UNIDADE um A REPÚBLICA CHEGA AO BRASIL

Fotografia em preto e branco. Vista elevada em diagonal, com uma rua ao centro e edifícios nas laterais direita e esquerda. No primeiro plano, pessoas caminham pela calçada e pela rua, ao lado de um bonde puxado por dois muares. Há uma fileira de árvores de médio porte delimitando os espaços da rua e da calçada. Há trilhos de bondes ao longo da rua. Em segundo plano, na extensão da rua, vê-se bondes e charretes. As pessoas estão vestidas com roupa escura e chapéu, algumas com guarda-chuva. À esquerda da imagem edificações de quatro andares, algumas com balcões, onde se notam flores, toldos e bandeiras. Ao fundo e no alto, um pedaço do céu claro.
Rua Primeiro de Março, uma das principais ruas do centro da cidade do Rio de Janeiro. Fotografia de Augusto Malta, década de 1910.

Você estudará nesta Unidade:

O processo de instauração da República no Brasil

Os mecanismos de dominação dos grupos oligárquicos estaduais durante a Primeira República

Conflitos no campo e movimentos urbanos nos primeiros anos da República

Imigração, industrialização e urbanização na Primeira República

O movimento modernista

Respostas e comentários

Apresentação

A primeira Unidade deste volume, “A República chega ao Brasil”, relaciona-se à seguinte Unidade Temática da Bê êne cê cê do 9º ano: O nascimento da República no Brasil e os processos históricos até a metade do século vinte.

Em consonância com as Competências Gerais da Educação Básica número 1, número 3 e número 6, os conteúdos trabalhados nesta Unidade buscam levar o estudante a valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade reticências (1) e valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais reticências (3). Além disso, o estudante é incentivado a valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho reticências (6).

Além disso, em consonância com as Competências Específicas do Componente Curricular História número 1, número 4 e número 6, os conteúdos trabalhados nesta Unidade pretendem levar o estudante a compreender acontecimentos históricos e relações de poder e processos reticências (1), identificar interpretações que expressem visões de diferentes sujeitos, culturas e povos com relação a um mesmo contexto histórico reticências (4) e compreender e problematizar os conceitos e procedimentos norteadores da produção historiográfica (6).

Fotografia em preto e branco. Vista elevada de rua que ocupa o centro da imagem. A rua é delimitada, à esquerda, por construções de dois pavimentos, com muitas portas e janelas, e à direita por um canteiro de obras. Próximo ao canteiro de obras, há muitos objetos empilhados, e pessoas trabalhando. Em primeiro plano, alguns homens carregam mercadorias, vestidos com roupas claras e escuras, com chapéu ou boné. À esquerda, estacionadas ao longo da lateral do edifício, vê-se charretes de transporte de carga atreladas a muares. Em segundo e terceiro planos, ao longo da extensão da rua, pessoas carregam mercadorias em pequenas carroças puxadas à mão. No balcão de uma das construções, no primeiro pavimento, duas pessoas observam o movimento da rua. Ao fundo, mais construções de pequeno porte e céu claro.
Rua da Carioca, na cidade do Rio de Janeiro. Fotografia de Augusto Malta, 1905. Coleção particular.
Fotografia em preto e branco. Em um local aberto, ao fundo, uma casa pequena e baixa com paredes de madeira, telhado triangular, com uma porta e duas janelas. Há sete pessoas negras na fotografia: duas crianças, duas mulheres e três homens, que estão parados observando o fotógrafo. Ao chão, próximo à casa, vê-se um cesto, pedaços de madeira e dois cachorros deitados. Nos arredores da casa nota-se algumas arvores e chão de terra batida.
Barraco às margens da Lagoa Rodrigo de Freitas, na cidade do Rio de Janeiro. Fotografia de Augusto Malta, 1922. Museu da Imagem e do Som, Rio de Janeiro.

Em 15 de novembro de 1889, um movimento liderado por militares decretou o fim da Monarquia e o início de uma nova fórma de governo no Brasil, a República.

A mudança na fórma de governo, contudo, não alterou substancialmente a sociedade brasileira. Enquanto os grandes proprietários de terra, principalmente os produtores de café, mantinham seu poder e seus privilégios, a maior parte da população permanecia excluída da vida política. No entanto, trabalhadores urbanos e rurais não deixaram de se mobilizar em busca de melhores condições de vida.

O que você conhece sobre esse período da história do Brasil? O que já sabe sobre a Política dos Governadores, os movimentos messiânicos, a greve de 1917, o Modernismo?

Respostas e comentários

Nesta Unidade

Esta Unidade apresenta aspectos da construção da República no Brasil. Foi em 15 de novembro de 1889 que um movimento liderado por militares concretizou aquilo que parecia inevitável: o fim da Monarquia. O imperador, intimado a deixar o país, acabou substituído por uma junta provisória de governo. Contudo, com a República, o poder político no Brasil continuou monopolizado por uma aristocracia latifundiária, na qual o grupo hegemônico era formado principalmente por cafeicultores do Oeste Paulista. Seriam eles, aliados aos militares, os responsáveis pelos primeiros governos republicanos no país.

Objetos de conhecimento trabalhados na Unidade

Experiências republicanas e práticas autoritárias: as tensões e disputas do mundo contemporâneo.

A Proclamação da República e seus primeiros desdobramentos.

A questão da inserção dos negros no período republicano do pós-abolição.

Os movimentos sociais e a imprensa negra; a cultura afro-brasileira como elemento de resistência e superação das discriminações.

Primeira República e suas características.

Contestações e dinâmicas da vida cultural no Brasil entre 1900 e 1930.

Anarquismo e protagonismo feminino.

CAPÍTULO 1   UMA REPÚBLICA EM CONSTRUÇÃO

A república, como fórma de governo, nasceu na Roma Antiga. Com ela, surgiu a noção de um governo considerado res publica (“coisa pública”), que deveria servir aos interesses dos cidadãos.

Com a Revolução Francesa, no final do século dezoito, o conceito de república se uniu às ideias de liberdade e democracia. A construção do regime republicano passou a ser associada aos direitos civis e políticos conquistados pelos revolucionários franceses.

No Brasil, a república surgiu como resultado de uma aliança entre setores do Exército e das elites econômicas e políticas do país no final do século dezenove. Nossa República foi estabelecida para atender aos interesses de uma pequena elite dominante.

Desde o início, o uso da “coisa pública” – ou seja, do Estado – em benefício de interesses privados e em prejuízo da coletividade marcou a nossa República. Os escândalos de corrupção ou relacionados ao descaso dos representantes do Estado com os serviços públicos, por exemplo, representam apenas uma parte dos problemas da República brasileira, reduzida de seu sentido público.

Fotografia. Vista parcial de um local aberto. Em primeiro plano e espalhadas por toda a extensão do lugar, centenas de pessoas segurando faixas e cartazes erguidos. Ao centro, uma grande faixa branca, onde está escrito: NAS REDES NAS RUAS – PASSE LIVRE JÁ! À esquerda, ao fundo, árvores altas com folhagem verde. À direita, ao fundo, prédios de tamanhos diversos em tons de bege, amarelo e azul-claro. No alto, também ao fundo, céu azul-claro e nuvens brancas esparsas.
Em junho de 2013, ocorreu uma série de manifestações em várias cidades brasileiras contra o aumento das tarifas do transporte coletivo, que logo se transformou em um movimento geral por melhorias nos serviços públicos, por mais justiça social e pela ética na política. Na fotografia, manifestação na cidade de Belém, Pará.
Respostas e comentários

Sobre o Capítulo

Neste Capítulo, ao conhecer as características do regime republicano que foi implementado no Brasil, os estudantes podem vir a compreender alguns aspectos da vida pública brasileira atual, como a prática do clientelismo e da compra de votos. Ao mesmo tempo, é interessante destacar aos estudantes que, enquanto o processo que inaugurava a República no Brasil tomava fórma, a população permanecia alijada da participação política: o movimento republicano não havia dado a ela o direito de atuar na vida pública, apenas de comportar-se como plateia naquele teatro político. Os conflitos, como veremos ao longo deste Capítulo e também do próximo, não tardaram a surgir.

Habilidades trabalhadas ao longo deste Capítulo

ê éfe zero nove agá ih zero um: Descrever e contextualizar os principais aspectos sociais, culturais, econômicos e políticos da emergência da República no Brasil.

ê éfe zero nove agá ih zero dois: Caracterizar e compreender os ciclos da história republicana, identificando particularidades da história local e regional até 1954.

Observação

Os conteúdos desta página possibilitam o início do trabalho de desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um.

Orientações

O estudo da palavra “república” é um primeiro passo para a compreensão dos temas deste Capítulo e desta Unidade como um todo. Com base nesse conceito, é possível orientar os estudantes a identificar as semelhanças e as diferenças entre o regime monárquico no Brasil e o regime republicano entre 1889 e 1930, comparando a estruturação do governo e os grupos sociais hegemônicos em cada período.

A emergência da república

Antes da independência do Brasil, muitos grupos sociais já defendiam a implantação de uma república. De maneira difusa, a proposta republicana apareceu, por exemplo, nas rebeliões coloniais do século dezoito, nas Conjurações Baiana e Mineira e na Revolução Pernambucana de 1817. Mas apenas no século dezenove, com a expansão da lavoura cafeeira e a formação de uma rica camada de fazendeiros no Sudeste, o projeto republicano ganhou fôrça no país.

O acontecimento que assinalou a arrancada desse movimento no Brasil foi a publicação do Manifesto Republicano, em 1870. Nele, seus adeptos criticavam o caráter centralizador e hereditário da monarquia e defendiam o princípio federativo do regime republicano.

Havia divergências entre os republicanos. O grupo dominante, liderado pelo jornalista Quintino Bocaiuva, pregava que a república deveria ser instalada sem agitações sociais que ameaçassem a ordem estabelecida. Outros, como o advogado Silva Jardim, criticavam as propostas republicanas conservadoras e defendiam uma mobilização popular para derrubar a Monarquia.

Charge em preto e branco. Cena em ambiente fechado. Em primeiro plano, ao centro da imagem, um homem adulto, de cabelos brancos, barba branca volumosa, veste roupa de mangas compridas, manto longo, dos ombros até os pés, e tem uma coroa sobre a cabeça. Ele é derrubado de uma poltrona, empurrada por trás por outro homem. Com a queda, ele abre a mão e solta um papel com letras pretas, em que pode-se ler "Fala do trono". O homem que empurra a poltrona é adulto, calvo, possui bigode e barbicha, um par de óculos de grau, casaca abotoada e calça branca. Ao fundo, por trás de uma longa cortina, nota-se silhuetas de pessoas que observam a cena com interesse e espanto.
AGOSTINI, Angelo. Dom Pedro segundo sendo derrubado do trono pelos republicanos. 1882. Charge publicada na Revista Ilustrada. Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro.
Ícone. Sugestão de site.

MUSEU da República. Disponível em: https://oeds.link/fizIg7. Acesso em: 28 fevereiro 2022. Criado em 1960 e localizado na cidade do Rio de Janeiro, o museu guarda peças e documentos relativos à história da República no Brasil. No site há fotografias do acervo e é possível fazer uma visita virtual ao local.

Respostas e comentários

Orientações

Os adeptos do Manifesto Republicano concluíam o documento declarando que a opção pelo sistema republicano aproximaria o Brasil das demais nações americanas. O documento está disponível na internet.

Atividade complementar

Aproveite este momento para desenvolver uma atividade complementar com os estudantes relacionada ao uso de novas tecnologias e da internet. Faça uma visita virtual com os estudantes ao Museu da República, explorando os recursos que o site do museu tem a oferecer, disponível em: https://oeds.link/fizIg7 (acesso em: 28 fevereiro. 2022). Para isso, reserve um espaço na sala de informática de seu estabelecimento de ensino (ou em outro local adequado em sua escola), se possível. No site indicado, pode-se conhecer a história do Palácio do Catete (séde do Poder Executivo no Brasil de 1897 a 1960), onde o museu está localizado, assim como parte de seu acervo. Uma atividade pertinente, com base nessa visita virtual, seria elaborar uma linha do tempo dos presidentes da Primeira República e suas principais contribuições. Além disso, nesta proposta de atividade complementar, é possível trabalhar, com os estudantes, a análise documental e a análise de mídias sociais como práticas de pesquisa.

Observação

Os conteúdos desta página, ao tratar da Proclamação da República no Brasil, dos grupos que apoiavam esse processo e do contexto social e econômico do período, possibilitam o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um.

Os conflitos com a Igreja

O movimento republicano só se transformou em fôrça decisiva quando a Monarquia perdeu o apoio dos grupos que a sustentavam: a Igreja católica, os militares e os cafeicultores do Vale do Paraíba.

Desde o período colonial, o poder civil e o religioso estavam unidos por meio do padroado, uma instituição que submetia a Igreja católica ao contrôle da Coroa portuguesa e, após a independência, da Coroa brasileira.

Ao longo do século dezenove, contudo, a Igreja buscou recuperar seu poder. A maçonariaglossário , por exemplo, havia sido condenada pelo papa e alguns bispos brasileiros passaram a exigir que tanto os fiéis como os clérigos que fossem maçons abandonassem essa prática. Isso gerou um dilema, uma vez que a elite brasileira era em grande parte maçônica e católica.

O imperador deu ordens para que a medida do papa não fosse cumprida e, na década de 1870, prendeu dois bispos que se recusaram a seguir as ordens imperiais. Situações como essa caracterizaram a Questão Religiosa, que marcou o afastamento entre o clero católico e a Monarquia.

A Questão Militar

Durante o governo de Dom Pedro segundo, o Exército ocupou uma posição marginal na política brasileira. Os baixos soldos, a rígida disciplina da corporação e a lentidão nas promoções desencorajavam os filhos das elites a seguir a carreira militar.

A maior parte dos membros do Exército pertencia às camadas médias da sociedade e, embora tivesse uma formação escolar rigorosa, dificilmente conseguia ascender na vida política ou ocupar cargos públicos.

Após a vitória brasileira na Guerra do Paraguai, o Exército saiu fortalecido como corporação.

Na década de 1880, evidenciou-se o objetivo militar de assumir um novo papel na cena política brasileira, o que desgastou a relação entre o Exército e a Monarquia.

Fotografia em preto e branco. Quatorze militares posam para a fotografia, posicionados um do lado do outro. A cena ocorre em local aberto, em frente à uma escada de acesso a uma edificação, ao fundo. Alguns portam sabres, abaixados em direção ao solo. Oito homens estão em primeiro plano, quatro estão em segundo plano, logo atrás e dois na última fileira, no alto da escadaria.
Militares na cidade do Rio de Janeiro. Fotografia de márc ferrês, 1885.
Ícone. Sugestão de livro.

VEIGA, Edison. Essa tal Proclamação da República. São Paulo: Panda Books, 2009. Este livro apresenta os antecedentes da Proclamação da República no Brasil e oferece um amplo panorama sobre a sociedade, a economia e a política do país no final do século dezenove.

Respostas e comentários

Texto complementar

O texto a seguir aborda alguns pontos ligados ao fim do padroado no Brasil.

Embalada pelos ideais de progresso, a República tornou-se tangível realidade para a Igreja Católica Apostólica Romana reticências no dia 7 de janeiro de 1890, quando o Decreto 119-A determinou o fim do padroado e estabeleceu a liberdade de culto no Brasil. Uma semana depois, por meio do Decreto 155-B, de 14 de janeiro, referendou-se o primeiro calendário republicano no qual inexistiram feriados de caráter religioso, inclusive o do Natal. Esses decretos indicaram a índole da transformação sociopolítica que se quis imprimir no novo regime, discursivamente sustentado em bases científico-tecnológicas – a modernidade republicana. Foi o início da Era Pós-Padroado das relações entre Estado e Igreja Católica Apostólica Romana [Igreja Católica Apostólica Romana] no Brasil.

AQUINO, Maurício de. Modernidade republicana e diocesanização do catolicismo no Brasil: as relações entre Estado e Igreja na Primeira República (1889-1930). Revista Brasileira de História, volume 32, número 63, página 146, 2012.

Observação

Os conteúdos desta página, ao tratar da Proclamação da República no Brasil, dos grupos que apoiavam esse processo e do contexto social e econômico do período, possibilitam, novamente, o desenvolvimento de aspectos relevantes da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um.

Ícone. Sugestão de livro.

Sugestão para o professor:

SEVCENKO, Nicolau. Literatura como missão: tensões sociais e criação cultural na Primeira República. segunda ediçãoSão Paulo: Companhia das Letras, 2003.

O autor trabalha com as ideias de escritores como Euclides da Cunha e Lima Barreto para estabelecer cruzamentos e relações entre história, ciência e cultura no Brasil, na passagem do século dezenove ao vinte.

A desconfiança de setores da sociedade

Além dos conflitos com a Igreja e os militares, o Império passou a enfrentar, na década de 1880, a descrença das camadas médias e da elite cafeicultora na capacidade de administração de Dom Pedro segundo, já idoso e com a saúde frágil. Por sua vez, os sucessores do trono, a princesa Isabel e seu marido, o francês Luís Filipe Maria Fernando Gastão, não inspiravam confiança nesses grupos.

