UNIDADE sete BRASIL: DA REGÊNCIA AO SEGUNDO REINADO
Você estudará nesta Unidade:
revóltas no período das regências
As fôrças políticas no Segundo Reinado
Guerra do Paraguai
O cultivo de café no centro-sul do Brasil
Construção da identidade nacional no século dezenove
O fim da escravidão
Entre os anos de 1831 e 1840, o Brasil viveu uma época bastante peculiar: o chamado período regencial, em que governos formados por regências se sucederam no poder político após a abdicação de Dom Pedro primeiro. Historiadores consideram que foi no período regencial que a unidade territorial do país se concretizou, mas não antes de o govêrno central enfrentar uma série de revóltas espalhadas pelo território.
Com o fim do período regencial, iniciou-se o Segundo Reinado. Dom Pedro segundo foi a figura central na política de então. Ao longo dos 49 anos do Segundo Reinado, o Brasil viu nascer a construção de uma história e de uma memória nacionais.
Quais foram os principais conflitos internos e externos vivenciados pelo país naquele período? De que maneira a unidade territorial no Brasil foi concretizada, ao longo do século dezenove? Quais foram as características do processo que levou ao fim da escravidão no país?
CAPÍTULO 15 O PERÍODO REGENCIAL (1831-1840)
Atualmente, o Brasil é uma república presidencialista. O presidente da República é escolhido pelo povo, nas eleições, e tem mandato temporário previsto pela Constituição. Além disso, o presidente é o chefe do Poder Executivo e exerce sua função auxiliado pelo vice-presidente e pelos ministros de Estado. Também é importante lembrar que, nessa fórma de govêrno, quando o presidente renuncia ao cargo ou é destituído, o vice-presidente assume o poder. Caso ocorra algum impedimento para a posse do vice-presidente, o presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado ou o do Supremo Tribunal Federal assume o cargo em caráter provisório, até que uma eleição defina o novo presidente do país.
No início do século dezenove, o Brasil não era uma república presidencialista, mas sim uma monarquia. O poder político era transmitido hereditariamente, ou seja, era passado de um membro a outro do mesmo grupo familiar. Em abril de 1831, Dom Pedro primeiro abdicou do trono em favor de seu filho, Pedro de Alcântara, que tinha apenas 5 anos de idade. Como Pedro era muito novo, seguiu-se, à época, a Constituição, que previa que o parente mais próximo do imperador com mais de 25 anos deveria assumir o poder.
Contudo, nenhum outro membro da família real estava habilitado a ocupar o trono no lugar do jovem herdeiro. Por isso, o Império do Brasil passou a ser governado, temporariamente, por três regentes. Após pouco mais de dois meses da abdicação de Dom Pedro primeiro, deputados e senadores reuniram-se em Assembleia Geral e elegeram a Regência Trina Permanente.
As regências
No período das regências, a elite brasileira estava dividida em três grandes grupos políticos: restauradores, liberais moderados e liberais exaltados.
Os restauradores eram um grupo formado por comerciantes portugueses e funcionários públicos. Desejavam que Dom Pedro primeiro voltasse de Portugal e assumisse o trono. Compunham o Partido Português e eram contrários a reformas sociais e econômicas. Além disso, a ideia de o Brasil ser governado por nativos, ou seja, por pessoas necessariamente nascidas em solo brasileiro, e não por portugueses, não agradava aos restauradores.
Por sua vez, os liberais moderados representavam a aristocracia rural e defendiam o estabelecimento, no Brasil, de uma monarquia constitucional. Eles dominavam a vida política do período.
Já os liberais exaltados eram ligados às camadas médias urbanas, mas também tinham vínculos com grandes proprietários rurais. A principal reivindicação desse grupo era a monarquia federativa, uma fórma de govêrno que garantiria autonomia às províncias. Alguns integrantes desse grupo também defendiam a instauração da república.
O govêrno regencial adotou medidas decisivas para a construção do Estado nacional brasileiro e agia de acôrdo com os interesses das elites provinciais. Por isso, a reivindicação de autonomia para as províncias esteve presente nos principais debates políticos e nas insurreições que marcaram o período.
Diante desse contexto, a regência instituiu o Ato Adicional de 1834, que reformava a Constituição de 1824 e conciliava o objetivo de garantir a unidade nacional com a autonomia desejada pelas elites provinciais. O ato criou as Assembleias Legislativas Provinciais, por meio das quais as províncias poderiam decidir questões que antes eram atribuições do govêrno imperial, como a criação de tributos e a instrução pública. O ato adicional também substituiu a Regência Trina Permanente pela Regência Una.
A Regência Una
As mudanças introduzidas pelo Ato Adicional de 1834 criaram no Brasil (que era uma monarquia) um modêlo de govêrnoque ficou conhecido como “experiência republicana”. O país passou a ser governado por uma pessoa, eleita pelo voto secreto e com mandato de quatro anos. A criação das Assembleias Provinciais também representou uma experiência federativa, geralmente associada aos regimes republicanos.
Essas reformas desagradaram aos políticos mais conservadores, que eram contrários à autonomia das províncias. Assim, dois novos grupos políticos surgiram: o dos regressistas, que defendia um govêrno forte e centralizado, e o dos progressistas, favorável à realização de diversas reformas liberais.
Em 1835, o padre progressista Diogo Antônio Feijó venceu as eleições para a regência. Durante seu govêrno, Feijó despertou inimizades em todos os grupos políticos e entrou em confronto com a Igreja católica, por defender a extinção das ordens religiosas e do celibato clerical.
A Guarda Nacional e a revólta de Manoel Congo
No início da Regência Una, por decisão do padre Feijó, foi criada a Guarda Nacional, uma fôrça paramilitar encarregada de combater os quilombolas e movimentos considerados “ameaças à nação”. Dela, só podiam participar brasileiros com idade entre 21 e 60 anos que tivessem renda superior a 100 mil-réis.
A Guarda Nacional pôs fim ao maior levante de escravizados ocorrido na região de Vassouras, no Vale do Paraíba fluminense. Liderada pelo ferreiro africano Manoel Congo e por sua companheira, Crioula, a revólta começou em novembro de 1838, na fazenda Freguesia, com a fuga de cêrca de 80 escravizados, e se espalhou para outras fazendas, incentivando novas fugas.
Centenas de escravizados saquearam propriedades e assassinaram feitores. O levante foi sufocado e o líder, Manoel Congo, enforcado em praça pública em 6 de setembro de 1839.
As revóltas regenciais
O período da regência de Feijó foi marcado pela eclosão de diversas revóltas provinciais, que ameaçaram dividir o jovem Estado brasileiro em diferentes repúblicas independentes. Estava em disputa um modêlo centralizado de poder, defendido pelas elites ligadas ao govêrno imperial, e o modêlo federativo, com autonomia para as províncias.
As rebeliões expunham também as fortes tensões sociais no interior do país, onde a maioria da população era vítima da pobreza e da violência da escravidão.
Acusado de não se esforçar para conter as rebeliões, Feijó renunciou ao cargo. Em seu lugar, assumiu o regressista Pedro de Araújo Lima.
revóltas do Período Regencial
Fonte: jôfili, Bernardo. IstoÉ Brasil 500 anos: atlas histórico. São Paulo: Três, 1998. página 57.
A Sabinada (Bahia, 1837)
A província da Bahia, em geral, foi palco de movimentos contra a opressão política e a favor de maior autonomia provincial. Nas primeiras décadas do século dezenove, uma série de revóltas de escravizados explodiu na região, como a Sabinada, que recebeu esse nome por causa de um de seus líderes, Francisco Sabino, médico e jornalista.
O descontentamento com o fato de o comércio e os altos postos administrativos serem ocupados principalmente por membros da elite, aliado à falta de autonomia provincial, mobilizou diversos grupos sociais: o povo pobre urbano, os escravizados, os negros livres, as camadas médias, os comerciantes, os artesãos e os militares.
Em 6 de novembro de 1837, revoltosos ocuparam militarmente a área próxima ao forte de São Pedro. Um documento assinado por 105 revoltosos declarava o desligamento da Bahia do govêrno central (Rio de Janeiro). O presidente da província (cargo que atualmente corresponde ao de governador) da Bahia foi obrigado a abandonar o cargo e os revoltosos declararam um govêrno republicano transitório (até que Dom Pedro segundo alcançasse a maioridade).Contudo, a repressão ao movimento foi forte e, após cercar a cidade de Salvador em 1838, o govêrno central pôs fim à revólta.
A imprensa teve participação intensa durante o movimento da Sabinada, inclusive após seu fim. Os jornais narravam os acontecimentos e diferentes veículos da imprensa marcavam suas posições ideológicas. Os jornais Novo Diário da Bahia e Sete de Novembro, ambos pertecentes a Francisco Sabino, foram os veículos mais atuantes à época.
A revólta dos Malês (Salvador, 1835)
Anteriormente, neste Capítulo, você conheceu a revólta de Manoel Congo, que ocorreu entre 1838 e 1839 na região de Vassouras, no Rio de Janeiro. Agora, você vai conhecer uma das diversas revóltas organizadas por escravizados que ocorreram na província da Bahia.
Os africanos trazidos ao Brasil eram provenientes de diferentes regiões da África e pertenciam a diversas etniasglossário . Em Salvador havia grande concentração de africanos convertidos ao islã.
Em 1835, aconteceu naquela cidade a revólta mais radical de africanos escravizados e libertos do Brasil. A maioria dos rebeldes fazia parte da nação nagô, em cuja língua – o iorubá – a palavra imále significa “muçulmano”. Por isso, eles eram chamados de malês, e a rebelião ficou conhecida como revólta dos Malês.
cêrca de 600 negros escravizados e alforriados se organizaram com o propósito de libertar escravizados, matar aqueles que eram considerados traidores e pôr fim à escravidão. A maior parte dos rebeldes desempenhava atividades nas áreas urbanas, como domésticos, pedreiros, carpinteiros, alfaiates, vendedores e ambulantes.
