina, e não apenas como generosidades de Deus. Isso explica por que o calvinismo obteve grande apôio da burguesia e estimulou seus adeptos a se esforçar para progredir economicamente.

A Igreja anglicana

A Reforma anglicana ocorreu na Inglaterra no começo do século dezesseis, em um momento em que o Estado era forte e centralizado e a Igreja católica era tida como uma rival de seus interesses. A ruptura religiosa foi conduzida pelo rei Henrique oitavo e teve caráter essencialmente político.

O pretexto para o rompimento com a Igreja veio de uma questão pessoal do rei. Como de seu casamento com Catarina de Aragão não havia nascido nenhum herdeiro, o rei solicitou a anulação ao papa, para que pudesse se casar com a cortesã Ana Bolena. O pedido foi negado, mas, mesmo assim, Henrique oitavo separou-se de Catarina e casou-se com Ana Bolena. Diante disso, foi excomungado pelo papa.

Em resposta, Henrique oitavo decretou, em 1513, o Ato de Supremacia, pelo qual se tornou o chefe da Igreja na Inglaterra, com total apôio do Parlamento.

Pintura. Em um salão escuro, visto de frente, à esquerda, sentado em um trono, em um patamar mais elevado, um homem de barba clara com um coroa dourada sobre a cabeça, vestido com traje marrom, listrado, até os joelhos,  com calça e sapatos vermelhos e, sobre as costas e ombros, um manto de pelo de cor marrom, com detalhes e a parte interna em branco com pintinhas pretas. Ele segura na mão direita uma espada cinza erguida. Na mão esquerda, segura um papel branco oferecido por um homem ajoelhado ao seu lado. Ao redor dele, há um grupo de homens. à esquerda, homens ajoelhados, vestidos com roupas iguais de cor preta,m mangas curtas bufantes sobre mangas longas vermelhas e detalhes em vermelho. À direita, há três homens ajoelhados com roupas escuras e longas, túnicas pretas e lenços marrons sobre os ombro, a cabeça coberta por panos escuros  No alto da imagem, à direita, uma placa de cor bege com texto em preto.
Rólbaim, Rans. Retrato de Henrique oitavo. cêrca de 1543. Ilustração.

A Contrarreforma

O luteranismo, o calvinismo e o anglicanismo produziram uma cisão definitiva na cristandade ocidental, que se dividiu em cristãos católicos e cristãos protestantes. Com isso, a intolerância religiosa e o radicalismo cresceram, e as perseguições e as guerras religiosas se estenderam por, pelo menos, um século. A Igreja católica reagiu às críticas dos reformadores e criou um movimento denominado Contrarreforma ou Reforma católica.

Para compreender esse período histórico, é importante perceber que a Igreja católica não estava indiferente aos seus problemas internos e não foi necessariamente o movimento protestante que a fez rever sua conduta. Entre os pensadores, os juristas e os devotos católicos, também havia a percepção de que a Igreja estava se desviando de seu rumo original e precisava de mudanças.

No entanto, a Reforma protestante, a expansão das novas igrejas pela Europa e a perda de adeptos pressionaram o catolicismo a iniciar seu movimento de renovação. Assim, no século décimo sexto, sob a liderança dos papas Paulo terceiro, Paulo quarto, Pio quinto e Xisto quinto, a Igreja católica iniciou um processo de moralização e reestruturação interna.

Entendendo a Contrarreforma

A chamada Contrarreforma deve ser compreendida como uma reação da Igreja católica ao avanço do protestantismo pelo continente europeu. Também é importante destacar que a Contrarreforma foi feita por meio de diversas ações, como a catequização (evangelização dos fiéis), a reativação do Tribunal do Santo Ofício da Inquisição e a proibição de circulação de determinados livros. Algumas dessas ações foram debatidas já durante o Concílio de Trento, como acompanharemos adiante.

A intolerância religiosa

Na época das reformas religiosas, no interior de cada país, as pessoas eram obrigadas a seguir a religião do rei, o que propiciava o aumento da intolerância e das guerras religiosas. Atualmente, os conflitos religiosos ainda fazem milhares de vítimas em diversas partes do mundo, como na Nigéria e na Indonésia, onde existem disputas entre muçulmanos e cristãos; na Síria e no Iraque, entre muçulmanos xiitas e muçulmanos sunitas; na Índia, entre seguidores do hinduísmo e do islã; no Afeganistão e no Sudão, entre muçulmanos e não muçulmanos.

Fotografia. Vista de local aberto, com destroços de construções, pedras de tamanhos pequenos e médios e grandes de cor cinza e escombros sobre o solo. Na parte inferior da imagem, vegetação rasteira seca em marrom e verde. Em primeiro plano, vistas de longe e de costas, duas mulheres com vestes azuis, em pé, segurando objetos encontrados nos escombros. Uma segura travesseiros. Outra um colchão dobrado. Ao fundo, uma construção grande em ruínas, com o teto caído e vigas tortas, desmoronando. À direita da construção, troncos de palmeiras sem o topo,  e mais ao fundo uma árvore de copa verde. No alto, céu em cinza.
Escombros após atentado de um grupo radical islâmico na vila de Bágus, no Léste da Síria. Fotografia de 2020.
Instrumentos da Contrarreforma

Para iniciar a Reforma católica, em 1545, o papa Paulo terceiro convocou um concílioglossário na cidade italiana de Trento, cujos trabalhos se estenderam até 1563. O Concílio de Trento, como ficou conhecido, reafirmou os dogmas e os ritos católicos, como a salvação pela fé e pelas boas obras; a presença de Cristo na eucaristia; a autoridade e a infalibilidade do papa; a hierarquia eclesiástica; o celibato do clero; a devoção aos santos e à Virgem; os sete sacramentos (batismo, eucaristia, crisma, matrimônio, ordem, penitência e extrema-unção); e o emprêgo do latim na Bíblia e na realização de missas.

O concílio também determinou a criação de seminários para a formação do clero e a elaboração do catecismo, um resumo da doutrina católica para ser usado na evangelização dos fiéis, principalmente de jovens e crianças. Em Trento, a Igreja também condenou a venda de indulgências e de cargos eclesiásticos. O Concílio de Trento acabou reafirmando a divisão da comunidade cristã, abrindo uma acirrada disputa entre católicos e protestantes em busca de adeptos na Europa e em outros continentes.