Os cafeicultores do Oeste Paulista, que usavam técnicas modernas de produção e já não dependiam do trabalho escravo, julgavam que o governo imperial não atendia às suas demandas. Consideravam-no conservador e atrasado e passaram a defender o federalismoglossário republicano. Para esse grupo, a república poderia assegurar mais autonomia política e financeira para as províncias e, na prática, subordinar o Estado aos interesses da economia cafeeira.

O golpe de 15 de novembro

O isolamento da Monarquia se acentuou após a abolição da escravatura, em 1888. O governo decretou a abolição sem nenhum tipo de indenização aos proprietários de escravizados, o que desagradou principalmente à elite cafeicultora. Com isso, o governo perdia mais um apoio que compunha sua sustentação política. Reuniões conspirativas passaram a ser organizadas com frequência por militares e republicanos civis.

Na manhã do dia 15 de novembro de 1889, o Ministério da Guerra foi ocupado por tropas sob o comando do marechal Deodoro da Fonseca. É possível que a intenção de Deodoro da Fonseca fosse derrubar apenas o gabinete ministerial, mas o episódio culminou com a Proclamação da República, sem resistência do imperador. Assim, o regime republicano foi instituído no Brasil por meio de um golpe, que resultou de uma ação isolada do Exército, sem participação popular, e com o apoio de um pequeno grupo de republicanos civis.

Fotografia em preto e branco. Oito pessoas em uma varanda de uma residência, tendo ao fundo uma grande janela de madeira e, à frente, os degraus de uma escadaria. Destaque para um homem adulto idoso com barba volumosa, que veste roupa preta e segura um chapéu à mão. Uma mulher adulta está do seu lado direito, e apoia as mãos em seu braço direito. Uma senhora está sentada em uma cadeira, ao lado de uma criança, que está sentada ao chão. Do lado esquerdo do senhor, também de pé, estão dois homens adultos e duas crianças.
A família imperial na escadaria do Palácio Isabel, em Petrópolis, em 1889, antes de partir para o exílio. Ao centro, estão o imperador Dom Pedro segundo e sua filha, a princesa Isabel. Instituto Moreira Salles, Rio de Janeiro.
Respostas e comentários

Texto complementar

Ao explorar a fotografia da família real em Petrópolis, em 1889, comente que tanto Dom Pedro II quanto a família imperial como um todo reuniram, ao longo do período da Monarquia no Brasil, milhares de fotografias. Sobre esse tema, sugerimos a leitura do texto a seguir.

O imperador pode ser considerado o principal colecionador da família, tendo formado uma coleção gigantesca ao longo de seu reinado, contabilizando mais de vinte e duas mil peças. reticências

Após o golpe militar que proclamou a República no Brasil a família imperial foi forçada a exilar-se do país, embarcando, às pressas, para Paris. Durante o exílio Dom Pedro II decidiu doar sua coleção particular de fotografias, seu herbário e outros objetos pessoais a instituições brasileiras, cabendo à Biblioteca Nacional a maior parte das fotografias.

reticências a valoração destas imagens enquanto fontes para a historiografia é muito recente. O olhar historiográfico passou por um processo, desde o século dezenove, em que começou a valorizar a ideia de representação em detrimento à ideia de uma história factual baseada em acontecimentos políticos. reticências As fotografias claramente simbolizam este novo olhar historiográfico, já que o retrato oitocentista é pura representação.

TIBAU, Fernanda Borges. A memória privada no espaço público: as coleções de fotografia da Familia Imperial brasileira. In: ENCONTRO REGIONAL DA ANPUH-RIO, 14., 2010, Rio de Janeiro. Anais reticências. Rio de Janeiro: Unirio, 2010. Disponível em: https://oeds.link/KsIcHA. Acesso em: 25 março. 2022.

Observação

Os conteúdos desta página, ao tratarem da Proclamação da República no Brasil, dos grupos que apoiavam esse processo e do contexto social e econômico do período, possibilitam, novamente, o desenvolvimento de aspectos relevantes da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um.

A República da Espada

O papel desempenhado pelo Exército na Proclamação da República assegurou aos militares a chefia do novo governo. Essa fase da República brasileira é conhecida como República da Espada (1889-1894).

O comando do Governo Provisório, instaurado pela República, foi entregue ao marechal Deodoro da Fonseca. Entre suas primeiras medidas, destacam-se a ordem de enviar a família real ao exílio na Europa e a naturalização de estrangeiros imigrados.

Em dezembro de 1889, foram convocadas eleições para o Congresso Nacional Constituinte para que fosse elaborada uma nova Constituição para o país. Em fevereiro de 1891, foi promulgada a primeira Constituição da República brasileira, que estabelecia, entre outros pontos, o presidencialismo no Brasil e eleições para presidente de quatro em quatro anos. Apenas o primeiro presidente seria eleito, excepcionalmente, pelo Congresso Constituinte, que elegeu Deodoro da Fonseca.

Pintura. Vista geral de local aberto. Em primeiro plano, uma grande área descampada, com muitos militares montados à cavalo e uma fileira de canhões atrelados a rodas. Alguns soldados estão com o braço direito erguido. Há fumaça cinza sobre a fileira de canhões. Em segundo plano, à direita e ao fundo, algumas construções, com destaque para extenso edifício horizontal de dois pavimentos, à direita. Ao fundo e no alto, montanhas, céu azul-claro e nuvens brancas esparsas.
CALIXTO, Benedito. Proclamação da República. 1893. Óleo sobre tela, 124 por 200 centímetros. Pinacoteca Municipal, São Paulo.

Ler a pintura

• Observe que, nesta pintura, o artista representou o evento que marcou a Proclamação da República como uma parada militar. É possível identificar a presença da população civil nesta obra? O evento parece pacífico ou conflituoso? Que mensagem o autor da obra pretendia transmitir ao representar a passagem da monarquia para a república no Brasil?

Respostas e comentários

Orientações

Informe aos estudantes que o pintor paulista Benedito Calixto recebeu a encomenda de produzir uma tela sobre a Proclamação da República. Isso ocorreu, na verdade, quatro anos após o acontecimento. Para fazer a obra, Calixto tomou como base algumas fotografias e representações do período da Proclamação.

O cenário da obra é o Campo de Santana, na antiga Praça da Aclamação, no centro da cidade do Rio de Janeiro (que era, então, a capital do país). À direita, o pintor representou o quartel-general do Exército. Nesse local, hoje, se encontra o Palácio Duque de Caxias. O espaço no centro da tela é ocupado por militares, cavalaria e alguns canhões. O marechal Deodoro da Fonseca está representado no grupo.

Apesar do protagonismo militar ter sido representado na obra, há alguns poucos civis na imagem; segundo historiadores, teriam participado do ato os jornalistas (e adeptos das ideias republicanas) Quintino Bocaiúva e Aristides Lobo. Tanto Bocaiúva como Lobo ocupariam cargos no governo provisório, como ministro das Relações Exteriores e ministro do Interior, respectivamente.

Após a Proclamação da República, a incerteza sobre como manter a nova organização política do Brasil era algo constante.

Se desejar, destaque aos estudantes a existência, no período, de grupos que, além de disputar o poder político, divergiam quanto aos modos de se organizar e de se conceber a República no Brasil.

Observação

O trabalho com os conteúdos sobre as chamadas República da Espada e República Oligárquica possibilita o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um e, em especial, da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero dois.

Resposta

Ler a pintura: Espera-se que os estudantes percebam que há muitos militares em formação. Não há, na pintura, elementos que possam sugerir a presença de agitação ou violência. O autor da obra parece buscar transmitir a ideia de que a passagem para a república foi ordeira e sem violência.

A crise econômica e o fim da República da Espada

Durante o Governo Provisório, Deodoro nomeou o primeiro ministro da Fazenda da República brasileira, Rui Barbosa, que decidiu implantar uma política de incentivo ao crescimento econômico, especialmente o industrial. Como nesse período havia escassez de moeda circulante no Brasil, o ministro determinou a emissão de mais dinheiro, que serviria para o financiamento de novas empresas e possibilitaria a concessão de créditos aos cafeicultores que precisassem reestruturar sua produção após a abolição da escravidão.

Com mais moedas em circulação, os preços aumentaram, ou seja, teve início um surto inflacionário. Além disso, em vez de ser empregada em empresas, grande parte do dinheiro foi investida em ações na Bolsa de Valores, até mesmo de empresas fictícias. Assim, a política de Rui Barbosa se mostrou um completo desastre, e a economia do Brasil entrou em colapso.

A grave crise econômica somou-se à crise política, com o caráter centralizador do governo sendo severamente criticado pelas elites cafeicultoras. Pressionado e sem apoio político, Deodoro foi levado a renunciar, em novembro de 1891.

A Constituição determinava que, em caso de renúncia do presidente, novas eleições deveriam ser convocadas. No entanto, o vice-presidente, marechal Floriano Peixoto, conseguiu evitar um novo pleito e governou o país até o fim do mandato com o apoio dos cafeicultores paulistas.

A primeira Constituição da República

A Constituição de 1891 estabeleceu o regime federativo, assim, as antigas províncias transformaram-se em estados.

Estabeleceu-se o voto direto e universal para cidadãos maiores de 21 anos. Mendigos, analfabetos e soldados não podiam votar, o que excluía a maioria da população desse direito. Na prática, o voto não era secreto e as mulheres estavam excluídas das eleições (como eleitoras e como candidatas), apesar de a Constituição não fazer menção a esses pontos.

O poder foi dividido em Executivo (o presidente e os ministros), Legislativo (Câmara de Deputados e Senado) e Judiciário (com a criação de um Supremo Tribunal Federal). O Estado separou-se da Igreja.

Ilustração em preto e branco sobre papel em tom amarelo. Em primeiro plano, uma rua com dezenas de homens de casaca e chapéu conversam intensamente tendo papéis à mão. Em segundo plano, ao fundo, vista parcial de prédios com dois e três pavimentos, com janelas e balcões, onde vê-se outros homens gesticulando na direção dos que estão na rua.
Movimentação em frente à Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Ilustração publicada no livro O encilhamento, de Visconde de toné, de 1894.
Respostas e comentários

Orientações

Além de muitas novidades, como a eleição do presidente da República, é importante destacar aos estudantes que a Constituição de 1891 estabeleceu o Federalismo, que favoreceu a ampliação da autonomia dos estados em relação ao poder da União.

Texto complementar

O texto a seguir trata de algumas diferenças de concepção entre partidários de Deodoro da Fonseca e de Floriano Peixoto.

Em torno do velho marechal reuniam-se os chamados tarimbeiros – veteranos da Guerra do Paraguai. Muitos desses militares não haviam frequentado a escola Militar e se distanciavam das ideias positivistas. Eles derrubaram o Império para salvar a honra do Exército e não possuíam uma visão elaborada da República. reticências Embora Floriano não fosse positivista e também tivesse participado da Guerra do Paraguai, os oficiais que se reuniam a sua volta eram jovens que haviam frequentado a Escola Militar e recebido uma forte influência do positivismo. Concebiam sua inserção na sociedade como soldados-cidadãos, com um sentido de dar um rumo ao país.

A República deveria ter ordem e também progresso. reticências Apesar da profunda rivalidade existente entre os grupos no interior do Exército, eles se aproximavam em um ponto fundamental reticências eram porta-vozes de uma instituição – o Exército – que era parte do aparelho do Estado.

RODRIGUEZ, Ricardo Vélez. Castilhismo, uma Filosofia da República. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal, Conselho Editorial, 2000. página 246. Disponível em: https://oeds.link/qj8GMq. Acesso em: 26 maio 2022.

Observação

Novamente, o trabalho com os conteúdos sobre as chamadas República da Espada e República Oligárquica possibilita o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um e, em especial, da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero dois.

A República Oligárquica

Em 1894, ocorreu a primeira eleição direta para presidente da República no Brasil. Venceu Prudente de Morais, um “republicano histórico”, ou seja, que tinha participado da fundação do Partido Republicano e era membro da elite cafeicultora paulista. Seu governo foi instável politicamente, pois elites dirigentes ainda não tinham estabelecido as bases de funcionamento do novo regime político, o que gerava disputas.

A estabilização política foi constituída no governo de seu sucessor, o também paulista Campos Sales. Durante sua gestão, de 1898 a 1902, consolidaram-se os mecanismos de poder que constituíram as bases da República Oligárquica: a criação da Política dos Governadores e o fortalecimento do coronelismo.

A Política dos Governadores e o coronelismo

Idealizada por Campos Sales, a Política dos Governadores era um mecanismo político para evitar os choques entre os governos estaduais e o governo federal. Por meio dela, os grupos dominantes de cada estado apoiavam as políticas do governo federal, que, em troca, favorecia esses grupos e dificultava a ação de seus opositores. Atualmente, esse acordo político seria o famoso “toma lá dá cá”.

No nível estadual, a troca de favores acontecia entre os grupos dominantes do estado e os grandes proprietários de terra dos municípios, conhecidos como coronéis, os quais controlavam os votos dos eleitores, valendo-se, para isso, da compra de voto ou mesmo da fôrça. Garantiam, assim, que fossem eleitos apenas os candidatos ligados às oligarquias do estado. Esse fenômeno ficou conhecido como coronelismo.

Voto de cabresto

O mecanismo de contrôle dos votos por parte dos coronéis, uma prática muito comum nos tempos da República Oligárquica, é chamado de voto de cabresto.

Essa expressão faz referência ao cabresto, que é um dispositivo de corda ou couro colocado nos cavalos para direcionar sua marcha.

Charge. Na parte inferior, um morro ovalado, cercado de homens com os braços erguidos em direção ao alto do morro. Esses homens portam chapéus e trazem os nomes de estados brasileiros escritos nas suas costas, como Rio Grande do Sul, Paraná, Bahia, e Mato Grosso. Na parte superior, no alto do morro, dois homens de chapéu estão de pé ao lado de uma grande poltrona em cujo encosto está escrito Presidência da Republica. No chapéu do homem à direita da poltrona está escrito São Paulo. Ele olha em direção ao pé do morro, e, com sua mão espalmada, procura acalmar os homens que estão embaixo. No chapéu do homem que está à esquerda da poltrona, está escrito Minas. Ele tem os braços cruzados.
A charge, de Alfredo Storni, ironiza a disputa entre as oligarquias dos Estados. Publicada na revista Careta, número 897, em 29 de agosto de 1925. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro.
Respostas e comentários

Orientações

No período conhecido como a República das Oligarquias, os grandes latifundiários, principalmente cafeicultores paulistas, conduziram a política nacional com a implantação da Política dos Governadores e da política do café com leite. Esses arranjos políticos baseavam-se em um sistema de troca de favores e também nas tradições do poder local no Brasil, representadas pelo coronelismo.

Atividade complementar

A Primeira República foi marcada por processos eleitorais fraudulentos, nos quais, além da alteração de votos e títulos, se praticava a coação do eleitor. Sugerimos a realização de um debate com o estudantes sobre esse tema, estabelecendo conexões com a atualidade, a partir da reflexão sobre os mecanismos necessários para impedir o contrôle do voto e da atuação dos representantes políticos pelo poder econômico.

Incentive os estudantes a comparar os direitos de cidadania política nos dois momentos da história da nossa República. Depois, eles podem organizar um quadro comparativo entre a época da Primeira República e a atualidade, considerando as seguintes questões: Quem possui o direito de voto? Como são realizadas as eleições? Os eleitores têm liberdade para escolher em quem votar? Por quê?

Observação

Novamente, o trabalho com os conteúdos sobre as chamadas República da Espada e República Oligárquica possibilita o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um e, em especial, da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero dois.

Ícone. Sugestão de livro.

Sugestão para o professor:

LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.

Referência na área da historiografia, a obra analisa a estrutura sistêmica do coronelismo, buscando compreender como o mandonismo local conseguiu alcançar, principalmente ao longo do século vinte, os elevados escalões da República no Brasil.

O poder das oligarquias

Os cargos políticos federais mais importantes, como o de presidente da República e o de ministro da Fazenda, eram dominados pelas oligarquias paulista, mineira e gaúcha. Particularmente, São Paulo e Minas Gerais, os estados mais ricos da União, impunham uma política de favorecimento de seus interesses. A hegemonia dos paulistas e dos mineiros na presidência da República ficou conhecida como política do café com leite.

É preciso, porém, relativizar o poder dessa frente oligárquica, pois ela não controlou sozinha e o tempo todo o governo da República. Em algumas ocasiões, esses dois estados estiveram em lados opostos, como nas eleições de 1910, em que o gaúcho Hermes da Fonseca, apoiado por Minas Gerais, venceu Rui Barbosa, candidato de São Paulo. Além disso, outros grupos políticos oligárquicos faziam parte do jogo de alianças e determinavam, em conjunto, os rumos políticos e econômicos do país.

A proteção ao café

O café foi o principal item de exportação do Brasil durante o Segundo Império e a Primeira República. Contudo, o aumento da produção, no final do século dezenove, provocou a queda nos preços do café no exterior. Diante disso, o governo federal lançou planos para reerguer os preços do produto.