A Guarda Nacional repreendeu violentamente o movimento. O conflito resultou na morte de 70 rebeldes e 10 militares, além de deixar muitos feridos e centenas de presos.
BARBOSA, Rogério Andrade. A caixa dos segredos. São Paulo: Record, 2010. Com base na história de Malã, contada por seu tataraneto, este livro apresenta um percurso sobre a escravidão africana no Brasil. Entre os segredos deste ex-escravizado está sua participação na revólta dos Malês, de 1835.
A Balaiada (Maranhão, 1838-1841)
A Balaiada foi um movimento predominantemente popular, uma vez que seus membros se posicionavam contra os grandes proprietários maranhenses. O nome “balaiada” tem origem em um de seus líderes, Manuel Francisco dos Anjos Ferreira, apelidado de “Balaio” por produzir balaios, um tipo de cesto.
Participaram da Balaiada escravizados, trabalhadores livres, vaqueiros e camponeses; esses eram os grupos que mais sofriam com a situação de crise e de miséria na província. Porém, os profissionais liberais também aderiram ao movimento:
reticências os profissionais liberais maranhenses, também descontentes, passaram a reivindicar mudanças nas regras das eleições locais e fundaram um jornal de nome O Bem-Te-Vi com o objetivo de difundir os princípios republicanos e federativos reticências.
Chuárquis, Lilia Mórits; istárlin, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. página 264.
Assim, altos impostos, miséria, desigualdades sociais, desmandos dos grandes proprietários maranhenses e uma crise geral na província causada pela queda nas exportações do algodão foram as principais motivações do movimento.
Em dezembro de 1838, outro líder da Balaiada, o vaqueiro Raimundo Gomes, invadiu a cadeia pública de Vila Manga para libertar seu irmão. A partir de então, com o apôio de Manuel Francisco dos Anjos e de um grupo de vaqueiros, os balaios tomaram a cidade de Caxias. Chegaram a decretar a expulsão dos portugueses da cidade e o fim da Guarda Nacional.
O govêrno do Maranhão passou a combater violentamente os revoltosos. Além disso, o govêrno central (no Rio de Janeiro) enviou tropas ao Maranhão, lideradas pelo coronel Luís Alves de Lima e Silva. A Balaiada foi, por fim, reprimida e terminou em 1841. Nos combates, cêrca de 12 mil escravizados, vaqueiros e camponeses foram mortos.
Cosme Bento
Cosme Bento, também chamado de Negro Cosme, tomou parte na Balaiada a partir de 1839. Organizou um “exército” com quase 3 mil africanos e afrodescendentes. Sua luta era pelo fim da escravidão e, por isso, chegou a fundar um quilombo em Lagoa Amarela. Estudiosos afirmam que as fôrças que oprimiram a Balaiada só consideraram o movimento efetivamente “contido” após a prisão de Cosme Bento, que foi enforcado em 1842.
A Cabanagem (Grão-Pará, 1835-1840)
Revoltas esparsas contra o govêrno central vinham ocorrendo na província do Grão-Pará desde a independência e se agravaram com a abdicação de Dom Pedro primeiro. O ponto central da insatisfação dos proprietários de terra e dos comerciantes locais era o contrôle que os comerciantes portugueses exerciam sobre os altos cargos públicos, incluindo o de presidente da província.
Além disso, os habitantes do Grão-Pará viviam em uma situação de pobreza extrema. Dessa , a fórma Cabanagem foi uma revólta que reuniu as reivindicações de ascensão política dos grupos ricos e médios locais com as exigências populares por melhores condições de sobrevivência. Logo, ter uma vida melhor era o desejo dos cabanos, população formada por indígenas, negros e mestiços pobres que moravam em cabanas à beira de rios e igarapés.
Quando o govêrno central nomeou um novo presidente para a província, o movimento se exacerbou.
No entanto, não havia unidade entre os rebeldes. Após a retomada da capital por tropas legalistas, eles se refugiaram no interior, onde permaneceram lutando por aproximadamente três anos. Em 1840, as tropas do govêrno retomaram o contrôle da província. Estima-se que 30 mil pessoas morreram no conflito.
As Rusgas Cuiabanas (Mato Grosso, 1834)
Em 1834, uma grande rebelião, conhecida como Rusgas Cuiabanas, ocorreu em Mato Grosso, na cidade de Cuiabá. A elite local era contrária aos interesses dos ricos comerciantes portugueses e reivindicava a autonomia da província e maior espaço na vida política.
Em 30 de maio de 1834, os rebeldes realizaram saques, assassinaram portugueses e tomaram o poder por três meses. Porém, o movimento foi reprimido e os principais líderes foram presos.
EXPOSIÇÕES virtuais do Arquivo Nacional. Disponível em: https://oeds.link/Gifnst. Acesso em: 25 fevereiro 2022. O site oferece uma série de exposições virtuais sobre a história do Brasil, tendo como base os documentos do Arquivo Nacional.
A Guerra dos Farrapos (Rio Grande do Sul, 1835-1845)
Em 1835, na província do Rio Grande do Sul, estourou a Guerra dos Farrapos, também conhecida como Revolução Farroupilha, liderada por ricos estancieirosglossário gaúchos. A economia da região tinha como base a criação de mulas, utilizadas para o transporte de mercadorias, e do gado bovino, com o qual se produzia o charqueglossário .
Os estancieiros tinham vínculos comerciais com as regiões platinas, em especial com o Uruguai, onde eram donos de grandes extensões de terras. Eles exigiam do govêrno central a livre circulação de rebanhos entre os dois países e o aumento das taxas cobradas sobre os produtos importados da região do Prata. Como as taxas de importação fixadas pelo govêrno central eram reduzidas, artigos similares produzidos no sul ficavam com o mesmo preço ou ainda mais caros que os produtos estrangeiros.
O conflito começou quando um grupo de estancieiros, liderados por Bento Gonçalves, depôs o governador da província. Em 1838, os rebeldes proclamaram a República de Piratini e colocaram no poder Bento Gonçalves. O govêrno rebelde organizou-se para defender as fronteiras da república recém-criada e chegou a convocar eleições para deputados, que elaborariam uma Constituição. Os rebeldes também invadiram Laguna, em Santa Catarina; em 1839, proclamaram a República Juliana, que durou apenas quatro meses.
A guerra civil persistiu até 1845, quando a paz foi assinada. Por se tratar de uma área de grande importância estratégica e econômica, o govêrno central agiu com cautela. Houve uma anistia geral, os oficiais farroupilhas foram incorporados ao Exército nacional e as dívidas da República de Piratini foram assumidas pelo império.
IDEAIS e Farrapos: A Revolução Farroupilha em quadrinhos. Pôrto Alegre: Estúdio Cria Ideias, 2021. No formato de história em quadrinhos, essa obra apresenta as principais características da Revolução Farroupilha, de seus desdobramentos e de seus líderes mais importantes.
Em debate
Os lanceiros negros na Revolução Farroupilha
A participação de escravizados e de afrodescendentes livres ou alforriados na Revolução Farroupilha tem sido bastante pesquisada por historiadores na atualidade. Compreender o papel desses grupos sociais no conflito colabora para o entendimento da história do estado do Rio Grande do Sul e mostra a diversidade de sujeitos históricos presentes nos campos de batalha.
Leia o texto a seguir e descubra como ocorreu essa participação.
Em troca da promessa de liberdade ao final do conflito, muitos escravos lutaram nos Corpos de Lanceiros do exército farroupilha, criados em doze de setembro de mil oitocentos e trinta e seis e trinta e um de agosto de mil oitocentos e trinta e oito. Estima-se que, em alguns momentos, eles tenham composto de um terço à metade das tropas revoltosas reticências.
Além de contribuírem como soldados à causa farroupilha, negros livres e alforriados, juntamente com índios, mestiços e escravos fugidos do Uruguai também trabalharam em outros setores cruciais da economia de guerra: foram tropeiros de gado, mensageiros, peões e campeiros nas estâncias, trabalhadores na fabricação de pólvora, nas plantações de fumo e erva-mate implantadas pelos rebeldes reticências.
Apesar da utilização da alforria como mercadoria de troca, em nenhum momento a República Rio-Grandense [também conhecida como República de Piratini] libertou seus cativos. A questão da abolição era controversa entre os farroupilhas.
OLIVEIRA, V.; CARVALHO, D. Os lanceiros Francisco Cabinda, João aleijado, preto Antonio e outros personagens negros da Guerra dos Farrapos. In: SILVA, G.; SANTOS, J. organização. Rio Grande do Sul negro: cartografias sobre a produção do conhecimento. Pôrto Alegre: êdí púc érre ésse, 2009. página 67-68.
- Por que, de modo geral, os escravizados lutaram nos Corpos de Lanceiros do exército farroupilha?
- Segundo informações do texto, é possível constatar que o número de escravizados nas tropas farroupilhas era grande ou pequeno? Explique.
- Como a questão da abolição da escravidão era vista pelos farroupilhas? Considerando a promessa de liberdade aos escravizados que lutassem nas tropas, é possível afirmar que esse posicionamento era contraditório?
Atividades
Faça as atividades no caderno.
- Durante o período regencial, havia diversos grupos políticos com interesses divergentes. Identifique a composição social dos seguintes grupos políticos e descreva em seu caderno a fórma de govêrno defendida por eles:
- restauradores;
- liberais moderados;
- liberais exaltados.
- Os dois textos a seguir trazem análises das repercussões geradas pela revólta dos Malês, que foi organizada por escravizados na Bahia, no ano de 1835. Reúna-se com um colega, leiam os textos e depois respondam às questões.
Texto 1
A rebelião teve repercussão nacional. No Rio de Janeiro a notícia provavelmente chegou ao público através dos periódicos que publicaram o relatório do chefe de polícia da Bahia. Temendo que o exemplo baiano fosse seguido, as autoridades cariocas passaram a exercer vigilância estreita sobre os negros.
