CAPÍTULO 8 Um intervalo democrático

Em 1945, após os anos da ditadura Vargas, teve início um período democrático no Brasil que se estendeu até 1964. Com a saída de Vargas, o presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares, assumiu a presidência da República de fórma provisória. êle se comprometeu a eleger um novo presidente da República e de elaborar uma nova Constituição para o país, alinhada aos princípios democráticos.

As eleições de 1945

Havia três principais candidatos para a presidência nas eleições de 1945: o brigadeiro Eduardo Gomes, que representava a União Democrática Nacional (u dê êne), e fazia oposição a Vargas; o general Eurico Gaspar Dutra, candidato pêlo Partido Social Democrático (pê ésse dê); e o engenheiro Iedo Fiuza, membro do Partido Comunista do Brasil (pê cê bê).

A declaração de apôio de Vargas à candidatura de Dutra, contribuiu para que êsse candidato vencesse com 55% dos votos.

Fotografia em preto e branco. Um desfile, com carros e homens uniformizados tocando instrumentos de sopro e percussão. No segundo plano, a bandeira do Brasil dentro de um triângulo. Abaixo da bandeira, uma faixa com o texto: SEJA BEM VINDO PRESIDENTE DUTRA.
Dutra é recebido com um desfile em sua homenagem em uóshinton Depois de Cristo, Estados Unidos, em 1949.

O govêrno de Dutra

Dutra governou o Brasil entre os anos de 1946 e 1951, de fórma conservadora e com intensa repressão ao comunismo no país. O pê cê bê foi colocado na ilegalidade em 1947, e diversos políticos dêsse partido tiveram seu mandato cassado. Nessa época, o Brasil rompeu relações diplomáticas com a União Soviética e se alinhou aos Estados Unidos.

No govêrno Dutra, foi promulgada uma nova Constituição para o país em 1946, determinando, entre outras medidas, que:

  • o presidente da República seria eleito por meio do voto direto e secreto para um mandato de cinco anos;
  • poderiam votar todos os brasileiros alfabetizados e maiores de 18 anos, de ambos os sexos;
  • era garantido como princípio geral o direito de greve dos trabalhadores, mas um decreto-lei regulava as paralisações e trazia diversas restrições a elas.

Vargas de volta ao poder

Nas eleições de 1950, Getúlio Vargas retorna ao poder por meio do voto. Durante o novo mandato, houve grande incentivo à industrialização e foram feitos investimentos públicos na área de transportes e de energia, sendo mantida sua política trabalhista. Conheça alguns pontos da política de desenvolvimento no segundo mandato de Vargas:

  • fundação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (bê êne dê é), em 1952, para acelerar e diversificar o desenvolvimento industrial;
  • criação do Plano Nacional do Carvão, em 1953, cujo objetivo era modernizar o processo de extração de carvão para a produção de energia;
  • fundação, em 1953, da Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia para estimular o desenvolvimento regional;
  • criação da Petróleo Brasileiro ésse á (Petrobras), em 1953, com o objetivo de implementar o monopólioglossário na produção do petróleo.
Fotografia em preto e branco. Ao centro, homem calvo, usando óculos e terno. Ele está com a mão estendida para frente, suja com óleo escuro. Ao redor, outros homens usando terno.
Getúlio Vargas mostra a mão suja de petróleo na refinaria de Mataripe, Bahia, em 1952.

O fim de Vargas

Apesar de manter a política trabalhista, a alta da inflação e o aumento do custo de vida geravam insatisfação popular. Esses fatores motivaram uma série de greves que ocorreram em 1953, como a greve geral em São Paulo, que ficou conhecida como Greve dos 300 mil.

A situação política tornou-se insustentável quando o jornalista Carlos Lacerda, principal crítico de Vargas, sofreu um atentado em 1954. êle foi ferido com um tiro em um dos pés e o responsável por sua segurança, o major Rubens Vaz, foi atingido e morreu. O chefe da guarda de Vargas foi o principal suspeito de ser o mandante do crime, o que intensificou a oposição ao govêrno e a êle próprio.

Os militares exigiam sua renúncia e planejavam um golpe para destituí-lo. Sob intensa pressão para renunciar, Vargas suicidou-se com um tiro no peito, deixando uma carta-testamento.

Os povos indígenas e o Estado

Durante o govêrno Vargas, em 1938, deu-se início à chamada Marcha para o Oeste, um projeto do Estado brasileiro para aumentar sua presença em regiões pouco ou não urbanizadas.