A principal medida, iniciada em 1906, foi contrair empréstimos para comprar estoques do produto e reduzir a oferta, forçando, assim, o aumento dos preços. A queda nas exportações de café foi sentida já no ano seguinte, quando as remessas para o exterior caíram de 19 mil sacas comercializadas, em 1906, para cêrca de 10 mil, em 1907.

As práticas conhecidas como defesa ou valorização do café foram retomadas outras vezes pelo governo brasileiro.

Fotografia em sépia. Vista parcial de local aberto, com arbustos de grande porte. Sete pessoas estão próximas aos arbustos, sendo que há, entre eles, uma criança. Dois homens estão sobre escadas e têm as mãos sobre as partes mais elevadas dos arbustos. Todos estão vestidos com roupas de mangas compridas e chapéus com abas largas. Uma mulher usa um pano na cabeça. Todos estão descalços. No alto, céu claro.
Colheita de café no interior paulista. Fotografia de tiodór praising, 1924. Museu Paulista da Universidade de São Paulo, São Paulo.
Respostas e comentários

Orientações

Destaque aos estudantes que a chamada política de valorização do café corresponde às medidas implantadas pelo Estado durante a Primeira República com o objetivo de garantir que o setor cafeeiro brasileiro tivesse condições para enfrentar a queda de preços do produto no mercado internacional. Entre as principais medidas estavam a compra e a estocagem dos excedentes da produção do café e a elaboração de mecanismos de estabilização do câmbio.

Texto complementar

O texto a seguir fornece algumas informações sobre o poder dos coronéis na República Oligárquica.

O poder do coronel advinha em grande parte da posse da terra. Dono de grandes propriedades rurais conseguia controlar a vida de centenas de colonos, meeiros e posseiros. reticências Assim, o coronel se transformava em protetor, juiz, compadre, padrinho ou conselheiro das pessoas do campo. Esse poder tornava possível o contrôle absoluto dos votos da região, que iam para quem o coronel indicasse. Eram os conhecidos votos de cabresto ou curral.

FERNANDES, uertevan Silva. A fôrça do clientelismo: práticas políticas recorrentes na cidade de Pombal. João Pessoa: Editora Universitária/Universidade Federal da Paraíba, 2006. página 38.

Observação

Trabalhar com aspectos da chamada República Oligárquica possibilita, mais uma vez, o desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um e, em especial, da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero dois.

Ícone. Ilustração de três pessoas e dois balões de fala indicando a seção Em debate.

Em debate

O ideal de unidade nacional e as contradições regionais

A transição para a Primeira República (que se estendeu de 1889 a 1930, segundo estudiosos) foi acompanhada pela difusão da ideia de integração regional, de consolidação da unidade do Estado nacional e da identidade do povo brasileiro. Os artistas românticos exaltaram as singularidades dos povos nativos, as peculiaridades dos costumes locais e as belezas da paisagem natural como símbolos do sentimento de brasilidade. O imaginário da unidade e da identidade nacional que sintetizariam em um modelo emblemático toda a diversidade étnica, social, cultural e geográfica existente no imenso território brasileiro era construído, ao mesmo tempo que aconteciam muitas disputas entre grupos de diversas localidades. As contradições entre os interesses regionais e entre os diferentes grupos sociais se manifestavam desde a colônia e o Império e continuaram a aflorar no período republicano.

Alguns historiadores, como Raymundo Faoro, estudaram a formação das instâncias de poder a partir da Primeira República e as relações que se estabeleceram entre o governo federal, os estados e os municípios. O modelo federalista foi reivindicado pelas elites das regiões economicamente mais poderosas, que buscavam garantir o contrôle político dos mecanismos decisórios do Estado, com base no discurso de autonomia administrativa e equilíbrio de interesses regionais.

reticências Na doutrina do Estado soberano, pregada por Campos Sales ainda quando deputado na Assembleia Provincial, está implícita a política dos governadores, ou, como queria seu fundador, por amor à correção, a política dos Estados. O sistema federativo caracterizar-se-ia pela existência de uma dupla soberania na tríplice esfera do poder público, explicitamente. “Neste regime, é minha convicção inabalável, a verdadeira fôrça política, que no apertado unitarismo do Império residia no poder central, deslocou-se para os Estados. A política dos Estados, isto é, a política que fortifica os vínculos de harmonia entre os Estados e a União, é, pois, na sua essência, a política nacional. É lá, na soma dessas unidades autônomas, que se encontra a verdadeira soberania da opinião. O que pensam os Estados pensa a União.” Ora, o curso da doutrina denuncia uma presença mais viva que o tecido abstrato das ideias: a ascendência dos Estados acarretaria, nesse plano de somas, a hegemonia dos mais prósperos e poderosos. Isto interessava a alguns – sobretudo a São Paulo, a Minas, ao Rio Grande do Sul, este com interesses divergentes dos dois primeiros –, mas não a todos, prejudicando manifestamente aos decadentes, sobretudo à Bahia e Pernambuco reticências.

FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. décima Editora São Paulo: Globo: Publifolha, 2000. volume2, página 73.

  1. Quais eram alguns dos princípios defendidos por Campos Sales para o estabelecimento da República Federativa?
  2. Segundo o historiador Raymundo Faoro, o sistema federativo de fato garantia a autonomia dos Estados e o equilíbrio das fôrças regionais?
  3. Em sua opinião, os mecanismos organizados durante a instauração da República no Brasil com a Política dos Governadores ainda vigoram no país nos dias de hoje?
Respostas e comentários

Respostas

1. Segundo o texto, Campos Sales considerava que o sistema federativo deveria ser caracterizado pela chamada “política dos Estados”, isto é, a política que fortaleceria os vínculos de harmonia entre os Estados e a União. O sistema federativo seria, portanto, caracterizado por uma espécie de dupla soberania.

2. Para Raymundo Faoro, a ascendência dos Estados levaria, na realidade, à hegemonia dos estados mais prósperos e poderosos e prejudicaria os estados com menos poder econômico, como Bahia e Pernambuco. Desse modo, o sistema federativo não garantiria a autonomia dos Estados nem o equilíbrio das fôrças regionais.

3. Nos dias de hoje, é possível observar que somos herdeiros, de alguma fórma, de alguns mecanismos instituídos durante a instauração da República no Brasil. É claro que devemos, sempre, considerar que vivemos num contexto completamente diferente daquele do fim do século dezenove e início do vinte. Hoje, muito tempo após a Proclamação da República, notamos que o Brasil passou por muitos e diferentes governos, vivenciando inclusive um período de ditadura civil-militar entre 1964 e 1985; enfrentou fases de crises, de implantação de políticas neoliberais, de investimentos em políticas sociais etcétera. Desse modo, não podemos dizer que mecanismos semelhantes aos do início da República ainda existam em nossa política, mas, sim, algumas tradições nascidas e cristalizadas no passado (como a que favorece oligarquias de alguns estados em detrimentos de outros) podem ter sobrevivido até os dias de hoje, adaptando-se aos novos tempos.

Observação

Os conteúdos e as atividades desta seção possibilitam, novamente, o trabalho com a habilidade ê éfe zero nove agá ih zero dois.

Os conflitos no campo

Na passagem do Império para a República, ao final do século dezenove, ainda predominavam no Brasil características econômicas herdadas da época colonial: latifúndio, monocultura e técnicas rudimentares de produção. A abolição da escravidão, em 1888, e a implantação do trabalho assalariado não significaram a garantia de direitos nem a criação de leis de proteção aos trabalhadores.

Nesse cenário de baixo desenvolvimento econômico e de superexploração dos trabalhadores, agravado por um regime político e eleitoral excludente, surgiram movimentos sociais baseados na religiosidade popular com líderes messiânicosglossário , como Canudos e o Contestado. Ganhou fôrça também um tipo de organização em grupo conhecido como cangaço.

A Guerra de Canudos

Antônio Vicente Mendes Maciel nasceu no interior do Ceará, por volta de 1830. Ainda criança, iniciou os estudos para a formação de padre, mas, ao se tornar adulto, acabou exercendo outras profissões, como a de comerciante e advogado.

Já adulto, passou a peregrinar pelo interior dos estados de Sergipe, Pernambuco e Bahia, pregando mensagens religiosas e aconselhando os sertanejos. Procurava ainda organizá-los para a realização de obras como a construção de igrejas, casas, açudes e colheitas agrícolas. Visto como liderança religiosa e política, o beato passou a ser chamado de Antônio Conselheiro.

Em 1893, junto com seus seguidores, fundou um povoado comunitário na antiga fazenda Canudos, às margens do rio Vaza-Barris, no estado da Bahia. Chamada de Belo Monte, a comunidade era organizada com base no trabalho agrícola coletivo. Canudos mantinha relações comerciais regulares com vilas e cidades da região e chegou a reunir entre 20 mil e 30 mil moradores.

Região de Canudos

Mapa. Região de Canudos.
Legenda: 
Vermelho: Região de Canudos (1893 a 1897) 
Linha em cinza: Limites atuais entre os estados brasileiros 
O mapa mostra a porção leste do território do Brasil e os limites atuais entre os estados brasileiros. Em vermelho, está a região de Canudos (de 1893 a 1897) abrangendo uma área a noroeste do estado da Bahia, englobando as cidades de Canudos e Monte Santo. Destaque para os rios São Francisco e Vaza Barris, representados em azul.
Na parte inferior direita, rosa dos ventos e escala de 0 a 340 quilômetros.

Fonte: SAGA: a grande história do Brasil. São Paulo: Abril Cultural, 1981. página 173.

Ícone. Sugestão de vídeo.

GUERRA de Canudos. Direção: Sérgio Rezende. Brasil, 1997. Duração: 170 minutos Baseado no conflito que tomou conta de Canudos nos tempos da Primeira República, este filme conta a história de uma família que migra para a região de Belo Monte, tomando contato com as ideias de Conselheiro.

Respostas e comentários

Orientações

Ao dar início ao estudo dos movimentos populares brasileiros do fim do século dezenove, em especial os conflitos no campo, é interessante comentar com os estudantes que a visão de que a Primeira República esteve marcada pelo desinteresse das camadas populares pela atividade política é um tema muito discutido na historiografia. Em geral, os estudos da década de 1970 procuravam mostrar que as fraudes eleitorais, a violência e a prática de favores empregada pelos coronéis, além da proibição do voto dos analfabetos, produziram relações de dependência dos pobres em relação aos proprietários rurais e os deixaram apáticos em relação aos acontecimentos políticos.

Pesquisas realizadas desde a década de 1980, contudo, têm chamado a atenção para as ações realizadas pelas camadas populares, nos espaços institucionais ou fóra deles, contra os mecanismos de exclusão criados ou mantidos pela República, contra suas fórmas de dominação e por direitos políticos e sociais.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página constitui momento favorável ao desenvolvimento da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um.

Texto complementar

O texto a seguir apresenta aspectos do modo de produção organizado comunitariamente em Canudos:

O sertão de Antônio Conselheiro, como até hoje, encontrava-se no contexto da desigualdade de ritmo e do desenvolvimento combinado das regiões subdesenvolvidas. Canudos não podia fugir à regra. À agricultura e ao pastoreio organizados em fórma comunal, como um “falanstério”, ajustava-se, por meio da exportação do couro, a participação no mercado mundial. reticências No sertão semifeudal, surgia uma nova fórma de experiência social, semelhante às de Fourier e de Owen.

MONIZ, Edmundo. Canudos: a guerra social. 2. edição. Rio de Janeiro: Elo, 1987. página78.

As expedições contra Canudos

À medida que a comunidade de Canudos cresceu, os fazendeiros passaram a notar a falta de mão de obra e a Igreja católica começou a perder fiéis. Diante disso, o governo federal foi chamado a intervir contra Canudos. As autoridades procuraram justificar a ação armada alegando que as pregações de Antônio Conselheiro comprovavam sua vocação monarquista e representavam, assim, uma ameaça à ordem republicana.

Em 1896, fôrças federais e baianas iniciaram a campanha militar para destruir Canudos. Apesar da superioridade bélica, o exército do governo foi derrotado pelos conselheiristas em três expedições.

Canudos só foi destruída na quarta expedição, quando mais de 10 mil homens fortemente armados foram enviados ao sertão baiano para atacar a comunidade. Após três meses de combate, o arraial foi derrotado pelas fôrças do governo em 5 de outubro de 1897. A maior parte de seus habitantes foi morta.

Relatos de civis contam que, mesmo após a queda do arraial, muitos prisioneiros foram mortos e várias crianças foram abandonadas ou entregues à adoção. O escritor Euclides da Cunha, que cobriu a Guerra de Canudos como correspondente de um jornal paulista, assim descreveu o fim da batalha:

Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a história, resistiu até ao esgotamento completo. Expugnadoglossário palmo a palmo, na precisão integral do termo, caiu no dia 5, ao entardecer, quando caíram os seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente 5 mil soldados.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. São Paulo: Martin Claret, 2008. página 597.

Fotografia em preto e branco. Vista parcial de local aberto. Em primeiro plano, uma área descampada com dezenas de pessoas sentadas, a maioria delas mulheres, algumas crianças e bebês. Elas estão vestidas com pedaços de panos. Algumas delas cobrem a cabeça com o mesmo pano usado para cobrir o corpo. Os corpos das pessoas que estão em primeiro plano são magros. Em segundo plano, dezenas de soldados em pé observam as pessoas sentadas. No alto, céu claro.
Moradores de Canudos presos em incursão das fôrças do governo, em Canudos, na Bahia. Fotografia de Flávio de Barros, 1897. Museu da República, Rio de Janeiro.
Respostas e comentários

Orientações

Segundo muitos estudiosos, a obra Os sertões, de Euclides da Cunha, é considerada um importante marco no processo de formação do pensamento sociológico brasileiro. É possível, inclusive, ir além: Os sertões não só constitui uma obra de cunho sociológico como também um texto literário, um relato jornalístico e um escrito privilegiado que traz aos nossos olhos um fundamental e valioso testemunho de Canudos.

É interessante notar que essa obra permanece, até os nossos dias, como importante fonte (ou documento) para se compreender e interpretar o cenário brasileiro dos primeiros anos da República. Os muitos aspectos da Modernidade que se formava no país e as questões ligadas à repressão que o governo central implantou em relação aos movimentos populares e messiânicos do fim do século dezenove podem ser discutidos e reelaborados com base nas interpretações dessa obra. Além disso, Os sertões é visto e analisado pelas lentes da geografia, na medida em que a mestiçagem narrada por Euclides da Cunha pode ser compreendida como a convivência entre diversas culturas.

Observação

Novamente, o trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um.

Texto complementar

O texto a seguir aborda a visão que as elites tinham de Canudos:

Literatos ou cientistas, monarquistas ou republicanos, liberais declarados ou indiferentes, na verdade essas distinções são superficiais: todos os intelectuais estavam atrelados ao carro do poder, empenhados na grande parada histórica do tempo que era a consolidação nacional. Para fazê-lo, foi preciso usar ferro e fogo, o que repugnou a alguns reticências. reticências No caso, foi só nos momentos da Guerra ou depois de seu fim que os rebeldes começaram a ser chamados de brasileiros reticências; até aí, a denominação comum é a de jagunçagem.

GALVÃO, Walnice Nogueira. No calor da hora. São Paulo: Ática, 1974. página 107-108.

A Guerra do Contestado

No início do século vinte, muitos camponeses se estabeleceram em uma região ao Sul do país, disputada pelos estados do Paraná e de Santa Catarina, conforme indicado no mapa A Guerra do Contestado (1912-1916), a seguir. Mas, ao longo dos anos, seus territórios foram ocupados por fazendeiros interessados na extração de erva-mate e madeira. Além disso, a presença de grandes companhias estrangeiras envolvidas na construção de estradas de ferro reduzia ainda mais o espaço das lavouras de subsistência das famílias camponesas.

Nesse período, surgiram na região movimentos messiânicos. Um dos pregadores com maior número de adeptos era o monge José Maria. Seus seguidores acreditavam que o fim do mundo estava próximo e que a adesão ao movimento significaria a salvação da alma.

Ao grupo de José Maria uniram-se também operários recrutados para a construção da ferrovia que tinham sido demitidos e proibidos de viver às margens da estrada. O anseio dessas pessoas por terra, trabalho e melhores condições de vida associou-se à religiosidade popular, tornando as tensões sociais da região ainda mais explosivas e dando início à Guerra do Contestado, que ocorreu entre 1912 e 1916.

Fotografia em preto e branco. Vista parcial do interior de uma casa com paredes de madeira e chão de terra. Ao centro, um homem idoso está sentado sobre um pedaço de madeira, com o pé direito cruzado sobre o esquerdo e as mãos entrelaçadas sobre as pernas. Ele tem cabelos brancos e barba volumosa, chapéu escuro sobre a cabeça, usa paletó de mangas compridas, calça clara e par de chinelos. À sua direita, estão algumas almofadas e, ao fundo, uma mobília com poucos objetos.
Monge José Maria de Agostinho, líder do movimento messiânico do Contestado. Fotografia de cêrca de 1910. Museu do Contestado, Caçador, Santa Catarina.

