CAPÍTULO 9 O projeto holandês na América portuguesa e na África

A pirataria muitas vezes é representada por personagens exóticos à procura de tesouros em territórios fantásticos. Essa imagem, que se difundiu pelo cinema, nem sempre ajuda a entender as pilhagens que se intensificaram com a expansão marítima europeia.

Desde o início do século dezesseis, a costa da América portuguesa foi alvo de ataques de corsários e de piratas. Os saques e os ataques, contudo, não eram atividades restritas a piratas e grupos particulares. Eles também foram apoiados e planejados pelas nações europeias.

Ilustração. Na parte superior da imagem principal, desenho de uma região representada em verde e com montes, entrecortada por rios com um núcleo populacional no centro. Na parte de baixo, o mar cheio de caravelas e outras embarcações indo na direção do núcleo populacional e da foz dos rios. No canto superior esquerdo, representação de um mapa que mostra um trecho de terra com litoral recortado e o nome das localidades representadas. No mar, há uma bússola amarela e vermelha da qual saem traços pretos em diferentes sentidos. No canto superior direito, ilustração de um engenho de açúcar com pessoas negras escravizadas trabalhando.
fárnambuci (ou Pernambuco), representação do cerco dos holandeses a Recife e Olinda, nicolás físser, cêrca de 1640. Entre os séculos dezesseis e dezessete, a cidade de Amsterdã, nos Países Baixos, tornou-se um dos centros da cartografia marítima europeia. Lá foram produzidos mapas que serviram para a prática do comércio e da pirataria.
Ícone. Ilustração de um ponto de interrogação indicando questões de abertura de capítulo.

Responda oralmente.

  1. Identifique o local escolhido pelos holandeses para o ataque representado no mapa. Quais seriam os principais interesses nessa região?
  2. Você acredita que o ataque representado se distancia ou se assemelha à pirataria retratada em filmes atuais? Justifique sua resposta.
Respostas e comentários

Abertura

Na introdução do capítulo, apresenta-se um tema bastante explorado pelo cinema atual: a pirataria. Espera-se que, ao ler o texto e analisar o mapa, os estudantes percebam que a atividade de saque e invasão foi um recurso utilizado pelos europeus e financiado por grandes empresas de comércio e navegação, contestando o imaginário sobre a ação de pilhagem como circunscrita ao universo dos piratas do início da Idade Moderna.

Atividades

1. A região escolhida para o ataque foi a capitania de Pernambuco. Com base na região representada (e na representação de escravizados moendo cana-de-açúcar presente no mapa reproduzido), os estudantes poderão inferir que o interesse principal dos holandeses em Pernambuco estava relacionado à produção e ao comércio do açúcar.

2. A grande quantidade de navios, o amplo conhecimento do território e as informações contidas na legenda da imagem indicam que o projeto dos Países Baixos na América portuguesa estava vinculado à exploração comercial do território. O projeto, arquitetado pela dáblio i cê, não era fruto da iniciativa de um sujeito ou de um pequeno grupo de piratas, mas contava com amplo respaldo estatal. Dessa fórma, os estudantes podem considerar que o ataque representado no mapa se distancia do imaginário produzido pelo senso comum, normalmente retratado nos filmes atuais.

Ao promover a análise cartográfica, vale a pena chamar a atenção dos estudantes para a iconografia reproduzida no capítulo. Comente com eles que as representações das conquistas americanas foram, em grande parte, produzidas com base em relatos, e não por meio da visão im loucoue da experiência.

Bê êne cê cê

Por envolver a análise de um mapa histórico sobre os ataques na América portuguesa, o conteúdo da abertura contribui para o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero sete agá ih um um, da Competência Específica de História nº 3 e da Competência Específica de Ciências Humanas nº 7.

Os holandeses se lançam ao mar

Os territórios que hoje correspondem aos Países Baixos, Bélgica, Luxemburgo e parte do norte da França foram herdados por Carlos cinco, do Sacro Império Romano-Germânico, no início do século dezesseis. Em 1516, ele tornou-se também o sucessor do trono de Castela, pois sua mãe, Joana primeira, foi impedida de assumir o governo por questões de saúde mental.

Em 1549, Carlos quinto unificou os condados e ducados dos Países Baixos nas chamadas Dezessete Províncias. Mais tarde, em 1556, ele abdicou do trono e seu filho, Filipe segundo, herdou boa parte de suas posses: o trono da Espanha e suas colônias na América, o Franco Condado, a Sicília e os Países Baixos, que foram incorporados à Coroa espanhola.

No entanto, entre 1568 e 1648, sete dessas províncias – Holanda, Zelândia, drente, Frísia, guélder, groninhã e overéiso – se rebelaram contra a dominação espanhola dando início a uma violenta guerra de independência: a Guerra dos Oitenta Anos. Nos Países Baixos, a guerra foi liderada pelo protestante Guilherme de órangi, que se opunha ao domínio espanhol e católico. Em virtude do componente religioso, o conflito envolveu também outros reinos, como França e Inglaterra.

Em 1581, as sete províncias assinaram o Acordo de utréchiti, criando a República das Províncias Unidas dos Países Baixos. Apesar da declaração de independência, esse Estado europeu só foi reconhecido pela Espanha em 1648, com a assinatura do Tratado de Vestfália.

Províncias Unidas – século dezessete

Mapa. Províncias Unidas, século dezessete. Destaque para as regiões que atualmente correspondem à Holanda e à Bélgica. Legenda: Linha vermelha: Limite da República dos Países Baixos em 1648. Linha tracejada vermelha: Limite das províncias. Verde: Território da União de Utrecht. Laranja: Territórios adquiridos durante a guerra com a Espanha. Hachurado branco e laranja: Territórios sob administração conjunta das Sete Províncias. Marrom: Países Baixos Espanhóis. No mapa: A linha vermelha contínua demarca o Limite da República dos Países Baixos em 1648 que atualmente corresponde à boa parte do território da Holanda. A linha vermelha tracejada demarca os limites das províncias, de norte a sul: Groningen, Frísia, Drente, Overijssel, Gueldre (incluindo a cidade de Niméga), Utrecht (incluindo a cidade de Utrecht), Holanda (incluindo as cidades de Amsterdã, Haarlem, Leydem, Haia, Delf e Roterdã), Território dos Estados Gerais (incluindo a cidade de Breda) e a Zelândia. As áreas em verde se referem aos Territórios da União de Utrecht correspondendo às províncias de Groningen, Frísia, Overijssel, Gueldre, Utrecht, Holanda e as ilhas da Zelândia. As áreas em laranja circunscrevem os territórios adquiridos durante a guerra com a Espanha: a província de Drente e a região da cidade de Maastricht. As áreas hachuradas de branco e amarelo indicam os territórios sob administração conjunta das Sete Províncias: sul da Zelândia (atual território holandês ao norte da Bélgica) e Territórios dos Estados Gerais. As áreas em marrom indicam os Países Baixos Espanhóis, circunscrevendo os territórios correspondentes à atual Bélgica (incluindo as cidades de Bruges, Gand, Antuérpia, Bruxelas, Lille e Tournai) e à faixa a leste do Rio Mosa. No canto superior esquerdo, a rosa dos ventos e escala de 0 a 30 quilômetros.