Pintura. Vista elevada de um local fechado, um grande salão em formato retangular, com paredes elevadas de cor marrom, com quadros pendurados (retratos de pessoas vestidas com trajes religiosos). Em primeiro plano, organizadas em semicírculo, há pessoas sentadas formando fileiras, vistas de costas, uma ao lado da outra. No centro da pintura, à esquerda e à direita, formando um corredor no centro do salão, há homens sentados em fileiras, vestidos com trajes religiosos nas cores branca e dourada e chapéus altos com pontas triangulares na cor branca. Sobre um patamares elevados na cor vermelha, à direita, um homem sentado, vestido com roupa preta e, à esquerda, um religioso com traje de cor clara com manto vermelho por cima e um chapéu alto branco sobre a cabeça. Ao fundo, um altar coberto com uma toalha vermelha, com uma cruz de madeira com uma escultura representando Cristo crucificado. Atrás do altar, em um patamar mais elevado, há duas fileiras de pessoas sentadas, usando trajes escuros e chapéus de cor preta.
DORIGATI, Nicolo. Sessão de abertura do Concílio de Trento em 1545. 1711. Óleo sobre tela (detalhe), 217 por 138,5 centímetros. Museu Diocesano Tridentino, Trento, Itália.
O Tribunal do Santo Ofício

Para garantir que os fiéis seguissem à risca suas determinações, o Concílio de Trento ordenou a reorganização do Tribunal do Santo Ofício da Inquisição, criado em 1231 com o objetivo de vigiar, julgar e punir os acusados de heresiaglossário . Além de protestantes, judeus, cristãos-novos, muitos cientistas e pensadores foram perseguidos pela Inquisição. Os acusados de crimes contra a fé católica eram punidos até mesmo com a morte, e alguns eram queimados em fogueiras. O Tribunal também era responsável pela elaboração do Índice de Livros Proibidos, o índequis, que consistia em uma lista de livros censurados pela Igreja por serem considerados prejudiciais à fé católica.

A tarefa de expandir o catolicismo e conquistar novos adeptos foi reforçada com a criação da Companhia de Jesus, em 1534, pelo militar espanhol Inácio de Loyola. Os jesuítas, como ficaram conhecidos, consideravam-se “soldados de Cristo”. Eles seguiam uma disciplina rígida e tinham a missão de combater o avanço do protestantismo por meio da reafirmação da fé católica, da criação de escolas religiosas e, principalmente, da conversão de fiéis. Além da Europa, a ação dos jesuítas voltou-se para a Ásia, a África e a América.

Gravura. Vista de um local aberto, em ambiente urbano, uma espécie de praça com chão de terra batida tendo, ao centro, uma forca de madeira, com um homem pendurado pelo pescoço, vestido de branco, aos pés da forca, uma fogueira, com feixes de palha em chamas. À esquerda, atrás da forca, um homem segura uma corda esticada, que está amarrada ao pescoço do enforcado. Em volta da forca, há um círculo de pessoas montadas à cavalo, segurando lanças em posição vertical. Atrás delas, uma multidão. Ao fundo, uma igreja e um prédio de três andares,com paredes de tijolos das cores cinza (à esquerda) e marrom (à direita), nas janelas do prédio, há grupos de pessoas que assistem à cena.
Rorreber, Frans. Representação do calvinista francês Âne di Bursendo queimado na fogueira. Século dezesseis. Gravura. Na França, onde o catolicismo continuou predominante, cêrcade 3 mil calvinistas, chamados de huguenotes, foram massacrados em 1572. Biblioteca Pública e Universitária, Genebra, Suíça.
Ícone. Ilustração de dispositivo eletrônico com um triângulo na tela indicando Sugestão de site.

MUSEU da história da Inquisição. Disponível em: https://oeds.link/SXIHbE. Acesso em: 3fevereiro 2022. Localizado em Belo Horizonte (Minas Gerais), o museu resgata a história da Inquisição e da presença de judeus e cristãos-novos na América portuguesa. O site oferece uma visita virtual às instalações do museu.

A Contrarreforma na arte: o Barroco

A arte barroca nasceu na península Itálica, no final do século dezesseis, e difundiu-se por diversos países católicos da Europa, como Portugal, Espanha e França, e, posteriormente, pela América. Esse estilo artístico predominou na arquitetura de igrejas e capelas, de palácios e prédios administrativos, bem como na pintura, na música e na literatura.

Produzida geralmente sob encomenda da Igreja católica, a arte barroca tinha como objetivo educar pelo olhar, convencer e envolver emocionalmente o observador. Opondo-se ao realismo da arte renascentista, o Barroco utilizou-se da exuberância, da dramaticidade, da exaltação dos sentimentos, da religiosidade e do misticismo, produzindo obras rebuscadas, repletas de detalhes e elementos decorativos que procuravam despertar nos fiéis o fervor religioso.

Por essas características, o Barroco também pode ser visto como um instrumento da Contrarreforma, utilizado para atrair fiéis.

Leia a seguir o que o historiador de arte érnést gombrit fala sobre o assunto:

Quanto mais os protestantes pregavam contra a ostentação nas igrejas, mais se empenhava a Igreja Católica Romana em recrutar o poder do artista. reticências O mundo católico descobrira que a arte podia servir à religião de um modo que superava a simples tarefa que lhe fôra atribuída nos começos da Idade Média – a de ensinar a doutrina a pessoas que não sabiam ler. Agora, poderia persuadir e converter mesmo aqueles que talvez tivessem lido demais. Arquitetos, pintores e escultores foram convocados para transformar igrejas em exibições grandiosas cujo esplendor e glória quase nos corta a respiração.

Gombrit, Érnést Rans Iosef. A história da arte. décima sexta edição. Rio de Janeiro: éle tê cê, 1999. página 436-437.

Pintura. Quadro retangular de orientação vertical com duas cenas, uma na parte inferior, em primeiro plano, outra na parte superior, mais ao fundo. Na parte inferior, no centro, sobre palhas de cor bege há um bebê deitado, representando o menino Jesus. Ao redor dele, quatro homens, três anjos e uma mulher o observando. A mulher, no centro do grupo, tem cabelos pretos, presos e cobertos por um véu branco. Ela veste uma túnica roca clara e um manto azul. Ao redor dela, os três anjos: três crianças com pares de asas e roupas brancas, observando o bebê, com encantamento. Na parte superior da pintura, sobre o céu azul, em uma grande nuvem espessa de cor branca , há dezenas de anjos, crianças e jovens, de cabelos loiros, curtos, cacheados com pares de asas nas costas. Alguns deles tocam instrumentos musicais como violas e violinos. No centro, há um figura angelical, um menino loiro com um tecido branco ao redor da cintura e segurando uma faixa branca com as duas mãos. Atrás deles, entre as nuvens, em tons fortes de amarelo, luz refletida nas nuvens brancas e iluminando os personagens.
. A adoração dos pastores. 1611-1612. Óleo sobre tela, 103 por 85 centímetros. Museu de Belas Artes, Orléans, França. O nascimento de Cristo foi representado como um grandioso e exuberante acontecimento, com uso de cores vivas, luzes e sombras. Os olhares dos personagens no quadro voltam-se para Jesus, os anjos comemoram com música e alegria, enquanto Maria e os outros demonstram intensa ternura.

Atividades

Faça as atividades no caderno.

1. Leia, a seguir, uma das teses formuladas por Martinho Lutero e responda: qual é o tema tratado nessa tese? De que modo essa tese se posiciona em relação às práticas da Igreja católica no século dezesseis?