A guerra do contestado (1912-1916)

Mapa. A Guerra do Contestado (1912 a 1916). Legenda: Laranja: Região disputada entre Paraná e Santa Catarina  Laranja com linhas em marrom na horizontal: Região da Guerra do Contestado  Linha horizontal contínua em preto com pequenos traços verticais simétricos dos dois lados: Estrada de ferro entre São Paulo e Porto Alegre. Linha horizontal contínua em cinza: Limites atuais entre os estados brasileiros. A porção sul do território do Brasil aparece em cor verde. Em laranja, região de fronteira disputada entre Paraná e Santa Catarina. Em laranja com linhas em marrom, região da Guerra do Contestado, abrangendo as cidades de Irani, Porto União, Caçador, Videira, Curitibanos, Lages e Campos Novos. Traçado em linha preta das estradas de ferro, ligando as cidades de Uruguaiana, Santa Maria, Porto Alegre, Passo Fundo, Porto União, Ponta Grossa, Itararé e São Paulo.  Na parte inferior esquerda, rosa dos ventos e escala de 0 a 135 quilômetros.

Elaborado com base em dados obtidos em: NOSSA, Leonencio. Os principais embates da guerra. Estadão, São Paulo, 11 fevereiro 2012. Disponível em: https://oeds.link/ozPIqu. Acesso em: 28 fevereiro 2022.

Ícone. Sugestão de site.

MUSEU Paranaense.

Disponível em: https://oeds.link/pp20Uh. Acesso em: 28 fevereiro 2022.

No site do museu, é possível acessar fotografias feitas no Contestado pelo sueco Claro Jansson.

Respostas e comentários

Orientações

A Guerra de Canudos e a Guerra do Contestado colocaram em foco o grupo social que, até aquele momento da história do Brasil, havia permanecido no esquecimento: a população pobre do campo. Os dois movimentos podem ser comparados em muitos aspectos: a origem social dos rebeldes, a presença da forte religiosidade popular, a luta pelo acesso à terra, a reação violenta do poder republicano instituído etcétera.

É interessante observar o mapa “A Guerra do Contestado (1912-1916)” com os estudantes e destacar que a questão da territorialidade é uma das marcas daquele conflito. O território demarcado no mapa passou a ser objeto de litígio entre os estados do Paraná e de Santa Catarina, numa querela que já existia mesmo antes do conflito. Desse modo, o nome “Contestado” se refere justamente a essa disputa. Segundo pesquisadores, os paranaenses defendiam o sistema de uti possidetis como base para definir os limites da região. Já os catarinenses defendiam critérios de delimitação com base nas fronteiras naturais; para eles, as margens do rio do Peixe deveriam ser a referência e estabeleceriam os limites entre os dois estados. Essa disputa política também tinha como pano de fundo os interesses econômicos, pois tanto as autoridades paranaenses como as de Santa Catarina desejavam se apossar da erva-mate da região.

Observação

Novamente, o trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um.

O desenrolar do conflito

A movimentação de camponeses e outros trabalhadores pobres em torno do monge José Maria gerou a desconfiança dos governos estaduais e federal, e essa tensão se converteu em conflito armado em outubro de 1912.

Como parte de suas peregrinações, o monge, acompanhado de um grupo de fiéis, foi até Irani, situada hoje no estado de Santa Catarina. Na época, o município era centro de uma disputa territorial entre Santa Catarina e Paraná. Por isso, as autoridades paranaenses pensaram que os caboclos tinham sido enviados pelo governo de Santa Catarina e iniciaram um ataque ao grupo, que culminou com a morte de José Maria.

A crença de que o monge ressuscitaria levou ao surgimento de “cidades santas”, comandadas por meninas que, segundo se acreditava, tinham visões e recebiam instruções diretamente de José Maria. Inicialmente religioso, o movimento tornou-se político. Os caboclos reivindicavam o direito à terra e à liberdade religiosa.

O Exército enviou cêrca de dois terços de seu efetivo para a região, equipando as tropas com canhões. Pela primeira vez no Brasil foram utilizados aviões com fins bélicos.

Em 1915, o cerco ao movimento intensificou-se. A truculência do Exército, a falta de alimentos e a proliferação de doenças enfraqueceram os rebeldes e provocaram o fim do conflito, em 1916, deixando cêrca de 20 mil mortos, principalmente caboclos pobres.

Parte dos descendentes dos rebeldes do Contestado vive hoje em comunidades no interior do estado de Santa Catarina. Dedicam-se, principalmente, aos cultivos de subsistência e ao trabalho temporário em grandes fazendas ou madeireiras.

Fotografia. Vista parcial de local aberto. Em primeiro plano, em destaque, porteira em madeira, com pórtico onde se lê Cemitério do Contestado. Em segundo plano, gramado cercado por cerca de madeira, contendo lápides e flores. Ao fundo, alguns pinheiros. No alto, céu nublado.
Entrada do Cemitério do Contestado, no município de Irani, em Santa Catarina. Fotografia de 2015. No cemitério, estão enterradas algumas das vítimas do conflito.
Respostas e comentários

Texto complementar

O texto a seguir fala sobre a existência das chamadas “vilas santas” ou “cidades santas” na organização do movimento do Contestado.

A reunião de fiéis em território catarinense, que anunciava a chegada de um milênio igualitário, mobilizou milhares de sujeitos das mais diversas camadas sociais. Eram pessoas desapropriadas de suas terras, pequenos e médios fazendeiros, mulheres, crianças e idosos. Difícil assegurar o número exato dos envolvidos no conflito, mas as estimativas apontam um número possível de 20 a 25 mil pessoas espalhadas em diversas vilas da região do planalto norte de Santa Catarina. Essa é outra diferença significativa do movimento do Contestado quando comparado a Canudos. Os rebeldes não se fixaram em um único espaço. Eles criaram diversas comunidades, por eles denominadas de vilas santas, chegando algumas a ter uma população estimada em 10 mil habitantes. As mais famosas foram Taquaruçu, Caraguatá, Vila Nova do Timbó, Santa Maria, Perdizes, Tamanduá e Timbozinho. Inclui-se, ainda, a presença significativa de fiéis em vilas já constituídas na região, tais como Canoinhas e Curitibanos, todas em território catarinense.

RODRIGUES, Rogério Rosa. Estilhaços da violência: a Guerra do Contestado e a memória oficial. Revista Contemporânea. Dossiê guerras e revoluções no século vinte, ano 5, número 8, 2015.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página possibilita, mais uma vez, o desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um.

Ícone. Sugestão de livro.

Sugestão complementar referente ao Capítulo:

Chuárquis, Lilia Moritz; istárlin, Heloisa Murgel (Organização). Dicionário da República: 51 textos críticos. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

A obra apresenta 51 verbetes que abordam desde as origens da República (em Grécia e Roma), passando pelas diversas matrizes do republicanismo, até a proclamação da República no Brasil e os numerosos movimentos sociais e republicanos no país (como Canudos e Sabinada).

O cangaço

Além do messianismo, outra fórma de expressão das tensões sociais no campo, especialmente no Sertão nordestino, foi o cangaço. Esse é o nome dado à ação de bandos armados que, entre os anos de 1870 e 1940, percorriam o Sertão nordestino promovendo assaltos e atacando fazendas e estabelecimentos comerciais. Despertavam medo e exerciam fascínio sobre os camponeses, que se sentiam, de certa fórma, vingados por eles dos desmandos dos grandes proprietários de terras.

O mais conhecido dos cangaceiros foi Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, nascido em Serra Talhada, no estado de Pernambuco. Depois de ingressar no cangaço, Lampião formou seu próprio bando e o liderou por quase vinte anos.

Em 1938, o bando de Lampião foi localizado pela polícia na fazenda Angicos, no sertão do estado de Sergipe. Lampião, sua companheira, Maria Bonita, e mais nove cangaceiros foram mortos e decapitados pela polícia.

O tema do cangaço tem sido objeto de muitas interpretações. Para a socióloga Maria Isaura de Queiroz, o cangaço representava a ação de sertanejos conscientes de sua condição miserável e dispostos a modificá-la. Já o historiador Eric róbisbáum considerava o cangaço um movimento de rebeldia, mas não necessariamente de transformação social.

Fotografia em preto e branco. Em primeiro plano, preenchendo os limites horizontais da imagem, dez pessoas com roupa de cangaceiro, feita em couro, com cartucheiras contendo balas dispostas sobre o peito, chapéus em meia-lua contendo a estrela de Salomão e espingardas apoiadas no chão. Apenas uma mulher usa um traje militar mais claro, vestido e chapéu. Ao fundo e no alto, vegetação com galhos finos e folhas pequenas.
Lampião e seus companheiros. Da esquerda para a direita: Vila Nova, cangaceiro desconhecido, Luís Pedro, Amoroso, Lampião, Cacheado, Maria Bonita, Juriti, cangaceiro desconhecido e Quinta-Feira. Fotografia de Benjamin Abrahão, 1936.
Ícone. Sugestão de vídeo.

FEMININO cangaço. Direção: Lucas Viana; Manoel Neto. Brasil. Duração: 75 minutos. O documentário aborda a vida das mulheres cangaceiras, que romperam com diversas barreiras de sua época.

Respostas e comentários

Observação

Novamente, o trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero um.

Atividades

Faça as atividades no caderno.

  1. A queda da Monarquia e o estabelecimento da República no Brasil resultaram de um conjunto de transformações. Sobre isso, responda:
    1. Por que os militares estavam insatisfeitos com o governo imperial?
    2. Que motivos geraram o afastamento entre a Igreja católica e a Monarquia, fato que ficou conhecido como Questão Religiosa?
    3. Os cafeicultores do Oeste Paulista defendiam a implantação da República e do federalismo no país. De que fórma eles seriam beneficiados com tais mudanças?
    4. Com a abolição da escravidão, em 1888, muitos fazendeiros de café do Vale do Paraíba, tradicionalmente aliados do imperador, passaram a apoiar o movimento republicano. Por quê?
  2. As expressões a seguir são usadas para definir as características do sistema de poder da Primeira República. Explique o significado de cada uma delas.
    1. República Oligárquica
    2. Política dos Governadores
    3. Política do café com leite
    4. Coronelismo
  3. Leia o trecho a seguir, de um livro do historiador José Murilo de Carvalho.

O povo assistiu bestializado à proclamação da República, segundo Aristides Lobo.

reticências

O povo sabia que o formal não era sério. Não havia caminhos de participação, a República não era para valer. Nessa perspectiva o bestializado era quem levasse a política a sério, era o que se prestasse à manipulação. reticências Quem apenas assistia, como fazia o povo do Rio por ocasião das grandes transformações realizadas a sua revelia, estava longe de ser bestializado. Era bilontraglossário .

CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 4. EditoraSão Paulo: Companhia das Letras, 2019. página 140.

  1. O autor do texto afirma que “a república não era para valer”. Explique o que ele quer dizer com isso.
  2. Por que o autor considera “bilontra” quem não levava a sério a política?
  3. O autor do texto e o jornalista Aristides Lobo têm a mesma opinião sobre a postura da população da cidade do Rio de Janeiro frente às transformações que ocorriam naquela época? Explique.
  1. Faça um texto comparando os movimentos de Canudos e do Contestado. Indique o local e a época de cada movimento, as motivações, os líderes, os grupos envolvidos e o desfecho de cada um deles.
  2. Sob orientação do professor, reúna-se com um colega. Observem com atenção a charge a seguir e leiam a legenda. Depois, respondam às questões no caderno.
Charge. Vista parcial de local aberto, com morros e árvores ao fundo. Em primeiro plano, três personagens. À esquerda, uma mulher de cabelos curtos pretos, de vestido até os joelhos e gorro amarelo sobre a cabeça. Com a mão direita, ela aponta na direção de um vaso redondo colocado sobre uma base quadrada, à sua frente. À direita, também próximo ao vaso, um homem visto de lado, com óculos de grau, chapéu e casaca cinza. Em suas costas, está escrita a palavra Político. À direita deste homem e puxado por ele por um cabresto, há um outro homem com cabeça de jumento, paletó e calça amarela. No braço deste segundo homem está escrita a palavra Eleitor.
STORNI, Alfredo. As próximas eleiçõesreticências “de cabresto”. 1927. Charge publicada na revista Careta, em 19 de fevereiro de 1927. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro.
  1. Que aspecto da política brasileira do início do século vinte o artista procurou representar na charge?
  2. Escrevam um texto para identificar e explicar a crítica que o artista da charge pretendeu fazer ao eleitor e aos políticos daquele período.
Respostas e comentários

Seção Atividades

Objetos de conhecimento

Experiências republicanas e práticas autoritárias: as tensões e disputas do mundo contemporâneo

A Proclamação da República e seus primeiros desdobramentos.

Habilidades

São trabalhados aspectos relacionados às habilidades:

ê éfe zero nove agá ih zero um (atividades 1, 3, 4, 5)

ê éfe zero nove agá ih zero dois (atividades 2, 5)

Respostas

1. a) Os militares reivindicavam maior participação política.

b) Buscando recuperar o poder perdido com a submissão à Coroa brasileira, por meio do padroado, os bispos exigiram que os fiéis e os clérigos que fossem maçons abandonassem essa prática. Isso gerou um dilema, já que a maior parte da elite era católica e maçônica. Contudo, o imperador autorizou que as ordens do papa fossem ignoradas e mandou prender dois bispos que insistiram em segui-las.

c) Eles passaram a defender a República Federativa, para que cada província tivesse mais autonomia política e financeira.

d) Porque eles eram dependentes do trabalho escravo.

2. a) Expressa o contrôle político da República pelos grandes proprietários de terras.

b) Arranjo entre determinados grupos das oligarquias estaduais, garantidas no poder, e a governabilidade do governo federal.

c) Pacto que, em grande parte da Primeira República, as elites de São Paulo e Minas Gerais estabeleceram para se manter no governo.

d) Sistema marcado pela presença de um chefe político local que controlava os eleitores, muitas vezes por meio da fôrça.

3. a) Segundo ele, a República não permitia a participação do povo e o Estado não agiria em prol do bem comum e, sim, dos interesses das elites.

b) Porque não se deixar manipular pela elite seria uma manifestação de esperteza.

c) Não. Enquanto Aristides Lobo vê, na postura da população, um sentido de desconhecimento e alienação, o autor argumenta que aquela postura era uma manifestação de descrença e uma recusa a se sujeitar à manipulação.

4. Canudos surgiu no interior da Bahia, em 1893, e os conflitos estenderam-se de 1896 a 1897. A Guerra do Contestado, em Santa Catarina, durou de 1912 a 1916. Antônio Conselheiro era um líder religioso popular, assim como o monge José Maria. Os dois movimentos são vistos como expressão do messianismo.

5. a) A prática do voto de cabresto.

b) O cartunista critica a postura do político que oprime e ameaça o eleitor e também deprecia a imagem do eleitor que se submete ao político.

CAPÍTULO 2 INDUSTRIALIZAÇÃO E URBANIZAÇÃO NA PRIMEIRA REPÚBLICA

Ao longo do século dezenove, a produção de café gerou muito lucro. A partir da década de 1880, muitos cafeicultores passaram a aplicar capital em outros setores, alguns deles em parceria com o Estado e com investidores estrangeiros, como os de ferrovias, portos, companhias de navegação, estradas e produção de energia elétrica. Dessa fórma, foi desenvolvida a infraestrutura para o escoamento do café. Com as ferrovias no Brasil, a circulação de pessoas em diversas cidades do interior aumentou, assim como seu comércio e serviços, enquanto novas cidades começaram a surgir em torno das linhas de trem.

A necessidade de crédito para financiar os serviços de transporte, distribuição e venda do produto no exterior estimulou ainda a expansão de bancos e de casas de exportação nas cidades das regiões produtoras. Por outro lado, o capital gerado pela economia cafeeira possibilitou o investimento na atividade industrial. Não por acaso, as principais regiões produtoras de café, principalmente São Paulo e Rio de Janeiro, também lideraram a expansão industrial.

Fotografia em preto e branco. Ocupando a maior parte da fotografia, um grande navio com mastros, atracado. Homens com grandes sacos nas costas sobem no navio por uma escada. Os homens usam blusa e calça clara. À direita, perto da embarcação, dois homens caminham para à direita. À esquerda, em primeiro plano, outros dois homens olham para frente. No alto, céu claro.
Embarque de café no porto de Santos. Fotografia de márc ferrês, cêrca de 1902. Instituto Moreira Salles, Rio de Janeiro.
Respostas e comentários

Sobre o Capítulo

Este Capítulo aborda a industrialização e a urbanização na Primeira República, contribuindo para o desenvolvimento, em sala de aula, de temas como imigração, inserção dos afrodescendentes na sociedade brasileira pós-abolição, movimentos sociais e artísticos do período, entre outros.

Nas primeiras décadas da República, a economia brasileira permaneceu baseada na exportação de produtos primários, como o café, o cacau, o algodão e a borracha. Apesar disso, o número de estabelecimentos industriais cresceu entre 1889 e 1930. Algumas cidades apresentaram um crescimento expressivo, além de modernizarem sua infraestrutura urbana.

Habilidades trabalhadas ao longo deste Capítulo

ê éfe zero nove agá ih zero três: Identificar os mecanismos de inserção dos negros na sociedade brasileira pós-abolição e avaliar os seus resultados.