FONTE: ristórical étlas ov dê uorld. Chicago: ruend macnáli, 2001. página 40.

Pintura. Uma vaca marrom no centro e homens vestidos com casacos compridos, golas volumosas e meias longas e justas. Seis dos homens estão atrás da vaca, dos quais alguns com as mãos na cabeça e no pescoço do animal. Um está atrás, do lado direito da imagem, segurando o rabo. Outro está deitado debaixo dela. E outro, com coroa na cabeça, está montado na vaca e segura dois bastões, um em cada mão. À frente da vaca, do lado esquerdo, uma mulher de cabelos claros, de vestido branco, longo, com armação e detalhes dourados na frente, além de véu comprido que parte de um adorno dourado no coque. Ela segura um fardo de feno e uma jarra nas mãos.
A vaca leiteira: as províncias holandesas, revoltando-se contra o rei espanhol Filipe segundo, são lideradas pelo príncipe Guilherme de órangi, os Estados Gerais imploram ajuda à rainha Elizabeth primeira, pintura anônima do século dezesseis.
Respostas e comentários

Objetivos do capítulo

Analisar a conjuntura internacional europeia do final do século dezesseis e da segunda metade do século dezessete – destacando a Guerra dos Oitenta Anos e a União Ibérica – e sua relação com o projeto holandês de invasão das colônias portuguesas na América e na África.

Demonstrar o processo de expansão ultramarino holandês e a importância da atuação das companhias de comércio e navegação, com destaque para a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais (dáblio i cê).

Identificar e analisar a cadeia de comércio internacional do açúcar, da produção na América portuguesa à distribuição no mercado europeu por comerciantes holandeses.

Analisar o governo de Maurício de Nassau, considerando o chamado Brasil holandês.

Caracterizar o fim da ocupação holandesa na América portuguesa e os impactos da expulsão dos holandeses para o comércio do açúcar brasileiro.

Justificativa

A relevância dos objetivos listados neste capítulo está relacionada à sensibilização dos estudantes para as interconexões existentes entre o mundo europeu, a América e a África, demonstrando como os interesses econômicos holandeses, baseados sobretudo na cadeia de comércio do açúcar, resultaram na transformação de territórios e culturas nesses três continentes. O incentivo ao desenvolvimento de procedimentos de identificação e análise, trabalhados em temáticas como o tráfico de escravizados dentro da cadeia mundial de comércio de açúcar e a tolerância religiosa durante a administração de Maurício de Nassau, é importante para que os estudantes sejam capazes de perceber as diferentes estratégias utilizadas em projetos de dominação.

Os holandeses e o comércio internacional

Para entender o contexto do projeto holandês na América portuguesa e na África, é importante saber que, nos séculos dezesseis e dezessete, os Países Baixos tinham uma grande frota de navios de guerra e comerciais. Estima-se que, no século dezessete, a frota holandesa equivalia ao conjunto de todas as frotas europeias. cêrca de cinco sextos das mercadorias transportadas entre a Península Ibérica e o Atlântico Norte eram levadas por navios holandeses. A produção manufatureira e a emissão de crédito somavam-se às atividades mercantis dos Países Baixos. Isso significa que a burguesia local era, ao mesmo tempo, mercantil e bancária.

Diferentemente do que aconteceu nos reinos ibéricos, responsáveis pelas expedições no ultramar, os Países Baixos criaram poderosas companhias de comércio e navegaçãoglossário , como a Companhia Holandesa das Índias Orientais, fundada em 1602. Essas empresas tiveram autorização para desenvolver negócios em várias regiões do mundo: da Ásia à América, passando pelos portos da África e da Europa.

Pintura. Uma grande construção formada por arcos que conectam dois pátios internos, onde pessoas estão reunidas em pequenos grupos e interagindo. Em primeiro plano, homens com roupas pretas e chapéus de abas largas, mulher com vestido carregando cesto e dois cachorros. Em segundo plano, a reunião de pessoas é maior e formada majoritariamente por homens. Na parte superior da construção, há janelas, um adorno em alto-relevo e telhado azul escuro. Do lado direito, conectado a essa construção principal, um prédio no qual a fachada lateral conta com quadros pendurados.
A Bolsa de Valores de Amsterdã, pintura de iob ádrians bérqueide, cêrca de 1675. A Bolsa de Valores de Amsterdã foi fundada no início do século dezessete.
Brasão. Duas representações ovais, sendo a da esquerda com um homem e uma mulher seminus com folhagens cobrindo o quadril. O homem segura um tridente e a mulher, um cetro. Eles estão um de cada lado de um quadro em que está representada uma caravela em alto-mar. Acima do quadro, um baú e várias flechas e a inscrição 'VOC'. A representação da esquerda tem, no centro, um quadrado vermelho com uma chave do meio e, de cada lado, dois leões com as patas dianteiras erguidas, um segurando um feixe de flechas e outro segurando uma espada. Em cima, a inscrição: BATAVIA.
Representação da Companhia das Índias Orientais, 1651.
Ícone. Ilustração de uma lupa indicando o boxe Imagens em contexto!

Imagens em contexto!

Na representação da Companhia das Índias Orientais, em um dos brasões, os elementos náuticos e as imagens de Netuno e de uma sereia simbolizam o comércio marítimo. No alto, há um brasão dourado com a inscrição “VOC”, abreviação em holandês de verrerrneide ôst índice compâni (Companhia Holandesa das Índias Orientais). No centro do brasão de armas da República das Províncias dos Países Baixos está escrito Batávia, nome da capital das Índias Orientais Holandesas. A cidade, que hoje conhecemos por Jacarta, foi fundada pelos holandeses em 1619 na região que corresponde à atual Indonésia.

Respostas e comentários

Dados numéricos sobre a frota mercantil holandesa e as mercadorias por ela transportadas foram retirados de: Brôdél, F. Civilização Material, economia e capitalismo: séculos quinze a dezoito. O tempo do mundo. São Paulo: Martins Fontes, 2009. volume 3. página 172,189.

Ampliando

Nas motivações do projeto holandês sobre o Brasil colônia, as companhias de comércio e navegação tiveram papel central.