REIS, João José. Rebelião escrava no Brasil: a história do levante dos malês em 1835. São Paulo: Brasiliense, 1986. página 7.
Texto 2
reticências As autoridades após a revólta concentraram-se durante semanas, e até meses, na revista da vida dos africanos de Salvador, perseguindo a “africanidade” nos diversos níveis em que se expressava, a qual parecia desestabilizar o aspecto emocional dos demais baianos.
A punição oficial, que preservou os interesses da elite proprietária, castigou os escravos com açoites e os devolveu, em seguida, aos seus senhores, somente sentenciou com pena de morte e prisão os líderes da revólta, e com deportação os libertos. reticências
No Rio, apesar dos muitos rumores de conspirações, reticências não há registros da real existência de revóltas escravas de grande vulto. Os escravos desta cidade travaram batalhas de cunho “pessoal”, através de ataques aos senhores e suas propriedades, ou, apelando para interpelações no trabalho, insultos, apatia, doenças fingidas reticências.
TEREZA, Tatiane Silva. Um olhar sobre a repercussão das notícias do levante dos malês na côrte imperial do Rio de Janeiro na primeira metade do século dezenove. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA, 23. 2005, Londrina. Anais... Londrina: uél, 2005. página .12320-.12323.
- De acôrdo com o texto 1, a revólta teve repercussão nacional. Naquele contexto, que medida foi tomada pelas autoridades do Rio de Janeiro?
- Segundo o texto 2, como ficou a vida dos africanos e de seus descendentes em Salvador após a revólta de 1835? Por que isso ocorreu?
- Por que, após a revólta de 1835, havia uma grande preocupação especificamente com a segurança do Rio de Janeiro?
3. Leia o texto a seguir e depois responda às questões propostas.
O vazio de poder propiciou a abertura de um espaço político para que os segmentos menos favorecidos da sociedade reticências manifestassem sua insatisfação, gerando um clima de permissividade, inquietação e incerteza.
GUIMARÃES, Lucia Maria Pasqual. Liberalismo moderado: postulados ideológicos e práticas políticas no Período Regencial (1831-1837). In: PEIXOTO, Antonio Carlos. O liberalismo no Brasil Imperial: origens, conceitos e prática. Rio de Janeiro: Revan: uérj, 2001. página 109.
- O que você acha que a autora do texto quer dizer ao usar a expressão “vazio de poder”?
- De que modo os segmentos menos favorecidos da sociedade demonstraram sua insatisfação durante o período regencial? Será que suas demandas foram atendidas? Justifique.
4. Retome as informações deste Capítulo e compare a diversidade social e política presente nas diferentes revóltas regenciais.
CAPÍTULO 16 O SEGUNDO REINADO
Em 1840, durante a regência de Araújo Lima, o govêrno regencial decretou uma lei que diminuía o poder das Assembleias Legislativas Provinciais, limitando a autonomia das províncias. Insatisfeitos com essa medida, que foi interpretada como um “regresso conservador”, os liberais foram ao ataque: lançaram uma campanha pública pela antecipação da maioridade do príncipe Pedro de Alcântara, então com 14 anos de idade.
Segundo historiadores, a antecipação da maioridade de Pedro de Alcântara, para que ele pudesse assumir o trono, já era algo considerado no cenário político brasileiro: desde 1835, pelo menos, essa possibilidade era avaliada e retomada de tempos em tempos. Ao longo dos anos, essa ideia se espalhou e ganhou fôrça, sendo discutida inclusive em textos publicados em jornais no Rio de Janeiro. Assim, a campanha ganhou apôio popular, e o Parlamento finalmente proclamou a maioridade de Pedro de Alcântara. Em julho de 1840, o príncipe assumiu o trono e recebeu o título de Dom Pedro segundo. Iniciava-se, assim, o Segundo Reinado no Brasil.
A antecipação da maioridade de Dom Pedro segundo foi a saída encontrada pelas elites para manter a ordem escravocrata e a unidade da monarquia, ameaçadas pelos levantes nas províncias. As elites desejavam um govêrno centralizado e forte, que contemplasse seus interesses e objetivos.
As fôrças políticas
O quadro de insurreições do período regencial contribuiu para aprofundar as divergências políticas entre as elites, especialmente no que dizia respeito às fórmas de garantir a estabilidade política e a unidade territorial do país. Nesse contexto, o grupo dos regressistas criou o Partido Conservador, apoiado pelas províncias do nordeste e composto de altos funcionários do govêrno, grandes comerciantes e proprietários de terras. Já os progressistas formaram o Partido Liberal, sustentado pelas províncias do centro-sul e constituído de senhores rurais e membros das camadas médias urbanas.
Os liberais, que haviam sido responsáveis pelo projeto de lei que antecipou a maioridade de Dom Pedro segundo, foram nomeados pelo jovem imperador para compor o primeiro ministério de seu govêrno. No entanto, como os conservadores tinham a maioria na Câmara dos Deputados, os liberais solicitaram ao imperador que dissolvesse o Parlamento e organizasse novas eleições.
Realizadas em outubro de 1840, as eleições ficaram marcadas pelo uso da violência tanto pelos liberais como pelos conservadores. Espancamentos e assassinatos de eleitores e adversários políticos, roubo de urnas e fraudes na contagem de votos explicam por que essa disputa pela hegemonia nas urnas ficou conhecida como “eleições do cacete”.
Os liberais saíram vitoriosos. Insatisfeitos, os conservadores exigiram que o imperador destituísse o gabinete liberal e convocasse novas eleições. Em reação, os liberais organizaram revóltas em São Paulo e em Minas Gerais, que foram rapidamente sufocadas pelas tropas do govêrno imperial.
Liberais e conservadores
De modo geral, podemos considerar que os conservadores acreditavam em um poder central forte. Por sua vez, os políticos liberais defendiam a autonomia de cada província do Brasil e valorizavam a representação na política nacional, por meio de deputados eleitos, por exemplo. Contudo, as atuações dos políticos pertencentes a cada partido têm sido revistas e estudadas por historiadores. Hoje, é possível dizer que existem basicamente três diferentes interpretações de historiadores sobre os partidos Liberal e Conservador no Brasil.
Segundo uma das interpretações, os dois partidos eram, em essência, semelhantes, pois ambos representavam os interesses da aristocracia rural.
Uma segunda corrente destaca as diferenças: enquanto os liberais tinham uma base urbana e defendiam mais autonomia nas províncias, os conservadores representavam setores agrários favoráveis à centralização.
A terceira interpretação historiográfica enfatiza tanto as diferenças quanto as semelhanças entre os dois partidos.
O “parlamentarismo à brasileira”
Visando estabilizar a situação política no país, o imperador Dom Pedro segundo acabou por criar, em 1847, o cargo de presidente do Conselho de Ministros, medida que instituiu o parlamentarismo no Brasil. Se compararmos o modêlo de parlamentarismo implantado no Brasil com o modêlo inglês, por exemplo, perceberemos que o parlamentarismo brasileiro funcionou de maneira diferente e peculiar.
Na Inglaterra, o primeiro-ministro, figura que de fato governa o país, é escolhido pelo partido que recebeu mais votos nas eleições. Depois disso, ele nomeia as pessoas que farão parte de seu gabinete ministerial. Contudo, o “poder maior” pertence ao Parlamento. A permanência ou não do primeiro-ministro em seu cargo no govêrno depende, geralmente, do próprio Parlamento.
No Brasil, o imperador, utilizando-se do Poder Moderador, nomeava o presidente do Conselho de Ministros, que escolhia os integrantes de seu gabinete ministerial. Depois disso, novas eleições eram realizadas, para garantir que o partido que ocupava o gabinete ministerial contasse com a maioria no Parlamento.
O revezamento no poder entre os partidos Liberal e Con-servador durou praticamente todo o Segundo Reinado.
Ler a charge
• O que as armas “à venda” no bazar eleitoral podem indicar sobre as características das eleições no Segundo Reinado? E as cédulas à venda, o que representam?
MUSEU Imperial.Disponível em: https://oeds.link/gPw855. Acesso em: 25 fevereiro 2022. Site do Museu Imperial, localizado em Petrópolis (). O Rio de Janeiro site disponibiliza visitas virtuais pelas dependências da instituição.
A “Primavera dos Povos” no Brasil
A última grande revólta do Segundo Reinado ocorreu na província de Pernambuco, em 1848. A Revolução Praieira foi assim chamada porque os líderes do movimento se reuniam na séde do jornal Diário Novo, localizada na rua da Praia, no Recife. Por esse motivo, os membros do movimento ficaram conhecidos como praieiros.
O movimento contou com ampla participação popular, sobretudo das camadas médias urbanas. Essa população lutava contra a falta de emprêgo e pelo fim do contrôle do comércio pelos portugueses em Pernambuco.
Essa revólta não teve apenas motivações locais. Ela foi fortemente influenciada pelo contexto das revoluções liberais que varreram o continente europeu no mesmo ano.
Inspirados no socialismo de Róbert Ôuen e chárles furriê, os praieiros utilizaram a imprensa liberal, sobretudo o jornal Diário Novo e a revista O Progresso, para divulgar suas ideias.
A presença das ideias revolucionárias europeias no movimento praieiro ficou evidente no “Manifesto ao mundo”, publicado em 1849. Por esses motivos, a revólta é chamada por alguns historiadores de “Primavera dos Povos brasileira”. Em 1850, ela foi derrotada pelas tropas imperiais.
Revolução ou revólta?
Os próprios sujeitos da época definiram a Praieira como uma “revolução” e se inspiraram nos valôres e elementos dos movimentos revolucionários europeus de 1830 e 1848, já estudados neste livro. Porém, no caso do Brasil, o movimento ocorreu em um contexto de centralização política imperial, elaborado pelas elites, em um cenário bem diferente das realidades europeias do período. No Brasil dos anos 1830 e 1840, a ordem e a unidade do território nacional até poderiam estar em jôgo mediante as aspirações dos praieiros, mas é importante ressaltar que não se tratava de uma ameaça revolucionária como a representada pelos movimentos de 1830 e 1848 na Europa.
