UNIDADE seis AS INDEPENDÊNCIAS NA ÁFRICA E NA ÁSIA

Fotografia em preto e branco. Dezenas de pessoas (homens, mulheres e algumas crianças), muitas delas com as mãos para cima batendo palmas e sorrindo. Ao centro, algumas dessas pessoas carregam um soldado com capacete redondo. Eles usam roupas leves, principalmente de manga curta.
Multidão recebe integrantes da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), em Moçambique, em comemoração à independência, em 15 de setembro de 1975.

Você estudará nesta Unidade:

A crise do colonialismo

A relação entre a Guerra Fria e os movimentos nas colônias africanas e asiáticas pela independência

Os diferentes projetos relacionados às independências na África

O apartheid na África do Sul

As independências dos países árabes e a formação da Liga Árabe

O movimento de resistência pacífica e de desobediência civil na independência da Índia

A Conferência de Bandung

Fotografia em preto e branco. Em um local aberto, dezenas de crianças e jovens  caminham para frente. Muitas estão com a boca aberta e punho em riste, e parecem estar falando ou cantando. Algumas seguram nas mãos mastros de bandeiras da Argélia, com uma metade branca e a outra mais escura e o símbolo de lua e estrela ao meio. Em segundo plano, à direita, construção e partes com árvores e vegetação.
Multidão comemora a proclamação da independência da Argélia, nas ruas de Argel, capital do país, em 5 de julho de 1962.
Fotografia em preto e branco. Em um local aberto, dezenas de homens em pé, um ao lado do outro, caminham para frente. Eles usam roupa clara, com um chapéu na cabeça. Ao centro, em destaque, um homem de cabelo raspado, vestido com túnica clara e de óculos de grau segura na mão direita um objeto fino. Em segundo plano, há árvores e folhas.
Marrátma Gandhi e seguidores durante a Marcha do Sal contra as leis inglesas, em 1930.

Nos cinquenta anos seguintes ao final da Segunda Guerra Mundial, movimentos de libertação em diversas colônias levaram à conquista da independência e à formação de dezenas de novos países nos continentes africano e asiático. Após décadas de rígido domínio imperialista, a conjuntura internacional da Guerra Fria e, principalmente, os movimentos dos povos nativos fizeram com que os antigos domínios coloniais na África e na Ásia conquistassem a condição de países independentes.

Em alguns casos, o processo de independência foi longo e conturbado; em outros, foi negociado com os dominadores. Seja qual for a maneira como as independências ocorreram, as consequências negativas deixadas por um duradouro período de colonização são visíveis até hoje.

O que você sabe sobre os processos de independência dos países africanos e asiáticos? O que conhece sobre as consequências do imperialismo europeu nos dois continentes?

CAPÍTULO 13  OS PROCESSOS DE INDEPENDÊNCIA NA ÁFRICA

Após a Segunda Guerra Mundial, o domínio imperialista na África passou a ser sistematicamente questionado. As condições políticas para a permanência de relações coloniais impostas pelos europeus em diversos territórios se esgotaram, visto que na própria Europa haviam se desenvolvido lutas contra as ditaduras existentes dentro do continente. Além disso, parte da população africana, que já resistia à dominação colonial, começava a se organizar para conquistar sua independência.

A igualdade entre os países era, nesse momento, uma das pautas defendidas pela ônu. A Carta das Nações Unidas, assinada por todos os países-membros da entidade, determinava que as metrópoles europeias consultassem os habitantes dos territórios dominados para encontrar a melhor fórma de lhes conceder autonomia política, econômica e social.

Assim, durante as décadas de 1950 a 1970, a combinação de fatores internos e externos criou condições favoráveis para que a maioria das colônias africanas conquistasse sua independência. As lutas pela conquista da emancipação política foram prolongadas e árduas na maioria das regiões coloniais da África. Em muitos casos, elas se estenderam por décadas.

Cartaz. Imagem na vertical com contorno em preto. À esquerda, um homem visto da cintura para cima, voltado para a direita, de cabelos escuros, com chapéu sobre cabeça, de blusa de mangas compridas. Ele segura nas mãos uma criança no colo, de cabelos escuros, com gorro claro e vestido. O homem olha para a criança, sorrindo. Há textos em vermelho em letras garrafais, em inglês (que afirma que Moçambique será livre) e em português (que diz Frelimo vencerá).  Na parte inferior do cartaz, há um texto escrito em letras brancas, em inglês.
Pôster de 1970 para campanha de independência de Moçambique. Nos dizeres, ao alto: "Moçambique será livre". Em 1975, a Frelimo proclamou a independência de Moçambique e implantou no país um regime socialista. Entretanto, logo se organizou a Resistência Nacional Moçambicana (renâmo), grupo anticomunista apoiado por Rodésia do Sul, África do Sul e Estados Unidos. Frelimo e Renamo travaram uma guerra civil que durou até 1992, quando foi assinado um acordo de paz. O caso de Moçambique é um exemplo que nos mostra a complexidade das lutas pela independência nas antigas colônias africanas.

A crise do colonialismo

A construção dos impérios coloniais na África e na Ásia esteve ligada a discursos que transmitiam a ideia de superioridade cultural e racial dos brancos europeus (racismo) em relação aos colonizados. Contudo, as populações colonizadas sempre procuraram combater esses discursos imperialistas.

É importante notar, também, que a experiência dos africanos durante a Primeira Guerra Mundial, quando lutaram lado a lado aos europeus em diversas batalhas, pôs em xeque a sustentação dos discursos que professavam a ideologia da superioridade branca. Ficou evidente para todos que acompanhavam aquele momento histórico que a origem dos combatentes não influenciava sua capacidade de atuação.

A guerra possibilitou, também, aos milhares de africanos recrutados para as fileiras de soldados que comparassem suas condições de vida com as dos europeus. Ao fim do conflito, a esperança de ver seus esforços recompensados foi frustrada quando a metrópole não os reconheceu, nem simbolicamente, nas homenagens feitas aos combatentes, tampouco materialmente, por meio de programas de compensação financeira.

Já a Segunda Guerra Mundial expôs a vulnerabilidade das potências europeias. O recrutamento de europeus que exerciam atividades nas colônias para lutar na guerra obrigou as metrópoles a ampliar o emprego de africanos em seus quadros administrativos. Essa medida possibilitou flexibilizar a rigidez da política administrativa colonial e, em alguns casos, buscar estreitar seus laços com as elites nativas africanas.

O fim da Segunda Guerra e o início da Guerra Fria trouxeram também a ideia de que a era colonial chegava ao fim. As disputas ideológicas entre capitalismo e socialismo e os interesses da União Soviética e dos Estados Unidos em ampliar seus respectivos blocos de países aliados criaram um contexto internacional favorável aos movimentos de independência.

Fotografia em preto e branco. Em uma rua, dezenas de soldados marcham, com quepe sobre a cabeça, casaco até os joelhos e botas de cano alto. À direita, há um carro escuro estacionado; ao longo da via, há diversos edifícios. No andar térreo da maior parte deles, há lojas com toldos e inscrições em francês.
Soldados senegaleses do exército francês deixam quartel em Toulon e se dirigem a Marselha, na França, em 1939. A presença de soldados oriundos de territórios colonizados foi bastante comum nas duas guerras mundiais.

Ler a fotografia

• O que está sendo mostrado na fotografia e de que modo esse evento se relaciona com o contexto de independência das colônias africanas?

Ícone. Sugestão de livro.

BELOTO, Gisele Maria; VITORINO, Artur José Renda. Paradidático sobre a história da África: o ateliê do aluno. São Paulo: Appris Editora, 2021. Com linguagem acessível para os jovens e rigor historiográfico, o livro contribui para a transmissão de conhecimentos e reflexões sobre a história da África na Educação Básica.

O pan-africanismo: uma conquista ideológica

A constituição de uma elite intelectual africana contribuiu para o desenvolvimento das bases ideológicas dos movimentos pela independência. Esses movimentos seguiram duas vertentes principais, chamadas pan-africanismo e negritude.

As lutas de resistência contra o colonizador já haviam sido organizadas e atuaram durante todo o período de dominação europeia na África. Exemplos dessa resistência foram as lutas dos herero, dos ashanti e dos maji-maji, entre o final do século dezenove e o início do século vinte.

Essas lutas, porém, eram realizadas espontaneamente, sem um direcionamento ou um projeto político que aglutinasse fôrças para o enfrentamento direto e combinado de toda a estrutura colonial. O pan-africanismo foi o primeiro a assumir esse papel. Criado no início do século vinte por intelectuais negros das Antilhas e dos Estados Unidos, o movimento pregava a solidariedade dos oprimidos pela segregação racial nessas regiões.