“Das motivações da empresa neerlandesa sobre o Brasil colônia no século dezessete, lista-se: a prióri a considerável frota marítima neerlandesa que já controlava o comércio no Mar do Norte e Báltico. Com navios menos pesados que as naus lusitanas, por isso mais ágeis no trato marítimo, como embates, cercos, perseguições e a prática do corso em si. Tal poderio comercial na região proporcionou aos neerlandeses lucros fantásticos que propuseram a criação em 1602 de uma nova empresa ultramarina, a Companhia Holandesa das Índias Orientais (VOC), que se especializara em comércio, corso e tratativas com os mercado da Ásia. reticências

Em segundo a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais (dáblio i cê), criada em 1621 por vílem uselínquis estimulada pelo sucesso do projeto vitorioso e antecessor: a Companhia Holandesa das Índias Orientais (VOC), que rompeu o monopólio e supremacia da Coroa ibérica no Oriente colhendo vultuosos lucros. Tal feito estimulou e ratificou as ambições dos neerlandeses para a região sul atlântica. A composição gestora da dáblio i cê era formada pelos “ríarrân” (Conselho de dezenove membros chamado portanto de “Conselho dos dezenove”), representava uma companhia de financiamento público e privado, cuja instituição regimentará toda a exploração ultramarina do governo neerlandês em mares do Atlântico Sul e parte do Índico. A dáblio i cê tinha como missão estratégica o mesmo módus operândi da VOC, porém em outro cenário geográfico: o Atlântico; portanto, prosseguia com o objetivo de ataques constantes às possessões ibéricas nas regiões ultramarinas do Atlântico Sul reticências.

O terceiro e decisivo fato: a União Ibérica, ou seja, a anexação da Coroa de Portugal à Coroa de Castela em 1580, decorrente da morte de Dom Sebastião em Alcácer Quibir (1578) fato que levou o reino à situação de ausência de herdeiros diretos e após o breve reinado de seu tio-avô, o cardeal Dom Henrique, assumiu por linhas de sucessão parental, o rei de Castela herdando os direitos de governança de Portugal, em 1580. Nesse ínterim, sob domínio de Castela, leia-se Filipe segundo, o Brasil, colônia lusitana, passou a ser visto como território passível de disputa entre os Países Baixos e Espanha. reticências”.

LIMA JUNIOR, T. B. de. Nova Holanda: uma discussão historiográfica sobre o tráfico de escravos africanos no Brasil Holandês (1630-1654). Dissertação (mestrado) – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2020. página 31.

Os holandeses e o açúcar

No capítulo 8, você estudou que, no início da colonização da América portuguesa, o açúcar foi o principal produto escolhido pela Coroa ibérica para exploração colonial. Mas, apesar de ser uma iniciativa portuguesa, os comerciantes holandeses também estavam envolvidos com o transporte e o refino do açúcar produzido na América portuguesa.

Na realidade, as relações comerciais entre portugueses e holandeses eram anteriores à produção em larga escala do açúcar americano. Já no século quinze, navios saídos do porto de Amsterdã comercializavam o açúcar produzido nas ilhas do Atlântico dominadas pelos portugueses.

No final do século dezesseis, enquanto ainda lutavam contra os espanhóis na Europa, os holandeses visitaram várias vezes o litoral da América portuguesa, participando ativamente do comércio do açúcar.

Com a expansão das lavouras açucareiras no início do século dezessete, os Países Baixos passaram a emprestar o capital necessário para a compra de equipamentos e a formação dos engenhos coloniais na América portuguesa. Em troca, exigiam os direitos de refinar e de distribuir o produto na Europa.

Dos Países Baixos, portanto, vinha o crédito necessário para montar os engenhos e as frotas navais para transportar as mercadorias. Para a Coroa portuguesa, isso permitia cobrar impostos não apenas dos produtores americanos, mas também dos comerciantes holandeses na Europa.

Ilustração. Quatro homens trabalhando, manuseando toras de madeira. Cada etapa apresentada está marcada com informações. Do lado esquerdo, homem segurando nas mãos um tronco de madeira. Próximo ao homem, uma corrente preta sustenta no ar vários outros troncos. Dessa parte da ilustração uma seta para o seguinte texto: 'A participação holandesa na economia colonial não envolvia apenas o açúcar, mas também outros recursos explorados na América. O pau-brasil era um deles'. No centro, dois homens segurando, um em cada ponta, uma tora de madeira como se fosse uma gangorra. A tora passa por um aparelho metálico de onde cai pó, que é depositado em um cesto que está no chão. Desse conjunto parte uma seta com o seguinte texto: 'A madeira obtida na América era ralada pelos prisioneiros até tornar-se um pó, utilizado na fabricação de pigmentos e tinturas para as manufaturas europeias'. Do lado direito, homem carregando no ombro uma tora de madeira. Ao fundo uma pilha de troncos disposta junto à uma estrutura que ocupa toda a parte do fundo da ilustração. Do tronco segurado pelo homem parte uma seta com o seguinte texto: 'No fim do século dezesseis, a mão de obra de prisioneiros foi explorada no processamento do pau-brasil em uma prisão de Amsterdã, nos Países Baixos'.
Ilustração atual, feita com base em gravura holandesa do século dezessete, representando a produção de tinta com pau-brasil em Amsterdã, Países Baixos.

FONTE: ráspeis. Arquivos da cidade de Amsterdã. Disponível em: https://oeds.link/HSeOZ6. Acesso em: 9 fevereiro 2022.

Respostas e comentários

Bê êne cê cê

Ao explorar os interesses dos holandeses no açúcar e nas atividades mercantis relacionadas a esse produto, favorece-se o desenvolvimento das habilidades ê éfe zero sete agá ih zero dois e ê éfe zero sete agá ih um três e da Competência Específica de História nº 5.

O açúcar não era o único produto comercializado entre Portugal e os Países Baixos. Os navios holandeses levavam para Portugal as mais variadas mercadorias do norte da Europa – como madeira, metais e outras manufaturas – e produtos de sua indústria – como peixe, manteiga e queijo. No retorno, levavam sal grosso, vinho, especiarias e todo tipo de drogas do leste da África.

Ampliando

No texto a seguir, os historiadores Adriana Lopez e Carlos Guilherme Mota demonstram a centralidade da cidade de Amsterdã, nos Países Baixos.

“[…] émsterdân dominou o sistema de fretes da Europa, penetrando até mesmo no Mediterrâneo. Suas embarcações faziam as rotas entre os portos da Península Ibérica e o norte da Europa desde pelo menos 1550. Sua frota era maior do que a de toda a Europa somada. […]

A superioridade de Amsterdam sobre os portos das demais províncias provinha da imensa capacidade de armazenamento, da disponibilidade de produtos e do grande volume de dinheiro circulante que animava seus negócios.”

LOPEZ, A.; MOTA, C. G. História do Brasil: uma interpretação. São Paulo: Senáqui, 2008. página 126-127.

Holandeses e portugueses

Os navios mercantes holandeses partiam principalmente do porto de Amsterdã, recolhiam o açúcar em Lisboa, refinavam o produto e o distribuíam em países europeus, como França e Inglaterra, e na região do Mar Báltico.

Esse processo de distribuição foi altamente lucrativo, pois o preço final da mercadoria era controlado pelos mercadores holandeses. Assim, o comércio internacional do açúcar beneficiava boa parte dos agentes envolvidos no processo.

Circunstâncias ligadas a uma crise sucessóriaglossário em Portugal, porém, afetaram essa cadeia comercial. As relações comerciais entre Portugal e os Países Baixos foram abaladas pelo desaparecimento do monarca português dom Sebastião, aos 24 anos, durante a Batalha de Alcácer-Quibir, em 1578.