A Guerra do Paraguai (1864-1870)
O principal fator para a eclosão da Guerra do Paraguai ou Guerra da Tríplice Aliança foram as disputas pelo contrôle da Bacia do Prata, formada pelos rios Paraná, Paraguai e Uruguai.
O Paraguai, sem saída para o mar, dependia dos rios platinos para o escoamento de seus produtos. Para o Brasil, os rios representavam a única via de comunicação entre a província de Mato Grosso e a do Rio de Janeiro.
Os enfrentamentos militares começaram com a intromissão do Brasil nos assuntos internos do Uruguai, cujo poder político era disputado entre os partidos Blanco e Colorado. Em outubro de 1864, o Brasil, que apoiava os colorados, invadiu o Uruguai. O Paraguai, governado por Francisco Solano López e aliado dos blancos, rompeu relações diplomáticas com o Brasil e, em novembro, aprisionou um navio brasileiro que seguia para Cuiabá. No mês seguinte, tropas paraguaias invadiram o Mato Grosso e pediram autorização do govêrno argentino para atravessar seu território e entrar no Rio Grande do Sul. Diante da recusa, Solano López declarou guerra à Argentina e atacou a província de Corrientes.
As investidas do Paraguai motivaram o Brasil, a Argentina e os colorados uruguaios a formalizar, em maio de 1865, a Tríplice Aliança, com o compromisso de derrotar Solano López e liberar a navegação fluvial na região para os três países.
Resultados do conflito
A guerra só terminou em 1870, com a morte de Solano López e a derrota paraguaia.
Para o Paraguai, o conflito foi uma catástrofe. O país teve de arcar com uma pesada dívida de guerra, além de ter boa parte de suas terras anexada pelos vencedores, como você pode observar no mapa “A Guerra do Paraguai (1864-1870)”. A população paraguaia foi reduzida a um quinto do total antes do conflito. As indústrias e ferrovias ruíram.
A Guerra do Paraguai (1864-1870)
Fonte: jôfili, Bernardo. isto é Brasil 500 anos: atlas histórico. São Paulo: Três, 1998. página 75.
O Brasil não obteve grandes vantagens com o conflito. cêrca de 40 mil soldados morreram em combate, e as dívidas contraídas em decorrência da guerra foram pesadas, o que provocou o aumento da inflação. Como o Brasil assumia a maior parte das despesas do bloco dos aliados, o govêrno de Dom Pedro segundo, em várias ocasiões, teve de recorrer a empréstimos externos para custear o conflito.
Mulheres na guerra
O texto a seguir fala sobre diversas mulheres que participaram, de alguma fórma, da Guerra do Paraguai.
No decorrer da Guerra do Paraguai, as espôsas de militares tinham como meta seguirem os maridos, algumas, inclusive, levando os filhos; determinadas viúvas também se propunham a acompanhar os filhos nessa empreitada. reticências
[Outras mulheres, conhecidas como vivandeiras,] praticavam o comércio, negociavam objetos de necessidade, preparavam e vendiam comidas, bebidas e obtinham excelentes preços pelas mercadorias, dada a precariedade de gêneros alimentícios, uma vez que os provimentos para abastecer o Exército Brasileiro eram irregulares. reticências
[Diversas] mulheres que tiveram algum tipo de referência histórica na Guerra do Paraguai foram aquelas que realizaram determinado ato considerado heroico (bravura) reticências.
CASTILHO, Maria Augusta de; GARCIA, Adilso de Campos. As mulheres na Guerra do Paraguai (1864-1870): o caso da Província de Mato Grosso (). Mato Grosso Revista de História da , Uég volume 9, número 2,/ julho dezembro 2020. Disponível em: https://oeds.link/qew7NB. Acesso em: 22 fevereiro 2022.
Em debate
Versões da Guerra do Paraguai
A Guerra do Paraguai é objeto de diferentes interpretações históricas. Nos trechos a seguir, o historiador brasileiro Bóris Fausto apresenta algumas dessas interpretações sobre esse conflito internacional que marcou profundamente a história do Segundo Reinado. As pesquisas dos historiadores estão em permanente construção, o que nos leva a perceber que, em determinadas épocas ou conforme o estudo de documentos e vestígios específicos, as interpretações a respeito desse tema podem mudar, se transformar ou serem complementadas por novos estudos e pesquisas.
Texto 1
A guerra constitui um claro exemplo de como a História, sem ser arbitrária, é um trabalho de criação que pode servir a vários fins. Na versão tradicional da historiografia brasileira, o conflito resultou da megalomania e dos planos expansionistas do ditador paraguaio Solano López. Membros das fôrças Armadas – especialmente do Exército – encaram os episódios da guerra como exemplos da capacidade militar brasileira, exaltando os feitos heroicos de Tamandaré, de Osório e, em especial, de Caxias. reticências
Atravessando a fronteira, encontramos no Paraguai uma historiografia oposta. O conflito é aí visto como uma agressão de vizinhos poderosos a um pequeno país independente. Essa versão serviu em anos recentes para glorificar o ditador paraguaio Alfredo Strósner [que governou o país entre 1954 e 1989]. reticências Strósner apresentava-se como continuador da obra do general Bernardino Cabalhêro, reticências oficial de confiança de Solano López nos anos da guerra.
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: êduspi, 2007. página 208-209.
Em debate
Texto 2
Na década de 1960, surgiu entre os historiadores de esquerda, como o argentino León Pomer, uma nova versão. O conflito teria sido fomentado pelo imperialismo inglês. O Paraguai era um país de pequenos proprietários que optara pelo desenvolvimento autônomo, livrando-se da dependência externa. Brasil e Argentina definiam-se como nações dependentes, baseadas no comércio externo e no ingresso de recursos e tecnologia estrangeiros. Esses dois países teriam sido manipulados pela Inglaterra para destruir uma pequena nação cujo caminho não lhe convinha. Além disso, os ingleses estariam interessados em controlar o comércio do algodão paraguaio, matéria-prima fundamental para a indústria têxtil britânica.
Essa interpretação está muito ligada às concepções correntes na esquerda latino-americana das décadas de 1960 e 1970. Pensava-se naqueles anos que os problemas do continente resultavam basicamente da exploração imperialista. A Guerra do Paraguai seria um exemplo a mais de como a América Latina, ao longo do tempo, tinha apenas trocado de dono, passando de mãos inglesas para norte-americanas.
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: êduspi, 2007. página 208-209.
Texto 3
Nos últimos anos, a partir de historiadores como Francisco Doratioto e Ricardo Salles, surgiu uma nova explicação. Não se trata da última palavra no campo da História, mas de uma versão menos ideológica, mais coerente e bem apoiada em documentos. Ela concentra sua atenção nas relações entre os países envolvidos no conflito. Tem a vantagem de procurar entender cada um desses países a partir de sua fisionomia própria, sem negar a grande influência do capitalismo inglês na região. Chama a atenção, assim, para o processo de formação dos Estados nacionais da América Latina e da luta entre eles para assumir uma posição dominante no continente.
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: êduspi, 2007. página208-209.
- Identifique as versões sobre a Guerra do Paraguai apresentadas nos textos 1, 2 e 3.
- Explique a visão tradicional da historiografia brasileira sobre essa guerra.
- Qual é a versão da historiografia paraguaia para o conflito?
- Segundo as vertentes historiográficas dos anos 1960 e 1970, citadas no texto 2, qual é a relação entre o imperialismo inglês e a Guerra do Paraguai?
- Como a interpretação elaborada por Francisco Doratioto e Ricardo Salles, no texto 3, se opõe à ideia de que essa guerra foi fomentada pelo imperialismo inglês?
A expansão cafeeira no Segundo Reinado
O café foi introduzido no Brasil no início do século dezoito, vindo da Guiana Francesa. Foi levado para a capitania do Rio de Janeiro, onde passou a ser cultivado para consumo doméstico. Apenas no final do século dezoito, com a ampliação do consumo nos países do Ocidente, a produção para o mercado começou a se expandir.
No comêço do Segundo Reinado, em 1840, o café já era o principal produto da economia brasileira, representando cêrca de 40% das exportações do país e mais da metade da produção mundial. A rápida expansão do cultivo deveu-se a quatro fatores principais: abundância de terras, disponibilidade de mão de obra, condições climáticas favoráveis e aumento do consumo do produto no exterior.
A primeira fase de produção teve como centro o Vale do Paraíba, onde os cafezais se espalharam por municípios fluminenses (como Barra Mansa, Vassouras e Barra do Piraí) e paulistas (como Taubaté, Areias e Bananal). Essa região reunia condições naturais excelentes para o cultivo: terras virgens e férteis, chuvas regulares e relêvo acidentado, que protegia a planta dos ventos fortes que vinham do oceano.
O cultivo no Vale do Paraíba seguiu o modêlo adotado na agricultura de exportação do Nordeste, baseado na grande propriedade e na mão de obra escrava. Sem investir em inovações técnicas, os fazendeiros aumentavam a produção por meio da expansão dos cafezais para novas terras e da ampliação do contingente de escravizados.
A caminho do Oeste Paulista
A proximidade entre as áreas de cultivo no Vale do Paraíba e o litoral facilitava o escoamento do produto para a Europa e para os Estados Unidos. Antes da construção das primeiras ferrovias, o café era transportado por tropas de burros e mulas ou em carros de bois até portos intermediários e daí para os portos exportadores, principalmente o do Rio de Janeiro e o de Paraty.
Contudo, por volta de 1860, a cultura cafeeira do Vale do Paraíba dava sinais de decadência. Algumas causas podem explicar esse fenômeno: o desmatamento, as práticas de queimada, o sistema extensivo de produção (ou seja, o tipo de sistema caracterizado pela exploração de grande extensão de terra) e a ausência de técnicas para evitar a erosão provocaram o enfraquecimento das plantas e a queda da produção.