Foi a partir do quinto Congresso Pan-Africano de manchéster, realizado em 1945, na Grã-Bretanha, que o pan-africanismo deixou de ser um movimento de intelectuais afro-americanos para se transformar em um instrumento de luta pela independência dos povos africanos, principalmente da África Ocidental Britânica.

A maior expressão do pensamento anticolonialista na África francesa foi o movimento denominado negritude. O conceito nasceu entre estudantes negros nascidos em colônias da África e da América, como leopold sengór, do Senegal, emê cezér, de Martinica, e Léon Damas, da Guiana Francesa. Em Paris, onde estudavam, esses jovens francófonos descobriram que tinham em comum com muitos outros afrodescendentes a identidade negra africana reprimida pelo racismo e pela dominação colonial. Movidos por essa nova consciência, esses intelectuais fundaram, em 1934, em Paris, o jornal L’etudiant noir (O estudante negro) para ser o porta-voz da cultura e da identidade negras.

O termo “negritude” foi empregado pela primeira vez em uma das publicações do jornal, em 1935. Ao mesmo tempo que afirmava o orgulho negro e negava a hegemonia da cultura europeia, também se voltava contra a dominação capitalista. Originalmente exprimindo o sentimento de resistência ao colonialismo francês, o termo foi apropriado pelos movimentos de independência na África e pela luta dos povos negros contra o racismo, dentro e fóra do continente.

Fotografia em preto e branco. Um homem negro visto da cintura para cima de frente para um púlpito. Ele tem cabelos escuros, par de óculos de grau no rosto, usa terno, camisa branca com gravata escura. A mão esquerda sobre o púlpito, olhando para frente, com a boca um pouco aberta.
O martinicano emê cezér, um dos principais líderes do movimento da negritude, fala durante manifestação contra o colonialismo europeu na África, em 1947.

As lutas pela independência na África

As lutas dos povos colonizados, a fragilidade das metrópoles europeias, exauridas pelos custos da Segunda Guerra, e a independência das colônias asiáticas aceleraram os processos de independência na África. Assim, até o fim da década de 1960, o colonialismo europeu no continente reduzia-se a algumas pequenas possessões francesas e às colônias portuguesas, que foram as últimas a conquistar a independência. Observe no mapa a seguir as datas das independências de diversos países do continente africano.

as independências na África

Mapa. As independências na África. Legenda: Verde-escuro: 1936 a 1955 Verde-claro: 1956 a 1957 Amarelo-claro: 1958 a 1960 Amarelo-escuro: 1961 a 1970 Laranja: 1971 a 1976 Vermelho: 1977 a 1990 Roxo: Territórios dependentes Cinza: Território não colonizado O mapa mostra que, entre 1936 e 1955, conquistaram a independência a Líbia, o Egito e Etiópia; entre 1956 e 1957 foi a vez do Marrocos, da Tunísia, do Sudão e de Gana; entre 1958 e 1960, tornaram-se independentes a Mauritânia, o Senegal, a Guiné, a Costa do Marfim, o Mali, Burkina Faso, o Togo, Benin, o Níger, a Nigéria, o Chade, Camarões, a República Centro-Africana, o Gabão, o Congo, o Zaire, a Somália e Madagascar; entre 1961 e 1970, conquistaram a independência Argélia, Gâmbia, Serra Leoa, a Guiné-Equatorial, Uganda, Quênia, Ruanda, Burundi, Tanzânia, Malaui, Zâmbia, Botsuana, África do Sul, Suazilândia, África do Sul, Lesoto, Suazilândia e parte das Ilhas Maurício; entre 1971 e 1976 foi a vez de Saara Ocidental, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Comores e Seychelles tornarem-se independentes. A Namíbia, Djibuti e o Zimbábue conquistaram sua independência entre 1977 e 1990. Os territórios dependentes do continente africano são a Ilha da Madeira, Ilhas Canarias e parte das Ilhas Maurício. O território não colonizado é a Libéria. Na parte inferior, rosa dos ventos e escala de 0 a 735 quilômetros.
A Etiópia foi ocupada pela Itália entre 1936 e 1941, único período de sua história em que esteve sob domínio estrangeiro direto. Vale notar que o atual Sudão do Sul não aparece neste mapa porque esse país só veio a se tornar um Estado independente em 9 de julho de 2011, em um contexto relativamente diverso daquele das independências africanas do começo do século vinte.

Elaborado com base em dados obtidos em: dubí jórj. Atlas historique mondial. Paris: Larousse, 2003. página 219.

O caso do Quênia

O Quênia, que corresponde à região conhecida como África Oriental Britânica, viveu entre 1952 e 1960 uma grande revolta do povo kikuyu, conhecida como Revolta dos Mau-Mau. A colonização britânica nessa área caracterizou-se pela expropriação dos camponeses e pela formação de uma elite branca de grandes fazendeiros. A rebelião eclodiu após a Segunda Guerra Mundial, quando uma nova leva de imigrantes ingleses afluiu para o território, intensificando os conflitos pela terra e piorando as condições de vida dos camponeses.

A repressão movida pelas autoridades britânicas contra a revolta causou milhares de mortes, além da prisão de Diômo Queniata, um dos líderes do movimento e fundador da União Africana do Quênia (KAU). Pressionada pelos principais grupos nacionalistas do Quênia, a Coroa britânica libertou Kenyatta e, sob sua liderança, a independência foi declarada, de fórma pacífica, em 1962, além de ter sido implementado um programa de conciliação nacional.

A África Ocidental Francesa

As pressões pela independência dos povos colonizados levaram o governo francês a permitir, em 1945, a participação de delegados dos territórios além-mar na Assembleia Nacional Constituinte, encarregada de elaborar uma nova Constituição para o Estado francês. Com uma expressiva bancada de comunistas e socialistas, fortalecida pela delegação colonial, a Constituição criou a União Francesa, que substituía o Império Colonial Francês. A mudança, no entanto, foi principalmente formal, pois a política colonialista continuou em vigor, sendo ditada pelas autoridades da metrópole.

Em 1958, um referendo popular propôs a criação da Comunidade Francesa, que concedia maior autonomia às colônias, mas mantinha em mãos francesas o contrôle da economia e a defesa dos territórios. Contudo, os planos do governo francês de evitar a ruptura definitiva fracassaram. Primeiro a Guiné e depois as demais colônias da África Ocidental Francesa declararam a sua independência.

A guerra da Argélia

Enquanto a maioria das colônias da África Ocidental Francesa tornou-se independente sem a necessidade de luta armada, a Argélia, colônia no norte da África, enfrentou forte resistência dos colonizadores franceses às aspirações de independência dos argelinos. Isso porque a colônia era uma grande produtora de petróleo e responsável pelo fornecimento de cerca de 60% da sua produção agrícola.

Em 1º de novembro de 1954, uma série de atentados realizados em vários pontos do território colonial marcou o início da luta armada da Frente de Libertação Nacional (éfe éle êne), um partido de orientação socialista. A adesão ao movimento iniciou-se nas áreas rurais e, aos poucos, espalhou-se pelas cidades.

A violenta repressão francesa fez com que as lutas pela independência durassem oito anos e deixassem mais de um milhão de mortos. Apenas em março de 1962, acordos assinados determinaram o cessar-fogo entre as partes. Em plebiscito realizado em julho desse mesmo ano, a maioria da população argelina optou pela independência.

Fotografia em preto e branco. Vista do alto de uma rua com centenas de pessoas aglomeradas. Entre a multidão, comboio de veículos e pessoas em fila desfilam. Do lado direito da multidão, há alguns carros estacionados e, no canto direito da foto, há uma rua em que praticamente não há carros. Essa rua é ladeada por construções pequenas de um ou dois pavimentos. À esquerda da rua onde está a aglomeração, há edifícios altos de três e quatro pavimentos, com janelas. Ao fundo, há mais edifícios.
Argelinos acompanham a grande parada do exército da éfe éle êne em Argel, no dia 5 de julho de 1962, data da independência da Argélia.

As independências das colônias portuguesas

O surgimento de uma elite de jovens intelectuais foi essencial para a criação de um projeto político para a independência das colônias portuguesas. Líderes como o angolano Agostinho Neto, o moçambicano Marcelino dos Santos e o cabo-verdiano Amílcar Cabral combinaram, em sua luta política, as ideias da revolução socialista e da negritude com uma produção literária de resistência ao colonizador.

Os Estados Unidos, preocupados com a crescente influência das ideias socialistas nos movimentos de emancipação, passaram a pressionar o governo português para libertar as suas colônias. Este, porém, adotou uma política de intensificação da repressão para combater os movimentos que lutavam pela independência.