Nesse confronto, as tropas comandadas pelo rei português aliadas ao sultão marroquino mulei murrámâd foram massacradas pelo exército do tio do sultão, que usurparaglossário o trono do Marrocos e contava com o apoio dos otomanos.

Fotografia. Embarcação de madeira sem velas e com bandeiras nos mastros em um canal, em frente a uma grande construção retangular de quatro andares, também com bandeiras hasteadas no telhado. Ao fundo, do lado esquerdo, árvores, automóveis e outras construções baixas.
Réplica de embarcação da Companhia das Índias Orientais no cais do Museu Nacional Marítimo. Amsterdã, Países Baixos. Foto de 2019. O museu está instalado em um antigo armazém naval construído no século dezessete.
Pintura. Homem jovem, branco e sem barba, com cabelos curtos e claros. Ele usa uma armadura dourada e preta e apoia uma mão na cintura enquanto a outra está sobre uma espada presa ao cinto. No canto esquerdo, um cachorro com pelos brancos e pretos está ao lado do jovem, olhando para o seu rosto.
Retrato do rei Dom Sebastião, pintura de Cristóvão de Morais, cêrca de 1570.
Ícone. Ilustração de uma lupa indicando o boxe Imagens em contexto!

Imagens em contexto!

O desaparecimento de dom Sebastião em batalha alimentou a crença no retorno do rei. Essa crença, chamada sebastianismo, permaneceu na cultura portuguesa por séculos. Diversos profetas e religiosos enxergavam o rei desaparecido como um messias que traria as glórias do passado de volta aos portugueses. O sebastianismo inspirou muitos artistas e escritores portugueses, como Fernando Pessoa que, no século vinte, utilizou a imagem do rei desaparecido em alguns de seus poemas, como os da obra Mensagem.

Respostas e comentários

O sebastianismo teve ecos tão fortes que reverberaram até na colônia e no Brasil independente. No século dezenove, esse messianismo teve forte influência no Nordeste, unindo-se ao fanatismo religioso e a demandas por justiça social. Um dos movimentos relacionados ao mito de dom Sebastião eclodiu em Pedra Bonita, no interior de Pernambuco, em 1835. No período regencial, os camponeses que se sentiam esquecidos pelos governantes passaram a alimentar sonhos de transformação social, retomando a memória de um governante que voltaria para libertar o povo da opressão. Nesse contexto, o sertanejo João Antônio dos Santos anunciou que dom Sebastião havia aparecido para ele e atestado que voltaria. Ele, então, proclamou-se rei e fundou o Reino Encantado de Pedra Bonita. No Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, publicado pela primeira vez em 1971, Ariano Suassuna narra essa história.

Muitos portugueses, na época do sumiço de dom Sebastião, não acreditaram que o rei havia morrido, pois ninguém o vira morto. Essa dúvida, associada ao inconformismo com a União Ibérica, gerou a crença de que o monarca voltaria para tirar Portugal da crise que se desencadeou depois de sua morte, quando o reino passou ao domínio espanhol. Esse messianismo foi batizado de sebastianismo.

A União Ibérica

Dom Sebastião desapareceu na batalha sem deixar herdeiros. Por isso, era preciso aclamarglossário um novo rei para assumir o reino. Diante da crise sucessória e da disputa entre alguns possíveis sucessores, o cardeal dom Henrique, tio-avô de dom Sebastião, já velho e doente, assumiu o trono português, mas morreu pouco tempo depois, em 1580.

Com a morte de dom Henrique, Filipe segundo, rei da Espanha, que pelo lado materno era neto do rei português dom Manuel primeiro, que havia reinado entre 1495 e 1521, reivindicou o direito ao trono de Portugal e foi aclamado rei em 1581, adotando no país o título de Filipe primeiro.

O acordo político que uniu as duas Coroas durou aproximadamente sessenta anos e ficou conhecido como União Ibérica.

Gravura em preto e branco em dois quadros. Acima, pessoas ajoelhadas nas laterais, com um homem em pé diante de um trono ao centro, no fundo da representação. Abaixo, pessoas reunidas, erguendo as mãos para o alto.
Filipe segundo de Espanha é reconhecido como Rei de Portugal, enquanto dom Filipe primeiro, pelas Cortes de Tomar reunidas em 1581, gravura de iân lâiken, 1699.

Império de Filipe segundo – 1580

Mapa. Império de Filipe Segundo, 1580
Destaque para o planisfério representando os continentes e o nome de localidades dispersas por várias regiões.
Legenda:
Marrom: Domínios de Filipe Segundo (1580).
No mapa:
Os domínios de Felipe II em 1580 correspondiam ao sul da América do Norte, à América Central e Caribe, incluindo Santo Domingo e Panamá, e territórios na América do Sul, sobretudo nas faixas litorâneas a leste e a oeste, abarcando as cidades de Cartagena, Santa Fé de Bogotá, Quito, Lima, Cuzco, Assunção, Santiago do Chile, Rio de Janeiro, Salvador e Olinda. Os domínios também abarcavam a Península Ibérica, os Países Baixos (incluindo as cidades de Antuérpia e Amsterdã), a região das cidades de Milão, Veneza, Nápoles, ilha da Sicília, ilha da Sardenha, Ilhas Canárias, Ilha da Madeira, Açores, além de territórios insulares e continentes do continente africano (incluindo Cabo Verde, Ilha de São Tomé, São Jorge de Mina, Luanda, Benguela, Cabo da Boa Esperança e Moçambique e o sul da ilha de Madagascar). Na Ásia, seus domínios incluíam a região das cidades de Áden, Mascate e Baçorá (na Península Arábica), Ormuz e Diu (no atual Irã), litoral oeste e leste da Índia (incluindo as cidades de Bombaim, Goa e Cochim), ilha do Ceilão, península onde fica a atual Malásia (incluindo a cidade de Malaca), a ilha de Java, as Filipinas, as ilhas Molucas e o norte da Nova Guiné. 
Na parte inferior direita, rosa dos ventos e escala de 0 a 1.900 quilômetros.

FONTE: CAMPOS, F. de; dounicóf, M. Atlas: história do Brasil. São Paulo: Scipione, 1997. página 11.

Ícone. Ilustração de um símbolo de localização sobre um folheto aberto e em branco, indicando o boxe Se liga no espaço!

Se liga no espaço!

Responda no caderno.

O mapa apresenta o vasto império de Filipe segundo ampliado durante a União Ibérica. Analise-o e responda: com a união das Coroas ibéricas, era necessário manter as decisões do Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494? Justifique sua resposta.

Respostas e comentários

Resposta do Se liga no espaço!: Como a União Ibérica representou a união dos Estados português e espanhol, sob administração do rei Filipe segundo, não havia necessidade de manter as decisões do Tratado de Tordesilhas. Esse acordo delimitava as áreas espanholas e portuguesas na América, as quais, em 1580, passaram ao contrôle da Coroa espanhola.

Bê êne cê cê

Por envolver a análise do mapa do império de Filipe segundo em 1580, durante a União Ibérica, promovendo uma reflexão sobre a historicidade das fronteiras, o boxe “Se liga no espaço!” mobiliza tanto a habilidade ê éfe zero sete agá ih um um quanto a Competência Específica de Ciências Humanas nº 7. Por explicitar os interesses mercantis holandeses nas duas margens do Atlântico, essa parte do capítulo contribui para o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero sete agá ih um três.