41. Deve-se pregar com muita cautela sobre as indulgências apostólicas, para que o povo não as julgue erroneamente como preferíveis às demais boas obras do amor.

LUTERO, Martinho. 95 teses de Lutero. [sem local]: Portal Luteranos, [Década de dois mil e dez]. Disponível em: https://oeds.link/n69xDM. Acesso em: 3 fevereiro. 2022.

  1. Elabore uma síntese dos principais fundamentos da doutrina luterana.
  2. Estabeleça a diferença, no que diz respeito à salvação dos seres humanos, entre a doutrina calvinista, a luterana e a católica.
  3. Sobre o Ato de Supremacia, aprovado pelo Parlamento inglês, responda:
    1. Em que contexto europeu esse decreto inglês foi aprovado?
    2. Qual foi a principal decisão aprovada com esse decreto?
  4. Atualmente, existe tolerância religiosa? Debata essa questão com seus colegas. Não se esqueça de escutá-los com atenção, procurando refletir sobre os argumentos apresentados.
  5. Forme um grupo com os colegas para pesquisar as correntes do protestantismo mais presentes atualmente no Brasil. Procurem informar-se sobre as características da sua doutrina, as celebrações religiosas e as diferenças entre elas. Se for possível, entrevistem conhecidos que sejam adeptos de uma dessas igrejas e complementem a pesquisa com as informações obtidas.

7. Observe a gravura a seguir e responda à questão.

Gravura em preto e branco. No centro, uma coluna divide o cenário em duas metades. À esquerda, sobre um púlpito liso e elevado, um homem com vestes de mangas longas, gesticula com uma das mãos. Sobre o púlpito, há um livro, que o homem folheia com a outra mão. Diante dele, há pessoas sentadas em cadeiras e em pé, mulheres, crianças e homens adultos, alguns com livros nas mãos, outros apenas ouvindo. À direita, em um púlpito entalhado e elevado, um homem com traje de mangas longas com bordados na altura do peito gesticula na direção das pessoas. Não há nenhum livro no púlpito. Diante dele, há mulheres e homens ajoelhados, sentados no chão e em pé, segurando terços nas mãos.
Pínquis, Guiórg. Dois tipos de sermão. 1529. Gravura, 29,5 por 39,2centímetros. À esquerda, estão os protestantes luteranos e, à direita, os católicos. Gabinete de Impressão e Desenhos, Berlim, Alemanha.

Que diferenças entre protestantes e católicos foram destacadas na gravura?

CAPÍTULO 5  O ESTADO ABSOLUTISTA E O MERCANTILISMO

Na Europa Ocidental, que vivera uma série de transformações sociais, políticas e econômicas, especialmente nos séculos quinze e dezesseis, a burguesia enriquecida desejava implementar reformas para impulsionar o comércio.

O transporte de mercadorias de uma cidade para outra, por exemplo, obrigava os comerciantes a cruzar vários feudos. Cada um deles estava sob a autoridade de um senhor feudal, que estipulava suas leis e taxações. Dificuldades como essas levaram a burguesia a apoiar a centralização do poder nas mãos de um rei, que poderia unificar a moeda, as leis e os impostos e estabelecer um sistema de pesos e medidas único, facilitando as trocas comerciais.

Muitos nobres também apoiavam a centralização do poder nas mãos de um rei. Esses nobres, geralmente enfraquecidos com as Cruzadas e com as fugas de servos para as cidades, desejavam se aliar aos reis em troca de benefícios e privilégios.

O processo de centralização do poder real foi longo e também sofreu resistências, principalmente da Igreja católica e da maior parte dos senhores feudais. Apesar desses entraves, os reis conseguiram impor sua autoridade sobre os habitantes de um território e consolidar os chamados Estados modernos.

Iluminura. Em um local fechado, com portas em arco com azulejos quadrados decorados com frisos coloridos nas cores verde e azul sobre um fundo avermelhado, há três homens à direita: dois um de traje vermelho, outro de traje marrom,  conversam em um balcão de madeira em um patamar mais elevado. Abaixo deles, um terceiro homem, usando um traje e uma boina, ambos na cor verde, e com uma espada presa à cintura, retira um pequeno saquinho de pano de um baú de madeira com a tampa aberta. À esquerda, há outros três homens diante de uma mesa grande de madeira clara, sobre a qual há montes de moedas de ouro. Eles dialogam entre si; dois deles, de trajes azuis, apontando para as moedas, um deles, de traje cinza, segurando um punhado de moedas em suas mãos. No alto e no centro da iluminura, a imagem de Jesus Cristo com túnica vermelha e manto azul, com uma das mãos esticada diante do corpo e, ao redor da cabeça, uma auréola dourada. No topo de um dos arcos no fundo, à esquerda, parte dos azulejos coloridos estão cobertos por tinta preta, e há um texto em caracteres amarelos que começa com a palavra 'Deus'. O restante do texto não está legível na reprodução.
Representação de banqueiros e de pessoas fazendo empréstimos. Século catorze. Iluminura. A centralização do poder nas mãos dos reis favoreceu as atividades comerciais da burguesia. Museu Britânico, Londres, Inglaterra.

A centralização monárquica

A partir do século doze, várias regiões da Europa tinham iniciado o processo de centralização do poder real e de formação dos Estados modernos. Essa mudança estava relacionada a um conjunto de transformações sociais, econômicas e culturais que ocorriam no período, como a intensificação do comércio e o crescimento das cidades, o questionamento do poder da Igreja católica, a difusão das ideias humanistas e o fortalecimento da autoridade do rei.

A partir do século quinze, os monarcas criaram mecanismos para a consolidação do seu poder e a possibilidade de exercê-lo sobre vastas regiões.

As crises econômicas, a baixa produção de alimentos, a fome e as guerras que atingiram algumas regiões da Europa também contribuíram para a centralização monárquica, que era considerada uma fórma de combater esses problemas e assegurar a estabilidade.

Os reis criaram leis, impostos e moedas de circulação nacional, passaram a fiscalizar as estradas e constituíram uma burocracia formada por funcionários administrativos encarregados de fazer valer as decisões do soberano em todo o reino. A organização e o contrôle do comércio, do sistema educacional e da justiça também ficaram a cargo do Estado. Além disso, os reis formaram exércitos permanentes e profissionais, subordinados à autoridade da Coroa.

Iluminura. Em formato quadrado, sobre um fundo vermelho com bordas azuis, há, no centro, um homem sentado sobre trono sem encosto, de cor branca com partes em verde. Ele tem uma coroa sobre a cabeça, cabelos curtos, veste uma túnica longa e tons de bege, tem uma fita verde amarrada à cintura e um manto azul sobre ombro e pernas. Nos antebraços, usa mangas com detalhes verdes. Está com a mão direita espalmada à frente de seu corpo. Dois homens estão de pé ao lado dele, um à esquerda e outro à direita. Ambos estão de lado, com o corpo voltado para o homem no centro, e usam túnicas longas de cor verde, além de um chapéu triangular verde e bastões com a ponta espiralada, que segura na posição vertical. Ambos tem uma das mãos erguida para cima e estão descalços. O homem à esquerda usa um manto de tom amarelado sobre sua túnica verde.
Péris, Méfiu. Representação de um soberano inglês do século doze, Henrique segundo. 1250-1252. Miniatura publicada na obra Flores hístoriarum. Biblioteca Chetham, Manchester, Inglaterra.