Em 1973, após mais de dez anos de guerrilha, o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde proclamou a independência da Guiné Portuguesa, que passou a se chamar Guiné-Bissau. Em 1974, após a Revolução dos Cravos, o governo português reconheceu a independência da Guiné e, em dezembro, nomeou um governo de transição para a independência de Cabo Verde.

Revolução dos Cravos

A Revolução dos Cravos foi um levante de jovens oficiais das fôrças Armadas portuguesas que em 25 de abril de 1974 derrubou um regime autoritário que governava Portugal desde os anos 1920. O movimento levou esse nome porque, no dia do levante, a população oferecia cravos aos soldados nas ruas.

Enfraquecido pelo desgaste das guerras coloniais na África, o regime caiu sem praticamente nenhum disparo.

A independência de Angola

Em Angola, a luta pela independência foi travada por três grupos rivais: o Movimento Popular pela Libertação de Angola (ême pê éle a), com um programa comunista, a Frente Nacional de Libertação de Angola (éfe êne éle a) e a União Nacional pela Independência Total de Angola (unita), ambos anticomunistas. Em 1975, o ême pê éle a proclamou a independência e instituiu a República Popular de Angola, sob um regime socialista.

As divergências étnicas e políticas entre o ême pê éle a e a Unita levaram a uma guerra civil que se estendeu até 2002. No contexto da Guerra Fria, a Unita recebeu o apoio dos Estados Unidos e da África do Sul, enquanto o ême pê éle a teve ajuda da União Soviética, da China e de Cuba.

Clique no play e acompanhe a reprodução do Áudio.

Transcrição do áudio

[LOCUTOR 1]: Guerra de libertação de Angola

 

[LOCUTOR 2]:

Entre as décadas de 1950 e 1970, a maior parte do território africano se tornou independente da dominação imperialista europeia. Nesse continente imenso e complexo, os processos de autonomia foram muito diferentes, a depender da região. Em alguns casos, foram negociados entre governos europeus e movimentos de independência; já em outros, como em Angola, foi necessária uma longa e sangrenta guerra contra as forças coloniais para que a libertação se concretizasse. A independência angolana foi conquistada em 1975, mas a guerra civil persistiu, com pequenos períodos de trégua, até 2002.

Lançado em 1980, o livro Mayombe, de Pepetela, narra a história da independência de Angola do ponto de vista das pessoas que lutaram no maior desses movimentos, o Movimento Popular de Libertação de Angola, conhecido por MPLA.

Segundo o autor, a intenção era redigir uma espécie de relatório sobre o cotidiano da guerra. No entanto, os escritos acabaram se tornando uma obra literária que nos apresenta um olhar interno da revolução de independência. Apesar de sua diversidade de origens e de interesses, cada personagem na luta é um universo de conflitos e dramas, unidos pelo sonho da libertação de Angola.

[LOCUTOR 3]:

[Narrador]

Capítulo I

A Missão

O rio Lombe brilhava na vegetação densa. Vinte vezes o tinham atravessado. Teoria, o professor, tinha escorregado numa pedra e esfolara profundamente o joelho. O Comandante dissera a Teoria para voltar à Base, acompanhado de um guerrilheiro. O professor, fazendo uma careta, respondera: Somos dezesseis. Ficaremos catorze.

Matemática simples que resolvera a questão: era difícil conseguir-se um efetivo suficiente. De mau grado, o Comandante deu ordem de avançar. Vinha por vezes juntar-se a Teoria, que caminhava em penúltima posição, para saber como se sentia. O professor escondia o sofrimento. E sorria sem ânimo.

À hora de acampar, alguns combatentes foram procurar lenha seca, enquanto o Comando se reunia. Pangu-Akitina, o enfermeiro, aplicou um penso no ferimento do professor. O joelho estava muito inchado e só com grande esforço ele podia avançar.

Os grupos de quatro, prepararam o jantar: arroz com corned-beef. Terminaram a refeição às seis da tarde, quando já o Sol desaparecera e a noite cobrira o Mayombe. As árvores enormes, das quais pendiam cipós grossos como cabos, dançavam em sombras com os movimentos das chamas. Só o fumo podia libertar-se do Mayombe e subir, por entre as folhas e as lianas, dispersando-se rapidamente no alto, como água precipitada por cascata estreita que se espalha num lago.

Eu, O Narrador, Sou Teoria

Nasci na Gabela, na terra do café. Da terra recebi a cor escura de café, vinda da mãe, misturada ao branco defunto do meu pai, comerciante português. Trago em mim o inconciliável e é este o meu motor. Num Universo de sim ou não, branco ou negro, eu represento o talvez. Talvez é não, para quem quer ouvir sim e significa sim para quem espera ouvir não. A culpa será minha se os homens exigem a pureza e recusam as combinações? Sou eu que devo tornar-me em sim ou em não? Ou são os homens que devem aceitar o talvez? Face a este problema capital, as pessoas dividem-se aos meus olhos em dois grupos: os maniqueístas e os outros. É bom esclarecer que raros são os outros, o Mundo é geralmente maniqueísta.

O Comissário Político, alto e magro como Teoria, acercou-se dele.

[Comissário]

O Comando pensa que deves voltar ou esperar-nos aqui. Dentro de três dias estaremos de volta. Ficará alguém contigo. Ou podes tentar regressar à Base aos poucos. Depende do teu estado.

[Narrador]

O professor respondeu sem hesitar: Acho que é um erro. Posso ainda tentar. Temos pouca gente, dois guerrilheiros a menos fazem uma diferença grande. O plano irá por água abaixo.

[Comissário]

– É pouco, mas talvez chegue.

[Teoria]

– Posso discutir com o Comando?

[Comissário]

– Vou ver.

 

[Narrador]

O Comissário voltou para junto do Comandante e do Chefe de Operações. Momentos depois, fazia sinal a Teoria. O professor levantou-se e uma dor aguda subiu-lhe pelo joelho até ao ventre. Sentiu que não poderia ir muito longe. A escuridão relativa escondia-lhe as feições e ninguém se apercebeu da careta. Procurou andar normalmente e aproximou-se dos três responsáveis.

O Comandante Sem Medo contemplou-o fixamente, enquanto o professor se sentava, gritando calado para esconder as dores insuportáveis. Estou arrumado, pensou.

[Comandante]

– É inútil armares em forte.

 

[Narrador]

Disse Sem Medo.

 

[Comandante]

– Topa-se bem que estás à rasca, embora tentes esconder. Não vejo qual é o mal de reconheceres que não podes continuar. Serás um peso-morto para nós.

 

[Narrador]

Teoria esboçou um gesto de irritação. 

 

[Teoria]

– Eu é que sei como me sinto. Afirmo que posso continuar. Já fui tratado e amanhã melhoro. É evidente que nada está partido, é só um esfolamento sem gravidade. Mesmo o perigo de infecção está afastado.

 

[Comandante]

 – Se amanhã encontramos o inimigo.

 

[Narrador]

disse o Comissário.

 

[Comandante]

– E for necessário retirar rapidamente, tu não poderás correr.

 

 [Teoria]

– Querem que corra aqui para provar que poderei?

 

[Comandante]

— Sou contra a tua participação.

 

 [Narrador]

Repetiu o Comissário.

 

[Comandante]

– Não vale a pena insistir.

 

[LOCUTOR 1]: O trecho do livro Mayombe é de autoria de Pepetela e foi publicado por Publicações Dom Quixote em 1993.

Fotografia em preto e branco. Um homem negro visto da cintura para cima de gorro sobre a cabeça, com um par de óculos de sol, vestido de blusa de mangas compridas clara, olhando para à direita, sorrindo. No colo, ele segura um bebê de boina sobre cabeça e de blusa de mangas curtas clara. Ao fundo, outros homens, vistos parcialmente, e uma construção em desfoque.
O cabo-verdiano Amílcar Cabral, um dos principais líderes do movimento de independência da Guiné Portuguesa e de Cabo Verde. Fotografia da década de 1950.

Desafios após as independências

Nos congressos pan-africanos realizados nas cidades ganenses de Kumasi, em 1953, e de Acra, em 1958, a discussão política centrou-se na definição das fronteiras africanas após a independência. Os minimalistas defendiam a manutenção das fronteiras coloniais, incentivando a construção de Estados nacionais com base nos limites já estabelecidos. Os maximalistas defendiam a construção de uma unidade econômica, política e militar no continente, o que representava, na prática, a radicalização das ideias do pan-africanismo. O grande defensor de uma África livre e unida foi o líder ganês cuâme nicrúma.

A principal resistência à proposta de uma África unida vinha dos países da antiga África Ocidental Francesa. As elites econômicas desses novos Estados nacionais acreditavam que o alinhamento político com a França lhes garantiria ajuda financeira.