Com o declínio da lavoura cafeeira no Vale do Paraíba, a economia do café entrou em uma nova fase, rumo ao Oeste Paulista.
A região do Oeste Paulista apresentava condições bastante favoráveis ao cultivo, como o solo de terra roxa, muito fértil, geografia pouco acidentada e grandes extensões de terras inexploradas.
Esses fatores, somados à adoção de novas técnicas agrícolas, possibilitaram que os cafezais do Oeste Paulista fossem mais produtivos e duradouros que os do Vale do Paraíba.
Outras atividades econômicas durante o Segundo Reinado
Além do café, outros produtos foram importantes para a economia nacional e tiveram destaque no volume de exportações brasileiras no Segundo Reinado.
Apesar de perder a predominância, o açúcar continuou sendo um produto importante para as exportações.
O algodão, cultivado principalmente nas províncias do Maranhão e de Pernambuco, chegou a ocupar o segundo lugar na pauta de exportações do Brasil durante a Guerra de Secessão (1861-1865) nos Estados Unidos. Nesse período, em razão da queda na produção estadunidense, o algodão brasileiro passou a suprir grande parte da demanda pela matéria-prima nas indústrias de tecidos da Inglaterra.
A partir da década de 1870, na Amazônia, a extração do látex das seringueiras impulsionou o crescimento econômico da região. O látex é uma seiva que, ao passar por determinados processos (como a coagulação), dá origem à chamada borracha natural. A demanda por látex no mercado mundial aumentou com o desenvolvimento da indústria automobilística, que utilizava o produto na fabricação de pneus.
A exploração dessa riqueza na Amazônia brasileira atraiu milhares de nordestinos (principalmente do Ceará), que fugiam da miséria e da prolongada estiagem que atingiu o sertão do Nordeste na década de 1870.
Crescimento de cidades
A partir da extração da borracha, cujo centro era a região amazônica, muitos povoados e vilas se desenvolveram e, com o tempo, foram transformados em cidades maiores. Desse modo, as atividades ligadas à extração da borracha impulsionaram o crescimento das cidades de Manaus e Belém, e de muitas outras cidades da região, como Marabá, Itacoatiara, Rio Branco, Eirunepé e Altamira.
Atividades
Faça as atividades no caderno.
- Que semelhanças e diferenças podem ser estabelecidas entre a Revolução Praieira e as Revoluções de 1848 na Europa, que você estudou na Unidade cinco?
- De acôrdo com o que foi estudado neste Capítulo, responda às questões a seguir.
- Qual foi o principal fator para a eclosão da Guerra do Paraguai?
- Identifique alguns resultados do conflito para o Paraguai e para o Brasil.
- O escritor Euclides da Cunha, que esteve na região da Amazônia entre 1904 e 1905, registrou a desventura dos trabalhadores cearenses que haviam migrado para aquela região, para trabalhar nos seringais:
É a imagem monstruosa e expressiva da sociedade torturada que mourejaglossário naquelas paragens. O cearense aventuroso ali chega numa desapoderada ansiedade de fortuna; e depois de uma breve aprendizagem em que passa de brabo a manso, consoante a gíria dos seringais (o que significa o passar das miragens que o estonteavam para a apatia de um vencido ante a realidade inexorável) – ergue a cabana [e] pressente que nunca mais se livrará da estrada que o enlaça, e que ele vai pisar durante a vida inteira, indo e vindo, a girar estonteadamente no monstruoso círculo vicioso da sua fainaglossário fatigante e estéril.
CUNHA, Euclides da. Citado em: ANTONIO FILHO, Fadél David. Riqueza e miséria do ciclo da borracha na Amazônia brasileira: um olhar geográfico através de Euclides da Cunha. In: GODOY, R. Teixeira de . organização História do pensamento geográfico e epistemologia em Geografia. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. página 204. Disponível em: https://oeds.link/0SqzdE. Acesso em: 25 março 2022.
- Com base no texto, é possível ter uma ideia da expectativa e da realidade dos nordestinos em relação ao trabalho de exploração da borracha na Amazônia. Exponha, com suas palavras, o quadro descrito por Euclides da Cunha.
- Como o autor avalia a capacidade do ser humano de vencer uma realidade adversa?
4. Em duplas, identifiquem, nos trechos do “Manifesto ao mundo” destacados a seguir, elementos e valôres que evidenciam que a Praieira contava com ideias inspiradas nos movimentos revolucionários europeus do período.
Manifesto ao mundo
1º – Voto livre e universal do povo brasileiro.
2º – A plena e absoluta liberdade de comunicar os pensamentos por meio da imprensa.
3º – O trabalho como garantia de vida para o cidadão brasileiro.
4º – O comércio de retalho só para os cidadãos brasileiros.
reticências
6º – A extinção do Poder Moderador reticências.
MANIFESTO ao mundo [1849]. In: MARSON, Isabel. O império do progresso: a Revolução Praieira. São Paulo: Brasiliense, 1987. página 79-80.
CAPÍTULO 17 O FIM DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL
Você já sabe que, durante o período da escravatura, muitos escravizados se rebelaram contra seus proprietários, promovendo diversas fugas e organizando revóltas. Agora, você vai estudar o fim da escravidão no Brasil e perceber que esse não foi um processo sem contradições: após obter a liberdade, os ex-escravizados não foram totalmente integrados à sociedade e à economia do país, pois o Estado não organizou projetos nem planos para que isso acontecesse. Muitos dos ex-escravizados, por exemplo, continuaram a ter laços de dependência com seus ex-senhores ou assumiram trabalhos desprestigiados nas cidades.
Após a abolição, muitos ex-escravizados foram buscar trabalho em grandes cidades, como São Paulo, Rio de Janeiro, Recife ou Salvador. No caso específico da cidade de São Paulo (e da província de São Paulo como um todo), os imigrantes vindos da Europa já ocupavam postos de trabalho na lavoura e na indústria. Os escravizados libertos, que infelizmente já sofriam todas as fórmas de preconceito, eram obrigados a aceitar os trabalhos mais pesados e mal remunerados.
A pressão contra o tráfico
Para entender o processo que levou à abolição da escravidão no Brasil, é necessário identificar as etapas que deram fim ao tráfico de escravizados, a começar pelas ações do govêrno da Inglaterra. No início do século dezenove, a Inglaterra aboliu o tráfico negreiro nas suas colônias e iniciou uma política agressiva pela abolição do tráfico transatlântico.
As razões para a mudança na política inglesa em relação ao tráfico e ao escravismo têm gerado muitas discussões entre os historiadores.
A explicação mais conhecida, defendida por uma parte dos historiadores, destaca basicamente os seguintes interesses econômicos da Coroa e da burguesia inglesas:
- ao abolir o tráfico em suas colônias, o govêrno inglês criou condições para que os colonos investissem os recursos antes aplicados na compra de escravizados na aquisição de produtos industrializados ingleses;
- o fim do tráfico nas Antilhas inglesas obrigou os proprietários a empregar trabalhadores assalariados nos engenhos de açúcar. Como consequência, o açúcar antilhano se tornou mais caro que o brasileiro, que continuava sendo produzido por escravizados.
Contrapondo-se a essa visão, estudos recentes têm concluído que a mudança na política inglesa tinha razões humanitárias e políticas. A campanha abolicionista inglesa era produto de um movimento popular muito forte na Inglaterra, realizado por meio de petições públicas antiescravistas, artigos na imprensa e pressões sobre o Parlamento.
Pressões internacionais
O texto a seguir aborda as pressões inglesas já no comêço do século dezenove para que o govêrno brasileiro désse fim ao tráfico de escravizados.
O Brasil passou a ser bastante pressionado. Antes mesmo da independência brasileira, reticências Dom João sexto assinou o primeiro tratado internacional com o objetivo de diminuir paulatinamente o tráfico de escravos para o Brasil. O tratado assinado em 22 de janeiro de 1815 proibia que aportassem em terras brasileiras os navios negreiros provenientes das partes da costa africana que ficassem ao norte da linha do Equador. Depois desse primeiro acôrdo, outros foram assinados. Em 1826, o Império do Brasil e o govêrno britânico assinaram outro documento estendendo a proibição do tráfico a todos os navios negreiros vindos da África. Esses acordos não eram completamente respeitados pelo Império, o tráfico, ilegal em teoria, continuava sem a repressão do govêrno imperial.
ACORDOS internacionais e legislação sobre escravidão. Biblioteca Nacional Digital. Disponível em: https://oeds.link/PFaWET. Acesso em: 26 fevereiro 2022.
A extinção do tráfico de escravizados
Em 1831, foi aprovada uma medida para validar um tratado entre Brasil e Inglaterra pelo fim do tráfico negreiro. Contudo, traficantes e proprietários ignoraram a lei. O tráfico de escravizados para o Brasil continuou em ritmo crescente, muitas vezes com a colaboração de autoridades brasileiras.
As relações entre Inglaterra e Brasil se deterioraram a partir de 1845, quando o Parlamento inglês aprovou o Bill Aberdeen, lei que autorizava a marinha inglesa a apreender os navios negreiros e a levar os responsáveis aos tribunais da Inglaterra.
O Bill Aberdeen provocou violentas reações de políticos brasileiros, que consideravam a medida uma violação da soberania nacional. Os ingleses ignoraram as reações brasileiras e reforçaram a fiscalização. Entre 1849 e 1851, cêrca de 90 navios negreiros foram apreendidos pelos ingleses.
No entanto, a queda de braço com a Inglaterra não duraria muito tempo. Em 1850, foi aprovada a Lei Eusébio de Queiroz, que proibia definitivamente o tráfico de escravizados para o Brasil.
Os efeitos do fim do tráfico
Com a proibição do tráfico internacional, os cafeicultores e outros fazendeiros tiveram de recorrer ao tráfico interno ou interprovincial. As lavouras empobrecidas de cana-de-açúcar do nordeste e o extremo sul do país ampliaram a venda de escravizados para as lavouras do centro-sul, que se transformaram na principal região escravista do Brasil.