O absolutismo

A centralização do poder atingiu seu ápice nos séculos dezesseis e dezessete com o absolutismo. O regime absolutista caracterizou-se pela grande concentração do poder político nas mãos dos reis, em uma época em que o comércio se expandia e a burguesia acumulava riqueza. Muitos dos antigos direitos feudais que favoreciam os senhores locais e a nobreza perderam validade.

A eclosão da Reforma protestante também contribuiu para o fortalecimento do poder dos reis. A divisão do cristianismo enfraqueceu o poder do papa. Nos países católicos, a Igreja foi colocada sob a autoridade dos reis. Alguns teóricos do período defenderam a centralização política do Estado absolutista como fórma de constituir uma sociedade forte e poderosa.

Ler a pintura

O rei Luís catorze, conhecido como o Rei-Sol, é um dos mais representativos monarcas absolutos. Seu reinado, que durou 72 anos (de 1643 a 1715), foi marcado pela ostentação e por rituais que envolviam vestes, objetos de luxo e uma grande côrte. Para muitos historiadores, as demonstrações de riqueza, a grandeza, a glória e o prestígio propagandeados pelo rei e sua côrte serviam para garantir a estabilidade do reino e a legitimação do poder real.

Em grupos, observem cuidadosamente a imagem a seguir e respondam:

a) Como o rei Luís catorze foi representado nesta pintura?

b) Que elementos da pintura revelam a autoridade do monarca?

Pintura. Vista de um local fechado. Em um patamar mais baixo, na parte inferior da pintura, diversos homens formando uma linha horizontal. No centro desse grupo, o rei, um homem de longos cabelos cacheados na cor preta, com aparência jovem, sentado sobre uma poltrona, vestido com uma roupa ornamentada vermelha, mangas rendas e gola bufante de cor branca, casaco dourado e bordado em tons de azul, calças largas, curtas e douradas, meias longas vermelhas e sapatilha dourada. Ele usa um chapéu preto com plumas vermelhas e segura na mão direita um cetro dourado. Tem o outro braço apoiado sobre uma mesa ao lado dele, coberta por um manto grosso, dourado e com bordados nas cores vermelha e azul. Sobre a mesa, há muitos livros, estampas, gravuras, mapas e pergaminhos enrolados. À frente da mesa, há um grande globo terrestre (da mesma altura da mesa) e um grande sextante dourado apoiado sobre o globo. À direita, há um homem sobre uma escada, auxiliando outros dois homens a fixar um grande mapa na parede. Atrás da mesa há outros homens, com cabelos compridos e cacheados que carregam rolos de papéis e observam a cena à volta. À esquerda do homem vestido de vermelho no centro da pintura, há outro homem, em pé, com cabelos pretos, compridos e cacheados e vestes pretas compridas. À esquerda dele, há um homem visto de lado, levemente curvado, com um chapéu sem abas, um manto e um traje azul, e uma cruz sobre o peito. Atrás dele, com  os corpos voltados para o lado direito, virados para o centro da pintura, um grupo de homens em pé, de cabelos longos e cacheados e vestes com grandes golas brancas e mantos bordados. No canto direito, há um homem visto de costas, vestido com um casaco branco e meias longas cor de rosa que segura um grande globo terrestre com suas duas mãos, Ao fundo, em um patamar mais elevado há uma espécie de palco. À esquerda, esqueletos de animais estão expostos para estudo e, à direita, ao lado de uma coluna verde, vista para uma construção de paredes de cor bege sob um céu azul com um morro verde ao fundo. Na parte superior da pintura, uma espessa cortina em tecido de cor vermelha e o verso com bordados dourados.
Testelam, Anri. O ministro das finanças da França Jan Batiste Colbér apresenta os membros da Academia Real de Ciências ao rei Luís catorze. cêrca de1667. Óleo sobre tela, 348 por 590 centímetros. Museu Nacional do Palácio de Versalhes e Trianon, Versalhes, França.
Teóricos do absolutismo

Na Europa ocidental, o poder absoluto dos reis contrariava uma longa tradição de poderes locais, exercidos pelos senhores em cada feudo. Era necessário, então, legitimar o poder dos reis e justificá-lo pela razão e pela fé. Essa tarefa ficou a cargo de intelectuais importantes, como Tômas Róbese jáque bossuê.

  • Tômas Róbes (1588-1679): filósofo inglês, rróbis afirma em sua principal obra, Leviatã, que só um Estado forte seria capaz de limitar a liberdade individual, impedindo a “guerra de todos contra todos”. O indivíduo deveria dar plenos poderes ao Estado, renunciando à sua liberdade a fim de proteger a própria vida. Hobbes defendia o poder absoluto do Estado, mas não necessariamente o do rei. Para ele, a autoridade poderia ser representada por um monarca ou por uma assembleia, desde que o poder fosse exercido sem contestação por parte dos súditos.
  • jáque bossuê (1627-1704): bispo e teólogo francês, bossuê foi um dos mais importantes intelectuais da côrte de Luís catorze, o mais absolutista dos reis da França. Em seu livro Política tirada da Sagrada Escritura, bossuê desenvolveu a doutrina do direito divino dos reis, segundo a qual o poder do soberano expressava a vontade de Deus, sendo, portanto, incontestável e ilimitado. Como o poder monárquico era tido como sagrado, qualquer rebelião contra ele era considerada criminosa.
Página de livro. Frontispício em preto e branco.  Imagem na vertical. Sobre uma folha de papel amarelado pelo tempo, na metade superior, há um homem visto da cintura para cima, cabelos até os ombros, de coroa sobre a cabeça, com uma espada na mão direita e um cetro na mão esquerda. O corpo do homem é formado por centenas de pequenas pessoas.  À frente dele, morros e uma cidade murada, com uma construção grande, similar a uma catedral. Na metade inferior da imagem, duas colunas laterais cada uma com cinco pequenos retângulos, com cenas diferentes desenhadas e, no centro, um pano com franjas onde está escrito, em inglês, 'Leviatã, ou matéria, palavra e poder de um governo eclesiástico e civil, por Thomas Hobbes, de Malmesbury'. Na coluna da esquerda, de cima para baixo, os retângulos contêm as seguintes ilustrações: acima, um castelo; logo abaixo, uma coroa; logo abaixo, um canhão; abaixo, uma cena de batalha; logo abaixo, na base, outra cena de batalha. Na coluna da direita, de cima para baixo, os retângulos contêm as seguintes ilustrações: no alto, uma catedral; logo abaixo, uma mitra papal, (uma espécie de chapéu alto em formato de cone, com uma dobra dividida ao meio no topo, formando uma estrutura triangular); logo abaixo, uma mancha branca sobre um fundo preto e quatro setas brancas, cada uma delas voltada para cada ângulo do retângulo; logo abaixo, quatro ferramentas (um tridente e outras três ferramentas com apenas dois dentes); por fim, na base, logo abaixo, uma cena de tribunal.
Frontispício da obra Leviatã, de Tômas Róbes. 1651. Biblioteca Britânica, Londres, Inglaterra.
Pintura. Pintura retangular de orientação vertical. Retrato de corpo inteiro de um homem de cabelos brancos e longos e sem barba, vestido com um traje longo azul com uma camada superior com renda branca sobreposta, mangas longas brancas e, sobre os ombros, um manto longo de  tecido azul e bege, com o forro interno vermelho. Sobre o peito, leva uma cruz dourada. Ele segura na mão direita um chapéu sem abas, de pelo na cor preta e, a mão esquerda, está apoiada sobre um livro de capa marrom apoiado verticalmente sobre uma mesa dourada coberta por uma parte de seu manto. Próximo ao pé da mesa, outros livros espalhados sobre o chão. Ao fundo, duas colunas largas de cor cinza e cortinas em coloração verde escura. À esquerda e à direita, os vãos  formados pelas colunas deixam entrever o céu azul com nuvens brancas.
Rigô, Françuá Oassâm. Retrato de jáque bossuê. 1702. Óleo sobre tela, 240 por 165 centímetros. Museu do Louvre, Paris, França.
Diferentes fórmas de pensar o absolutismo