A formação da Organização da Unidade Africana (ó u a), em 1963, acabou com os últimos resquícios do movimento pan-africanista ao reafirmar os Estados africanos como autônomos, independentes e iguais no conjunto dos Estados mundiais.

Escultura. Um homem negro, vestindo uma longa túnica drapeada. Ele olha para frente, altivo, e tem o braço direito erguido e o dedo indicador da mão direita aponta para a frente. O braço esquerdo está abaixado, ao longo do corpo, e a mão esquerda está fechada. Ele está com a perna esquerda para frente.
Escultura em bronze que homenageia o líder ganês cuâme nicrúma, vista no Memorial cuâme nicrúma, na cidade de Acra, em Gana. Fotografia de 2010. A estátua foi erguida no mesmo local em que nkruma pronunciou seu discurso de independência, em 6 de março de 1957.

A nova diáspora africana

O termo “diáspora”, de origem grega, significa “dispersão” e é utilizado para nomear o deslocamento, normalmente forçado, de grandes contingentes populacionais em várias regiões do planeta.

No caso dos povos africanos, a expressão diáspora negra ou diáspora africana passou a ser utilizada para se referir à saída forçada de homens e mulheres do continente, durante quase quatro séculos, na condição de mão de obra escravizada em direção às colônias americanas.

Atualmente, o termo também é utilizado para se referir ao movimento migratório de africanos para a Europa e América, onde esperam encontrar melhores condições de vida. Na maioria dos casos, os antigos vínculos coloniais determinam a escolha do destino final dessas pessoas.

Nos últimos anos, o Brasil também se converteu em um importante destino dessas migrações. A familiaridade com o idioma leva o nosso país a atrair imigrantes da África de língua portuguesa, como Angola, Moçambique e Cabo Verde.

Ícone. Sugestão de livro.

COUTO, Mia. Terra sonâmbula. São Paulo: Companhia de Bolso, 2015. Escrito pelo moçambicano Mia Couto, o romance tem como pano de fundo a instabilidade política de Moçambique após o processo de independência política.

Ícone. Seção Integrar conhecimentos.

Integrar conhecimentos

História e Geografia

Migrações africanas na atualidade

O mapa a seguir apresenta um intenso fluxo migratório interno na África, que expressa as inúmeras dificuldades enfrentadas por vários povos no continente, como a fome, a pobreza, o avanço de doenças e as guerras civis ou tribais. Apesar de existir também um grande fluxo migratório para o exterior, tendo como destino sobretudo a Europa e a América, também podemos perceber uma significativa movimentação dentro do próprio continente, com vários focos de expulsão e atração. Esses deslocamentos ajudam a identificar os problemas políticos e as disputas pelo poder nos diversos países da África, assim como as economias mais prósperas e as que enfrentam mais dificuldades.

Observe o mapa a seguir e depois faça às atividades em grupo.

MIGRAÇÕES NO CONTINENTE AFRICANO (2015)

Mapa.  Migrações no continente africano em 2015. As cores da legenda indicam as sub-regiões da África e estão identificadas com as seguintes cores: Rosa-claro: Norte da África, que inclui o Saara Ocidental, o Marrocos, a Argélia, a Tunísia, a Líbia, o Egito e o Sudão. Verde-claro: África Ocidental, que inclui A Mauritânia, o Senegal, a Gâmbia, Guiné-Bissau, a Guiné, Serra Leoa, a Libéria, a Costa do Marfim, Gana, Togo, Benin. a Nigéria, o Níger, o Mali, e Burkina Faso. Lilás: África Central, que inclui o Chade, a República Centro-africana, Camarões, a Guiné Equatorial, São Tomé e Príncipe, o Gabão, o Congo, a República Democrática do Congo e Angola. Amarelo: África Oriental, que inclui a Eritreia, a Etiópia, o Sudão do Sul, Uganda, Ruanda, Burundi, Djibuti, a Somália, o Quênia, a Tanzânia, o Malawi, a Zâmbia, Moçambique, o Zimbábue e Madagascar. Verde-escuro: Sul da África, que inclui a Namíbia, Botsuana, Eswatini, Lesoto e a África do Sul. A legenda conta, ainda, com setas mais ou menos espessas, indicando a quantidade de migrantes dentro da África, entre 20 e 50 pessoas; entre 50 e 100 pessoas; entre 100 e 250 pessoas; entre 250 e 500 pessoas; entre 500 e 1000 pessoas e mais de 1000 pessoas. As setas que indicam que há entre 20 e 500 migrantes vão do Sudão para o Egito, do Egito para a Líbia, da Mauritânia para o Senegal e vice-versa, da Guiné para a Gâmbia e Costa do Marfim, da Nigéria para outros países do oeste da África, de Angola para a Namíbia, de Malawi para a Zâmbia e de Angola, Moçambique, Zimbábue e diversos outros países do centro do continente para a África do Sul. As setas que indicam que há entre 500 e 1000 migrantes dentro da África vão do Sudão do Sul para o Sudão e da Costa do Marfim para Burkina Faso. As setas que indicam que há mais de 1000 migrantes vão de Burkina Faso para a Costa do Marfim e vice-versa. Na parte inferior, rosa dos ventos e escala de 0 a 695 quilômetros.

Elaborado com base em dados obtidos em: FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS; CENTRE DE COOPÉRATION INTERNATIONALE EN RECHERCHE AGRONOMIQUE POUR LE DÉVELOPPEMENT. Rural Africa in motion: dynamics and drivers of migration South of the Sahara. Roma: Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, 2017. página 23. Disponível em: https://oeds.link/Vd2j5c. Acesso em: 7 março 2022.

  1. O mapa mostra as migrações no interior da África e que há um grande fluxo populacional em direção à África do Sul. Levantem uma hipótese: O que explicaria essa movimentação?
  2. Pesquisem informações que possam explicar as causas das migrações no Sudão e redijam um breve texto sobre a situação atual desse país.
Cidaddania e Civismo.

O apartheid na África do Sul

Colonizada por holandeses desde o século dezessete, a porção sul da África teve uma história diferente do restante do continente. No início do século vinte, após duas guerras contra os holandeses (Guerras dos Bôeres), os africanos da região do sul da África tiveram suas terras conquistadas por britânicos que, reconciliando-se com os africânderes (descendentes dos holandeses), fundaram a União Sul-Africana, a qual passou a fazer parte da Commonwealthglossário em 1910.

A partir de então, brancos passaram a ter mais privilégios no país, enquanto negros e mestiços eram excluídos e só tinham acesso a 8% das terras, em geral as menos férteis e pobres em recursos minerais. Mas a situação pioraria.

Em 1948, o Partido Nacional ganhou as eleições. Convidado a compor o novo governo, o sociólogo rêndrik éf vervúerd criou, entre 1949 e 1953, um aparato legal para segregar os negros e mestiços, que ficou conhecido como apartheid. A legislação classificou os sul-africanos em brancos, mestiços, negros e indianos (pois muitos imigrantes indianos viviam no país) e segregou as etnias nativas. Estabeleceu acessos separados para negros nas escolas, praias, clubes, ônibus, universidades e outros espaços de convivência e proibiu os casamentos inter-raciais.

Bantustões

A legislação referente ao apartheid também estabeleceu áreas separadas dentro do território, chamadas bantustões, onde os não brancos deveriam viver. Para saírem dessas áreas e circularem nas cidades sul-africanas, os habitantes dos bantustões deveriam ter um passe especial.

Fotografia. Nesta fotografia, uma parte do andar térreo de um edifício de parede cinza tem duas portas de entrada, acessadas por escadas descendentes ladeadas por corrimões cinza escuro. Acima da porta da esquerda, há uma placa de fundo branco com o símbolo de uma pessoa, na cor cinza. Acima da porta da direita, há uma placa com fundo preto e o símbolo de uma pessoa, na cor branca. À esquerda dessa placa, há palavras em língua inglesa e em africâner, indicando tratar-se de um banheiro público. 
Um homem negro sobe a escada da esquerda, com a mão esquerda sobre o peito. Ele veste camisa verde de mangas longas e calça bege com um cinto marrom, leva um relógio no punho esquerdo e segura uma mala esportiva azul claro com alça laranja. À direita, um homem grisalho e branco é visto de costas. Ele veste casaco cinza, calça em bege-claro e sapatos escuros, e carrega um casaco escuro no braço esquerdo.
Banheiro público na Cidade do Cabo, na África do Sul, durante o regime do apartheid. Fotografia de 1985. Nas placas da fotografia, é possível observar a distinção do banheiro público para brancos e para negros.
Cidaddania e Civismo.

A resistência e o fim do apartheid

As primeiras manifestações contra as leis segregacionistas foram organizadas pelo Congresso Nacional Africano (cê êne á), partido político fundado em 1913 por ativistas negros e indianos. A partir de sua criação, o cê êne á passou a organizar vários atos de desobediência civil, como greves e manifestações.

