O ensino de Língua Portuguesa

A alfabetização

A Política Nacional de Alfabetização (PNA) define alfabetização como "o ensino das habilidades de leitura e de escrita em um sistema alfabético" (BRASIL, 2019, p. 18). O sistema alfabético, por sua vez, é o sistema que representa os sons da fala (fonemas) por meio de letras do alfabeto (caracteres).

Para ser considerada alfabetizada, a pessoa precisa primeiro compreender o princípio alfabético, ou seja, entender que as letras são mais do que meros sinais gráficos, mas que representam os sons da fala. Ao compreender as relações grafofonêmicas, ou seja, a relação entre os sons da fala e suas representações escritas, ela começa a ler e escrever. Para isso, o ideal é que a criança aprenda as relações entre grafemas e fonemas das mais simples para as mais complexas. Sobre o assunto, Stanislas Dehaene defende:

[...]

Chegado o momento, a partir do início do curso preparatório, as correspondências entre grafemas e fonemas deverão ser ensinadas de um modo bastante explícito e sem medo de repeti-las. Não se pode supor que o aluno terminará por adquiri-las em consequência de ver muitas palavras. É preciso explicar claramente ao aluno que cada "som" tem suas "roupas", as letras ou grupos de letras que podem vesti-lo e que, inversamente, cada letra se pronuncia de uma ou de várias maneiras possíveis. Bem entendido, os grafemas serão introduzidos numa ordem lógica: começa-se pelos mais simples e mais regulares, aqueles que se pronunciam sempre da mesma maneira, como "v", "f", para incorporar na sequência, progressivamente, grafemas complexos como "on", em "ponto" e os grafemas mais raros e irregulares, como "x". [...]

DEHAENE, Stanislas. Os neurônios da leitura: como a ciência explica a nossa capacidade de ler. Trad. Leonor Scliar-Cabral. Porto Alegre: Penso. 2012. p. 246.

José Morais, em seu livro Alfabetizar para a democracia, também defende que o ensino das relações entre grafemas e fonemas seja das mais simples para as mais complexas:

[...]

O ensino das regras de correspondência grafema-fonema deve ser sistemático e ordenado por parte do professor, baseado no princípio de uma progressão do mais acessível ao menos acessível e do mais simples ao mais complexo. Por exemplo, a decodificação de sílabas iniciadas por uma consoante fricativa é mais acessível do que a de sílabas iniciadas por uma consoante oclusiva (gerada mediante uma oclusão rápida da passagem do ar na boca), porque o valor fonológico das fricativas pode ser facilmente modelado, arrastando a pronúncia (ffff..., ssss....), o que não é possível com as oclusivas. E é mais fácil aprender os grafemas constituídos por uma letra do que por duas (ch, lh, nh, ss,...), aqueles que têm uma relação biunívoca com o fonema (b, d, f, j,...) do que os que podem receber mais do que um valor fonológico (c, s, x,...) segundo a sua posição e as letras adjacentes (é o caso de m ou n precedidos de vogal e seguidos de consoante) e os grafemas simples do que os que incluem um diacrítico (como ç, ã) ou os que representam ditongos (ai, ui, ao, ão, etc.).

[...]

MORAIS, José. Alfabetizar para a democracia. Porto Alegre: Penso, 2014. p. 47-48.

Dessa forma, no 1o ano desta coleção, optou-se por apresentar primeiro as relações grafofonêmicas mais simples, ao longo da unidade 1, iniciando pelas vogais, seguidas das consoantes com regularidades biunívocas e, na sequência, as demais consoantes com foco na realização fonológica dominante da letra. Na unidade 2, foram apresentadas as relações mais complexas, incluindo realizações fonológicas não dominantes de determinadas letras, cedilha, dígrafos e sinais gráficos, como til e os acentos agudo e circunflexo. Outra escolha foi apresentar somente a realização fonológica dominante da letra x no volume de 1o ano e os demais sons representados pela letra x, no 3o ano, considerando a complexidade do conteúdo. O mesmo ocorreu em relação aos dígrafos sc, sç e xc.

No 2o e no 3o ano, essas relações são retomadas no início do volume, na seção Revisão, e algumas são desenvolvidas e ampliadas ao longo do volume. Já no 4o e no 5o ano, os alunos continuam desenvolvendo o conhecimento alfabético com foco na ortografia e na gramática.

Ao longo do trabalho com o conhecimento alfabético e a consciência fonêmica, principalmente no 1o ano, são apresentadas as representações fonêmicas para identificar o som representado pelo grafema trabalhado. O quadro a seguir mostra as correspondências entre grafemas e fonemas utilizadas na coleção.

15-MP

IMAGEM: Tabela de correspondência entre grafemas e fonemas. FIM DA IMAGEM.

Fonte de pesquisa: NÓBREGA, Maria José. Ortografia. São Paulo: Melhoramentos, 2013. (Como eu Ensino).

Assim que os alunos compreendem as relações entre o som e sua representação escrita, eles começam a desenvolver a prática de leitura e de escrita. No entanto, de acordo com a PNA, aprender a codificar e a decodificar (portanto, ler e escrever) não é um fim em si mesmo, pois o objetivo da alfabetização é que a pessoa aprenda a ler e escrever com autonomia e compreensão. Dessa forma:

[...]

O ensino dessas habilidades de leitura e de escrita é que constitui o processo de alfabetização. Se alguém é alfabetizado, significa que é capaz de decodificar e codificar qualquer palavra em sua língua. Mas a aquisição dessa técnica não é um fim em si. O objetivo é fazer que se torne capaz de ler e escrever palavras e textos com autonomia e compreensão. Sem isso, o processo de alfabetização não frutifica, pois ler e escrever palavras com precisão e fluência, dentro e fora de textos, é apenas o começo de um caminho que deve ser consolidado por meio de atividades que estimulem a leitura e a escrita de textos cada vez mais complexos, a fim de que a pessoa se torne capaz de usar essas habilidades com independência e proficiência para aprender, transmitir e até produzir novos conhecimentos.