O tráfico interno continuou significativo até 1870, quando começou a declinar, constituindo a última tentativa de comercialização de escravizados entre as províncias.
Proibido o tráfico, os capitais antes aplicados na compra de escravizados foram deslocados para outras atividades. Ocorreu, assim, um incremento das indústrias, das ferrovias, dos telégrafos e da navegação.
estimativa de ESCRAVIZADOS importados que desembarcaram no Pôrto da bahia
Fonte: A abolição do tráfico de escravos no Brasil. In: MATTOSO, Kátia de Queirós. Ser escravo no Brasil. 3. edição São Paulo: Brasiliense, 2003. página 61.
BAQUAQUA, marrômá Gardo. Biografia de marrômá Gardo Baquaqua. São Paulo: Uirapuru, 2017. Autobiografia de marrômá Gardo Baquaqua, africano que chegou ao Brasil em 1845 na condição de escravizado. Em 1847, Baquaqua foi levado aos Estados Unidos e, lá, tornou-se livre.
Abolição lenta e gradual
A partir da década de 1860, o movimento pela abolição ganhou fôrça no país, principalmente depois da Guerra do Paraguai, quando milhares de escravizados combateram nas fileiras do Exército brasileiro.
A grande influência dos fazendeiros na Câmara, no Senado e no govêrno decidiu os rumos da abolição no Brasil. Ela seria lenta, gradual e segura, ou seja, sem riscos para os privilégios dos grupos dominantes. Acompanhe, a seguir, os passos da legislação abolicionista no Brasil.
- Lei Rio Branco (Lei do Ventre Livre – 1871): declarava livres os filhos de mulheres escravizadas nascidos a partir dessa data. As crianças livres ficariam com suas mães até os 8 anos de idade. Depois disso, os senhores poderiam receber uma indenização do Estado ou exigir que os libertos trabalhassem para eles até completarem 21 anos. Essa lei, contudo, não concedia liberdade aos escravizados nascidos antes da data de sua promulgação tampouco estabelecia um prazo para a extinção da escravidão.
- Lei Saraiva-Cotegipe (Lei dos Sexagenários – 1885): libertava os escravizados com mais de 60 anos e os obrigava, a título de indenização, a trabalhar para seus antigos donos por três anos. Mesmo os proprietários que inicialmente se colocaram contra a lei perceberam, depois de aprovada, as vantagens que ela lhes trazia. Isso porque a expectativa média de vida de um escravizado não chegava aos 40 anos, e os poucos que atingiam os 60 anos eram praticamente improdutivos, tornando-se um “ pêso” para seus senhores.
Por volta de 1885, a campanha abolicionista tornou-se mais intensa. Associações e clubes voltaram-se contra a escravidão, fazendo propaganda e levantando fundos para a compra de cartas de alforria. Intelectuais, jornalistas, advogados, profissionais liberais e mesmo fazendeiros aderiam à causa abolicionista.
Antes e depois da abolição
Ao mesmo tempo que a campanha abolicionista se intensificava, as fugas de escravizados tornavam-se mais frequentes. Ativistas, entre eles filhos da elite cafeeira, organizavam grupos para ajudar escravizados a fugir das fazendas, conduzindo-os a lugares seguros, como a cidade de Santos. Nessa região, escravizados fugidos formaram o quilombo do Jabaquara, que chegou a reunir cêrca de 10 mil pessoas.
Muitos proprietários, sem condições de impedir as fugas, passaram a libertar os escravizados em troca de sua permanência na lavoura por mais alguns anos. Diante dessa situação, em 13 de maio de 1888, a princesa Isabel, que substituía provisoriamente o pai, Dom Pedro segundo, no govêrno, assinou a Lei Áurea, abolindo a escravidão no Brasil.
A abolição não provocou o colapso da produção agrícola, como temiam muitos cafeicultores. Os ex-escravizados não receberam nenhum tipo de indenização ou auxílio para recomeçar a vida longe do cativeiro. Assim, grande parte deles continuou trabalhando para seus ex-senhores, em uma situação de dependência semelhante à da escravidão, em especial no nordeste do país. No Vale do Paraíba fluminense e paulista, era comum encontrar libertos que estabeleceram regimes de parceria com seus antigos donos, tornando-se pequenos sitiantes ou ainda tocadores de gado.
Muitos ex-escravizados foram trabalhar nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro.
A monarquia com os dias contados
Para a monarquia, a abolição causou a perda de uma importante fôrça de sustentação política. Setores agrários mais dependentes do trabalho de escravizados, em particular os cafeicultores do Vale do Paraíba, sentiram-se traídos pelo govêrno, que acabou com a escravidão sem um programa de indenização aos proprietários. Após o dia 13 de maio, a monarquia estava com os dias contados no Brasil.
Ler o cartaz
• O cartaz reflete o processo que levou ao fim da escravidão no Brasil? Por quê?
MOURA, Clóvis. Quilombos: resistência ao escravismo. São Paulo: Expressão Popular, 2020. A obra trata da formação dos quilombos no Brasil e do papel dessas organizações na luta contra a escravidão. Traz também uma análise: a importância dos movimentos organizados pelos escravizados ao longo do século , como a dezenove revólta dos Malês, na Bahia.
Lei de Terras
A Lei de Terras foi aprovada em 1850, quinze dias depois da proibição do tráfico de escravizados para o Brasil. Seu decreto estava associado à preocupação com a substituição do trabalho de escravizados. A lei determinava que o acesso às terras devolutasglossário só poderia ocorrer por meio da compra. A posse da terra por meio da ocupação de terrenos vagos passava a ser proibida.
Com a Lei de Terras, a possibilidade de os futuros imigrantes virarem proprietários tornou-se remota, pois essa lei definia que as terras públicas deveriam ser vendidas por um preço relativamente alto, o que afastava posseiros e imigrantes pobres. Além disso, estrangeiros que tivessem passagens financiadas para viajar ao Brasil só poderiam adquirir terras após três anos de estadia. Assim, a atração de imigrantes era mantida, mas evitava-se que eles se transformassem rapidamente em proprietários.
Um decreto de 1854 regulamentou a Lei de Terras, determinando a medição, a legalização das posses e o registro das propriedades. O historiador Uóren Dian, estudando a situação fundiária do município de Rio Claro, no estado de São Paulo, verificou que, entre 1855 e 1857, grande parte dos proprietários da região não conseguiu pagar a quantia cobrada para o registro de suas propriedades. Por esse motivo, muitos perderam suas terras, foram expulsos ou continuaram a trabalhar em suas antigas propriedades na condição de assalariados ou arrendatários. Portanto, a Lei de Terras acentuou a concentração fundiária no Brasil, mantendo o latifúndio como marca de nossa estrutura agrária.
Luiz Gama, abolicionista
Entre os abolicionistas brasileiros, Luiz Gama merece destaque. Gama nasceu livre, em 1830, em Salvador, na Bahia. Ele era filho de uma africana livre e de um fidalgo de origem portuguesa. Contudo, aos 10 anos, Luiz Gama foi vendido por seu pai, como escravizado, e nessa condição foi levado para a cidade de São Paulo. Aprendeu a ler e a escrever e reconquistou sua liberdade após provar que havia nascido livre.
No texto a seguir, é possível conhecer com mais detalhes a vida de Luiz Gama e sua atuação no movimento abolicionista do Brasil, como jornalista e advogado.
[Luiz Gama] Publicou, em 1859, uma coletânea de poemas satíricos, “Primeiras Trovas Burlescas”, onde faz uma crítica social e política da sociedade brasileira, denunciando as questões raciais do ponto de vista negro, na primeira pessoa.
Ativista da causa republicana e abolicionista, colaborou com a sua pena em diversos jornais: Diabo Coxo, Cabrião, Correio Paulistano, A Província de São Paulo, Radical Paulistano, A Gazeta da côrte, onde atuou junto com outros abolicionistas negros como Ferreira de Menezes, André Rebouças e José do Patrocínio. O Radical Paulistano era o órgão de comunicação do Partido Liberal Radical, abolicionista e republicano. Neste jornal, Luiz Gama denunciava violações das leis por parte dos representantes dos senhores. Denunciava sentenças e apontava os erros cometidos por juízes e advogados.
reticências
Luiz Gama dedicou-se com afinco e gratuitamente a libertar pessoas escravizadas de várias províncias do Brasil.
Mesmo não sendo “diplomado”, era advogado autodidata com grande cultura jurídica. Luiz Gama possuía uma provisão, documento que autorizava a prática do direito, dada pelo Poder Judiciário do Império.
LUIZ GAMA, ativista abolicionista. Biblioteca Nacional, 13 maio 2020. Disponível em: https://oeds.link/GyNaZc. Acesso em: 26 fevereiro 2022.
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Transcrição do áudio
[LOCUTOR 1:] A poesia de Luiz Gama, um abolicionista negro
[LOCUTORA]: Luiz Gama foi um dos principais líderes abolicionistas do Brasil. Nascido em 1830, na cidade de Salvador, na Bahia, era filho de uma mulher negra que havia se libertado da escravidão e de um aristocrata português, sobre o qual pouco se sabe. Sua mãe, Luísa Mahin, natural de Gana, na África, foi uma figura importante nas revoltas antiescravistas que eclodiram na Bahia no início do século XIX.
Aos dez anos de idade, Luiz foi vendido como escravo por seu pai e forçado a trabalhar em São Paulo. Oito anos depois, conseguiu fugir. Após reunir provas de que fora escravizado ilegalmente, conseguiu sua liberdade.
Autodidata, aprendeu a ler e a escrever com 18 anos. Enfrentando o racismo de estudantes e professores, frequentou como ouvinte a Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em São Paulo, e passou a advogar, mesmo sem diploma, em prol da libertação de pessoas escravizadas. Foram mais de 500 pessoas libertadas por ele nos tribunais, sem contar as que tiveram suas alforrias compradas com a ajuda e a iniciativa de Luiz Gama.