Com a união de Portugal e Espanha – ou, como alguns historiadores defendem, a perda de autonomia do reino português –, os territórios coloniais ibéricos adquiriram dimensões extraordinárias. Conforme apontado no boxe “Se liga no espaço!”, o Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494, foi relativizado, o que, após o período, gerou uma série de disputas por fronteiras. Como visto anteriormente, os sertanistas frequentemente penetravam em áreas sob domínio espanhol, chegando a invadir aldeamentos comandados por jesuítas hispânicos. Do outro lado do continente, a Missão de Mainas, no Alto Rio Amazonas, foi objeto de disputa entre jesuítas espanhóis e carmelitas portugueses. As fronteiras entre a América portuguesa e a espanhola nessas áreas, tanto ao sul quanto ao norte, foram redefinidas pelo Tratado de Madri, em 1750, bastante tempo após a separação das duas Coroas.

É importante que os estudantes saibam relacionar o tema do Brasil holandês ao contexto de formação da União Ibérica e aos conflitos envolvendo a Coroa espanhola e os Países Baixos. Lembre-os de que, naquele momento, o território brasileiro era parte de um vasto império administrado pelos Habsburgo da Espanha. Isso ajuda a explicar a decisão dos holandeses de investir contra o Nordeste açucareiro, pois o Brasil (como possessão portuguesa) formava o elo mais frágil desse império colonial.

A decisão holandesa de atacar a América portuguesa

Com a união das Coroas, Portugal foi forçado a assumir os inimigos da Espanha, entre eles os holandeses. Diante disso, as companhias de comércio dos Países Baixos, que até então dominavam a comercialização e o refino do açúcar da América portuguesa, foram obrigadas a abrir mão desse lucrativo negócio. Assim, a invasão holandesa nessa região foi uma etapa do conflito que envolvia a Espanha e os Países Baixos.

Com o recrudescimentoglossário da guerra entre os Países Baixos e os espanhóis, em 1621, os holandeses fundaram uma nova companhia de comércio e navegação, a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, conhecida pela sigla dáblio i cê. Essa empresa tinha como objetivos complementares e indissociáveis: ocupar zonas de produção açucareira na América e controlar o suprimento de escravizados africanos.

A ação da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais complementava o trabalho da Companhia Holandesa das Índias Orientais, cujas ações eram direcionadas, principalmente, para Índia, Ceilão, Malaca, Ilhas Molucas, Batávia e Japão.

Rotas comerciais holandesas – século décimo sétimo

Mapa. Rotas comerciais holandesas, século dezessete.
Destaque para territórios localizados nos continentes africano, asiático e oceânico e para os oceanos Índico e Pacífico.
Legenda:
Seta laranja: Rotas comerciais holandesas.
No mapa:
Setas laranjas indicam as rotas comerciais holandesas que passam pelo sul da África, no Cabo da Boa Esperança, e pelas Ilhas Maurício, atravessam o Oceano Índico em direção à Indonésia, na província de Bantam, e em direção à Índia, na cidade de Calcutá. Outras rotas se iniciam em Cochim, no sul da Índia, e em Colombo, no atual Sri Lanka, de onde se deslocam para a Indonésia, passando por Malaca, na Malásia, e se direcionando para Fort Zelândia, no Taiwan, e finalmente chegando à Nagasaki, no Japão. Nas proximidade de Malaca, há uma bifurcação na rota até Batávia (Jacarta). Uma rota menor sai de Macáçar, localizada no Arquipélago da Malásia, e também alcança Batávia. 
No canto inferior direito, rosa dos ventos e escala de 0 a 970 quilômetros.

FONTE: beracláu, G. Atlas da história do mundo. São Paulo: Folha da Manhã; Londres: Times Books, 2000. página 157.

Respostas e comentários

Comente com os estudantes que os holandeses se empenharam em conquistar áreas nas duas margens do Atlântico: na América, para a produção de açúcar, e na África, para o fornecimento de escravizados, cujo tráfico consistia em atividade altamente rentável.

Neste ponto, é importante verificar com os estudantes a historicidade das fronteiras que conformam o território brasileiro. No primeiro século, como afirmou o frei Vicente do Salvador, os portugueses eram como caranguejos: ocupavam apenas o litoral. Com o avanço da colonização, o território sob colonização portuguesa foi sendo progressivamente ampliado. No entanto, em algumas áreas, a disputa com outros europeus – franceses, holandeses, ingleses e espanhóis – foi intensa. Comente com os estudantes que os atuais limites do Brasil foram estabelecidos apenas em 1903, com o Tratado de Petrópolis. Caso tenha oportunidade, apresente a eles mapas com representação de diversos momentos da formação do território brasileiro.

A dáblio i cê era uma companhia majestática fundada em 1621, com capital privado e autorização do Estado, para exploração da navegação e do comércio com a América e a África Ocidental. Foi um importante instrumento da política exterior holandesa, funcionando como máquina de guerra a serviço dos Países Baixos. Sua finalidade declarada era a de quebrar o monopólio ibérico do Atlântico e invadir colônias portuguesas e espanholas para explorá-las comercialmente.

Organizados em torno dessas companhias, os holandeses empregaram navios de guerra, equipamentos bélicos e contrataram soldados mercenários experientes em guerra para ocupar os entrepostosglossário comerciais criados por espanhóis e portugueses na África, na Índia, na Ásia e, depois da União Ibérica, também na América.

As primeiras tentativas de invadir a costa da América portuguesa ocorreram entre 1624 e 1625, quando os holandeses tomaram a cidade de Salvador.

Diante da resistência organizada por Matias de Albuquerque, governador da capitania da Bahia, os invasores não conseguiram ultrapassar os limites da cidade. Depois de um ano controlando Salvador, os comandantes da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais se renderam e, em 1625, deixaram a Bahia.

Gravura. A imagem apresenta uma área litorânea. Ao fundo, terra firme em tons de verde com algumas construções pequenas e desníveis no relevo. Em primeiro plano, várias caravelas e outras embarcações na Baía de Todos os Santos indo em direção à terra. Do lado esquerdo, uma parte de uma fortaleza e canhões sendo acionados na direção das embarcações. Acima está escrito: São Salvador.
Navios de guerra da dáblio i cê atacam a cidade de Salvador, em 1624, gravura colorizada de Essél Gerritsz e clás iânson físsêr, século dezessete.
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Imagens em contexto!

A gravura representa parte da esquadra de 26 navios comandada pelo almirante holandês Djeicób vílequens. Estima-se que pelo menos 600 marinheiros e .1700 soldados atacaram a capital da América portuguesa, que foi bombardeada pelos holandeses em 1624. Na gravura, à esquerda, é possível notar a representação dos tiros dos canhões. A divisão de Salvador entre cidade baixa e cidade alta e os fortes que protegiam a cidade também foram representados.