Por meio da construção de estradas e de ferrovias, a Marcha para o Oeste pretendia ampliar a ocupação e o povoamento de regiões no interior do Brasil, sobretudo o Norte e o Centro-Oeste, considerados pêlo govêrno federal como “vazios territoriais”.

Porém, esses territórios eram tradicionalmente habitados por diversas sociedades indígenas. Por isso, o govêrno iniciou também um projeto de integração dessas sociedades, procurando difundir a imagem dos indígenas como símbolo nacional e de patriotismo. Em seu projeto, Vargas teve a colaboração de Cândido Rondon, diretor do Serviço de Proteção ao Índio (ésse pê ih), criado em 1910.

êsse projeto de integração, porém, não considerava as especificidades sociais, econômicas e culturais dos diversos povos indígenas. Tampouco garantia que os indígenas preservassem as suas culturas e tradições.

Durante a Marcha, muitos indígenas foram confinados em pequenas áreas (as chamadas “reservas indígenas”, criadas no início do século vinte pêlo Serviço de Proteção ao Índio) ou removidos de suas terras tradicionais.

A Expedição Roncador-Xingu

Ao longo da Marcha para o Oeste, foram realizadas diversas expedições às regiões ocupadas por povos indígenas no Norte e Centro-Oeste do Brasil. Uma das mais conhecidas foi a Expedição Roncador-Xingu, liderada pelos irmãos Villas-Bôas (Orlando, Leonardo e Cláudio Villas-Bôas).

Nessa expedição, os irmãos Villas-Bôas chegaram à região do Xingu, no estado no Mato Grosso, em 1946. Com o apôio de diversos intelectuais, cientistas e militares, êles se engajaram na luta dos indígenas, e contrariando o projeto de integração do govêrno, desenvolveram medidas para preservar e valorizar suas culturas, seus modos de vida e suas terras, que sofriam com constantes ataques e invasões de fazendeiros.

Fotografia em preto e branco. À esquerda, um homem, com cabelos ondulados e barba, usando blusa larga e calça, está de pé e de perfil com as mãos na cintura. Ao lado, outro homem, com cabelos lisos e barba, usando camisa e calça, está de pé e de perfil com uma das mãos no pescoço. Atrás, moradias e vegetação.
Irmãos Villas-Bôas no pôsto Avançado da Serra do Cachimbo, Pará, em 1951.

A resistência xavante

Durante a Marcha para o Oeste, os representantes do Serviço de Proteção ao Índio se depararam com uma grande resistência dos Xavante, e reagiram à invasão de suas terras e às tentativas de dominação com grande resistência e ataque aos grupos expedicionários, sendo pacificada somente após 5 anos do primeiro contato com o Serviço de Proteção ao Índio.

Leia o texto a seguir, do historiador estadunidense Seth gárfild, sôbre a resistência xavante à tentativa de integração pêlo Serviço de Proteção ao Índio durante o Estado Novo.

Fotografia em preto e branco. Destacando o busto de um homem indígena com um alargador na orelha.
Indígena xavante da região da Serra do Roncador, Mato Grosso, em 1949.

reticências

A Marcha para o Oeste encontrara um obstáculo e o govêrno correu para mascarar a rejeição dos Xavante. reticências A estratégia Xavante de ataques surpresa manteve invasores à distância durante décadas. A defesa de extenso território foi essencial para manter sua economia mista baseada na caça e coleta e, em menor escala, na agricultura. Embora o govêrno Vargas retratasse o Oeste como uma utopia, os Xavante conheciam a variabilidade do clima e a pobreza do solo da região, que faziam da agricultura um empreendimento arriscado. Por requisitar um extenso território para a caça de animais e coleta de frutas, babaçu e raízes, a comunidade Xavante combatia qualquer invasor que ameaçasse acesso ao precioso recurso natural.

reticências Devido às suas diretrizes sociais, orientação cultural e memória histórica, o amor dos Xavante pêlo Brasil apenas podia ser “uma simples extensão” do amor que sentiam pêlo seu território. reticências

gárfild, Seth. As raízes de uma planta que hoje é o Brasil: os índios e o Estado Nação na era Vargas. Revista Brasileira de História, São Paulo, volume 20, número 39, 2000. página 27.

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Questão 1.

De acôrdo com o texto, qual é o motivo da resistência Xavante?