Aos 29 anos, lançou suas Primeiras Trovas Burlescas, livro que reúne poemas com forte teor de crítica social e política.
Pouco tempo depois, ingressou no jornalismo, contribuindo com vários veículos da imprensa paulistana e fundando seus próprios jornais. Assim como em todas as suas atividades, Gama usou o jornalismo como um meio para lutar contra a escravidão e a monarquia, recebendo o apelido de “terror dos fazendeiros”.
Luiz Gama morreu em agosto de 1882, aos 52 anos. Deixou para nós um legado literário inestimável e um exemplo inspirador de luta contra a irracionalidade da escravidão e do racismo.
[LOCUTOR 2]:
NO CEMITÉRIO DE SÃO BENEDITO
Da cidade de São Paulo
Também do escravo a humilde sepultura
Um gemido merece de saudade:
Ah caia sobre ela uma só lágrima
De gratidão ao menos.
Dr. Bernardo Guimarães
Em lúgubre recinto escuro e frio,
Onde reina o silêncio aos mortos dado,
Entre quatro paredes descoradas,
Que o caprichoso luxo não adorna,
Jaz de terra coberto humano corpo,
Que escravo sucumbiu, livre nascendo!
Das hórridas cadeias desprendido,
Que só forjam sacrílegos tiranos,
Dorme o sono feliz da eternidade.
Não cercam a morada lutuosa
Os salgueiros, os fúnebres ciprestes,
Nem lhe guarda os umbrais da sepultura
Pesada laje de espartano mármore,
Somente levantado em quadro negro
Epitáfio se lê, que impõe silêncio!
– Descansam neste lar caliginoso
O mísero cativo, o desgraçado!...
Aqui não vem rasteira a vil lisonja
Os feitos decantar da tirania,
Nem ofuscando a luz da sã verdade
Eleva o crime, perpetua a infâmia.
Aqui não se ergue altar ou trono d’ouro
Ao torpe mercador de carne humana.
Aqui se curva o filho respeitoso
Ante a lousa materna, e o pranto em fio
Cai-lhe dos olhos revelando mudo
A história do passado.
Aqui nas sombras
Da funda escuridão do horror eterno,
Dos braços de uma cruz pende o mistério,
Faz-se o cetro bordão, andrajo a túnica,
Mendigo o rei, o potentado escravo!
[LOCUTOR 1]: O trecho de No cemitério de São Benedito, de Luiz Gama, foi publicado em 1859 pela tipografia Dous de Dezembro.
Em debate
Vozes negras
No imaginário de grande parte dos brasileiros, a abolição da escravidão, em 13 de maio de 1888, resultou da iniciativa da princesa Isabel. O texto a seguir, porém, mostra que os negros escravizados foram os principais agentes dessa decisão.
Em 1889, um grupo de libertos da região de Vassouras, no Rio de Janeiro, endereçou a Rui Barbosa uma carta na qual exigia instrução pública para seus filhos. reticências Os signatários da carta se declaravam republicanos e diziam que foram eles, os ex-escravos, e não a família real, os autores da abolição. Esta declaração de protagonismo não agradava a Rui Barbosa (1849-1923) e a outros emancipacionistas mais conservadores, para quem a abolição era um problema nacional que tinha sido resolvido pelos “cidadãos”, os “homens esclarecidos”, categorias que não incluíam escravos e libertos.
Mas nem de longe o fim da escravidão foi algo decidido e encaminhado apenas pelos senhores brancos e doutores do império. Desde que aqui aportaram os primeiros tumbeiros, as autoridades policiais e políticas eram sobressaltadas por fugas e insurreições escravas a comprometerem, dia após dia, os negócios, o sossêgo e a autoridade senhorial.
Na segunda metade do século dezenove, a relevância da rebeldia negra para a falência do escravismo ficou ainda mais evidente. A historiografia está repleta de personagens negros que tinham na abolição a sua principal causa, como Luiz Gama, José do Patrocínio e Manuel Querino. Houve outros menos famosos, mas também contundentes propagandistas da liberdade negra, como um certo Salustiano.
Ele ficou conhecido na crônica baiana como o orador do povo, graças à veemência com que discursava a favor da abolição e em apôio a José do Patrocínio sempre que se desincumbia dos seus afazeres de sapateiro. A pregação de Salustiano contrariava de tal maneira a ordem vigente que um delegado de Cachoeira, no Recôncavo Baiano, chegou a solicitar ao chefe de polícia orientação para fazer “calar o dito preto”. reticências
A intensidade das revóltas e fugas coletivas foi uma das maiores evidências da crise do escravismo. A movimentação negra foi tão decisiva que um dos argumentos abolicionistas era de que só o fim do cativeiro libertaria o homem branco, visto como refém da resistência dos seus escravos.
Tinham razão os libertos de Vassouras ao reivindicarem a autoria da abolição.
ALBUQUERQUE, vlamíra R. Ouçam Salustiano. Revista de História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, ano 3, número 32, maio 2008. página 18.
- Por que Rui Barbosa ficou descontente com o conteúdo da carta encaminhada pelos ex-escravizados?
- Qual tese é defendida pela autora para criticar a visão de Rui Barbosa? Quais evidências ela apresenta?
- Como você explica o argumento dos abolicionistas de que o “fim do cativeiro libertaria o homem branco”?
Os imigrantes no Brasil
Na segunda metade do século dezenove, países como Portugal e Espanha passavam por graves dificuldades econômicas. Nas áreas rurais italianas e alemãs, o desenvolvimento do capitalismo, as sêcas e as guerras de unificação expulsavam os camponeses de suas terras. Uma das saídas encontradas pelas autoridades para minimizar as tensões sociais foi promover a emigração da população empobrecida para a América.
Quase 4 milhões de pessoas imigraram para o Brasil com o sonho de conseguir um bom emprêgo, cultivar o próprio pedaço de terra e assegurar aos filhos um futuro promissor. De 1850 a 1920, a imigração foi essencialmente de origem europeia; entre 1920 e 1935, os asiáticos predominaram.
O incentivo à colonização europeia refletia a visão de alguns setores das elites brasileiras, influenciadas por teorias racistas que eram divulgadas na Europa. De acôrdo com essa visão, os brancos eram superiores, por isso a civilização europeia atingira um grande progresso. Consequentemente, com a vinda de imigrantes europeus para o Brasil, haveria um “branqueamento” do país, que poderia finalmente se desenvolver.
Em geral, as primeiras tentativas de colonização fracassaram: as terras cedidas aos colonos eram pobres e distantes dos mercados consumidores. Com exceção de alguns núcleos de colonização no sul do país, a maior parte das terras foi abandonada pelos colonos.
MUSEU da Imigração.Disponível em: https://oeds.link/T8DNpn. Acesso em: 26 fevereiro 2022. Este site reúne textos, imagens e documentos que fazem parte do acervo do Museu da Imigração do Estado de São Paulo.
Políticas de imigração
Em São Paulo, o pioneiro na experiência com o trabalho imigrante foi o senador Nicolau Pereira de Campos Vergueiro. Em 1846, cêrca de trezentas e sessenta e quatro famílias suíças e alemãs foram trabalhar nas lavouras de café da fazenda Ibicaba, no município de Limeira, de propriedade do senador.
O fazendeiro pagava as passagens dos imigrantes e os contratava no sistema de parceria. Também assumia as despesas de manutenção da família dos trabalhadores até a primeira colheita de café. Após a venda do café, o colono entregava ao proprietário metade da produção mais o correspondente a 6% de juros sobre as dívidas contraídas desde a viagem.
O sistema de parceria, porém, não tardou a enfrentar problemas. Os colonos tinham graves reclamações: os fazendeiros reservavam para si as melhores terras, que eram cultivadas pelos escravizados. Os imigrantes ficavam com os cafeeiros mais improdutivos. Além disso, estavam sempre endividados, pois eram obrigados a comprar mantimentos no armazém da fazenda a preços elevados. Descontentes, os colonos chegaram a promover revóltas.
Em 1871, em São Paulo, foi implantado um novo sistema de colonato: os imigrantes passaram a receber salário e podiam cultivar alimentos e vender o excedente da produção.
O govêrno ficava encarregado de divulgar a imigração nos países da Europa e de pagar o transporte do imigrante e de sua família até o Brasil. Esse programa ficou conhecido como imigração subvencionada e inaugurou o período mais ativo da imigração europeia para o Brasil.
Os colonos no sul do Brasil
A fixação dos imigrantes no sul do Brasil ocorreu por meio da formação de núcleos de colonização em torno da pequena propriedade em áreas do governo ou de particulares compradas especialmente para esse fim, em prejuízo dos povos indígenas, como os Kaingang, os Guarani e os Xokleng, que tradicionalmente ocupavam essa porção do território.
Em Santa Catarina, houve presença de russos, ucranianos e poloneses, além de pessoas de outras nacionalidades. Os açorianos tiveram importância em Florianópolis. Alemães e italianos predominaram em Joinville, Blumenau, Itajaí e em outros núcleos catarinenses. Em Chapecó, a colonização foi marcada por ítalo-brasileiros e teuto-brasileiros.
No Rio Grande do Sul, instalaram-se açorianos, italianos, alemães e austríacos, enquanto no Paraná predominaram russos, poloneses, ucranianos, holandeses, alemães e italianos.
Lugar e cultura
As mulheres no Brasil do século dezenove
De acôrdo com a Constituição Brasileira de 1988, homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Essa igualdade, porém, nem sempre existiu. No passado, as mulheres eram, em sua maioria, subordinadas juridicamente aos homens.
Embora representassem quase metade da população do Brasil na primeira metade do século dezenove, as mulheres não eram consideradas cidadãs e não podiam votar. As mulheres das famílias de elite não tinham direito de trabalhar fóra do lar ou estudar. Além disso, era o marido quem administrava as propriedades da espôsa. Passaram-se anos de batalhas políticas e jurídicas para que as mulheres pudessem desfrutar de direitos como igualdade e liberdade.