[...]

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Alfabetização. PNA: Política Nacional de Alfabetização. Brasília: MEC: Sealf, 2019. p. 19. Disponível em: https://oeds.link/q1AVtg. Acesso em: 8 jul. 2021.

Práticas de linguagem

Leitura

Durante o processo de alfabetização, quando os alunos ainda não conseguem ler sozinhos, o professor deve ser o mediador da leitura, lendo os textos em voz alta para a turma e pedindo aos alunos que acompanhem a leitura com o dedo e ensinando a ordem - da esquerda para a direita e de cima para baixo, por exemplo. Então, deve progressivamente incentivá-los a tentar relacionar grafemas e fonemas e ler palavras conhecidas para começarem a ler textos com extensão, linguagem e conteúdo adequados à faixa etária.

16-MP

Ao longo do Ensino Fundamental, os alunos devem entrar em contato com variados gêneros textuais, com temas e conteúdos diversos, assim como com diferentes autores, para que ampliem seu repertório de leitura. Para explorar os textos, garantindo sua interpretação e compreensão, as atividades propostas ao longo da coleção visam aos quatro processos gerais de compreensão de leitura:

Com relação à fluência em leitura oral, tendo como base pesquisas, a PNA definiu um número médio de palavras que devem ser lidas com fluência ao final de cada ano do Ensino Fundamental.

Ano do Ensino Fundamental Número médio de palavras lidas por minuto
1o 60
2o 80
3o 90
4o 100
5o 130

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Alfabetização. PNA: Política Nacional de Alfabetização. Brasília: MEC: Sealf, 2019. p. 34. Disponível em: https://oeds.link/dtK4yS. Acesso em: 8 jul. 2021.

Por isso, em alguns momentos deste Manual do professor, há sugestões para avaliar a fluência em leitura oral dos alunos, tanto pelo professor e pelos familiares quanto pelos próprios alunos. Mas essa prática, bem como os parâmetros descritos anteriormente, podem ser usados em quaisquer oportunidades que você julgue pertinentes ou necessárias com a turma.

Escrita

Saber escrever com clareza e competência é de fundamental importância para a plena participação social. A leitura e a escrita são atos inseparáveis e interdependentes, de modo que a prática constante e eficiente de leitura favorece a escrita. Em sala de aula, é importante que os alunos sejam conscientizados a respeito disso e incentivados a refletir sobre suas atividades de escrita. Também é preciso desenvolver um trabalho de produção de textos que envolva diferentes procedimentos, ensinando os alunos a:

A função da escrita excede o âmbito escolar, assim é preciso estar atento a esse aspecto. Desse modo, a produção escrita também deve ser vista como uma atividade interativa entre sujeitos e como manifestação de ideias, sentimentos, informações, intenções, etc., com unidade temática e progressão.

Oralidade

É importante ressaltar que, em sala de aula, o trabalho com a modalidade oral da língua não deve ser confundido com "corrigir" as falas dos alunos. Trata-se de organizar atividades em que gêneros orais sejam produzidos e em que haja reflexão sobre a função da língua oral nas interações verbais, bem como os níveis de formalidade e a variedade adequada a cada gênero/situação.

É fundamental considerar que, quando chega à escola, a criança já tem conhecimentos sobre a língua com base, principalmente, nas experiências de linguagem oral trazidas de seu contexto familiar e social, e tais conhecimentos e experiências devem ser valorizados. Além disso, é de suma importância o respeito às diferentes variedades linguísticas e o combate ao preconceito linguístico.

Para um bom trabalho com a oralidade, é preciso promover diferentes situações comunicativas com atividades em que os alunos devem manifestar opiniões, argumentar, recontar, debater, relatar, narrar, dramatizar, recitar, etc. A oralidade também é desenvolvida quando eles são incentivados a falar e ouvir o outro, com atenção, respeito e cooperação.

Conhecimentos linguísticos e gramaticais

Embora sejam usuários eficazes do idioma, os alunos muitas vezes se veem diante de determinadas situações de comunicação em que são necessários conhecimentos formalizados acerca da língua materna. Por isso, é importante que aprendam como a língua está estruturada e de que modo ela pode ser utilizada/compreendida nas situações de interação verbal.

A prática pedagógica deve levar em consideração os conhecimentos prévios dos alunos sobre a língua para, assim, introduzir novos conhecimentos. Em sala de aula, é possível propor atividades em que os alunos sejam levados a refletir sobre o funcionamento da língua, mostrando-lhes como se organiza a língua portuguesa e de que forma ela aparece nos mais variados textos/ discursos.

Em alguns casos, as nomenclaturas são úteis para que os alunos situem determinado conhecimento. Contudo, o objetivo não é sobrecarregá-los com nomes e conceitos, mas levá-los a entender de que modo e com que função tais conteúdos incidem nos textos.

Ortografia

É preciso considerar que, mesmo após aprender a ler e escrever, o aluno pode ainda não dominar as regularidades e as irregularidades determinadas pela norma ortográfica.

A forma correta da grafia de uma palavra é sempre uma convenção, algo que se define socialmente. Assim, o conhecimento ortográfico é algo que os alunos não aprendem sozinhos, considerando sua natureza de convenção social, de modo que se tornam necessárias atividades sistematizadas para que essa aprendizagem aconteça. Partindo dessa concepção, a ortografia precisa ser considerada um objeto de aprendizagem, isto é, algo que se aprende.