ê éfe zero nove agá ih zero quatro: Discutir a importância da participação da população negra na formação econômica, política e social do Brasil.

ê éfe zero nove agá ih zero cinco: Identificar os processos de urbanização e modernização da sociedade brasileira e avaliar suas contradições e impactos na região em que vive.

ê éfe zero nove agá ih zero nove: Relacionar as conquistas de direitos políticos, sociais e civis à atuação de movimentos sociais.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento inicial de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero cinco.

Ícone. Sugestão de site.

Sugestão para o estudante:

MUSEU do Café. Disponível em: https://oeds.link/8F6BVp. Acesso em: 25 março. 2022.

O Museu do Café está localizado no edifício que abrigava a antiga Bolsa Oficial de Café na cidade de Santos (São Paulo) e hoje conta com exposições interessantíssimas sobre a história da produção de café no Brasil e sua comercialização. O site traz fotografias do museu e oferece uma visita virtual.

Os imigrantes

As cidades cresciam e as atividades urbanas demandavam mão de obra: operários para trabalhar nas fábricas; profissionais para trabalhar na construção civil; no comércio e na prestação de serviços. Muitas pessoas se deslocaram para os centros urbanos em busca de novas oportunidades. Grande parte delas era imigrante.

Entre 1887 e 1930, cêrca de 3,8 milhões de estrangeiros se estabeleceram no Brasil. Em sua maioria, eram italianos, espanhóis, alemães, portugueses, sírios, libaneses e japoneses. Alguns deles, principalmente alemães e italianos, se instalaram no Sul do Brasil, onde se dedicaram ao cultivo de pequenas lavouras e à criação de animais.

A maioria dos imigrantes dirigiu-se às regiões cafeeiras dos atuais estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Mas, descontentes com a condição de pobreza e exploração nas lavouras, muitos seguiram para as cidades, onde tentaram se estabelecer trabalhando no comércio ou nas indústrias que surgiam.

Imigrantes nas cidades

Alguns imigrantes se deslocaram de seu país de origem para as cidades brasileiras em crescimento na condição de empresários, comerciantes e profissionais liberais. Geralmente trabalhavam como técnicos e administradores de empresas ou investiam capital em negócios.

No estado de São Paulo, por exemplo, no ano de 1920, quase 65% das empresas pertenciam a estrangeiros.

Fotografia em preto e branco. Vista parcial de local aberto. Em primeiro plano, parte superior de embarcação, com dezenas de homens em pé, agrupados à esquerda e ao fundo, na ponta do convés. Todos observam algo à esquerda da embarcação, e que não aparece na fotografia. Em segundo plano, à esquerda, região portuária, com embarcações liberando fumaça pela chaminé e alguns morros. À direita, o mar. No alto, céu claro.
Navio com imigrantes atracando no porto de Santos, no final do século dezenove. Fundação Energia e Saneamento, São Paulo.
Respostas e comentários

Atividade complementar

Se possível, organize os estudantes em duplas para que eles façam uma atividade de pesquisa iconográfica no site do Museu da Imigração do Estado de São Paulo, disponível em: https://oeds.link/rWHmj0 (acesso em: 25 março. 2022).

Informe à turma que o Museu da Imigração, localizado na cidade de São Paulo, no bairro do Brás, preserva a história dos imigrantes que chegaram à cidade via Hospedaria dos Imigrantes. Depois de passarem pela hospedaria, os imigrantes e suas famílias dirigiam-se, em geral, às fazendas de café. O museu guarda um riquíssimo acervo de fotografias e documentos oficiais digitalizados, que se relacionam com a história dessas pessoas.

Peça às duplas que acessem o site e selecionem uma das fotografias ali disponibilizadas. Os estudantes devem organizar um pequeno relatório informando do que se trata a imagem (se é um retrato, um cartão-postal, uma fotografia de viagem, uma vista de plantação em uma fazenda, por exemplo), em que período ela foi produzida, o que ela nos conta a respeito da imigração no Brasil e por que escolheram aquela imagem.

Esta atividade pode incentivar, entre os estudantes, o contato com o uso de novas tecnologias digitais em suas reflexões sobre história. Além disso, esta proposta de atividade complementar possibilita o trabalho com a análise documental como prática de pesquisa.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero cinco.

As reformas urbanas

Nos primeiros anos da República, a urbanização nas cidades próximas aos grandes centros econômicos cafeeiros na região Sudeste acelerou-se. Mas não aconteceu acompanhada de um planejamento público de uso e ocupação do solo, articulado com os sistemas de transporte e saneamento.

O crescimento desordenado de algumas cidades brasileiras contribuiu para que a população ocupasse moradias com condições precárias de higiene e conforto e que facilitavam a proliferação de epidemias. Em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, que se configuravam como grandes centros urbanos, a população pobre passou a morar em cortiços nas áreas centrais, que chegavam a abrigar muitas famílias em uma mesma construção.

No Rio de Janeiro, no início do século vinte, as chamadas reformas urbanas foram iniciadas pela prefeitura da cidade, com o apoio do governo federal, para promover a renovação e a modernização da cidade, servindo como modelo para o restante do país. Casas e cortiços foram demolidos para a abertura de avenidas, o calçamento foi reformado, jardins e praças foram construídos. As reformas resultaram na expulsão da população pobre que morava no centro ou nas redondezas.

São Paulo, onde os recursos gerados pela economia cafeeira possibilitaram o investimento na reurbanização da cidade, foi dividida em bairros nobres, na parte alta, e em bairros operários, longe das áreas centrais, próximos à várzea dos rios, às fábricas e às linhas de trem.

Esse modelo de reurbanização foi, em geral, o seguido pelas demais capitais brasileiras da época. Ele expulsa as camadas populares dos centros das cidades, afastando-as para áreas cada vez mais distantes e periféricas, onde os serviços públicos praticamente não existem.

Fotografia em preto em branco. Vista elevada e parcial de local aberto. Em primeiro plano, uma avenida larga, com duas fileiras de árvores que delimitam os espaços entre as faixas e a calçada. Nela passam alguns carros, um bonde e poucas pessoas. À esquerda, há um cruzamento com outra avenida, que delimita toda a parte esquerda da fotografia. Em segundo plano, há prédios de dois e três pavimentos com janelas e toldos nas portas de entrada. Em terceiro plano, muitas construções e um morro à direita da imagem. Ao fundo, morros. No alto, céu claro.
Vista da avenida Affonso Pena, em Belo Horizonte, em Minas Gerais. Fotografia de cêrca de 1910-1930. Inaugurada em 1897, a cidade foi construída com forte influência das reformas urbanísticas promovidas nas principais cidades europeias. Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte.
Respostas e comentários

Orientações

O plano de remodelação urbana da capital federal ficou conhecido popularmente como “bota-abaixo”, pois foram destruídos quarteirões inteiros de maneira autoritária e, muitas vezes, violenta em relação aos moradores das edificações demolidas.

Observação

Trabalhar as reformas urbanas do começo do século vinte possibilita o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero cinco.

Atividade complementar

O filme Rio de memórias, dirigido por José Inácio Parente (1987), é um documentário com cêrca de 30 minutos de duração. A produção narra, ao mesmo tempo, a história da fotografia e a história da cidade do Rio de Janeiro entre as décadas de 1840 e 1920.

Se o tempo de trabalho for reduzido, é possível apresentar aos estudantes apenas um trecho do vídeo. A passagem entre 11 minutos e 52 segundos e 21 minutos e 30 segundos trata do período situado entre a abolição da escravidão e a Belle Époque carioca; dessa maneira é possível ampliar os conhecimentos já trabalhados em sala de aula. O documentário pode ser encontrado na internet. Se julgar pertinente, peça aos estudantes que façam, oralmente, uma breve descrição do que viram.

Ícone. Sugestão de livro.

Sugestão para o professor:

RIO, João do. A alma encantadora das ruas do Rio de Janeiro. São Paulo: Saraiva de Bolso, 2012.

A obra apresenta uma reunião de textos publicados na imprensa carioca entre 1904 e 1907, por João do Rio (pseudônimo de Paulo Barreto). Em suas crônicas, João do Rio observa e relata o cotidiano nas ruas do Rio de Janeiro, em um momento em que a cidade vivia um processo de transformação urbana acelerada.

Ícone. Ilustração de um círculo de quatro cores, montado como um quebra-cabeça, sobre uma mão, indicando a seção Integrar conhecimentos.

Integrar conhecimentos

História e Geografia

As reformas urbanas no Rio de Janeiro e em Salvador

Entre 1902 e 1906, a cidade do Rio de Janeiro passou por seguidas reformas na gestão do prefeito Pereira Passos, para reestruturar sua aparência nos moldes da urbanização europeia e acabar com surtos de doenças como a febre amarela. Como os investimentos públicos se restringiram às regiões central e portuária, a oferta de serviços básicos – como saneamento, iluminação e transportes – tornou-se desigual, criando áreas diferenciadas pela cidade.

Antes das reformas, as regiões central e urbana, áreas com melhor oferta de emprego nas fábricas, no porto e no comércio urbano, eram o destino preferencial das populações rurais e estrangeiras que chegavam à cidade. Com a substituição dos antigos cortiços por novas moradias e a abertura de avenidas modernas, o preço dos terrenos e dos aluguéis no centro subiu, o que expulsou a população mais pobre para os morros ou para o longínquo subúrbio.

No subúrbio, a ocupação acompanhou as linhas férreas. As ferrovias compensavam a grande distância até o centro, percorridas diariamente até os locais de trabalho. A outra opção era morar nos morros próximos ao centro. Nesses locais, os moradores ficavam livres do aluguel. As favelas, que existiam desde fins do século dezenove, cresceram após as reformas em virtude do aumento do custo de vida no centro da cidade e das medidas elitistas da prefeitura.

Entre 1890 e 1920, a população da cidade mais que dobrou. O fator decisivo para essa mudança foi a chegada de migrantes nacionais e estrangeiros à cidade. Observe no gráfico a seguir como essa população acabou distribuída de fórma desigual pela cidade.

Gráfico de barras. 
Legenda: a cor verde representa o subúrbio, a cor amarela representa a região urbana e a cor vermelha o centro. 
O eixo horizontal conta com a marcação dos anos de 1890, 1906 e 1920. O eixo vertical conta com o número de habitantes correspondentes a cada ano e para cada região da cidade do Rio de Janeiro. 
O gráfico mostra que em 1890 havia 92.906 pessoas no Subúrbio, 305.562 pessoas na Região urbana e 124.183 pessoas no Centro. Em 1906, havia 183.402 pessoas no Subúrbio, 508.168 pessoas na Região urbana e 119.873 no Centro. Em 1920, havia 356.776 pessoas no Subúrbio, 701.904 pessoas na Região urbana e 99.193 no Centro.
O gráfico mostra que, ao longo dos anos indicados, a população do Subúrbio e da Região urbana cresceu, enquanto a população do Centro diminuiu. As barras verde e amarela crescem ao longo do tempo, enquanto a vermelha diminui.
Fotografia em preto e branco. Vista parcial de área urbana. Ao centro, rua larga com calçada à esquerda e à direita. Na calçada à esquerda, há postes de iluminação e jardim. Ao fundo, à direita, um prédio com três pavimentos e telhado trapezoidal atrás de uma árvore. Ao fundo, à esquerda, há destaque para uma edificação larga com três pavimentos e uma abóbada sobre a qual há uma estátua de ave com longas asas abertas. Na entrada desse edifício, há uma escada e uma série de colunas erguidas do chão ao teto e muitas janelas na vertical. No segundo andar, há um amplo balcão. Ao fundo, na extensão da rua, outras construções. No alto, céu claro.
Teatro Municipal na cidade do Rio de Janeiro. Fotografia de Marc Ferrês, cêrca de 1910. Instituto Moreira Salles, Rio de Janeiro.
Respostas e comentários

Orientações

A seção apresenta um conjunto de informações sobre a urbanização das cidades do Rio de Janeiro e de Salvador no início da República. Os conteúdos e as questões propostas na seção estabelecem relações com os temas já estudados e propõem um diálogo com o tempo presente. Além disso, essa seção possibilita um trabalho interdisciplinar com o componente curricular Geografia.

Observação

Além de aprofundar e complementar os conteúdos vistos na Unidade, esta seção visa desenvolver a habilidade ê éfe zero nove agá ih zero cinco e incentivar práticas de leitura entre os estudantes.

Salvador foi a primeira capital do Brasil, permanecendo nessa condição até 1763, quando o Rio de Janeiro se tornou a nova capital. Em Salvador, as reformas urbanas promovidas pelo prefeito José Joaquim Seabra, entre 1912 e 1916, também causaram grande impacto na vida da população pobre e trabalhadora que ocupava a região central.

O modelo de urbanização inspirado no estilo monumental em moda na Europa procurava romper com o passado colonial escravista, conferindo à cidade um novo ar, “moderno” e “civilizado”. O projeto de urbanização foi acompanhado do ideal de higienização e de contrôle de doenças e epidemias que se tornaram uma preocupação dos poderes públicos no início do século vinte.

As antigas casas e cortiços que abrigavam inúmeras famílias em condições precárias de higiene e conforto, focos de doenças e epidemias, precisariam, segundo essa visão, ser derrubadas para dar lugar a largas avenidas, prédios modernos, ruas projetadas que permitissem a circulação de meios de transporte e a instalação de comércio. A população pobre, composta fundamentalmente de negros e ex-escravizados, por sua vez, precisaria ser afastada da região central para que esta se tornasse vitrine da cidade moderna e higiênica.

Fotografia em preto e branco. Vista parcial de local aberto. Ao centro, rua larga vista em sua extensão. Ao longo da rua, existem trilhos de bonde e postes de eletrificação. Delimitando as laterais da rua, à esquerda e à direita, calçadas e prédios de dois a três pavimentos, com muitas janelas. Poucas pessoas passam na rua. Ao fundo e no alto, céu claro.
Rua da Cidade Baixa, em Salvador, na Bahia. Fotografia de Pedro Gonsalves da Silva, entre 1912 e 1914. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro.
  1. Analise o gráfico relacionado ao processo de urbanização da cidade do Rio de Janeiro. Identifique as principais transformações na configuração urbana que ocorreram entre 1890 e 1920.
  2. Por que as populações pobres que viviam no centro das cidades do Rio de Janeiro e de Salvador, no início do século vinte, eram vistas como empecilhos para a concretização dos projetos de modernização e urbanização promovidos nesse período?
  3. Atualmente, no município onde você mora, que providências a prefeitura toma para melhorar a qualidade de vida nos bairros? Todos os moradores são beneficiados? Você concorda com essas providências? Se você fosse prefeito, que decisões tomaria? Justifique.
Respostas e comentários

Orientações

Comente que, de modo geral, em grande parte das atuais cidades brasileiras, as pessoas que têm maior poder aquisitivo são beneficiadas em detrimento das pessoas mais pobres, que acabam tendo de ir morar em locais cada vez mais distantes das regiões centrais. Esse afastamento dificulta ainda mais as possibilidades de ascensão social, mantendo a sociedade em situação permanente de desigualdade. É importante os estudantes perceberem que uma modernização de fato deveria priorizar a elevação da qualidade de vida da população como um todo, disponibilizando educação, saúde e transporte de qualidade para todos.

Respostas

1. O aumento populacional foi maior nas regiões mais distantes do centro, carentes de infraestrutura. Entre 1890 e 1920, a população do subúrbio quase quadriplicou. Além disso, é esperado que os estudantes percebam que, como os investimentos públicos se restringiram às regiões central e portuária da cidade, a oferta de serviços básicos, como saneamento, iluminação e transportes, tornou-se desigual. De modo geral, o objetivo de modernizar a cidade do Rio de Janeiro, no período identificado no gráfico, foi cumprido em parte porque somente as regiões centrais e grandes avenidas foram modernizadas.

2. No início do século vinte, a população pobre da cidade de Salvador (composta fundamentalmente de ex-escravos) precisaria ser afastada da região central para que esta se tornasse “vitrine” de uma cidade moderna e higiênica. Na cidade do Rio de Janeiro, por sua vez, a população mais pobre, que vivia nos antigos cortiços, foi expulsa para os morros ou para o longínquo subúrbio. No lugar dos cortiços, novas moradias e avenidas modernas foram construídas, atraindo investimentos, aumentando o preço dos terrenos e dos aluguéis.

3. Resposta pessoal. Nos dias atuais, as comunidades pobres que moram em habitações irregulares em diversos municípios são expulsas de suas moradias e, consequentemente, obrigadas a se mudar para regiões mais distantes do centro da cidade. Essas expulsões possibilitam, por exemplo, a instalação de estabelecimentos comerciais que, ao se difundirem em um bairro, elevam os preços da região, tornando difícil a fixação de pessoas menos favorecidas. As distâncias entre o trabalho e o local de moradia das pessoas, assim como a dificuldade de locomoção, os preços dos meios de transportes e o tempo gasto no deslocamento são fatores que tornam a vida dos trabalhadores pobres ainda mais precária e exaustiva. Incentive os estudantes a pensar em algumas melhorias para a qualidade de vida nos diversos bairros do município em que vivem, considerando os problemas aqui identificados e discutidos.