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Questão 2.

De que fórma se constituiu a resistência Xavante à Marcha para o Oeste?

O govêrno de Juscelino cubishéqui

Após o suicídio de Getúlio Vargas, Café Filho, o vice-presidente, assumiu o govêrno, sendo substituído ainda por Carlos Luz e, depois, por Nereu Ramos, que cumpriu o restante do mandato (1954-1955). As eleições presidenciais estavam marcadas para outubro de 1955.

Nesse cenário político, destacou-se Juscelino cubishéqui(Jota Ka), do Partido Social Democrático (pê ésse dê). Em sua carreira política, Jota Ka já havia sido prefeito de Belo Horizonte (Minas Gerais), na década de 1940, e governador de Minas Gerais.

Na época, os eleitores podiam votar em um candidato para a presidência e em outro para a vice-presidência. Assim, Jota Ka foi eleito presidente com 36% dos votos, e João Goulart, o Jango, do Partido Trabalhista Brasileiro (pê tê bê), elegeu-se vice-presidente.

O Plano de Metas

O slogan do govêrno Jota Ka era “Cinquenta anos em cinco”, ou seja, durante os cinco anos de govêrno, o país passaria por transformações que normalmente demorariam cinquenta anos para ocorrer.

Assim, um dos destaques do govêrno de Jota Ka foi o Plano de Metas, que consistia em 31 objetivos, organizados em seis grupos: transportes, energia, alimentação, educação, indústria de baseglossário e a construção de Brasília, prometida ainda em campanha.

Para atingir todos esses objetivos, Jota Ka recorreu ao capital internacional. lógo, o govêrno tomou empréstimos de países como Inglaterra, Alemanha e França. Os Estados Unidos também fizeram empréstimos ao Brasil, tornando-se os grandes financiadores do projeto modernizador do govêrno. Em troca, o govêrno brasileiro concedia incentivos fiscais (redução ou isenção de impostos) a empresas internacionais para que elas se instalassem no país.

Fotografia em preto e branco. À esquerda, homem com cabelos penteados para trás, usando terno claro. Ele está sentado em uma cadeira com as mãos abertas gesticulando. Ao lado, outro homem, com cabelos lisos usando terno escuro. Ele também está sentado e sorri olhando para as mãos.
Juscelino cubishéqui, candidato a presidente, e João gulár, candidato a vice-presidente, durante a campanha presidencial de 1955.
Fotografia em preto e branco. Dois homens usando macacão. Eles segurando parte de um caminhão em uma linha de produção.
Operários de indústria automobilística trabalhando na montagem do primeiro caminhão fabricado no Brasil, em São Paulo, ésse pê, em 1955.

A industrialização

A industrialização cresceu muito na década de 1950, principalmente o setor automobilístico, que se tornou um dos símbolos do desenvolvimento industrial no govêrno de Jota Ka. Antes, já havia montadoras de automóveis no Brasil, a primeira indústria automobilística se instalou no país em 1919. No entanto, foi o govêrno de Jota Ka que concedeu maior incentivo para o desenvolvimento e para o aumento da produção de veículos, o que resultou na instalação de novas fábricas no país, entre elas, diversas empresas multinacionais.

A aceleração do processo de desenvolvimento e de urbanização ocorreu de modo desigual, beneficiando principalmente as regiões Sul e Sudeste. Essa industrialização atraiu muitos trabalhadores, principalmente do Nordeste brasileiro, que migraram para essas regiões em busca de melhores condições de vida e de trabalho.

Além da indústria automobilística, também se instalaram no país indústrias de eletrodomésticos e de outros bens de consumo. A maior parte delas se estabeleceu no á bê cê paulista, próximo à cidade de São Paulo.

Fotografia em preto e branco. À esquerda, homem usando terno. Ele está de pé e dentro de um carro aberto, acenando com uma das mãos. Nas laterais, pessoas em pé batendo palmas.
Jota Ka durante inauguração de indústria automobilística no município de São Bernardo do Campo, São Paulo, em 1959.

Região do ABC paulista

Mapa. Região do ABC paulista. Mapa territorial destacado conforme legenda. Município de São Paulo: Grande extensão de terra. ABC paulista: Porção de terra ao lado do Município de São Paulo. Formado pelas cidades destacadas de São Caetano do Sul, Santo André e São Bernardo do Campo. No canto superior à direita, mapa do estado de São Paulo, destacando um trecho do município de São Paulo e a região do ABC. Ao lado, representação da rosa dos ventos e, abaixo, escala de 18 quilômetros quilômetros.