No final da década de 1950, setores descontentes com a política do cê êne á fundaram o Congresso Pan-Africano (cê pê á). O novo partido defendia ações mais ostensivas contra o apartheid. Orientados pelo partido, os negros passaram a ocupar os lugares reservados aos brancos e a circular em áreas proibidas para eles. Em março de 1960, uma manifestação pacífica convocada pelo cê pê á contra a lei que obrigava os negros a portar um passe para circular nas ruas foi brutalmente reprimida pela polícia. O Massacre de Sharpeville, como ficou conhecido, resultou na morte de 69 manifestantes e na prisão das principais lideranças dos dois partidos.

Depois da tragédia de Sharpeville, o jovem advogado Nelson Mandela, um dos líderes do cê êne á e até então contrário à luta armada, convenceu-se de que era necessário radicalizar a resistência para derrotar o regime. Identificado em um protesto em 1962, Mandela foi detido, julgado e condenado à prisão. Dois anos depois, teve um novo julgamento e foi condenado à prisão perpétua.

A prisão de Mandela repercutiu no mundo todo. Por pressões da comunidade internacional, a África do Sul foi banida dos Jogos Olímpicos de 1972. Em 1989, o novo partido eleito prometeu formar um governo de conciliação. Em 1990, após forte pressão internacional, Mandela foi libertado. Em 1992, um plebiscito determinou o fim do apartheid e, no ano seguinte, Mandela foi eleito presidente da África do Sul.

Fotografia. Homem negro diante de púlpito, visto da cintura para cima, com o braço direito erguido e a mão direita fechada. Diante dele, há dois microfones; ele tem os cabelos grisalhos, veste camisa de gola branca, gravata cinza, colete preto e por cima, paletó em cinza. Em segundo plano, há diversas pessoas, desfocadas na fotografia.
Com o gesto tradicional do movimento negro, Nelson Mandela saúda os milhares de sul-africanos reunidos no estádio de souêto, na África do Sul, para celebrar a sua libertação, em fevereiro de 1990.
Ícone. Sugestão de livro.

gang seôn eun. Nelson Mandela, o prisioneiro mais famoso do mundo. Rio de Janeiro: Pallas, 2011. Este livro traz uma biografia bastante completa de Nelson Mandela.

Ícone. Sugestão de vídeo.

INVICTUS. Direção: clínt ístiud. Estados Unidos, 2009. Duração: 132 minutos Este filme aborda o desejo de Nelson Mandela em unir a África do Sul por meio do esporte, no período em que ele havia acabado de assumir a presidência do país.

Atividades

Faça as atividades no caderno.

1. Observe a charge a seguir.

Charge. Um mapa estilizado do continente africano está desenhado com uma linha vermelha sobre fundo verde-claro. Na região noroeste desse mapa estilizado, está escrita a palavra África, em língua húngara. No canto superior direito, com os pés descalços sobre a porção nordeste do mapa, existe a ilustração de uma pessoa negra, vestida com uma túnica branca e chapéu vermelho, varrendo do mapa três personagens de pele branca de chapéu com tecido protetor de pescoço, vestindo camisa de manga curta, bermuda, meia branca e sapatos esverdeados. Eles parecem assustados e são lançados como poeira pelo golpe da vassoura para fora da linha vermelha que delimita o continente. Há linhas escuras próximas à vassoura e aos personagens que são varridos do mapa, indicando movimento. A palavra guiarmat é varrida junto com os personagens. Ela é a palavra húngara para o termo colônia.
GIZI, Szego. Intenso outono de limpeza. 1960. Charge.

• Com base em seus conhecimentos, explique: Como foi representado nesta charge o processo de independência das colônias africanas?

  1. Explique a relação existente entre a independência da Argélia, no norte da África, e a debilidade dos impérios coloniais europeus após o fim da Segunda Guerra Mundial. Depois disso, compare a política do governo francês para a Argélia com a adotada para as suas colônias na África Ocidental.
  2. Redija um texto expositivo sintetizando a história do apartheid na África do Sul, desde a sua legalização e a organização da resistência contra o regime até a eleição de Nelson Mandela para a presidência da república do país.
  3. Leia o texto a seguir.

A negritude, aos meus olhos, não é uma filosofia. A negritude não é uma metafísica. A negritude não é uma pretensiosa concepção do Universo. É uma maneira de viver a história dentro da história; a história de uma comunidade cuja experiência parece, em verdade, singular, com suas deportações de populações, seus deslocamentos de homens de um continente a outro, suas lembranças distantes, seus restos de culturas assassinadas. reticências Vale dizer que a negritude, em seu estágio inicial, pode ser definida primeiramente como tomada de consciência da diferença, como memória, como fidelidade e como solidariedade.

cisérr eimí. Discurso sobre a negritude. Belo Horizonte: Nandyala, 2010.

  • Com base nos argumentos utilizados no texto, explique por que o movimento da negritude teve importância fundamental nas independências africanas.

5. Leia o texto a seguir e faça as atividades em grupo.

É muito difícil discordar que a Europa tem uma enorme dívida para com a África pela escravidão atlântica, pela partilha do continente e pelo colonialismo e suas heranças que constituem obstáculos para a construção de uma longa estrada de combate à miséria e às extremas desigualdades, assim como de enfrentamento dos vários conflitos presentes no continente.

HERNANDEZ, Leila Leite. A África na sala de aula: visita à história contemporânea. São Paulo: Selo Negro, 2005. página 69.

  1. Por que, segundo a autora, a “Europa tem uma enorme dívida para com a África”?
  2. Como seria possível “pagar” essa dívida?
  3. Qual é a posição da autora sobre as razões que explicam as desigualdades sociais e o quadro de pobreza extrema que caracterizam as condições de vida em grande parte do continente africano? Vocês concordam com ela? Com base no estudo feito neste Capítulo e nos conhecimentos que vocês já tinham sobre o assunto, formulem argumentos para defender sua posição, a favor ou contra a visão da autora.

CAPÍTULO 14 INDEPENDÊNCIAS NA ÁSIA

Como você já sabe, durante e após a Segunda Guerra Mundial, o domínio dos países europeus sobre regiões da África e da Ásia passou a ser duramente questionado pelos povos colonizados. Nesse cenário, surgiram movimentos nacionalistas de independência em ambos os continentes, que seguiram diferentes caminhos de libertação, conforme os fatores internos e externos predominantes em cada região.

Em algumas regiões da Ásia, o processo de retirada dos colonizadores ocorreu de modo mais pacífico, enquanto em outras, como na Palestina (que estudamos na Unidade cinco) e na Índia, a saída dos dominadores estrangeiros causou sérios conflitos pela posse dos territórios.

Algumas das independências foram negociadas, como em parte do Oriente Médio, mas muitas delas se deram por meio de guerras, como na Indonésia. Em alguns casos, como já estudamos, a interferência das duas superpotências da Guerra Fria no processo de libertação levou à divisão do território de alguns países, como ocorreu na Coreia e no Vietnã.

Na historiografia, esse processo ficou conhecido como descolonização. O termo passou a ser repensado recentemente pela teoria decolonial, que sustenta a ideia de que os diversos processos de emancipação se completam lentamente, em longo prazo, com a descolonização inclusive do pensamento, das visões de mundo e das experiências dos povos colonizados. Em relação à Ásia, especificamente, os estudos a partir da década de 1970 buscaram valorizar a participação ativa dos povos nativos na construção dos processos emancipatórios.

Fotografia em preto e branco. Em um local aberto, dezenas de pessoas sentadas seguram armas, pedaços de pau, apontados para cima, na posição vertical e cartazes. Em primeiro plano, homens de cabelos escuros, sendo que muitos usam chapéus de diferentes modelos e cores. Ao centro, um homem de chapéu branco, com instrumento circular na mão direita. Perto dele, outros usam roupa clara, e, mais à esquerda, um homem olha para frente, sorrindo.
Revolucionários indonésios em manifestação a favor da independência do seu país. Fotografia de cêrca de 1946.

Independências no Oriente Médio

Os processos de independência no Oriente Médio tiveram início ao final da Primeira Guerra Mundial. Com a derrota e a desagregação do Império Turco-Otomano após o conflito, grande parte dos seus domínios no Oriente Médio passou a ser administrada pela Grã-Bretanha e pela França. A Palestina e os atuais Iraque e Jordânia, por exemplo, tornaram-se áreas tuteladas pelos ingleses, enquanto a Síria e o Líbano ficaram subordinados à jurisdição francesa.

O processo de independência das nações do Oriente Médio ocorreu de fórma gradual. Teve início com a independência do Iraque em 1932 e do Egito em 1936, estendendo-se pela década de 1940.