Cidadania e Civismo.

A luta pela cidadania

Nas primeiras décadas do período republicano no Brasil, a participação política dos cidadãos comuns era bastante restrita. A maioria da população, por ser analfabeta, não votava, poucos conseguiam fazer valer os seus direitos e o poder político se concentrava nas mãos de uma pequena elite.

Dessa fórma, eclodiram nesse período várias manifestações contra as arbitrariedades existentes na sociedade e lutas pela cidadania. Algumas revoltas ocorridas entre 1904 e 1910 podem ser consideradas símbolos dos protestos populares contra a opressão do Estado e das elites.

A Revolta da Vacina

A política de remodelamento e modernização da capital federal era acompanhada de campanhas de higienização e erradicação de doenças como febre amarela, varíola e peste bubônica.

Em 1903, o médico sanitarista Oswaldo Cruz, diretor-geral de Saúde Pública, criou brigadas sanitárias para eliminar o mosquito transmissor da febre amarela. No ano seguinte, foi aprovada a lei que tornava obrigatória a vacinação contra a varíola.

Contudo, a população não recebeu orientações sobre o assunto, e muitos não se conformavam com a obrigatoriedade da vacina. Assim, explodiu uma rebelião popular, que ficou conhecida como Revolta da Vacina.

Durante vários dias, a população enfrentou nas ruas as fôrças policiais e as tropas do Exército e da Marinha. Em 16 de novembro de 1904, a lei da vacinação obrigatória foi revogada, e o movimento refluiu até desaparecer completamente. A revolta deixou um saldo de trinta mortos e quase mil presos, dos quais 461 foram deportados para o estado do Acre.

Caricatura. Homem de cabelos pretos agrisalhados, bigode preto, vestido com paletó preto e gravata vermelha. Segura um chapéu e uma coroa de folhas de louro na mão direita. Na mão esquerda, ele traz uma grande seringa apoiada ao solo, que faz as vezes de uma muleta. Próximo ao seu pé direito há um rato. O fundo da imagem é amarelo. Na lateral da caricatura, em letras pequenas, está escrito O Dr. Oswaldo e a Seringa.
Caricatura de Oswaldo Cruz, de Bambino, década de 1910. Coleção particular.

Ler a charge

• Essa imagem é uma crítica ou um elogio ao trabalho de Oswaldo Cruz? Justifique sua resposta com elementos da imagem.

Ícone. Sugestão de site.

REVOLTA da Vacina. Disponível em: https://oeds.link/EE3qt2. Acesso em: 28 fevereiro 2022. Site ligado ao Ministério da Saúde. Apresenta diversas informações sobre a Revolta da Vacina.

Respostas e comentários

Orientações

O processo de modernização dos centros urbanos foi acompanhado, em geral, por projetos sanitários, visando combater surtos epidêmicos, como a febre amarela e a peste bubônica. O tema pode ser utilizado para discutir métodos de erradicação de doenças atuais, como a dengue e o retorno da febre amarela.

Além disso, ao abordar aspectos da luta pela cidadania nas primeiras décadas do período republicano no Brasil, o conteúdo desta página trabalha o tema contemporâneo Educação em Direitos Humanos.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento de aspectos das habilidades ê éfe zero nove agá ih zero três, ê éfe zero nove agá ih zero quatro e ê éfe zero nove agá ih zero nove.

Resposta

Ler a charge: A charge parece querer passar a ideia de que Oswaldo Cruz vivia um sentimento de frustração. Pode ser considerada, assim, tanto simpática a ele, mostrando que estava atribulado e sem resposta positiva por parte da população, como crítica, mostrando que tudo que ele fazia não teria utilidade.

Ícone. Sugestão de livro.

Sugestão para o professor:

SEVITCHENCO, Nicolau. A Revolta da Vacina: mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo: Editora Unesp, 2018.

Nessa obra, o historiador brasileiro Nicolau SEVITCHENCO identifica os principais fatores que levaram à Revolta da Vacina, durante a campanha de vacinação contra a varíola ocorrida em 1904. Segundo o historiador, a revolta teria sido o “último motim urbano clássico do Rio de Janeiro”.

Clique no play e acompanhe a reprodução do Áudio.

Transcrição do áudio

[LOCUTOR]: A Revolta da Chibata

 

[LOCUTORA]:

Na noite de 22 de novembro de 1910, um grupo de mais de mil marinheiros rendeu os próprios comandantes em dois navios de guerra que estavam ancorados na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro. Dava-se início à Revolta da Chibata, um protesto dos marinheiros contra as más condições em que viviam nas embarcações e, principalmente, contra os castigos físicos a que eram submetidos com regularidade.

 

As punições traziam à memória dos agredidos cenas que remetiam aos horrores da escravidão, e eles sabiam que aquela herança da Marinha portuguesa não era correta, até porque alguns haviam convivido por um tempo com marinheiros ingleses, grupo bastante organizado que condenava a prática dos castigos da chibata.

 

O principal nome da liderança dos rebeldes foi João Cândido, que ficou conhecido como Almirante Negro. “Almirante” é a patente de quem comanda a Marinha, e o apelido remete à moral que o líder tinha entre os marujos. Durante o movimento, ele conduziu o encouraçado Minas Gerais, o maior navio de guerra brasileiro.

 

A revolta durou cinco dias, até que o governo aceitasse as reivindicações dos rebeldes. Porém, dois dias depois, o acordo foi traído, eles acabaram presos e muitos foram expulsos da Marinha.

 

A seguir, ouviremos um trecho do depoimento de João Cândido concedido ao Museu da Imagem e do Som, o MIS, de São Paulo, em 1968.

 

[VINHETA]

 

[MIS]:

Se o senhor era tratado bem, se o senhor tinha uma condição de liderança, o que lhe levou a estruturar aquela revolta de 1910?

 

[JOÃO CÂNDIDO]:

É porque eu era marinheiro que tinha gozado de uma certa regalia com os oficiais, e a marujada me obedecia muito porque eu sempre a voz exercia uma função de mando. Eu exercia uma função de um oficial, uma função de mando, e os demais marinheiros sempre queriam estar junto a mim e essas coisas. E havia oficiais mesmo que tinham contato direto comigo. Havia oficiais sérios mesmo que queriam saber, oficiais que até pediam instrução. E daí...

 

[MIS]:

O senhor era benquisto, portanto, pelos oficiais?

 

[JOÃO CÂNDIDO]:

Pelos oficiais, por alguns. Pelos oficiais e pela marujada. E os oficiais por mim. Daí fui nascendo, fui crescendo, fui crescendo, fui crescendo, fui crescendo, até que o milho deu a espiga – deu a espiga desejada. Os marinheiros gozavam: João Cândido para aqui, João Cândido para ali, essas coisas. O senhor vai encontrar talvez aí nalgum desses livros manifestações aqui no Largo do... do Paço. Uma velha que pedia esmolas e ninguém tinha dinheiro. E eu tinha 5 mil réis no bolso e larguei na mão da velha na ocasião em que vinha chegando o meu comandante, Alexandrino de Alencar. Era o comandante do Riachuelo. Então aquilo para mim e para os demais marinheiros, aquilo foi um alento. Mandou formar a tripulação ele mesmo, fizeram um grande elogio e outras coisas. Aquilo pra mim foi um alento. Fui indo, fui tomando... era da Marinha, andando pelo mundo, tendo contato com outros povos. Muito viajado, por todos os países da Europa...

 

[MIS]:

E essa espiga de milho, quando é que nasceu o primeiro grãozinho? O que levou a produzir a espiga de milho?

 

[JOÃO CÂNDIDO]:

O primeiro grãozinho foi que... foi na organização dos comitês já com o título de comitês revolucionários.

 

[MIS]:

Quem organizou?

 

[JOÃO CÂNDIDO]:

E a intenção era aquela. Era, logo que tivéssemos o elemento essencial para impormos às autoridades, a revolta teria que vir.

 

[MIS]:

Mas quem organizou esses comitês?

 

[JOÃO CÂNDIDO]:

Os marinheiros. Eu era, eu era um dos chefes. Os marinheiros da época.

 

[MIS]:

Quais eram os outros chefes?

 

[JOÃO CÂNDIDO]:

Os outros, por exemplo, Dias Martins. Dias Martins que comandou mais tarde o cruzador Bahia, Gregório do Nascimento, que mais tarde comandou o encouraçado de São Paulo, André Avelino que comandou o encouraçado Deodoro. Todos esses marinheiros, eles congregaram os marinheiros dos navios em que eles serviam de outras repartições.

 

[MIS]:

Mas essa ideia de congregar marinheiros nesses comitês nasceu de onde e por quê?

 

[JOÃO CÂNDIDO]:

Dos próprios marinheiros.

 

[MIS]:

Pelo processo de chibata?

 

[JOÃO CÂNDIDO]:

Para combater os maus tratos e as más alimentações da Marinha. Para acabar definitivamente com a chibata na Marinha. O causo era este. Nós que vínhamos da Europa, em contato com outras marinhas, não podíamos mais admitir que na Marinha do Brasil ainda o homem tirasse a camisa para ser chibateado por outro homem.

 

[VINHETA]

A Revolta da Chibata

Em 1910, uma revolta de marinheiros, em sua maioria negros, marcou o início da República, exigindo o fim dos castigos físicos que eram aplicados pelos oficiais na Marinha brasileira.

Nas fôrças Armadas, principalmente na Marinha, os cargos oficiais eram ocupados por membros das camadas mais ricas da sociedade. A maioria dos marinheiros, por sua vez, era composta de negros e de famílias pobres. Para os oficiais, a disciplina só podia ser mantida com a mesma violência praticada no período escravista, apesar de a escravidão ter sido abolida há 22 anos, em 1888.

Liderada pelo marinheiro João Cândido, filho de um ex-escravizado, que ficou então conhecido como Almirante Negro, a revolta contra os castigos se iniciou no encouraçado Minas Gerais e se espalhou por outros navios de guerra. Inicialmente, o presidente Hermes da Fonseca cedeu às exigências dos marinheiros, prometendo anistiar os amotinados. Contudo, após a rendição, o governo prendeu e expulsou vários marinheiros da corporação.

A carta dos marinheiros

Durante o movimento, os líderes da Revolta da Chibata enviaram ao presidente Hermes da Fonseca uma carta, em que faziam suas reivindicações. Leia um trecho a seguir.

reticências retirar os oficiais incompetentes e indignos de servir a Nação Brasileira. Reformar o Código Imoral e Vergonhoso que nos rege, a fim de que desapareça a chibata, o bologlossário , e outros castigos semelhantes; aumentar o soldoglossário reticências, educar os marinheiros que não têm competência para vestir a orgulhosa farda reticências.

MARTINS, Francisco Dias. Carta redigida durante a Revolta da Chibata. gepetéc. Rio de Janeiro, [2003]. Disponível em: https://oeds.link/Fzkr7V Acesso em: 22 março 2022.

Fotografia em preto e branco. Vista parcial em local aberto. Ocupando toda a extensão horizontal da imagem, dezenas de homens negros, trajados com roupa de marinheiro, seguram vasilhas e panelas vazias. Ao solo, no convés do navio, há algumas vasilhas junto aos pés dos marinheiros. Um deles segura um cartaz com os dizeres Viva a Liberdade. Ao fundo, à esquerda, na parte mais alta do navio, outros marinheiros observam a cena.
Marujos que participaram da Revolta da Chibata, a bordo de um navio no Rio de Janeiro. Fotografia de 1910.
Respostas e comentários

Texto complementar

A visão da Revolta da Chibata pela imprensa e os desdobramentos do movimento são tratados no texto a seguir.

A construção do personagem João Cândido remonta a acontecimentos reticências de novembro de 1910, quando um grupo de mais de mil marinheiros subalternos da Marinha de Guerra se rebelou na baía de Guanabara reticências. Os marinheiros, na maioria negros, pardos e oriundos do Norte e do Nordeste do Brasil, exigiam melhores condições e o fim dos castigos corporais, em particular, a abolição da chibata.

A rebelião durou aproximadamente cinco dias e mobilizou a sociedade e a opinião da época. Alguns órgãos da imprensa foram simpáticos aos marinheiros, bem como certos parlamentares, e o governo acabou concedendo a anistia aos rebeldes. No entanto, dias depois, o Estado autorizou a publicação de um decreto que previa o desligamento da Marinha dos elementos considerados “nocivos à disciplina” a bordo dos navios (decreto 8400, de 28 novembro. 1910). Aproximadamente mil marinheiros foram dispensados da Marinha até o início de dezembro do mesmo ano, e um clima de desconfiança entre praças subalternos e oficiais tomou conta dos navios.

ALMEIDA, Silvia Capanema P. de. Do marinheiro João Cândido ao Almirante Negro: conflitos memoriais na construção do herói de uma revolta centenária. Revista Brasileira de História, São Paulo, volume 31, número 61, 2011. Disponível em: https://oeds.link/uCNMwY. Acesso em: 7 maio 2022.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento de aspectos das habilidades ê éfe zero nove agá ih zero três, ê éfe zero nove agá ih zero quatro e ê éfe zero nove agá ih zero nove.

A organização dos movimentos negros no pós-abolição

A fase que se iniciou após a abolição da escravidão e a consolidação do regime republicano foi bastante difícil para a população pobre e principalmente para os negros. O projeto popular e democrático que havia sido pensado por ativistas negros na luta pelo fim do regime escravista foi sufocado pelas elites conservadoras. Os grupos abolicionistas mais comprometidos com as questões que envolviam a cidadania da população negra propunham mudanças radicais, como reforma agrária, reforma eleitoral, acesso à educação e à saúde pública, emprego e salários dignos, entre outros direitos que permitiriam a inserção igualitária dos ex-escravizados na sociedade. No entanto, os interesses e privilégios das elites foram preservados, sem mudanças que ameaçassem a propriedade ou o poder político e econômico desses grupos.

Em diversas regiões do país foram organizadas associações de pessoas negras que buscavam fazer frente às práticas racistas e às desigualdades sociais. Esses núcleos contribuíram para as experiências de organização e luta da população negra e a difusão de ideias de pensadores negros que buscavam alternativas para a construção de uma sociedade menos desigual. Nesse período, foram fundados diversos jornais independentes que compunham a chamada imprensa negra e que tiveram papel importante no desenvolvimento das lutas por democracia, igualdade econômica e social e participação da população afro-brasileira na vida política do país.

A imprensa negra contribuiu ainda no processo de consolidação dos movimentos negros contemporâneos e na construção de identidades das comunidades afrodescendentes.

Primeira página de jornal, em preto e branco. Na parte superior, em letras garrafais está escrito o nome do periódico: A Liberdade. Logo abaixo, no cabeçalho, o local e data de publicação: São Paulo, 14 de Julho de 1919. Trata-se do primeiro número do jornal. Na parte inferior, há três colunas na vertical com textos. À esquerda, está um artigo com o titulo A Liberdade e, à direita, um poema com título Alma morta.
Primeira página do periódico da imprensa negra A liberdade, de 14 de julho de 1919. O jornal circulou na cidade de São Paulo entre 1919 e 1920 e trazia em seu subtítulo: “Órgão dedicado à classe de cor, crítico, literário e noticioso”. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro.
Ícone. Sugestão de livro.

PETTA, Nicolina Luiza de. A fábrica e a cidade até 1930. São Paulo: Atual, 2009. A vida urbana no Brasil do começo do século vinte e o cotidiano dos operários nas fábricas são os temas abordados neste livro.

Respostas e comentários

Atividade complementar

Pesquisadores da Universidade de São Paulo (úspi) organizaram um site para divulgar edições digitalizadas de periódicos da imprensa negra paulista do começo do século vinte. Segundo texto dos próprios pesquisadores, esse site

reticências foi concebido como dispositivo para ampla divulgação das edições dos periódicos da Imprensa Negra no Estado de São Paulo, que circularam na primeira metade do século vinte. O interesse que move a criação do site é a facilitação do acesso público aos periódicos da imprensa negra, importantes fontes documentais para a elaboração de pesquisas sobre o tema das relações raciais no Brasil.

IMPRENSA Negra Paulista. Institucional. Universidade de São Paulo (úspi). 2022. Disponível em: https://oeds.link/o6Nau8. Acesso em: 25 março. 2022.

Sugerimos uma consulta às edições do periódico A Liberdade, digitalizadas em ótima qualidade. Se possível, você pode mostrar aos estudantes algumas páginas dessas edições, numa atividade de consulta, utilizando os computadores da sala de informática de seu estabelecimento de ensino. Essa será uma boa oportunidade para que os estudantes possam ler trechos de textos publicados na imprensa negra do começo do século vinte, tomando contato com o teor das notícias e dos textos literários publicados e com a linguagem usada na época. Além disso, destacamos que esta proposta de atividade complementar possibilita, entre os estudantes, um momento propício para exercitar a análise documental como prática de pesquisa.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento de aspectos das habilidades ê éfe zero nove agá ih zero três, ê éfe zero nove agá ih zero quatro e ê éfe zero nove agá ih zero nove.

Ícone. Sugestão de livro.