É possível perceber uma diferença no pensamento dos dois teóricos vistos anteriormente (Tômas Róbes e jáque bossuê): 

  • rróbis, por um lado, defendia o absolutismo com base na razão, no argumento de que era necessário garantir a segurança dos indivíduos.
  • Por outro lado, o bispo bossuê fundamentava sua defesa do absolutismo no direito divino dos reis, ou seja, na religião.

Ao estudar esse tema nas aulas de História, é comum vermos que a defesa do absolutismo com base no direito divino dos reis é considerada a fórma mais “clássica” de absolutismo. Contudo, como acabamos de notar ao comparar as ideias de rróbis e bossuê, diferentes teorias a respeito do poder absoluto dos reis coexistiram em um mesmo período, em diferentes reinos.

Diferentes absolutismos

Hoje, historiadores consideram que o absolutismo poderia variar de região para região, como mostra o trecho a seguir.

reticências o absolutismo apresentava variações regionais que o poderiam fazer mais ou menos centralizado. Há diferentes absolutismos, cada qual com suas particularidades, como é o caso da Espanha, da Inglaterra e da Rússia. reticências

Hoje é comum que o absolutismo francês seja tomado como modêlo clássico, Luís catorze, como o maior soberano absolutista, e a teoria do direito divino dos reis generalizada para todas as monarquias absolutas. No entanto, essa teoria não foi aceita e defendida por todas as monarquias. Em países como a Espanha, apesar do caráter religioso dos soberanos, a legitimação do poder foi feita mais por princípios legais do que religiosos. reticências

Já na Inglaterra, o Parlamento muito cedo diminuiu o poder dos monarcas.reticências

Assim, vemos que o absolutismo assumiu diferentes fórmas dependendo do Estado onde foi aplicado. As justificativas jurídicas ou teológicas tinham em comum o fato de que foram construídas para explicar o poder centralizado do rei.

SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Absolutismo. In: SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos históricos. segunda edição. São Paulo: Contexto, 2009.página 8-9.

Pintura. Retrato de um homem visto de corpo inteiro, voltado para o lado esquerdo com a perna esquerda à frente, em um aposento com um trono real, um grande dossel vermelho com detalhes dourados, tapetes bordados e uma coluna ao fundo. O homem tem cabelos pretos, cacheados e longos, na altura do peito. O cabelo está dividido ao meio, com um espaço na risca no centro da cabeça. Ele veste um longo manto de pele, de aspecto aveludado, na cor azul, decorado com flores de lis douradas. As bordas e a parte interna do manto tem a cor branca com pequenas bolinhas pretas. Presa ao pescoço, cobrindo seu peito, uma peça de renda branca com pregas. Sobre o manto, nos ombros, ao redor das pregas de renda, há um colar grosso e dourado, com uma cruz dourada abaixo de seu peito. Seu braços estão cobertos por mangas volumosas, em tecido de cor branca, decorado por renda. Nos punhos, há ornamentos em renda branca, volumosa e pregueada. Suas pernas estão cobertas por meias brancas presas por fivelas abaixo dos joelhos. Há uma espada dourada, incrustada com pedras coloridas presa à sua cintura. Ele usa sapatos brancos com fivelas decoradas com pedras brilhantes e saltos quadrados de cor vermelha. Uma de suas mãos está apoiada sobre a cintura. A outra, está apoiada sobre um cetro, que está firmado sobre um pequeno banco coberto pelo mesmo material do manto (aveludado, azul com flores de lis douradas). Sobre essa peça há também uma coroa dourada com detalhes azuis e pedras brilhantes, além de outra peça composta por uma haste dourada que termina em uma mão feita de prata, com os dedos indicador e médio estendidos, e os demais dedos flexionados. Atrás do homem, o trono real dourado, recoberto por um material semelhante ao do manto (aveludado, azul, com flores de lis douradas). Em segundo plano, uma coluna de cor escura, cuja base é decorada por cenas com figuras humanas gravadas na cor dourada.
Rigô, Françuá Oassâm. Retrato de Luís catorze. 1701. Óleo sobre tela, 277 por 194 centímetros. Museu do Louvre, Paris, França.

O mercantilismo

Observe, na pintura reproduzida a seguir, a vestimenta das pessoas, repleta de adornos e requinte. Manter a abundância e ostentação das côrtes europeias, assim como sustentar os funcionários que cuidavam da administração do reino e equipar as tropas que protegiam o território, tinha um custo muito alto.

Como sustentar tudo isso? A solução encontrada por muitas monarquias para enriquecer o reino foi adotar um conjunto de práticas que recebeu o nome de mercantilismo. Conheça algumas delas:

  • Metalismo: a riqueza de um reino era medida pela quantidade de metais nobres que ele possuía. Por essa razão, muitos governos evitavam a saída de ouro e prata dos cofres do Estado.
  • Balança comercial favorável: os governos criavam medidas protecionistas para encarecer os produtos importados e reduzir sua entrada no reino. Diminuindo as importações e aumentando as exportações, a balança comercial ficaria positiva.
  • Estímulo às manufaturas locais: os governos estimulavam a produção de bens manufaturados, como tecidos e ferramentas. Esses produtos abasteciam o mercado interno, geravam impostos e podiam ser exportados, rendendo mais moedas para a Coroa.
Pintura. Vista de um local fechado, com janelas retangulares de vidro nas paredes. Do lado esquerdo, um grupo de homens sentados, com roupas pretas e marrons, a maioria de chapéus com formas e colorações diversas. Eles conversam entre si e gesticulam observando as outras pessoas no salão. No centro e à direita da imagem, há pessoas em pé, casais de mãos dadas, vestidos de forma elegante como em um baile. Se movimentam organizadamente, em fila, pelo salão, em leves gestos de dança. As mulheres usam vestidos longos e os homens calças largas, coletes, chapéus e botas de cano alto. No fundo, há mulheres sentadas, com vestidos compridos e penteados com os cabelos presos enfeitando a cabeça. O penteado da maioria das mulheres consiste em dois cones de cabelo, um de cada lado da cabeça, compondo uma forma que lembra a letra 'M'. Na parte inferior da pintura, à esquerda,m um casal de crianças vestido como os adultos: o menino usando um traje preto, cinto marrom e chapéu, que segura em usa mão. A menina usando um vestido dourado, segurando um lenço branco em uma mão, com os cabelos loiros preso em um penteado igual ao das mulheres. O teto do salão é verde escuro, com vigas de madeira aparente.
Baile em Veneza em honra dos visitantes estrangeiros. cêrca de 1580. Óleo sobre tela, 1,05 por 1,54 métros Museu Nacional do Palácio de Versalhes e Trianon, Versalhes, França.
A acumulação de riquezas

As práticas mercantilistas foram utilizadas pelos reinos europeus para acumular riquezas. Um traço comum a todos os reinos foi a interferência do Estado na economia por meio de incentivos, tributação (impostos e taxas) e contrôle monopolistaglossário do comércio.

Entre os séculos quinze e dezoito, na Europa, a aliança entre os Estados e as burguesias impulsionou o investimento nas grandes viagens marítimas. Vários governos europeus passaram a organizar expedições para explorar os mares e conquistar colônias na África, na Ásia e na América, em busca de riquezas e produtos de alto valor para serem comercializados no mercado europeu, como especiariasglossário e metais preciosos. Assim, a acumulação de capitaisglossário foi garantida por meio de saques nas regiões conquistadas, que permitiram a transferência de imensos tesouros para a Europa. A pirataria também teve papel importante nesse processo.

As conquistas territoriais e a ampliação das relações comerciais permitiram a concentração de riquezas pelos europeus. A produção colonial de mercadorias muito cobiçadas e de alto valor na Europa, como o açúcar, o cacau, o algodão, o ouro e a prata, foi possível com a utilização do trabalho compulsórioglossário de indígenas e africanos.

Além disso, as monarquias europeias intensificaram a produção de manufaturas, que também passaram a ser vendidas em suas colônias, o que aumentava seus lucros. Dessa fórma, algumas monarquias se transformaram em grandes potências econômicas mundiais.

Gravura em preto e branco. Cena em alto mar, com duas embarcações à vela, uma perpendicular à outra. A embarcação à esquerda, vista de lado, tem três mastros verticais; o mastro grande, o mais alto, no centro do convés, dois mais baixos, um na proa outro na popa e um mastro inclinado na proa, o gurupés. Em cada mastro, há vários feixes de corda amarrados. As velas dessa embarcação estão recolhidas, amarradas nas retrancas que cortam o mastro horizontalmente. No convés, há um homem armado na popa, disparando uma arma de fogo. Na proa, há nuvens espessas de fumaça. Sobre as águas, embaixo da embarcação, o texto 'Caca Fogo'. A embarcação à direita, é semelhante à primeira. Vista de frente, está com as velas abertas. Sobre as águas, embaixo dela, o texto 'Caca Plata'. Ambas as embarcações têm bandeiras pequenas no topo dos mastros. Na parte superior da gravura, o céu com nuvens.
Rulsius, Levinus . Representação da abordagem de navio pirata ao galeão espanhol Nuestra Señora de la Concepción, conhecido como Cacafuêgo, em 1579. 1626. Gravura, 19 centímetros de altura. No período da expansão marítima europeia, a Inglaterra foi um dos países que praticaram a pirataria. A pilhagem de navios espanhóis carregados de ouro e prata, retirados da América, enriqueceu a côrte inglesa. Biblioteca Britânica, Londres, Inglaterra.
Diferentes caminhos

Os reinos europeus seguiram diferentes caminhos no processo de acumulação de riquezas. Portugal e Espanha deram maior ênfase ao metalismo. No séculodezesseis, a Espanha extraiu uma grande quantidade de ouro e prata das suas colônias na América. Portugal encontrou minas de ouro no Brasil no final do século dezessete.

Já a Holanda investiu na integração do comércio externo e nos empréstimos ao setor manufatureiro, por exemplo, para a produção do açúcar. A França, em busca de uma balança de comércio favorável, estabeleceu incentivos às exportações, restrições às importações e estímulo à produção de manufaturas de luxo.

A Inglaterra, além de garantir uma balança de comércio favorável e a produção interna de manufaturas, promoveu os cercamentos das terras, o que induziu a migração em massa de trabalhadores do campo para as cidades.

A Inglaterra combinou diferentes métodos de acumulação de capitais e superou os demais países europeus, preparando o caminho de transição do mercantilismo para o capitalismo industrial, no século dezoito.

Os cercamentos

Os “cercamentos” foram decretos do govêrno inglês que permitiram aos grandes proprietários rurais cercar e se apoderar das terras comunais, que eram utilizadas pelos camponeses para a produção agrícola. Nessas terras, foram criadas ovelhas, das quais era retirada a lã, utilizada como matéria-prima na indústria têxtil.

Esse processo, que deixou os camponeses sem ter onde plantar para a sua sobrevivência e obrigou-os a abandonar o campo, foi criticado na obra mais famosa do humanista Tômas Morus (1478-1535). Leia o trecho a seguir.

De fato, a todos os pontos do reino, onde se recolhe a lã mais fina e mais preciosa, acorrem, em disputa do terreno, os nobres, os ricos e até santos abades. reticênciasEles subtraem vastos tratos de terra à agricultura e os convertem em pastagens; abatem as casas, as aldeias, deixando apenas o templo para servir de estábulo para os carneiros. Transformam em desertos os lugares mais povoados e mais cultivados.

reticências honestos cultivadores são expulsos de suas casas, uns pela fraude, outros pela violência reticências. E estas famílias mais numerosas do que ricas (porque a agricultura tem necessidade de muitos braços) emigram campos em fóra, maridos e mulheres, viúvas e órfãos, pais e mães com seus filhinhos.

mórus, tômas. A Utopia. [sem local]: Ridendo Castígat Mores, 2011. ibúk.