Respostas e comentários

Dados numéricos sobre a esquadra holandesa foram retirados de: planelia, J. J. O ataque holandês à Bahia: um episódio na luta pelo domínio Atlântico. Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre (Rio Grande do Sul), número 103, página 122, dez. 1975.

Ampliando

O historiador Evaldo Cabral de Mello analisa, no texto a seguir, as investidas holandesas na Bahia.

“Fins de abril, começos de maio de 1624, a armada da dáblio i cê surgiu diante da capital da América portuguesa. A 9 de maio, as tropas comandadas por iân van dórt desembarcaram sob a proteção de cerrado bombardeio que aterrorizou a população, levando-a a abandonar a cidade pela segurança do Recôncavo. No dia seguinte, os neerlandeses entraram sem oposição na capital da América portuguesa, onde se depararam apenas com o governador-geral Diogo de Mendonça Furtado. Mas eles logo constataram a dificuldade de estender sua presença para além dos muros de Salvador, onde se acharam encurralados pelas guerrilhas luso-brasileiras do Arraial do Rio Vermelho, as quais, sob a chefia do bispo Dom Marcos Teixeira e, depois, de Dom Francisco de Moura, ofereceram forte resistência às tentativas de penetração dos contingentes batavos.

A partida da armada de vílequens e a dos navios do vice-almirante pít réin para a costa africana deixaram a tropa neerlandesa desprotegida. […] Em vista da fraqueza militar e da desmoralização reinante, foi sem maiores problemas que uma poderosa armada luso-espanhola sob o comando de Dom Fadrique de Toledo, na qual se alistou boa parte da nobreza lusitana, reconquistou Salvador a 30 de abril de 1625. Pela primeira vez na história das guerras holandesas no Brasil, tornava-se evidente a vantagem geopolítica de que desfrutava Portugal relativamente a um inimigo, cuja esmagadora superioridade naval ficava imobilizada nos meses de outono-inverno pelas condições de navegação do Mar do Norte e no Canal da Mancha.”

MELLO, E. C. de (organizador). O Brasil holandês. São Paulo: Pêngüim, 2010. página 39-40.

Curadoria

Biblioteca Digital de Cartografia Histórica (sáite)

Laboratório de Estudos de Cartografia Histórica (léshi). Disponível em: https://oeds.link/xBeLFB. Acesso em: 22 março 2022.

O sáite reúne uma coleção de mapas impressos e digitalizados do Império Português na Idade Moderna. Os mapas, em alta resolução, são acompanhados de verbetes explicativos, com a contextualização do processo de produção, circulação e apropriação das imagens cartográficas.

A conquista de Pernambuco e do Maranhão

Após a derrota na Bahia, os holandeses organizaram-se melhor e, em 1629, iniciaram uma nova investida, dessa vez contra a capitania de Pernambuco, principal produtora de açúcar na América. Na época, havia na capitania 121 engenhos de açúcar, conforme o relato de ádrriân van der dusse, funcionário da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais.

O ataque contou com 65 embarcações e 7280 homens. Olinda, a capital, foi ocupada em fevereiro de 1630, iniciando-se o projeto holandês na América portuguesa.

De fórma geral, os objetivos e as práticas coloniais dos holandeses não se diferenciavam muito dos de Portugal. O contrôle e o lucro sobre o comércio de produtos coloniais e de africanos escravizados foram tão centrais para o projeto holandês na América quanto eram para os portugueses.

História em quadrinhos composta por um quadro. A imagem apresenta, à frente, homens negros, algemados e de torso nu. Eles estão sentados com as mãos em cima dos joelhos dobrados. Em pé, ao fundo, dois homens um com casaco vermelho de botão e uma vara na mão e outro com chapéu e um papel na mão que diz: “Dezenove, vinte, fechou esse lote! Separe essas peças aqui, João Fernandes”. Eles estão na frente de um casarão.
Reprodução de página da história em quadrinhos Holandeses, de André Toral, publicada em 2017.
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Imagens em contexto!

A ocupação de Pernambuco pelos holandeses marcou a memória da região. Existem muitos monumentos e construções que remetem ao período da invasão holandesa, além de obras de arte e livros que tratam dessa etapa da história, como o quadrinho Holandeses, de André Toral.

Agora é com você!

Responda no caderno.

  1. Explique a diferença entre as expedições ultramarinas organizadas pelas Coroas ibéricas e as organizadas pelos Países Baixos.
  2. De que modo os holandeses estavam envolvidos na produção e na comercialização do açúcar da América portuguesa?
  3. Relacione o ataque à cidade de Salvador pelos holandeses em 1624 às relações entre Espanha, Portugal e Países Baixos no mesmo período.

Dica

LIVRO

Holandeses, de André Toral. São Paulo: Veneta, 2017.

Nesse livro em formato de quadrinhos, são narradas as aventuras de dois irmãos judeus que vieram ao Brasil no contexto da invasão de Pernambuco pelos holandeses. Aspectos históricos do período são explorados, revelando as transformações promovidas pelos holandeses no período em que permaneceram na América.

Respostas e comentários

Dados numéricos sobre o ataque holandês foram retirados de: Chuárquis, L.; istárlin, H. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. página 59.

Agora é com você!

1. Enquanto as expedições ultramarinas ibéricas eram financiadas pelo governo, as dos Países Baixos eram custeadas por poderosas companhias de comércio e navegação, que recebiam autorização do Estado para desenvolver negócios em várias regiões do mundo.

2. Os holandeses emprestavam o capital necessário para a compra de equipamentos e a formação dos engenhos coloniais e, em troca, exigiam os direitos de refino e de distribuição do açúcar na Europa.

3. Com a união das Coroas de Portugal e Espanha (União Ibérica), problemas espanhóis passaram a ser também portugueses. A guerra com os Países Baixos era o principal deles. A invasão holandesa foi uma etapa colonial desse grande conflito entre holandeses e espanhóis. Com a criação da dáblio i cê, para ocupar as zonas de produção açucareira na América portuguesa e controlar o tráfico de escravizados, os holandeses tomaram Salvador, capital da colônia, em 1624 e 1625, mas não conseguiram expandir seu domínio. Depois de um ano controlando a cidade, renderam-se e, em 1625, deixaram a Bahia.

Orientação para as atividades

Os estudantes deverão reler o conteúdo, identificando as informações necessárias para fazer as atividades do boxe “Agora é com você!”. Em seguida, deverão elaborar as respostas. Para realizar as duas primeiras atividades, mais simples, eles precisarão relembrar informações do texto-base, como o custeamento das expedições, bancado pelas Coroas ou pelas companhias de comércio e navegação, e o envolvimento dos holandeses com a produção e a comercialização do açúcar da América portuguesa. Já a terceira atividade envolve a relação de acontecimentos e processos ocorridos na América portuguesa e na Europa. Para facilitar o trabalho, proponha aos estudantes que façam uma cronologia dos eventos. Isso poderá ajudá-los nos procedimentos de relacionar e temporalizar o evento em questão.