Sugestões para o professor:

DOMINGUES, Petrônio. Protagonismo negro em São Paulo: história e historiografia. São Paulo: Edições Serviço Social do Comércio, 2019.

Na obra, o historiador brasileiro Petrônio Domingues identifica e analisa o protagonismo negro paulista no século vinte, considerando ações políticas, manifestações culturais e movimentos sociais.

Chuárquis, Lilia Moritz. Retrato em branco e negro: jornais, escravos e cidadãos em São Paulo no final do século dezenove. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.

A obra apresenta um estudo completo e abrangente sobre como os afrodescendentes eram vistos pela elite branca da cidade de São Paulo, entre os anos de 1870 e 1890.

Ícone. Ilustração de três pessoas e dois balões de fala indicando a seção Em debate.

Em debate

Multiculturalismo

A inserção dos ex-escravizados na sociedade brasileira após a abolição

É consenso entre os historiadores que o Estado brasileiro não se responsabilizou pelo destino dos ex-escravizados após a abolição. Contudo, as estratégias dos ex-escravizados para obterem meios de ganhar a vida é motivo de debate. Até o início da década de 2000, a maior parte dos pesquisadores do tema acreditava que a quase totalidade dessas pessoas teria migrado para as cidades.

Leia o artigo a seguir e depois discuta com um colega as questões propostas. Registre as suas conclusões no caderno.

Mas havia os que migraram imediatamente para as cidades e mesmo para outras fazendas. reticências [Podia ser] uma nova fazenda ou sítio, nos quais os indivíduos construíam suas casas de pau a pique, e vinculavam-se ao proprietário ou arrendatário da terra por um contrato, cujo pagamento convertia-se em gêneros alimentícios ou em moeda reticências.

As famílias que permaneceram [onde eram escravizadas antes da abolição] vincularam-se ao trabalho mediante contratos baseados no costume reticências. Nesses sistemas, eles tocavam o gado, abriam roçados, plantavam as sementes, colhiam os frutos e cuidavam das dependências da fazenda, mesmo que para isso ganhassem, nos casos de extrema exploração, somente um litro de banha pela tarefa executada reticências. Aqueles que tinham o direito a pequenas lavouras plantavam para complementar a alimentação familiar e, em certas condições, poderiam até melhorar a qualidade de vida e ascender socialmente. reticências

Como podemos ver, a complexidade dos destinos dos libertos mostra um lado enriquecedor da História quando comparada àquela, já bastante criticada reticências, que defende que os negros migraram em massa para as cidades, moravam nas favelas, as mulheres prostituíam-se e os homens tornavam-se marginais. Algumas coletâneas, por exemplo, reúnem outras fórmas de investigar os libertos e seus descendentes no pós-abolição, revelando as experiências de trabalho urbano desses homens, mulheres e crianças nas áreas mais diversas, como a indústria, o trabalho doméstico, os esportes, a música, o teatro, a imprensa, a escola, as fôrças Armadas, a construção de ferrovias e as profissões liberais.

NASCIMENTO, Álvaro Pereira do. “Sou escravo de oficiais da Marinha”: a grande revolta da marujada negra por direitos no período pós-abolição (Rio de Janeiro, 1880-1910). Revista Brasileira de História, São Paulo, volume 36, número 72, agosto 2016. Disponível em: https://oeds.link/7LSQyR. Acesso em: 25 abril 2022.

  1. Além da migração para as cidades, que outras soluções para ganhar a vida os ex-escravizados encontraram?
  2. Quais eram as condições de trabalho dos libertos que permaneceram nas fazendas após a abolição da escravidão?
  3. Que visão sobre a inserção dos ex-escravizados nas atividades urbanas é criticada pelo autor do texto?
Respostas e comentários

Observação

Esta seção constitui uma ótima oportunidade para o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero três.

Respostas

1. Segundo o texto, muitos ex-escravizados dirigiram-se para outras fazendas ou sítios, onde construíam casas de pau a pique e vinculavam-se ao proprietário ou arrendatário da terra por meio de um contrato. O pagamento pelo seu trabalho era feito em gêneros alimentícios ou em moeda. Outros permaneciam nas mesmas fazendas em que já trabalhavam antes da abolição.

2. Os libertos que permaneceram nas fazendas após a abolição passaram a se vincular ao trabalho por meio de contratos baseados no costume. Tocavam o gado, abriam roçados, plantavam as sementes, realizavam as colheitas etcétera.

3. O autor do texto considera que os destinos e as trajetórias dos ex-escravizados após a abolição constituem processos bastante complexos. Ele critica a visão que dizia que os ex-escravizados migraram em massa para as cidades, passando a morar nas favelas. De acordo com essa visão, criticada por diversos outros pesquisadores, as mulheres “prostituíam-se” e os homens “tornavam-se marginais”. Ele ainda defende que, segundo pesquisas recentes, essa visão é errônea porque a experiência de trabalho urbano de homens e mulheres libertos deu-se em muitas outras áreas, como na indústria, nas fôrças Armadas, na imprensa, na música, no trabalho doméstico, nas profissões liberais etcétera.

Orientações

Ao trabalhar questões relacionadas às atividades exercidas pelos ex-escravizados após a abolição, em 1888, bem como a importância da luta dos afrodescendentes por direitos e por melhores oportunidades de trabalho, destacamos que o conteúdo desta seção possibilita uma abordagem dos temas contemporâneos Educação para valorização do multiculturalismo nas matrizes históricas e culturais brasileiras e Educação em Direitos Humanos.

Trabalhadores e trabalhadoras se organizam

A expansão urbana e do setor industrial resultou no crescimento do operariado no país. Em 1880, o Brasil possuía 54 mil trabalhadores nas indústrias. Em 1920, esse número havia ultrapassado a marca de 200 mil operários.

As condições de trabalho dos operários na nascente indústria brasileira eram péssimas. As jornadas de trabalho variavam entre 14 e 16 horas diárias, não havia cobertura médica nem indenização por acidente dos trabalhadores nas fábricas. Além disso, não havia direito a férias remuneradas, salário mínimo, licença-maternidade e proibição ao trabalho infantil.

Os melhores salários eram pagos aos trabalhadores mais qualificados. No setor metalúrgico, por exemplo, fundidores, caldeireiros e mecânicos eram mais bem pagos. As mulheres e as crianças, por sua vez, trabalhavam principalmente no setor têxtil. Em 1920, a participação das mulheres nas indústrias de tecidos chegava a 58% do total de empregados no setor.

Grande parte dos operários das indústrias brasileiras era imigrante, com predomínio de italianos, espanhóis e portugueses. Foi por intermédio desses estrangeiros que as ideias socialistas, comunistas e anarquistas se difundiram no ambiente fabril e nos bairros operários.

Nas primeiras duas décadas do século vinte, a influência anarquista foi predominante no meio operário brasileiro. Uma de suas principais correntes era o anarcossindicalismo, que propunha o engajamento dos militantes nos sindicatos, vistos como instrumentos de luta por melhores condições de trabalho e de organização dos trabalhadores para a construção de uma revolução social.

Fotografia em preto e branco. Vista parcial de um vasto salão com máquinas de tear e tanques de lavar tecido, com grandes janelas gradeadas ao fundo. Em primeiro plano, quatro mulheres trabalham, sendo que duas operam uma máquina de tear, a outra as observa trabalhando e, uma outra, está sentada e costura um objeto à mão. Em segundo plano, alguns homens e mulheres em pé trabalham.
Operárias da Tecelagem Mariângela, das Indústrias Reunidas F. Matarazzo, na cidade de São Paulo. Fotografia da década de 1920. As fábricas têxteis empregavam um grande número de crianças e mulheres, as quais recebiam salários mais baixos que os dos homens adultos que desempenhavam a mesma função.
Respostas e comentários

Atividade complementar

Compartilhe o texto a seguir com os estudantes.

reticências a deficiência de ventilação e iluminação, a falta de aspiradores de pó, a ausência de vestiários, principalmente para as operárias –, notados em alguns estabelecimentos, seriam facilmente corrigidos desde que houvesse, por parte dos industriais, um pouco de boa vontade. reticências

Funciona esta fábrica em um vasto edifício de dois pavimentos, hoje insuficiente para o número de máquinas assentadas e para a quantidade de operários em serviço. Com esse acúmulo de máquinas e trabalhadores e com a falta de separação das diferentes seções, não são raros os desastres reticências.

Os operários, ao entrarem para o serviço, por falta de lugar apropriado, são obrigados a mudar as suas vestes no próprio lugar em que trabalham em comum.

CONDIÇÕES do trabalho na indústria têxtil no estado de São Paulo. Boletim do Departamento Estadual do Trabalho, página 35-77. In: DECCA, Maria Auxiliadora Guzzo de. Indústria, trabalho e cotidiano: Brasil, 1889-1930. São Paulo: Atual, 1991. página 32-33.

Após a leitura do texto, os estudantes podem fazer a seguinte atividade, reunidos em duplas:

Relacionem o texto com o que vocês aprenderam sobre as lutas do movimento operário no Brasil durante a Primeira República.

É importante que os estudantes identifiquem as péssimas condições de trabalho nas fábricas na Primeira República, levando em consideração que esse foi um dos motivos que levaram à organização e à mobilização do movimento operário.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero nove.

A greve geral de 1917

Os métodos de luta dos anarquistas eram o boicote, a sabotagem e, sobretudo, a greve, vista como estratégia fundamental na conquista de direitos.

Em julho de 1917, uma greve geral paralisou por três dias a cidade de São Paulo. Atividades industriais, comerciais, dos setores de serviços e de transportes foram interrompidas. A fim de agrupar as várias categorias em greve e intermediar as negociações com empresários e o governo, anarquistas, apoiados por socialistas, formaram o Comitê de Defesa Proletária. Dentre os militantes que se destacaram na coordenação do movimento, cabe ressaltar a presença de mulheres anarquistas do Centro Feminino de Jovens Idealistas, em especial de Rosa Musitano e Maria Angelina Soares, que era secretária da Liga Operária da Mooca.

Com a ajuda de uma Comissão de Imprensa, um acordo foi assinado entre grevistas, empresários e representantes do governo. Entre as conquistas dos trabalhadores, constavam aumento de 20% sobre os salários, o direito de associação dos operários e a não demissão de grevistas. Depois de cessada a greve, contudo, o acordo não foi cumprido por grande parte dos industriais, e nos meses seguintes líderes anarquistas foram presos e deportados.

Fotografia em preto e branco. Vista parcial de uma rua em declive, cercada de prédios baixos, de até três pavimentos. Em destaque, uma multidão caminha e ocupa toda a extensão da rua. Duas pessoas carregam duas bandeiras pretas. Em primeiro plano, nota-se que a maioria é formada de homens, mas há poucos adolescentes e algumas crianças. No canto esquerdo da imagem, sobre uma plataforma, duas crianças e alguns homens observam o movimento da rua.
Passeata de operários em greve, descendo a Ladeira do Carmo a caminho do bairro do Brás, em São Paulo. Fotografia publicada na revista A Cigarra, em 26 de julho de 1917. Arquivo Público do Estado de São Paulo, São Paulo.

Greves em 1907 e 1912

Em São Paulo, nos anos de 1907 e 1912, sob influência anarquista, várias categorias deflagraram greves por aumento salarial e pela implantação da jornada de trabalho de oito horas diárias. Em 1907, alguns trabalhadores da construção civil, de gráficas e de indústrias de sapatos conquistaram essa jornada. Em 1912, os operários da fábrica de calçados Clark conseguiram reduzir sua jornada diária para oito horas e meia.

Ícone. Sugestão de livro.

GATTAI, Zelia. Anarquistas, graças a Deus. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. Este livro conta a trajetória de uma família de imigrantes italianos e anarquistas e sua adaptação no Brasil do começo do século vinte.

Respostas e comentários

Orientações

Ao tratar do contexto das greves de 1907, 1912 e da greve geral de 1917, é interessante informar aos estudantes que os patrões reagiram às mobilizações dos trabalhadores aprovando a lei de expulsão de estrangeiros que colocassem em risco a ordem pública. Essa lei, ao entrar em vigor em 1907, resultou na expulsão de 132 estrangeiros, principalmente italianos, todos eles líderes sindicais. Até 1921, período de vigência da lei, foram expulsos 556 estrangeiros.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página possibilita, mais uma vez, o desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero nove.

Orientações

As riquezas geradas pelo café impulsionaram o processo de urbanização e industrialização do país. Com isso, novos personagens entraram em cena, como os operários, que atuaram em greves e organizaram outras fórmas de luta. Para desenvolver esse tema em sala de aula, sugerimos incentivar os estudantes a estabelecer comparações entre as condições de trabalho nas fábricas brasileiras do início do século vinte com aquelas vigentes na Europa e nos Estados Unidos, na época da Primeira e da Segunda Revolução Industrial.

O Modernismo

O período entre o final do século dezenove e início do século vinte foi caracterizado por uma grande efervescência cultural na Europa. A ideia de que se vivia em uma época nova, marcada pelos avanços tecnológicos, despertava debates.

Alguns artistas brasileiros entraram em contato com essas discussões. De suas reflexões e produções artísticas surgiu o movimento conhecido como Modernismo, que rompeu com valores e padrões estéticos.

O movimento deve ser compreendido no contexto em que surgiu. A nova elite brasileira que ascendeu com a riqueza gerada pelo café e pelas indústrias desejava conquistar também a hegemonia no campo das ideias e da cultura. Opondo-se à antiga elite do país, que valorizava exclusivamente a cultura europeia tradicional, a nova elite passou a estimular a produção dos artistas modernistas.

Uma nova identidade cultural

O ambiente cultural, literário e artístico efervescente do início do século vinte e a Primeira Guerra Mundial colaboraram para que se produzisse uma “desilusão em relação à Europa” e uma valorização das raízes locais.

Foi nesse contexto, no início da década de 1920, que o Modernismo surgiu no Brasil. Os artistas e intelectuais que participaram desse movimento, principalmente paulistanos, queriam criar uma nova cultura nacional, conectada com as grandes transformações da civilização industrial.

A Semana de 1922

O movimento modernista atingiu o seu ápice com a Semana de Arte Moderna de 1922, realizada no Theatro Municipal de São Paulo. O evento reuniu artistas como Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Mário de Andrade, osváld de Andrade, vitor brêchêrê e Heitor Villa-Lobos.

A Semana de 1922 foi programada para comemorar o primeiro centenário da independência do Brasil. Mas, na realidade, a intenção dos artistas era proclamar a segunda independência, dessa vez cultural e moderna. Eles propunham a ruptura com o tradicionalismo e a visão colonialista, por meio da apropriação de diversas influências culturais e da valorização da cultura popular.

Capa de catálogo. Na parte superior, há uma ilustração em preto e branco sobre papel amarelado representando uma estátua de corpo feminino nu, com cabeça para baixo, sobre uma plataforma quadrada onde se lê as iniciais D C. Ao fundo, partes em preto e branco de formas diversas, sendo que algumas delas lembram folhas, e outras lembram corpos de pessoas. Os traços e as formas não pretendem apresentar as figuras com realismo; trata-se da arte modernista, que distorce as formas para obter impactos diversos sobre o observador. Na parte inferior da capa do catálogo está escrito, em vermelho e preto: SEMANA DE ARTE MODERNA – CATÁLOGO DA EXPOSIÇÃO. SÃO PAULO 1922.
Capa produzida pelo pintor Di Cavalcanti para o catálogo da exposição da Semana de Arte Moderna de 1922. Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo, São Paulo. As inovações artísticas apresentadas não agradaram ao público; apesar disso, a arte moderna foi consagrada como uma das mais importantes manifestações culturais do período.
Respostas e comentários

Orientações

Um exemplo da intenção dos modernistas de transpor os modelos culturais existentes é o poema No meio do caminho, do poeta mineiro Carlos Drumôn de Andrade (1902-1987). Publicado em 1928, o coloquialismo, a concisão e as repetições criadas no poema rompiam com o rigor da métrica e das estruturas fixas predominantes nos poemas até então, causando estranheza e reações extremadas, tanto de repúdio quanto de encantamento.

No meio do caminho tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

Tinha uma pedra

No meio do caminho tinha uma pedra.

ANDRADE, Carlos Drumôn de. No meio do caminho. In: MORICONI, I. (Organização.). Os cem melhores poemas brasileiros do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. página 71.

Observação

O trabalho com os conteúdos desta página possibilita o desenvolvimento de aspectos da habilidade ê éfe zero nove agá ih zero cinco.

Ícone. Sugestão de livro.

Sugestão complementar referente ao Capítulo:

DE NICOLA, José; DE NICOLA, Lucas. Semana de 22: antes do começo, depois do fim. São Paulo: Estação Brasil, 2021.

A obra reúne vasta documentação e uma rica iconografia sobre a Semana de Arte Moderna de 1922 e pretende aprofundar as discussões a respeito desse evento, tão importante para a história da Arte no Brasil.

Atividades

Faça as atividades no caderno.

  1. Qual é a relação entre a urbanização e a industrialização no Brasil?
  2. Como as reformas urbanas nas capitais brasileiras impactaram a vida da população pobre no início do século vinte?
  3. Leia a seguir um trecho de artigo publicado em 1927 no jornal Clarim d’Alvorada, que circulou na cidade de São Paulo e constituiu a imprensa negra do início do século vinte.