Pintura. Vista de local aberto, com morros baixos cobertos por vegetação  verde e rasteira e algumas árvores delimitando lotes de cultivo da terra e de pastagens. Num desses lotes, à esquerda, há gado pastando, em outro, ao fundo, há pessoas arando a terra usando um carro de boi, à esquerda, os diferentes tons de verde e amarelo em faixas, indicam que a terra foi cultivada. No centro da pintura, uma casa grande, de três andares, com paredes cor rosa, telhado cinza de formato triangular, uma chaminé que expele fumaça branca. Ao redor da casa há um muro, contornando-a e formando uma grande área gramada à frente da construção. À frente, o muro forma um portal de entrada, com uma porta em arco e um telhado pequeno na cor cinza. À direita da casa, há outras duas casas menores, térreas. Do lado de fora dos muros, há pessoas caminhando, outras à cavalo e uma carruagem preta puxada por três duplas de cavalos.
Representação de residência em Littlecote. cêrca de 1705-1710. Óleo sobre tela (detalhe), 114 por 227 centímetros. A obra mostra uma área rural inglesa, já no século dezoito, cercada e organizada por um grande proprietário.
Ícone. Ilustração de três pessoas e dois balões de fala indicando a seção Em debate.

Em debate

Economia.

Mercantilismo como transição para o capitalismo ou capitalismo comercial?

Frases como “tempo é dinheiro” e “tudo é mercadoria” traduzem um tipo de sociedade chamado de capitalista. A sociedade capitalista caracteriza-se pela propriedade privada dos bens e dos meios de produção, pela produção em massa voltada para o mercado, pela existência de trabalhadores que precisam vender sua fôrça de trabalho em troca de um salário para sobreviver e pela busca do lucro.

O capitalismo começou a se desenvolver no interior do feudalismo, quando este entrava em declínio. Na concepção de alguns historiadores, o mercantilismo é um conjunto de práticas relacionadas a esse processo de transição.

Para o historiador Francisco Falcon, o mercantilismo é uma época específica, com estruturas políticas, econômicas e sociais que não são mais feudais nem propriamente capitalistas. A acumulação de capital pelos Estados modernos europeus nesse período teria possibilitado a posterior consolidação das relações capitalistas. Para aprofundar esse tema, leia o texto a seguir e realize as atividades propostas.

Vivemos hoje, mais do que nunca, mergulhados num mundo de “ismos”, tanto políticos quanto econômicos, a tal ponto que eles se tornaram elementos necessários a nossa própria maneira de pensar e sentir a realidade que nos cérca. É com eles que classificamos, rotulamos e, acima de tudo, aceitamos ou criticamos a realidade contemporânea. O mercantilismo é, num certo sentido, um desses ismos reticências.

Do nosso próprio ponto de vista acreditamos que o mercantilismo deve ser entendido como o conjunto de ideias e práticas econômicas que caracterizam a história econômica europeia e, principalmente, a política econômica dos Estados modernos europeus durante o período situado entre os séculos quinze/dezesseis e dezoito.

Nesse sentido, entendemos que a definição de Mauricio Dób “o mercantilismo foi essencialmente a política econômica de uma era de acumulação primitivaglossário ” é, ainda, bastante esclarecedora, se entendermos essa acumulação primitiva como a acumulação prévia reticências, ou seja, um período anterior à existência da produção capitalista propriamente dita enquanto fórma ou modo de produçãoglossário dominante, reticências durante o qual diversas fórmas de acumulação de capital, não capitalistas por definição, tiveram lugar.

FALCON, Francisco. Mercantilismo e transição. São Paulo: Brasiliense, 1996.página 8-12.

  1. De acôrdo com o texto, o que é o mercantilismo?
  2. Segundo o historiador, por que a época mercantilista foi um período de transição?
  3. Com base no texto e no estudo do Capítulo, explique como as práticas mercantilistas colaboraram para a acumulação primitiva de capitais.

Atividades

Faça as atividades no caderno.

  1. No caderno, numere as frases a seguir para que, ao serem encadeadas, formem um texto contínuo e coerente.
    1. O bispo jáque bossuê, ao contrário, defendia o poder absoluto dos reis com base em explicações religiosas.
    2. Os teóricos do poder absoluto dos reis utilizaram a razão e a fé para justificar a autoridade monárquica.
    3. A centralização do poder real ocorreu em um contexto de empobrecimento da aristocracia e de perda do poder pelo papa em decorrência da Reforma protestante.
    4. Em vários países da Europa, o crescente fortalecimento do poder dos reis foi o início do processo que originou o absolutismo.
    5. O filósofo Tômas Róbes, um dos mais importantes defensores do absolutismo, pregava a necessidade de uma monarquia forte para controlar a agressividade humana e impedir a luta de todos contra todos.
    6. Segundo ele, o poder do rei tinha origem divina; logo, era inquestionável.
  2. A frase “O Estado sou eu” é tradicionalmente atribuída ao rei francês Luíscatorze. Qual era o sentido dessa afirmação?
  3. Elabore uma frase que sintetize cada uma das práticas mercantilistas listadas a seguir.
    1. Balança comercial favorável.
    2. Metalismo.
    3. Incentivo à produção interna.
  4. Qual grupo social se aliou aos reis e apoiou a centralização política? Quais eram os interesses envolvidos nessa aliança?
  5. Como a política econômica mercantilista contribuiu para o fortalecimento das monarquias europeias e a passagem para o capitalismo?
  6. Explique a relação entre o mercantilismo e o avanço territorial das monarquias europeias em diversas regiões do mundo.
  7. O texto a seguir aborda o processo de transição da Idade Média para a consolidação dos Estados modernos. Com um colega, leia e identifique as principais transformações mencionadas pelo autor. Depois, ainda em dupla, respondam às questões:

reticências é impossível duvidar que o Estado, tendo fôrça para fazê-lo, não tomasse, pouco a pouco, o caminho do mercantilismo. Essa palavra não se pode empregar aqui sem amplas restrições. Mas, por estranho que seja, ainda, aos governos do fim do século catorze e princípios do quinze, o conceito de uma economia nacional, o certo é que a sua conduta revela o desejo de proteger a indústria e o comércio dos seus súditos contra a concorrência externa, e mesmo, em alguns casos, de introduzir, na região, novas fórmas de atividade. Inspiraram-se, a esse respeito, no exemplo das cidades. Sua política é, no fundo, unicamente, uma política urbana estendida até os limites do Estado. Da política urbana conserva o caráter essencial: o protecionismo. Inicia-se a evolução que, por fim, rompendo com o internacionalismo medieval, impregnara os Estados de um particularismo tão exclusivo como o foi o das cidades durante os séculos.

Pirrêne, Enrí. História econômica e social da Idade Média. São Paulo: Mestre Jou, 1982. página 216-217.

  1. Quais aspectos citados no texto evidenciam que ainda no final do séculocatorze surgiram práticas que culminariam mais tarde na centralização política do absolutismo e no mercantilismo?
  2. Como o autor caracteriza a política urbana desse período?
Ícone. Ilustração de cabeça humana com engrenagem cinza no lugar do cérebro, que se conecta com outra engrenagem menor e azul, indicando a seção Para refletir.

Para refletir

Ciência e Tecnologia.

Como se deu a construção da ideia de “modernidade” e de ciência moderna?