A independência do Líbano se deu em 1943, quando dirigentes políticos libaneses foram libertados pelos franceses e a emancipação do país foi reconhecida. A Jordânia conquistou sua independência em 1946, ao ser assinado o Tratado de Londres entre o governo do Reino Unido e o governo de Abdulá primeiro. Nesse mesmo ano, as últimas tropas francesas se retiraram da Síria, selando a independência do país.

Com o início do processo de independência dos Estados Árabes, principalmente a partir da década de 1940, a insistência das potências mandatárias em se manter na região gerou um ambiente de instabilidade. As disputas entre os principais atores regionais e a transição da ordem mundial da multipolaridade para a bipolaridade trouxe novos atores à cena, sendo França e Reino Unido substituídos pelos Estados Unidos e a União Soviética.

reticências em 10 de maio de 1945, a Liga Árabe é formalmente criada. Ela reticências desempenharia papel relevante como veículo para cooperação nos campos político, econômico e cultural nas relações inter-árabes.

zaredine, Danny; TEIXEIRA, Rodrigo Corrêa. A ordem regional no Oriente Médio 15 anos após os atentados de 11 de Setembro. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, volume 23, número 53, março 2015. página 77-78.

Em 1948, Egito, Líbano, Síria, Jordânia e Iraque, membros da Liga Árabe, aliaram-se na guerra contra o recém-criado Estado israelense, inaugurando os intensos conflitos no Oriente Médio em torno da Questão Palestina.

Fotografia. Vista do alto de uma sala com paredes claras e detalhes em marrom, e carpete verde. Ao centro, diversas figuras geométricas nas cores bege e verde formam um grafismo que lembra uma flor. Ao redor desse grafismo circular, mesas e cadeiras, algumas vazias e outras ocupadas por homens e mulheres com trajes diversos, estão dispostas em formato de círculo. No centro da fotografia, há uma mesa menor, atrás da qual estão sentados dois homens voltados para a frente. Atrás deles, outra mesa em bege claro, mais alta do que as demais, é ocupada por três homens, que parecem dirigir a reunião. Atrás deles, no fundo da sala, há dois conjuntos simétricos de mastros com bandeiras, que ladeiam um brasão, localizado bem ao centro da parede que fica atrás das bandeiras. Nessa parede, à esquerda e à direita, há dois televisores.
Reunião da Liga Árabe, em 8 de fevereiro de 2021.

A Índia e a desobediência civil

A região correspondente aos atuais Paquistão, Bangladesh, Mianmar e Índia foi, durante a era moderna, alvo de disputas territoriais e comerciais entre portugueses, holandeses e ingleses. No século dezoito, essa área foi dominada pela Companhia Britânica das Índias Orientais e, a partir de 1858, a Coroa britânica assumiu o contrôle do território.

Com o avanço da industrialização na Inglaterra, a Índia se transformou em um grande mercado consumidor para os produtos têxteis ingleses. Incapaz de concorrer com a indústria britânica, que produzia tecidos muito mais baratos, a tradicional produção têxtil indiana entrou em colapso.

A oposição ao domínio colonial britânico era realizada pelo Partido do Congresso, fundado em 1885 por membros da elite intelectual indiana. Nos primeiros anos do século vinte, o movimento pela independência da Índia passou a ser liderado por morrandas caramchând gândi, que ficou conhecido como Marrátma (“grande alma”). Gandhi formou-se em Direito na Grã-Bretanha e viveu um tempo na África do Sul, onde trabalhou como advogado.

Ao conhecer de perto a segregação racial no país africano, Gandhi experimentou na prática os princípios da resistência pacífica e da desobediência civil. Ao retornar à Índia, ele se tornou um dos principais líderes do Partido do Congresso, fazendo a defesa dos princípios de não violência.

Fotografia em preto e branco. Ao centro, sobre uma base escura em formato de paralelepípedo, há uma toalha clara. Em cima dela, está um homem sem cabelos, um colar que chega até a sua cintura, vestido apenas com uma túnica branca que cobre o quadril e parte das pernas.  Ele está sentado com as pernas cruzadas e tem uma expressão serena, demonstrando calma e tranquilidade. Dois homens sentados no chão, com roupas brancas, estão à frente da plataforma. Um deles olha para o homem sobre a plataforma e tem, diante dele, uma planta, enquanto o outro, que usa um chapéu branco, olha para a frente. Ladeando a plataforma, há dois homens em pé. Um deles, à direita, veste bermuda e camisa de mangas curtas claras e um turbante escuro. O homem da esquerda usa camisa e calça escura e um turbante claro. Atrás desta cena, há dezenas de pessoas com trajes diversos.
Marrátma Gandhi em Madras, na Índia. Fotografia de cêrca de 1915.

Ler a fotografia

• Observe a fotografia e elabore uma descrição para ela, relacionando a postura e a imagem de Gandhi aos princípios de não violência que ele defendia.

Ícone. Sugestão de livro.

GANDHI, Arun. A virtude da raiva: E outras lições espirituais do meu avô Marrátma Gandhi. São Paulo: Editora Sextante, 2018. Escrito pelo neto de Marrátma Gandhi, o livro trata de ensinamentos transmitidos por seu avô sobre como usar a raiva com sabedoria e a prática da não violência.

A conquista da independência e os conflitos internos

Uma das maiores mobilizações lideradas por Gandhi foi a Marcha do Sal, em 1930, realizada em protesto contra as leis que proibiam os indianos de produzir o próprio sal. Empregando mais uma vez o princípio da resistência pacífica, Gandhi percorreu durante cêrca de 24 dias quase 400 quilômetros em direção ao mar, atraindo, durante a caminhada, milhares de seguidores. cêrca de 50 mil pessoas foram presas no protesto sem reagir à violência policial.

Ao encerrar a Segunda Guerra Mundial, o enfraquecido Império Britânico já não podia atender às reivindicações dos colonos nem suportar a pressão realizada pelos movimentos de emancipação. Em agosto de 1947, a independência indiana foi finalmente reconhecida.

Após a independência, conflitos entre hindus e muçulmanos levaram à divisão do país em dois Estados independentes: a Índia, de maioria hindu, e o Paquistão, de maioria muçulmana. O Paquistão ficou dividido em duas partes, uma oriental e outra ocidental, muito distantes uma da outra.

Mesmo separados, os dois países continuaram em conflito. Em 1971, o governo indiano apoiou a separação do território oriental do restante do Paquistão. O novo país passou a se chamar Bangladesh.

As tensões entre indianos e paquistaneses agravaram-se ao longo dos anos, sobretudo em razão da disputa pela Caxemira, região de maioria muçulmana que abriga as nascentes dos rios Ganges e Indo, principais fontes de recursos hídricos dos dois países. Atualmente, a região encontra-se dividida entre a Índia, o Paquistão e a China.

A divisão da Índia

Mapa. A divisão da Índia. Legenda: Lilás: Região disputada por Índia, Paquistão e China Laranja-claro: Território da Índia após 1947 Linha em cinza na horizontal: Limites políticos atuais Linha grossa em marrom: Fronteiras da Índia até 1947 A região disputada pela Índia, pelo Paquistão e pela China é a Caxemira, um território que faz fronteira com esses três países. Até 1947, o território da Índia incluía o Paquistão, a Caxemira e Bangladesh, regiões que se separaram da Índia após 1947, formando novos países. A exceção é a Caxemira, que atualmente não é um país soberano e cujo território está dividido entre a China, o Paquistão e a Índia. Na parte inferior, à esquerda, rosa dos ventos e escala de 0 a 375 quilômetros.

Elaborado com base em dados obtidos em: CHALIAND, Gérard; RAGEAU, jân piérr. Atlas politique du XXe siècle. Paris: Seuil, 1988. página 154.

Ícone. Ilustração de um recipiente de base circular, com duas hastes laterais e grafismos coloridos, indicando a seção Lugar e cultura.

Lugar e cultura

Multiculturalismo

Cultura e identidade na Índia

O dia do nascimento de Gandhi, 2 de outubro, é feriado na Índia. Na ocasião, todos os anos, homenagens e preces ao líder da independência acontecem por todas as partes do país. Em escolas, universidades e sédes dos governos de todas as cidades há comemorações, cerimônias, palestras e discursos enfocando sua memória e a não violência. Cinemas exibem filmes biográficos sobre o líder e diversas instituições culturais realizam exposições de arte sobre a independência da Índia e a participação de Gandhi nesse processo.

Além disso, monumentos e estátuas em homenagem a Gandhi são decorados com flores e enfeites. Grande parte da população evita o uso de bebidas alcoólicas nesse dia. A data é tão significativa que, em 2007, a Assembleia Geral das Nações Unidas declarou o dia 2 de outubro como o “Dia Internacional da Não Violência”.