O Império Holandês na América portuguesa e na África

Como o negócio do açúcar estava associado à utilização da mão de obra escravizada, além de ocupar grandes áreas produtoras de açúcar da América portuguesa, os holandeses tomaram pontos importantes do litoral africano explorados pelos portugueses, de onde traziam escravizados para serem vendidos na América. Atacavam, sobretudo, os fortes mantidos pelos europeus na costa africana que serviam como centro de comércio e de armazenamento de pessoas e de mercadorias.

No continente africano, a maior parte das pessoas escravizadas era capturada na Costa da Mina, no golfo da Guiné, em Angola e em São Tomé e Príncipe. Essas colônias portuguesas eram importantes entrepostos do tráfico de escravizados no Atlântico. No capítulo 11, você estudará esse tráfico de fórma aprofundada.

Assim, após tomar dos portugueses importantes territórios e fortes africanos, como a Fortaleza de São Jorge da Mina, conquistada em 1637, e parte da América portuguesa, os holandeses garantiram o contrôle do tráfico de escravizados e do principal centro de produção açucareira americano, de modo que o açúcar passou a ser, cada vez mais, um negócio holandês.

Ilustração. Ao fundo, uma terra à beira do mar, tendo à esquerda uma construção semelhante a um castelo com uma bandeira da com listras laranja, branca e azul hasteada e, à direita, uma pequena vila com uma plantação ao lado e canoas compridas de madeira enfileiradas na praia. No centro, o mar com alguns homens navegando em canoas e, na parte inferior, outra faixa de terra com pessoas desembarcando de uma canoa.
Ilustração do atlas bláu vân der rém, do século dezessete, representando a Fortaleza de São Jorge da Mina, em Elmina, atual Gana. A fortaleza foi construída pelos portugueses em 1482, quando o local era território da etnia acã e o principal produto comercializado era o ouro.
Pintura. Homem negro usando chapéu de aba larga e preto, camisa branca estampada com detalhes dourados nas mangas, gola grande e branca e colete preto. Há um acessório transversal com detalhes em alto-relevo atravessando o torso do homem.
Dom Miguel de Castro, emissário do Congo, pintura de iásper béks, cêrca de 1643.
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Imagens em contexto!

Dom Miguel de Castro foi enviado ao Recife para mediar um conflito entre o Conde de Sonho, senhor da cidade de sôio, na foz do Rio Congo (na região de Angola), e o rei do Congo, procurando o apoio do governo holandês no Recife. Nesse período, Angola também estava sob o domínio dos holandeses, que atacaram Luanda em 1641.

Respostas e comentários

Bê êne cê cê

Ao tratar das conquistas holandesas na América e na África e das relações mercantis que se estabeleceram no Oceano Atlântico durante a Idade Moderna, principalmente as vinculadas ao tráfico de pessoas escravizadas, o conteúdo mobiliza as habilidades ê éfe zero sete agá ih zero dois, ê éfe zero sete agá ih um três e ê éfe zero sete agá ih um seis.

É importante comentar com os estudantes as relações que estruturavam o tráfico de escravizados. O comércio era feito por meio de alianças entre traficantes europeus – incluídos os holandeses – e comerciantes africanos, que capturavam moradores de aldeias inimigas e os trocavam por armas de fogo, tecidos, utensílios de ferro, pólvora e tabaco, entre outros produtos. Chame a atenção dos estudantes para o fato de os europeus terem instrumentalizado as rivalidades históricas entre os povos africanos.

Curadoria

Museu Afro Brasil (Site)

Disponível em: https://oeds.link/8Sp4bJ. Acesso em: 22 março 2022.

O acervo digital do Museu Afro Brasil contém peças que revelam a história de diferentes povos africanos. Além de dados sobre a escravidão e o tráfico de escravizados, há no site muitas informações sobre as milenares sociedades africanas e suas riquezas culturais.

Versões em diálogo

A seguir, você encontrará dois textos sobre um mesmo tema: o ataque da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais à América portuguesa no século dezessete. O primeiro deles é uma análise dos acontecimentos feita pelo historiador brasileiro Evaldo Cabral de Mello. O segundo é um documento de época, uma fonte histórica. Leia-os e, em seguida, faça as atividades propostas.

TEXTO 1

“Na escolha do Brasil como alvo do ataque empresadoglossário pela WIC pesou uma variedade de motivos. A América portuguesa constituiria o elo frágil do sistema imperial castelhano, em vista de sua condição de possessão lusitana, o que conferia à sua defesa uma posição subalternaglossário na escala das prioridades militares do governo de Madri. Contava-se também com a obtenção de lucros fabulosos a serem proporcionados pelo açúcar e pelo pau-brasil, calculando-se que, uma vez conquistada a um custo máximo de 2,5 milhões de florins, a colônia renderia anualmente cêrca de 8 milhões de florins. Outro argumento favorável ao ataque contra o Brasil dizia respeito ao fato de que, enquanto os centros do poder espanhol no Novo Mundo estavam concentrados no altiplanoglossário , o que tornaria a ocupação tarefa complexa e onerosaglossário , os núcleos de população portuguesa situavam-se ao longo do litoral, ao alcance do poder naval batavoglossário . reticências

MELLO, E. C. de (organizador). O Brasil holandês. São Paulo: Pêngüim, 2010. página 29.

TEXTO 2

“Estes dois lugares, isto é, Bahia e Pernambuco (nos quais consiste este grande país, conforme já disse), não dispõem de fôrças consideráveis ou fortalezas, de modo que, com a graça de Deus, os mesmos poderão ser e serão ocupados reticências principalmente se a Companhia das Índias Ocidentais para aí enviar oficiais corajosos, bons soldados, mestres ou engenheiros experimentados e adequados instrumentos de guerra reticências.”

múerbék, J. A. Motivos por que a Companhia das Índias Ocidentais deve tentar tirar ao rei da Espanha a terra do Brasil. Amsterdã, 1624. ín: MELLO, E. C. (organizador). O Brasil holandês. São Paulo: Penguin, 2010. página 30.

Respostas e comentários

Bê êne cê cê

Por envolver a análise de uma fonte histórica – procedimento basilar da produção historiográfica – e de um texto do historiador Evaldo Cabral de Mello sobre a ocupação holandesa nas áreas coloniais portuguesas, a seção contribui para o desenvolvimento das habilidades ê éfe zero sete agá ih zero dois e ê éfe zero sete agá ih um três, bem como das Competências Específicas de História nº 3 e nº 6.

Versões em diálogo

Nessa seção, são reproduzidos dois excertos. O primeiro é uma análise feita pelo historiador brasileiro Evaldo Cabral de Mello, que situa o projeto holandês no Brasil em uma conjuntura maior, relacionada ao contexto da União Ibérica. O segundo é um documento de época e indica parte da motivação da dáblio i cê para atacar o Brasil. Espera-se que, ao analisar os dois textos, os estudantes sedimentem parte do conteúdo explorado no capítulo e relacionem tanto o contexto europeu dos séculos dezesseis e dezessete quanto a cadeia internacional de comércio do açúcar à decisão holandesa de invadir o Brasil.