Você já percebeu que os estudos da História são resultado de uma construção? Essa construção tem como base o trabalho dos historiadores e as questões que eles consideram importantes, de acôrdo com as experiências de seu tempo. Assim, é interessante perceber que os estudiosos fazem escolhas: eles escolhem o que vão analisar e, mais importante, como vão analisar determinado evento ou uma questão específica.

No trabalho com a chamada Idade Moderna não é diferente. O que está em jôgo quando pensamos na ideia de modernidade? Vamos pensar mais sobre essa ideia, construída ao longo do tempo? Para começar, leia uma definição de modernidade no contexto da História que estudamos nesta Unidade:

Os homens do século dezesseis julgavam estar vivendo em um mundo novo (moderno), embora o passado greco-romano devesse ser respeitado na construção desse novo mundo e do novo homem, liberto do “obscurantismo” medieval. reticências

Podemos definir a modernidade como um conjunto amplo de modificações nas estruturas sociais do Ocidente, a partir de um processo longo de racionalização da vida. Nesse sentido, como afirma [o historiador] Jaques Le Gófi, modernidade é um conceito estritamente vinculado ao pensamento ocidental, sendo um processo de racionalização que atinge as esferas da economia, da política e da cultura. reticências

reticências No plano cultural, aos poucos ocorreu o desencantamento do mundo: o mundo moderno só poderia ser entendido pela razão, sem necessitar recorrer a mitos, às lendas, ao temor, à superstição.

SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Modernidade. In: SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos históricos. segunda edição São Paulo: Contexto, 2009. página 297-298.

  1. Como os autores definem a modernidade?
  2. Retome os conteúdos estudados nesta Unidade e escreva um pequeno parágrafo relacionando a ideia de modernidade exposta nesse trecho à formação dos Estados modernos, ao Renascimento, à Reforma protestante e ao mercantilismo.

Você também percebeu, ao longo dos estudos nesta Unidade, que a modernidade e o racionalismo contribuíram para a valorização da ciência moderna, certo? E não foi só isso: o pensamento racional e os métodos científicos possibilitaram também a consolidação da História como disciplina científica.

Assim, os estudos históricos passaram a ser organizados em uma periodização criada por intelectuais franceses no século dezenove. Essa periodização, utilizada ainda na atualidade, segue uma lógica que coloca a Europa e o Ocidente como centro propulsor da evolução humana.

Para saber mais sobre esse assunto, leia o texto a seguir, do historiador jeãn chenô.

O quadripartismo [periodização da História em Antiga, Medieval, Moderna e Contemporânea] tem como resultado privilegiar o papel do Ocidente na história do mundo e reduzir quantitativa e qualitativamente o lugar dos povos não europeus na evolução universal. reticênciasOs marcos escolhidos não têm significado algum para a imensa maioria da humanidade: fim do Império Romano, queda de Bizâncio.

chenô jeãn. Devemos fazer tábula rasa do passado? Sobre a história e os historiadores. São Paulo: Ática, 1995. página 95.

  1. Segundo jeãn chenô, a periodização da História utilizada atualmente tem consequências? Explique.
  2. Considerando os dois textos, responda:

• Você acha que é possível dizer que a ideia de modernidade está ligada ao Ocidente e, mais especificamente, às transformações na Europa entre os séculosquinze e dezoito?

Agora, para refletir sobre como a construção da ideia de modernidade desconsidera o ponto de vista de muitos povos, leia a seguir o trecho de um artigo.

A começar com o Renascimento e culminando [no século dezoito], os europeus passaram a se ver como sendo o centro do mundo e o clímax da evolução humana. Não apenas criaram uma geografia em que se localizam no centro e os outros povos reticências na periferia, mas também inventaram uma história em que se situam no presente de uma linha do tempo que evolui de um estado da natureza a um estado racional, civilizado, e os demais povos, embora contemporâneos, são situados no passado, são primitivizados.

[Nessa ideia de modernidade], os não europeus, “não ocidentais” são totalmente excluídos do diálogo, sequer são considerados reticências.

Minhôlo, Válter D.; SOUZA PINTO, Júlio Roberto de. A modernidade é de fato universal? Reemergência, desocidentalização e opção decolonial. tchívitas, volume 15, número 3, página 381-402, julho/setembro 2015. página 386-387. Disponível em: https://oeds.link/1SLTcs. Acesso em: 3 fevereiro 2022.

5. Considerando o trecho do artigo que você acabou de ler, a ilustração do artesão chinês e sua legenda, responda: será que a ideia de modernidade pode tornar pouco visíveis as contribuições históricas e culturais dos diversos povos que não viviam no continente europeu?

Ilustração em preto e branco. Em uma sala com uma janela retangular ao fundo, um homem sentado no chão sobre seus calcanhares, em um tapete retangular e de frente para uma mesa baixa.  Sobre a mesa baixa, há uma base retangular um pouco menor que  o tampo na mesa e uma folha branca sobre ela. O homem sentado no chão usa um chapéu sem abas sobre a cabeça, uma blusa branca de mangas compridas, um colete escuro e calças compridas claras. Ele tem um bigode e um cavanhaque fino. Com a mão direita, segura a ponta da folha de papel sobre a mesa e, com a mão esquerda, segura um utensílio cilíndrico, similar a um rolo de massa. Esse cilindro está apoiado em um quadrado de madeira sobre o chão. Perto dele, à direita, também sobre o chão, há duas caixas retangulares com cubos com caracteres, semelhantes a carimbos enfileirados de três em três, há uma tigela com tinta preta e um pincel, além de outros utensílios. À esquerda, amarrado nas grades da janela, há um cordão formando um pequeno varal. No varal há quatro folhas de papel branco com caracteres chineses gravados em preto penduradas como se estivessem secando.
Ilustração de Bi chêngui com tipos móveis, originalmente publicada na História das Nações, de uálter rãtchinsân, em 1915. Bi chêngui foi um artesão chinês considerado o inventor do primeiro tipo móvel, feito de porcelana chinesa, no século onze. Coleção particular.

Glossário

Concílio
Reunião do alto clero católico convocada para decidir questões da doutrina da Igreja, dos costumes e da disciplina eclesiástica.
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Heresia
Pensamento ou conduta que contrariam a doutrina estabelecida pela Igreja. Entre as práticas consideradas heréticas pela Igreja, estavam a feitiçaria e os ritos pagãos.
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Monopolista
Na época mercantilista, exploração exclusiva, sem concorrência, do comércio de mercadorias ou manufaturas.
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Especiaria
Nome dado ao conjunto de temperos que os europeus traziam do Oriente, como açúcar, cravo, canela, gengibre e pimenta.
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Capital
Em economia, é qualquer bem econômico que pode ser utilizado na produção e aquisição de outros bens ou serviços, como recursos monetários, fábricas e equipamentos.
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Trabalho compulsório
Trabalho forçado, imposto a uma pessoa.
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Acumulação primitiva
Fase preparatória de acumulação de riquezas que antecedeu a constituição do modo de produção capitalista.
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Modo de produção
Reúne as fôrças produtivas (meios de produção e fôrça de trabalho) e as relações sociais e técnicas de produção.
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