Fotografia. Vista de uma área aberta com árvores e céu azul. Em destaque, há uma grande estátua de um homem sem cabelos, com óculos de grau, vestido com uma túnica. Ele está sentado com as pernas cruzadas, voltado para a esquerda. A estátua está enfeitada com um longo colar laranja, verde e amarelo. A plataforma sobre a qual repousa a estátua também está decorada com enfeites em laranja. À frente dessa plataforma há uma outra, maior, cerca de dois palmos mais baixa, sobre a qual há flores laranja. Diante dessa plataforma mais baixa, há cerca de seis pessoas, homens e mulheres voltados para a estátua. Uma das mulheres tem cabelos pretos, e usa blusa de mangas compridas marrom, e tem as mãos para frente de gesto de reza. Ao lado dela, enfileirados diante da plataforma, há homens de blusas brancas de mangas compridas que estão com os braços erguidos e para a frente, em direção à estátua.
Pessoas prestam homenagem a Marrátma Gandhi, em bubânes uár, na Índia, no Dia Internacional da Não Violência, também data de seu aniversário, comemorado em 2 de outubro. Fotografia de 2021.
  1. Mais do que uma data cívica oficial, o dia 2 de outubro parece ter um significado especial e profundo para o povo indiano. Com base em seus conhecimentos, na fotografia e nas informações desta seção, explique por que isso acontece.
  2. Você consegue se lembrar de alguma data cívica brasileira que seja comemorada de fórma semelhante ao 2 de outubro indiano?

A Indonésia: de colonizada a colonizadora

A Indonésia é o maior arquipélago do mundo. Colonizada por holandeses no século dezessete, a região foi ocupada por fôrças japonesas em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial. Interessado nos recursos naturais do arquipélago, o Japão aproveitou a fragilidade da Holanda, ocupada pela Alemanha nazista, e invadiu o território.

A ocupação japonesa despertou o nacionalismo indonésio. Com os dois países debilitados pela guerra, a população indonésia teve a oportunidade de conquistar sua independência em 19 de agosto de 1945, dez dias após a explosão da bomba atômica em Nagasaki, no Japão.

Com o fim da guerra, os holandeses tentaram recuperar sua antiga colônia. Apoiados pelos Estados Unidos e pela Grã-Bretanha, eles invadiram o território indonésio, desencadeando uma guerra que se prolongou por quatro anos. No final, os holandeses reconheceram a independência da Indonésia e retiraram suas tropas do arquipélago.

Timor Leste

A Ilha de Timor (observe o mapa a seguir) começou a ser colonizada, no século dezesseis, por Portugal, interessado nas especiarias da região. No século dezenove, Portugal e Holanda dividiram a ilha. A parte leste ficou com os portugueses e recebeu o nome de Timor Português.

A declaração da independência do Timor Português, em 1975, pouco mais de um ano após a Revolução dos Cravos, teve como resposta a invasão da ilha pelo exército indonésio. Seguiu-se um período de violenta repressão à resistência local. Além disso, interessado em destruir a identidade cultural do povo timorense, o governo indonésio proibiu o ensino do português nas escolas do Timor.

A ocupação se prolongou até 1999, quando a população timorense, no referendo popular organizado pelos governos de Portugal e da Indonésia, decidiu pela independência. Os conflitos, porém, não haviam terminado. Milícias pró-Indonésia espalharam o terror e a destruição pela ilha, obrigando a ônu a intervir com uma fôrça internacional de paz. Em 2002, a ônu transferiu o contrôle do país a um governo eleito democraticamente.

Indonésia e Timor Leste

Mapa. Indonésia e Timor Leste.
O mapa não apresenta legenda.
Em verde, estão destacados os territórios da Indonésia, com capital em Jacarta e tendo Bandung como uma das cidades importantes do arquipélago. Em vermelho, está destacado o Timor Leste, com capital em Dili.
Na parte inferior direita, rosa dos ventos e escala de 0 a 400 quilômetros.

Elaborado com base em dados obtidos em: FERREIRA, Graça M. Lemos. Atlas geográfico: espaço mundial. quintaedição São Paulo: Moderna, 2019. página 95.

A conferência de Bandung

Em abril de 1955, foi realizada na Indonésia a Conferência de Bandung. Participaram dessa reunião 23 países asiáticos e 6 africanos. Os principais propósitos da reunião eram consolidar uma nova fôrça política global, o chamado Terceiro Mundo, e promover a cooperação econômica e cultural entre a Ásia e a África.

Diante da polarização do mundo pela Guerra Fria, Bandung fez surgir uma nova estratégia dos países recém-independentes ou que lutavam pela independência, baseada no neutralismo em relação aos blocos de poder existentes, criando o movimento dos países não alinhados.

O Movimento dos Não Alinhados (ême êne á) defendia uma postura anticolonialista, baseada no nacionalismo afro-asiático, e repudiava a inserção na lógica bipolar das duas superpotências – Estados Unidos e União Soviética.

Fotografia em preto e branco. Em um local de paredes claras, há várias fileiras de mesas e cadeiras, ocupadas por centenas de pessoas, voltadas para a esquerda. Há homens de camisa de mangas compridas, casaco, olhando para frente, à esquerda. Na ponta da esquerda, um homem de cabelos escuros, apoia o queixo sobre a mão esquerda, e o cotovelo sobre a mesa. Na parte superior, há um balcão sobre colunas arredondadas, no qual várias pessoas, em pé ou sentadas, acompanham o evento.
Representantes de países asiáticos e africanos se reúnem na Conferência de Bandung, Indonésia, em 1955.

Os dez princípios de Bandung

1) Respeito aos direitos fundamentais, de acordo com os fins e os princípios da Carta das Nações Unidas;

2) Respeito à soberania e integridade territorial de todas as nações;

3) Reconhecimento da igualdade de todas as raças e de todas as nações, grandes e pequenas;

4) Não intervenção e não ingerência nos assuntos internos dos demais países;

5) Respeito do direito de cada nação a defender-se, individual e coletivamente, de acordo com a Carta das Nações Unidas;

6) Rejeição do recurso aos acordos de defesa coletiva destinados a servir os interesses particulares das Grandes Potências, sejam quais sejam elas;

7) Abstenção de atos ou de ameaças de agressão ou do emprego da fôrça contra a integridade territorial ou a independência política de um país;

8) Solução de todos os conflitos por meios pacíficos, tais como a negociação ou a conciliação, a arbitragem, ou o recurso perante os tribunais, assim como outros meios pacíficos que possam adotar os países interessados, de conformidade com a Carta das Nações Unidas;

9) Fomento dos interesses mútuos e da cooperação;

10) Respeito da justiça e das obrigações internacionais.

BISSIO, Beatriz. De Bandung aos bríquis: continuidade ou ruptura? 37º Encontro anual da anpócs – 2013, Águas de Lindoia, 2013. Anais dos encontros. Disponível em: https://oeds.link/lLBRM2. Acesso em: 28 abril 2022.

Desdobramentos de Bandung

A Conferência de Bandung foi considerada um marco nas relações internacionais por discutir os problemas dos países que haviam ficado na esfera do imperialismo europeu e firmar um compromisso entre esses países de apoio à luta pela liberdade e soberania dos povos, o que contribuiu para a liquidação dos impérios coloniais que ainda persistiam na África.

Bandung também consagrou a expressão Terceiro Mundo, que denotava um registro de identidade naquele momento histórico e mostrava a explícita intenção dos países pobres de não se alinharem aos grandes interesses estadunidenses e soviéticos, predominantes no cenário internacional.

A reunião procurou definir novas relações de fôrça entre o Terceiro Mundo e os dois blocos hegemônicos. E, a partir dos anos 1960, o Terceiro Mundo passou a ter significação política na ônu e fez realçar as suas dificuldades e aspirações no sentido de ajudar os países economicamente dependentes a se desenvolverem.

Bandung criou o conceito de conflito Norte-Sul, expressão de um mundo dividido entre países ricos e industrializados e países pobres e exportadores de produtos primários. Contudo, em relação à reconstrução econômica e ao desenvolvimento, poucos avanços foram alcançados.

Outra proposta da conferência que não foi efetivada diz respeito à criação de um Tribunal da Descolonização, que julgaria práticas imperialistas, vistas como um crime contra a humanidade.