Trabalhemos para que vejamos alto a nossa classe. Unamo-nos, esforcemo-nos, estudemos, para o melhorio da raça negra. Ela necessita de um hospital para o amparo dos nossos patrícios inválidos, necessitamos de Jornais, como já temos o Clarim d’Alvorada, pequeno na verdade, no entanto, essa pequenez toma vulto de gigante, pois grande, soberbo, é o ideal pelo qual ele se bate. reticências A União, – si unirmos, dentro de poucos anos seremos outros, teremos tudo quanto almejamos, como sejam, Hospitais, Jornais, Caixas beneficentes, etcétera etcétera

Portanto, unamo-nos, a classe nos chama, corremos a ela e ergamo-la dos escombros. Com um pequenino esforço de cada, poderemos tão facilmente levar avante o nosso ideal e mantermos uma posição mais elevada em nosso meio social. reticências

LUIS de Souza. Treze de maio. Clarim d’Alvorada, São Paulo, página 13, 13 maio 1927. Disponível em: https://oeds.link/Uw0WmE. Acesso em: 23 março 2022.

  1. O que o autor do artigo propõe à comunidade negra?
  2. Segundo o texto, quais eram os ideais almejados pela população negra na época em que o artigo foi escrito?
  3. Explique a importância da imprensa negra na organização dos movimentos de luta pela transformação da sociedade e de oposição às práticas racistas na Primeira República.

4. Leia o texto a seguir e responda às questões.

A escalada sufocante do custo de vida, convergindo com a ampliação dos investimentos industriais e a interrupção do fluxo migratório, reforçou a capacidade de organização, reivindicação e negociação dos operários, levando empresários e autoridades a recorrerem mais aberta e completamente à violência policial como recurso fundamental de contenção. A equação explosiva que assim se armou irrompeu num conflito urbano da mais extrema gravidade em julho de 1917, quando a polícia matou um operário grevista ao reprimir uma manifestação de têxteis por melhores salários. A passagem do cortejo fúnebre pela cidade arrebatou multidões operárias, desencadeando uma greve geral reticências.

SEVITCHENCO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. página 142.

  1. Por que empresários e autoridades recorreram à violência policial em 1917 para conter o movimento operário?
  2. Que acontecimento levou operários às ruas e provocou a greve geral de 1917?

5. O pintor carioca Di Cavalcanti é considerado um dos maiores representantes do Modernismo brasileiro. Observe uma de suas telas e responda ao que se pede.

Pintura. Três personagens foram representados nessa pintura, sendo duas mulheres e um homem. Ele está na parte inferior esquerda da pintura, veste calça e paletó azuis, uma camisa de gola branca e sapatos claros. Está voltado para a frente e sentado, e toca um instrumento de corda, assemelhado à viola, ao violão e ao cavaquinho. A parte direita de seu corpo não aparece na pintura. Ele observa a mulher ao centro, voltando o rosto e os olhos para cima e para a direita da pintura, onde ela está. Essa mulher ao centro e no alto da pintura está sentada, tem o cabelo preto preso em coque, e veste uma camiseta rosa de manga curta, uma saia verde claro até os joelhos e uma meia fina da mesma cor. Ela apoia o queixo sobre a mão direita, de maneira que seu rosto está voltado para cima; o cotovelo esquerdo está sobre o joelho esquerdo e a mão esquerda repousa sobre seu joelho direito; sobre o punho esquerdo, está o seu cotovelo direito. A terceira figura é uma mulher que está de costas para o observador, e olha para a esquerda. Ela tem cabelos negros aparentemente soltos, que chegam até a nuca. Ela usa uma camiseta branca, sem gola, o que deixa seus ombros à mostra; está sentada, e, por isso, não é possível identificar se ela usa uma calça, bermuda, ou uma saia vermelho claro. A parte direita de seu corpo não aparece na pintura. Sua mão direita está sobre a cabeça e, com a esquerda, ela leva à boca um objeto pequeno e amarelo, semelhante a um cachimbo ou a um apito. Atrás dessas pessoas, há formas cilíndricas da cor de madeira. No centro da pintura, atrás da cabeça da mulher de camiseta rosa, essas formas cilíndricas dão lugar à cor preta. As figuras estão distribuídas em triângulo na pintura; são robustas e rechonchudas; traços mais retilíneos foram reservados pelo pintor para os narizes, bocas, bancos ou plataformas sobre os quais as figuras estão sentadas, e para as formas cilíndricas ao fundo. Todos são negros, e não há preocupação com o realismo na representação. A ideia de movimento de uma da roda de samba é obtida pelo posicionamento dos membros do corpo (como a mão sobre a cabeça da mulher de costas, ou o olhar e as mãos do homem que toca o instrumento de corda).
DI CAVALCANTI, Emiliano. Roda de samba. 1929. Óleo sobre madeira, 64 por 49 centímetros. Coleção particular.

Compare o tema e o estilo de sua pintura com os do quadro Proclamação da República, de Benedito Calixto, apresentado anteriormente. Que diferenças você percebe?

Respostas e comentários

Seção Atividades

Objetos de conhecimento

A questão da inserção dos negros no período republicano do pós-abolição.

Os movimentos sociais e a imprensa negra; a cultura afro-brasileira como elemento de resistência e superação das discriminações.

Primeira República e suas características.

Contestações e dinâmicas da vida cultural no Brasil entre 1900 e 1930.

Anarquismo e protagonismo feminino.

Habilidades

São trabalhados aspectos relacionados às habilidades:

ê éfe zero nove agá ih zero três (atividades 3, 5)

ê éfe zero nove agá ih zero quatro (atividades 3, 5)

ê éfe zero nove agá ih zero cinco (atividades 1, 2)

ê éfe zero nove agá ih zero nove (atividades 3, 4)

Respostas

1. A instalação das indústrias atraiu pessoas para as cidades, assim como o crescimento das cidades contribuiu para incrementar as indústrias, pois criou demandas por bens de consumo doméstico. Essa produção foi a base da indústria nascente.

2. Elas geraram uma reacomodação da população daquelas cidades. As pessoas com menor poder aquisitivo, que, na maior parte dos casos, moravam no centro, foram expulsas para bairros distantes, longe de seus locais de trabalho. A população que se deslocou para bairros mais distantes não tinha acesso regular a serviços como saneamento básico nem desfrutou das melhorias urbanas das regiões centrais.

3. a) “Trabalhemos para que vejamos alto a nossa classe. Unamo-nos, esforcemo-nos, estudemos, para o melhorio da raça negra.”

b) Melhores condições de vida e de trabalho para a população negra, com a criação de hospitais, jornais, etcétera.

c) A imprensa negra tornou-se um meio de comunicação dos negros durante a Primeira República, um período especialmente delicado para os ex-escravizados. Por isso, a presença de periódicos no qual eles pudessem se expressar foi muito significativa.

4. a) Porque os trabalhadores conseguiram se organizar melhor no período e passaram a ter mais fôrça para reivindicar melhorias e direitos para a sua classe.

b) De acordo com o texto: “quando a polícia matou um operário grevista ao reprimir uma manifestação de têxteis por melhores salários. A passagem do cortejo fúnebre pela cidade arrebatou multidões operárias, desencadeando uma greve geral”.

5. A pintura de Benedito Calixto representa a arte oficial e acadêmica, voltada para a exaltação da nacionalidade brasileira. A obra de Di Cavalcanti, ao contrário, representa uma ruptura com esse modelo acadêmico. Ele se apropria de modelos e técnicas estrangeiros, especialmente do cubismo, para representar e, ao mesmo tempo, valorizar a cultura brasileira.

Ícone. Ilustração do globo terrestre circundado por uma linha amarela, simulando a trajetória da Lua em torno do planeta, indicando a seção Ser no mundo.

Ser no mundo

Multiculturalismo

Samba e identidade

Em 1916, Ernesto dos Santos, conhecido como Donga, entregou no Departamento de Direitos Autorais da Biblioteca Nacional, na cidade do Rio de Janeiro, um pedido para registrar oficialmente o primeiro samba que seria gravado, intitulado “Pelo telefone”.

A palavra “samba” tem origem na expressão africana “semba” (umbigada), usada para se referir a uma dança de roda. Assim, o samba urbano, praticado pelas comunidades negras baianas que viviam na cidade do Rio de Janeiro, entre o final do século dezenove e o começo do vinte, tinha suas raízes no samba de roda praticado na Bahia desde o século dezessete e acima de tudo na cultura africana.

Era especialmente na chamada “Pequena África”, da cidade do Rio de Janeiro, na casa de mulheres afrodescendentes, muitas delas baianas, conhecidas como “tias”, que a primeira geração de sambistas urbanos se reunia para compor, tocar e festejar. Muitas das pessoas que frequentavam essas rodas de samba haviam migrado de diversas cidades da Bahia para o Rio de Janeiro, procurando novas oportunidades de trabalho. A “Pequena África” compreendia a região entre o cais do porto e os seguintes bairros: Saúde, Estácio, Santo Cristo, Gamboa e Cidade Nova.

Fotografia em preto e branco. Nove homens em duas fileiras seguram instrumentos musicais. Quatro deles são negros e cinco são brancos. Todos estão vestidos com camisa de gola branca, de gravata, terno, calça e sapatos escuros. Na fileira da frente, há cinco homens sentados, quatro deles com um violão entre as pernas e um outro, à esquerda, com um cavaquinho sobre o joelho esquerdo. Na ponta da direita, um círculo vermelho destaca Donga, que olha levemente à direita. Na fileira do fundo, os outros quatro homens estão em pé. Ao centro, um deles segura uma flauta transversal e o outro, um reco-reco.
Na imagem, Donga (no detalhe) com os integrantes do conjunto Os Oito Batutas, do qual também fazia parte o compositor e instrumentista Pixinguinha. Fotografia de cêrca de 1922. Instituto Moreira Salles, Rio de Janeiro.
Respostas e comentários

Seção Ser no mundo

Em consonância com as Competências Gerais da Educação Básica número 1, número 3 e número 6, os conteúdos trabalhados nesta seção buscam levar o estudante a valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade reticências (1) e valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais reticências (3). Além disso, o estudante é incentivado a valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais reticências (6).

Além disso, em consonância com a Competência Específica do Componente Curricular História número 4, esta seção busca levar o estudante a Identificar interpretações que expressem visões de diferentes sujeitos, culturas e povos com relação a um mesmo contexto histórico, e posicionar-se criticamente com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.

Destacamos também que os conteúdos desta seção constituem um momento propício para o trabalho com o tema contemporâneo Educação para valorização do multiculturalismo nas matrizes históricas e culturais brasileiras.

Habilidades

ê éfe zero nove agá ih zero três: Identificar os mecanismos de inserção dos negros na sociedade brasileira pós-abolição e avaliar os seus resultados.

ê éfe zero nove agá ih zero quatro: Discutir a importância da participação da população negra na formação econômica, política e social do Brasil.

O surgimento do samba moderno, radiofônico e fonográfico, isto é, integrado à indústria cultural representada pela rádio e pelo disco, se dá no início do século vinte, no cenário pós-abolição. Nesse momento, os afrodescendentes procuravam ampliar seus direitos, sua participação no mercado de trabalho, na vida pública, artística, cultural e política do país. Será que o samba constituiu uma fórma importante de afirmação da identidade da população afro-brasileira? Leia o trecho a seguir e reflita um pouco mais sobre o assunto.

A maior das figuras dessa época é sem dúvida a Tia Ciata, essa baiana de Salvador que fez de sua casa o ponto de resistência fundamental do que Heitor dos Prazeres [sambista, compositor e pintor] chamava de “a pequena África”reticências.

reticências

Ciata chegou ao Rio em 1876, já feita no candomblé e mãe de uma criança. Em sua casa, “se mesclavam o baile, o sarau, a roda de samba e o candomblé”. Por ela, diz Maria Clementina Pereira da Cunha [historiadora], “circulavam todas as esferas da sociedade, do esnobe literato ao policial ou ao partideiro capoeirista da Saúde”. Por que tanta e variada gente ia lá? Responde Edigar de Alencar [jornalista e cronista]: “Como disse certa vez Almirante [cantor, sambista, radialista e pesquisador] ao microfone, a casa era um laboratório de ritmos manipulados por macumbeiros, pais de santo, boêmios e gente curiosa que ali acorria para assistir às cerimônias religiosas e às festas de sons que representavam”.

MOURA, Roberto. No princípio, era a roda: um estudo sobre samba, partido-alto e outros pagodes. Rio de Janeiro: Rocco, 2004. página 58, 60.

Fotografia em preto e branco. Retrato do busto de uma mulher, com olhar levemente direcionado para à esquerda do fotógrafo. Ela é negra, tem cabelos escuros e crespos penteados para trás, formando dois coques laterais. Traz um brinco na orelha esquerda, e um colar no pescoço. Ela usa um tecido no braço esquerdo com listras horizontais e traja um vestido branco rendado de mangas curtas.
Hilária Batista de Almeida, a Tia Ciata, símbolo da resistência cultural africana no Brasil. Acervo da Organização dos Remanescentes da Tia Ciata (ó érre tê cê), Rio de Janeiro.
  1. Considerando as informações do texto, você diria que a socialização que ocorria em torno da casa da Tia Ciata e da “Pequena África” foi positiva para os descendentes de africanos no período logo após a abolição da escravidão? Por quê?
  2. Em sua opinião, o samba cumpre atualmente algum papel na construção da identidade dos afrodescendentes brasileiros? Existem outras manifestações hoje no Brasil que podem ser relacionadas à identidade e à cultura negra?
  3. Reúna-se em grupo com os colegas. Vocês irão organizar um material de divulgação de uma manifestação cultural que contribuiu ou contribui para a construção da identidade negra no Brasil. Vocês devem pesquisar informações sobre a manifestação cultural que considerarem mais interessante e escolher um meio para divulgar as descobertas que fizeram. Pode ser a produção de um programa de rádio em podcast, de audiovisual, de cartaz, de performance, de artigo impresso e ou ou digital, entre outras fórmas.
Respostas e comentários

Respostas

1. É esperado que os estudantes compreendam que sim. Num período de preconceito racial e ascensão de teorias de branqueamento, participar de uma socialização desse tipo foi de extrema importância para os ex-escravizados e seus descendentes. A arte, a música, a sociabilidade e a criação de espaços em que os afrodescendentes pudessem elaborar e fortalecer a própria autoestima constituem fatores importantes para a inserção deles no “mundo livre” após a abolição, além de colaborar para a formação da identidade do grupo.

2. Respostas pessoais. Espera-se que os estudantes digam que o samba ainda cumpre papel importante na construção da identidade de afro-brasileiros. Contudo, a construção dessa identidade não se dá apenas pelo samba, mas também por outras manifestações culturais relacionadas, como a literatura, o rap, a dança, as artes visuais, o teatro, entre outras.

3. Incentive os estudantes na realização da pesquisa. A divulgação das descobertas feitas pela turma pode ser feita de diversas maneiras. Se possível, estimule o uso de meios digitais (com a produção de textos ou podcasts) para que os estudantes tenham a oportunidade de produzir e divulgar conhecimentos utilizando e experimentando novas tecnologias.

Questões para autoavaliação

Na página final de cada Unidade deste livro, incluímos questões que podem, a seu critério, ser sugeridas aos estudantes para que eles realizem uma autoavaliação sobre o que apreenderam ao estudar os conteúdos da Unidade. Eles podem respondê-las de fórma escrita, individualmente, ou podem conversar sobre elas em duplas ou em grupos, de maneira a incentivar a oralidade e a troca de ideias na sala de aula.

A seu critério, as questões aqui apresentadas também podem ser utilizadas para o diagnóstico do grau de aprendizagem dos estudantes.

1. Que acontecimentos levaram à queda da Monarquia e à instauração da República no Brasil?

2. De que maneira o regime federativo atendia aos interesses dos grupos oligárquicos dominantes nos estados?

3. Que tipos de conflitos aconteceram no campo nos primeiros anos da República, e quais as suas causas?

4. Quais fatores impulsionaram a industrialização e o crescimento das cidades brasileiras na Primeira República? Qual o papel dos imigrantes nesse contexto?

5. Que problemas sociais e políticos do Brasil os movimentos urbanos do início da República expressavam e contestavam?

6. Como as mudanças tecnológicas, econômicas e sociais do Brasil da Primeira República contribuíram para o surgimento de uma nova arte?

Glossário

Maçonaria
Associação filosófica e política com práticas secretas que era vista com desconfiança pela Igreja católica por ter entre seus princípios a tolerância religiosa.
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Federalismo
Sistema de governo em que províncias ou estados de um país têm autonomia administrativa, embora sujeitos às leis gerais da federação.
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Líderes messiânicos
Pessoas que se veem e são vistas como enviadas de Deus para salvar a humanidade.
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Expugnado
Conquistado.
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Bilontra
Que ou quem age com esperteza.
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Bolo
Tipo de castigo que consistia em bater na mão com uma palmatória.
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Soldo
Remuneração recebida pelos marinheiros.
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