É importante notar que os problemas que afetavam as mulheres negras, principalmente as escravizadas, eram ainda mais graves do que os vivenciados pelas mulheres brancas.
Para muitos estudiosos, a vida das mulheres brasileiras começou a mudar com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, em 1808. Os eventos sociais tornaram-se mais frequentes, e as mulheres da elite do Rio de Janeiro passaram, por exemplo, a aprender música, dança e francês.
Em outubro de 1827, uma lei determinou a criação de estabelecimentos de ensino voltados para o público feminino nas cidades e nas vilas mais populosas do Brasil. Com o passar do tempo, essas escolas cresceram em número e se espalharam pelo país. Muitas mulheres defendiam a educação e a emancipação femininas e escreviam sobre o assunto em jornais, revistas e livros.
Uma das primeiras brasileiras a reivindicar direitos para as mulheres e a publicar um livro sobre o tema foi Dionísia Gonçalves Pinto, mais conhecida como Nísia Floresta Brasileira Augusta. Em 1831, passou a publicar artigos sobre a condição das mulheres em diferentes culturas no jornal pernambucano Espelho das Brasileiras. Em 1838, fundou e dirigiu um colégio feminino no Rio de Janeiro: o Colégio Augusto, que funcionou por 17 anos.
- Pesquise o que as meninas aprendiam nas escolas voltadas para o público feminino a partir de 1827.
- A proposta de ensino do colégio criado por Nísia Floresta foi bem recebida pelo público, mas criticada por alguns educadores. Com base nas informações desta seção e no tipo de conhecimento apreendido pelas meninas nos colégios do início do século dezenove, formule uma hipótese sobre por que a proposta de Nísia não foi bem recebida.
- Em sua opinião, na nossa sociedade, as mulheres ainda possuem menos direitos do que os homens? Debata o assunto com os colegas.
Atividades
Faça as atividades no caderno.
1. Após a abolição, muitos ex-escravizados foram trabalhar nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro. A maior parte deles, em São Paulo, não tinha condições de concorrer com os imigrantes e foi obrigada a aceitar trabalhos mal remunerados. Para refletir mais sobre os legados da escravidão, reúna-se com um colega, leiam o texto e depois façam as atividades propostas:
[Segundo o historiador Leandro Jorge Daronco] É preciso lançar pelo menos dois olhares sobre os legados da escravidão no Brasil reticências. O primeiro ponto seria os aspectos formadores da cultura, da identidade e da etnicidade brasileiras reticências.
O segundo ponto seria a presença determinante do trabalho negro nos principais ciclos produtivos da história brasileira: açúcar, ouro, pecuária, café, entre outros. reticências Ao mesmo tempo, a escravidão produziu mazelas históricas em nosso país que dificilmente poderão ser reparadas. Uma dessas marcas é a segregação étnico-racial.
reticências
Observam-se, sobretudo na última década, tentativas de redução das desigualdades étnico-raciais em nosso país, expressas principalmente por políticas públicas afirmativas. Um exemplo desse tipo de política reticências é o sistema de cotas universitárias reticências.
MANFREDO, Maria Teresa. Desigualdade como legado da escravidão no Brasil. Gueledés Instituto da Mulher Negra, 20 setembro 2012. Disponível em: https://oeds.link/vY0mnA. Acesso em: 2 fevereiro 2022.
- De acôrdo com o texto, quais são os dois pontos que nos mostram aspectos do legado da escravidão no Brasil? Expliquem cada um deles.
- Além disso, o texto considera que a escravidão deixou mazelas históricas em nosso país. Que mazelas são essas?
- Façam uma pesquisa para coletar dados estatísticos que mostrem a profunda desigualdade racial existente em nosso país. Uma dica é buscar pesquisas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ( ipéa) sobre a situação social do negro no Brasil.
- O que são políticas afirmativas e qual o papel delas para uma sociedade como a brasileira, que conviveu com a escravidão durante tanto tempo?
2. Leia o texto e observe a imagem a seguir.
Um telegrama hoje recebido pelo “ país” diz o seguinte: “Em Campinas, um fazendeiro importante mandou surrar, pelos seus escravos, e meter no tronco da fazenda o súdito português José Joaquim Silveira, oficial de pedreiro e homem trabalhador”.
Revista Illustrada, número 468, 1887. In: MENDONÇA, Joseli Nunes. Cenas da abolição: escravos e senhores no Parlamento e na Justiça. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2001. página 34.
- Identifique a crítica presente na imagem.
- O que explicaria a violência utilizada pelos proprietários para punir imigrantes que trabalhavam nas fazendas?
Ser no mundo
A construção da identidade nacional no Brasil: cultura popular e erudita
O Brasil do século dezenove, especialmente a partir do govêrno de Dom Pedro segundo, precisava de uma identidade própria. Recém-independente de Portugal, o país tinha como tarefa urgente construir uma identidade nacional que conseguisse conectar um território imenso, onde vivia uma população incrivelmente diversificada.
Uma das ações mais bem-sucedidas nesse sentido foi a criação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro , em 1838. Entre os principais objetivos do instituto estavam o incentivo ao estudo de História do Brasil no ensino público e a organização, a preservação e a divulgação de documentos da história do Brasil.
reticências [O í agá gê bê] pretendia fundar a história do Brasil tomando como modêlo uma história de vultos e grandes personagens sempre exaltados tal qual heróis nacionais. Criar uma historiografia para esse país tão recente [era o objetivo principal do instituto].
Chuárquis, Lilia Mórits. As barbas do imperador: Dom Pedro segundo, um monarca nos trópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. página 127.
A literatura e as artes plásticas do século dezenove também se mobilizaram para a construção da identidade brasileira.
Pintores na Academia Imperial de Belas Artes, no Rio de Janeiro, e escritores ligados ao Romantismo passaram a expressar a nascente identidade brasileira em suas produções artísticas. Para isso, utilizavam especialmente a figura do indígena. De fórma romântica e bastante idealizada, o indígena passou a ser um símbolo nacional. Todo esse processo cultural era bem visto – e financiado – por Dom Pedro segundo.
De modo geral, os artistas do Romantismo ligavam-se ao nacionalismo, à valorização da pátria, da liberdade, da natureza e dos “heróis nacionais”. No caso dos românticos brasileiros, a figura do indígena foi central, e no século dezenove criou-se uma imagem idealizada dos indígenas. Nos romances de José de Alencar, por exemplo, os personagens indígenas surgem sem qualquer rebeldia, como aliados fiéis dos portugueses, incorporando hábitos dos colonizadores.
Outras manifestações culturais, da culinária à religião e à música, também foram importantes para o estabelecimento da identidade da nação. As festividades populares, como a congada, o batuque, o lâmdu (ritmo musical afro-brasileiro) e o samba, originadas de culturas africanas e praticadas nas cidades brasileiras, são exemplos desse tipo de manifestação.
Para compreender a identidade nacional que começou a ser elaborada no século dezenove, é necessário identificar a participação de todos os sujeitos históricos. Considerar somente a imagem idealizada do indígena não é suficiente, já que não representava de modo significativo as características, os problemas e o cotidiano dos povos indígenas na época.
Os povos indígenas da atualidade, inclusive, nos mostram que é possível repensar a questão da identidade nacional. A imagem romantizada do indígena ficou para trás: no Brasil de hoje, a identidade nacional carrega em si os valôres de cada região do país, a luta de mulheres, de jovens, as artes populares, as festividades, o patrimônio histórico e cultural... Vamos conhecer, agora, dois nomes do rap indígena da atualidade que discutem e repensam o Brasil atual.
Formado por Bruno Veron, Clemersom Batista, Quélvin Peixoto e Chárli Peixoto, o Brô êmi cis é considerado o primeiro grupo de rap indígena no Brasil. Os integrantes da etnia guarani- caiouá cantam sobre diversos temas, entre eles os povos tradicionais, a luta de terras e o cotidiano das aldeias.
reticências
[Por sua vez, as] músicas de Kaê Guajajara provocam e denunciam. Com letras sobre preconceito, ancestralidade e resistência, a rapper tem diversas músicas incríveis com melodias envolventes. A artista quer passar importantes mensagens por meio das canções, como em “Mãos Vermelhas”: “Ainda resistimos, em tantos tons e vivências.”
MILLAN, Camilla. Dia da Resistência Indígena: conheça 5 nomes do rap indígena. Rolling Stone, 19 abril 2021. Disponível em: https://oeds.link/xIDIGY. Acesso em: 26 fevereiro 2022.
- Qual foi a principal contribuição do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro para a formação da identidade nacional do Brasil no século ? dezenove
- Como a literatura e as artes plásticas colaboraram para a elaboração da identidade nacional do Brasil no século ? dezenove
- A identidade nacional pode ser repensada e transformada. Os povos indígenas, por exemplo, têm mostrado, ao longo do tempo, essa possibilidade de transformação. E você, quando pensa na identidade nacional, ou seja, nas características que fazem com que o Brasil seja único diante de outros países, que elementos vêm à sua mente? Por quê?
Glossário
- Etnia
- Grupo social que compartilha uma identidade cultural própria.
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- Estancieiro
- Nome que se dá, no Rio Grande do Sul, ao proprietário de fazendas de gado.
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- Charque
- Carne salgada e sêca ao sol para ser mantida própria para o consumo por mais tempo.
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- Mourejar
- Trabalhar muito, com afinco; labutar.
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- Faina
- Trabalho contínuo e permanente.
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- Terras devolutas
- Terras que eram devolvidas à Coroa portuguesa. No período colonial, o termo era empregado para designar a terra cujo sesmeiro (aquele que recebeu uma sesmaria, ou seja, terreno cedido pela Coroa) não cumpria as condições impostas no ato de doação. Com o tempo, esse termo passou a significar “terras vagas”.
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