Fotografia em preto e branco. Três homens conversam. Dois deles estão sentados em cadeiras estofadas de cor clara. O homem sentado na cadeira da esquerda usa uma camisa clara, fechada até o pescoço, e um lenço branco na cabeça. Ele está voltado para o lado direito da foto, e olha para o homem que está sentado na outra cadeira. Este tem os cabelos e uma barbicha escuros, tem um chapéu preto sobre a cabeça e um paletó claro. Ele está voltado para a esquerda da fotografia. Entre eles, um terceiro homem, voltado para o de barbicha, em posição de fala. Ele apoia seus braços sobre as duas cadeiras, e encosta o dedo mínimo da mão esquerda no peito do homem de barbicha. Ele usa um casaco escuro e um chapéu claro. Diante deles, há objetos desfocados sobre a mesa. Atrás deles, há cortinas escuras, igualmente desfocadas.
Representantes da Índia, da Birmânia e da Indonésia conversam durante a Conferência de Bandung, Indonésia, em 1955.

Atividades

Faça as atividades no caderno.

  1. Observe o mapa “A divisão da Índia”, apresentado anteriormente, para responder às questões.
    1. Identifique o conflito político e religioso que levou à divisão territorial representada no mapa.
    2. Que dificuldades demográficas essa divisão causou para quem vivia no território?
    3. Como é a relação entre os dois Estados atualmente? Ainda há conflitos entre eles?
  2. Explique o significado do termo “descolonização” no contexto histórico estudado neste Capítulo e como ele tem sido repensado.
  3. Descreva e avalie a situação política do Oriente Médio entre 1919 e 1949.
  4. Leia o texto a seguir e responda às questões.

A não violência é a maior fôrça e a mais ativa do mundo. Não se pode ser passivamente não violentoreticências Uma pessoa que sabe expressar ahimsa (não violência) em sua vida exerce uma fôrça superior a todas as fôrças da brutalidade. reticências

Uma lei injusta é uma espécie de violência. Prender alguém por causa da infração dessa lei injusta é, ainda mais, um ato de violência. Ora, a lei da não violência declara que se deve resistir à violência não por uma oposição violenta, mas pela não violênciareticências Isso eu faço, infringindo as leis e submetendo-me pacificamente à detenção e à prisão.

GANDHI, Marrátma apud MARQUES, Adhemar; BERUTTI, Flávio; FARIA, Ricardo. História do tempo presente. segunda edição São Paulo: Contexto, 2009. página 55-57.

  1. Quais são os princípios defendidos pelo autor do texto?
  2. Escreva um parágrafo expondo sua opinião sobre a utilização desses princípios como estratégia política.
  1. A Indonésia foi colonizada por dois países, em períodos diferentes. Quais eram os interesses de cada um deles na colonização da Indonésia?
  2. Leia o texto a seguir, sobre a Liga Árabe, e responda às questões.

A 22 de março de 1945, então, os representantes da Síria, Egito, Líbano, Transjordânia, Iraque, Arábia Saudita e Iêmen anunciaram a criação de um “pacto de solidariedade”. Outros países seriam convidados a integrar a aliança, assim que conquistassem sua independência.

O grupo, entretanto, enfrentou divergências internas. A Síria e o Iraque defendiam a formação de uma unidade política. A Síria ainda não via no Líbano uma nação soberana, enquanto os libaneses brigavam entre si pela conquista do poder. Já a Arábia Saudita e o Iêmen tinham muitas afinidades, mas desenvolveram características próprias que os distanciaram entre si.

reticências

O Egito, por exemplo, foi expulso da aliança em 1979, depois de assinar o acordo de paz com Israel em Camp David. A partir daí, a organização transferiu sua séde do Cairo para a Tunísia. Somente alguns anos mais tarde, com a reconciliação, retornaria à capital egípcia.

píter fílip. 22 de março de 1945. Deutsche Welle, sem local, 22 março 2017. Disponível em: https://oeds.link/kiR64Q. Acesso em: 7 março 2022.

  1. Retomando o que você aprendeu neste Capítulo, qual seria o objetivo dos países que fundaram a Liga Árabe?
  2. Quais eram as divergências internas no grupo?
  3. Faça uma pesquisa na internet e registre no caderno: Quais são as principais linhas de atuação da Liga Árabe hoje?
  1. Algumas décadas após declarar sua independência, a Indonésia iniciou a colonização de outra região. Mencione qual foi ela e quais fatores contribuíram para esse processo.
  2. Responda: Em que consistiu a Conferência de Bandung?
Ícone. Ilustração de cabeça humana com engrenagem cinza no lugar do cérebro, que se conecta com outra engrenagem menor e azul, indicando a seção Para refletir.

Para refletir

Economia.

Os processos de independência política da África foram acompanhados de autonomia econômica?

Praticamente todos os países africanos tornaram-se independentes politicamente de suas metrópoles europeias entre as décadas de 1950 e 1960. A exceção foram as colônias que pertenciam a Portugal: elas obtiveram a independência na década de 1970.

Você já sabe que as décadas de imperialismo europeu no continente africano deixaram heranças muito negativas para a África como um todo. Algumas delas persistem entre os povos africanos até hoje, como a falta de infraestrutura, a baixa qualidade de ensino (voltado principalmente para os valores ocidentais) e a falta de incentivos ao desenvolvimento econômico interno.

Quando identificamos esse legado como fruto do imperialismo, é inevitável pensar sobre a situação econômica da África no pós-independência. Afinal, o que a independência política foi capaz de fazer pelas economias africanas? Tornar-se independente politicamente significa obter uma rápida melhoria nas condições de vida dos habitantes de um país? Os processos de independência política da África garantiram, também, sua autonomia econômica? Reflita sobre essas questões com base nos trechos a seguir.

Fotografia. Vista aérea de duas áreas ocupadas por residências e divididas por uma faixa de vegetação. À esquerda, há inúmeras casas de tamanho pequeno; algumas têm telhado marrom; outras são ainda menores, cujos telhados lembram o topo de barracos. Não há muitas áreas de vegetação, as ruas são estreitas ou, mesmo, impossíveis de serem vistas do alto de tão estreitas que são. À direita, há casas maiores, algumas com dois pavimentos; em alguns terrenos, é possível ver piscinas. As ruas são mais largas, e há grama e árvores pelos quarteirões.
Moradias populares em Luanda, capital de Angola. Fotografia de 2019.

Trecho 1

A indústria dos países mais avançados, como Estados Unidos, França e Inglaterra, havia tomado impulso após a Segunda Guerra Mundial como um salto no aperfeiçoamento tecnológico e um decorrente aumento na produtividade. Com a ampliação dos mercados de consumo de bens industrializados, que veio associada à expansão e barateamento da produção, a África era um mercado promissor. A Inglaterra e a França, as duas potências coloniais da época, amadureciam o projeto de deixar de atuar como administradores diretos de suas colônias, mantendo o contrôle sobre as relações comerciais e extrativistas que lá tinham. Por outro lado, cresciam os movimentos de libertação de movimentos africanos, que uniam populações urbanas e rurais, litorâneas e do interior, assim como intelectuais de dentro e de fóra do continente.

reticências A retirada dos administradores coloniais reticências não significou a retirada dos comerciantes e interesses econômicos estrangeiros. reticências

reticências As economias [africanas] se endividaram com os empréstimos feitos para a montagem de uma infraestrutura modernizadora. reticências a produção interna foi ainda mais enfraquecida diante da oferta de mercadorias importadas, de baixa qualidade e que reforçavam a dependência do exterior.

SOUZA, Marina de Mello e. África e Brasil africano. São Paulo: Ática, 2006. página 165-168.

Trecho 2

reticências o capitalismo ocidental não sofrera com a descolonização política da África, na [medida] que este processo não se acompanhou de uma descolonização econômica. A história mostrou que ao capitalismo internacional não [...] era imprescindível plantar pavilhões imperiais, em impérios territoriais, para poder alimentar-se da substância de outras sociedades, ele é perfeitamente capaz de parasitá-los, sem erguer a bandeira nacional.

tchínueizu. A África e os países capitalistas. In: MAZRUI, Ali A. (edição). História Geral da África, oito: África desde 1935. segunda edição Brasília, Distrito Federal: unêsco, 2010. página 962.

  1. A autora do trecho 1 aborda o momento imediatamente anterior às independências políticas dos países africanos. O que ela quis dizer ao afirmar que “a África era um mercado promissor”?
  2. Qual passou a ser o “projeto” das potências, como Inglaterra e França, para o continente africano logo depois da Segunda Guerra Mundial?
  3. Que interesses econômicos permaneceram na África após as independências políticas? E o que ocorreu, de modo geral, com as economias africanas após o processo de independência?
  4. Agora, com base em seus conhecimentos de História, nas informações desta seção e na leitura atenta do trecho 2, escreva uma pequena redação para desenvolver a seguinte questão: Os processos de independência política da África foram acompanhados de autonomia econômica? Compartilhe a redação com os colegas e o professor.

Glossário

Commonwealth
Organização de Estados independentes, em sua maioria ex-colônias britânicas, que tem como chefe de Estado a rainha da Inglaterra.
Voltar para o texto