Fonte de pesquisa: ATLAS geográfico escolar. Rio de Janeiro: í bê gê É, 2009. página 174.

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Questão 3.

Quais municípios formam o á bê cê paulista?

A construção de Brasília

Em 1956, iniciou-se a construção de Brasília, para ser a nova capital do Brasil. Planejada pelos arquitetos Oscar Niemeyer e Lúcio Costa, ela foi inaugurada por Juscelino cubishéqui em 1960 e tornou-se símbolo da civilização e da modernização do país.

A maior parte do investimento na construção de Brasília era originária do capital estrangeiro.

Foram atraídos para o local aproximadamente 40 mil trabalhadores, que ficaram conhecidos como candangos. dêsse total, quase 45% deles eram de origem nordestina. A cidade de Brasília foi construída em tempo recorde: cêrca de três anos e meio.

Fotografia. Vista aérea. À esquerda dois prédios de tamanhos iguais e duas cúpulas. À direita, um prédio de dois andares brancos. No fundo, silhueta de outras construções em um terreno plano.
Vista aérea da construção de edifícios do Palácio do Planalto, no final da década de 1950.

Os candangos

O cotidiano dos candangos era bastante difícil, com muito trabalho e raros momentos de descanso e lazer. A Região Centro-Oeste, ainda pouco habitada, não tinha estrutura adequada para receber tantas pessoas e as moradias disponibilizadas ao redor de Brasília eram extremamente precárias.

êles se revezavam em turnos de oito horas, muitas vezes trabalhando inclusive de madrugada. Era comum também a realização de horas extras.

Além disso, a segurança no cotidiano dos trabalhadores nas obras também podia ser bem precária. Fontes como relatos de operários e fotos da época evidenciam trabalhadores muitas vezes sem luvas, capacetes, cordas e outros equipamentos de segurança. De acôrdo com relatos, os acidentes eram constantes.

Fotografia em preto e branco. Homens, usando chapéu, camisa e calça, estão segurando enxadas com as mãos em um canteiro de obras
Operários trabalhando sem equipamentos de proteção durante construção de Brasília, em 1959.
Fotografia em preto e branco. Uma construção de madeira com muitas portas. Um homem usando chapéu está de pé em uma das portas.
Alojamento de operários durante a construção de Brasília, em 1958.

A seguir, leia o relato de um trabalhador candango sôbre suas memórias a respeito do período em que trabalhou na construção de Brasília.

reticências

“Nosso lazer era êsse: contar história do passado, das pessoas que a gente tinha deixado na terra da gente. Cada um contava a sua história. O lazer? Quase ninguém nessa época tinha lazer. Aqui não tinha lazer. Aqui tinha que ser igual porco: comer, trabalhar e dormir. […] o ânimo era o melhor possível, o pessoal animado, todo mundo atrás do seu eldorado, não é? Foi muito bom, foi uma época assim, que as amizades da época, era uma amizade, a gente via que tinha, mais sincera, não é?... Eu achei muito bom, isso de ter vindo para Brasília. Talvez se tivesse que começar tudo de novo eu repetiria isso. Mesmo já sabendo de todo o sofrimento que passei.”

reticências

MEMORIAL da democracia. Disponível em: https://oeds.link/ucDeUC. Acesso em: 18 fevereiro 2022.

Após o término das obras de construção de Brasília, devido ao alto custo de vida na nova capital, a maioria dos candangos se afastou do lugar que ajudaram a construir para morar em seu entôrno, nas chamadas cidades-satélites, como Taguatinga, Ceilândia, Sobradinho e Núcleo Bandeirante.

Após a leitura do texto, converse com seus colegas e reflitam a respeito dos questionamentos a seguir.

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Questão 4.

Quais sentimentos a respeito do período da construção de Brasília podem ser apreendidos pêlo relato?

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Questão 5.

É possível identificar no texto o que motivou essas pessoas a se colocarem em condições extremas de trabalho?

Glossário

Monopólio
: prática na qual determinadas empresas, grupos ou governos detêm exclusividade sôbre a comercialização de um produto ou serviço.
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Indústria de base
: tipos de indústrias como as de siderurgia e as de mineração, que atuam na produção ou na extração de bens tidos como base de outros ramos industriais.
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