Ampliando

No texto a seguir, o historiador Sérgio Buarque de Holanda compara as cidades coloniais espanholas às portuguesas.

“[…] a colonização espanhola caracterizou-se largamente pelo que faltou à portuguesa: por uma aplicação insistente em assegurar o predomínio militar, econômico e político da metrópole sobre as terras conquistadas, mediante a criação de grandes núcleos de povoação estáveis e bem ordenados. Um zelo minucioso e previdente dirigiu a fundação das cidades espanholas na América. […]

Já à primeira vista, o próprio traçado dos centros urbanos na América espanhola denuncia o esforço determinado de vencer e retificar a fantasia caprichosa da paisagem agreste: é um ato definido da vontade humana. […] O traço retilíneo, em que se exprime a direção da vontade a um fim previsto e eleito, manifesta bem essa deliberação. E não é por acaso que ele impera decididamente em todas essas cidades espanholas, as primeiras cidades ‘abstratas’ que edificaram europeus em nosso continente.

[…]

Comparado ao dos castelhanos em suas conquistas, o esforço dos portugueses distingue-se principalmente pela predominância de seu caráter de exploração comercial reticências.”

HOLANDA, S. B. de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. página 95-98.

Fotografia. Vista de uma cidade à beira-mar. Em primeiro plano, destaque para uma igreja em formato retangular com uma torre lateral de três andares, um pátio, vários coqueiros e outras árvores, além de construções mais baixas com telhados alaranjados. Em segundo plano, à esquerda, extensa faixa de mar em tons de azul e verde e, à direita, faixa de areia, prédios, construções baixas e vegetação rasteira.
Vista aérea do município de Olinda (Pernambuco). Foto de 2021. Capital da mais rica capitania da América portuguesa, Pernambuco, Olinda foi o ponto escolhido pelos holandeses para o ataque de 1630. No ano seguinte da ocupação da cidade, em 1631, foi incendiada pelos holandeses.

Responda no caderno.

  1. De acordo com o texto 1, quais eram os interesses holandeses na ocupação do território da América portuguesa?
  2. Com base na leitura do primeiro texto, explique uma diferença entre o processo de ocupação da América pelos espanhóis e o empreendido pelos portugueses.
  3. Os dois textos apresentam motivos para o ataque dos holandeses às capitanias da Bahia e de Pernambuco. Esses motivos são semelhantes ou diferentes? Justifique sua resposta.
Respostas e comentários

Atividades

1. O interesse dos holandeses em ocupar o território brasileiro residia, sobretudo, no comércio de açúcar e de pau-brasil. Eles acreditavam que a invasão acarretaria um custo de aproximadamente 2,5 milhões de florins. No entanto, anualmente, após a invasão, esse território poderia render aos cofres holandeses 8 milhões de florins.

2. O tipo de ocupação relaciona-se diretamente ao padrão de assentamento dos povos indígenas, concentrados em núcleos no interior, na área de interesse espanhol, e no litoral, na área sob colonização portuguesa.

3. O segundo texto aponta a fragilidade das defesas militares das capitanias da Bahia e de Pernambuco como um dos fatores que motivaram os ataques da dáblio i cê. No texto do historiador Evaldo Cabral de Mello, essa fragilidade está relacionada ao contexto da União Ibérica, período de aproximadamente sessenta anos no qual Portugal foi incorporado pela Espanha por intermédio de um acordo político. Diante da crise sucessória, instituída com a morte de dom Sebastião, rei de Portugal, Filipe segundo da Espanha reivindicou seu direito ao trono português.

Curadoria

O Brasil holandês (Livro)

Evaldo Cabral de Mello (organizador). São Paulo: Pêngüim, 2010.

O reconhecido historiador do Brasil holandês Evaldo Cabral de Mello reuniu, nesse livro, artigos e ensaios sobre as ocupações holandesas do território português. A produção é rica em documentos sobre o período.

A administração de Maurício de Nassau

A presença holandesa na América portuguesa chegou ao auge durante o governo do conde João Maurício de Nassau, veterano das guerras holandesas contra a Espanha, encarregado de governar e administrar as possessões holandesas conquistadas em Pernambuco. De Olinda, os holandeses estenderam seus domínios pela costa até Natal. Mais tarde, alcançaram as cidades de Fortaleza e de São Luís.

Nassau chegou à cidade do Recife em 1637 e conseguiu estabelecer boas relações com os produtores portugueses (nascidos em Portugal ou na América portuguesa), concedendo empréstimos aos senhores de engenho e até perdoando as dívidas que eles tinham contraído com a antiga metrópole ibérica.

Para modernizar a cidade, Nassau investiu em grandes obras e construções: drenou terrenos e construiu canais, diques, pontes e palácios. Além disso, incentivou atividades culturais e de pesquisa sobre a fauna e a flora da América, cercando-se de artistas, cientistas e intelectuais. Foi nesse contexto que, em 1637, os artistas frãns pôst e álbert équirráut vieram para Pernambuco.

América portuguesa: domínio dos holandeses no Nordeste – século dezessete

Mapa. América portuguesa: domínio dos holandeses no Nordeste, século dezessete.
O mapa apresenta a porção nordeste do atual território brasileiro.
Legenda:
Verde: Domínio holandês.
No mapa o domínio holandês, abrange: o entorno das cidades de São Luís (1641) e Fortaleza (1637); a faixa na costa litorânea incluindo as cidades de Nova Amsterdã, Natal (1634), Forte de Cabedelo, Frederica (1634), Igarassu, Olinda (1630), Forte de Orange, Recife (1630), Forte do Rio Formoso, Porto Calvo, Penedo (1637), Forte Maurício e São Cristóvão (1637) e Salvador (1624 e 1625).
No canto inferior esquerdo, rosa dos ventos e escala de 0 a 220 quilômetros.

FONTE: ATLAS histórico escolar. Rio de Janeiro: fei ,1980. página 26.

Fotografia. Vista para uma ponte de cimento sobre um rio. Na ponte há alguns postes de iluminação, fios de eletricidade e pessoas caminhando. Ao fundo, construções da área urbana.
Ponte Maurício de Nassau, sobre o Rio Capibaribe, no centro histórico do Recife (Pernambuco), 2020. Inaugurada em 1643, durante a administração de Maurício de Nassau, é considerada a primeira grande ponte instalada no território que hoje corresponde ao Brasil.
Respostas e comentários

Embora se voltasse às atividades mercantis do açúcar, a ocupação holandesa no Nordeste também é conhecida por seu caráter letrado. A vinda de artistas que fixaram imagens e criaram representações do Brasil holandês, como as reproduzidas ao longo do capítulo, contribuiu para a construção dessa memória de requinte cultural.

Ampliando

No texto a seguir, Adriana Lopez e Carlos Guilherme Mota abordam a “idade do ouro” do Brasil holandês.

“Para apaziguar os senhores de engenho que permaneceram nos territórios dominados pelos holandeses, Nassau prometeu-lhes igualdade perante as leis e liberdade de consciência. Se jurassem fidelidade à Companhia [dáblio i cê], teriam o direito de portar armas para defender-se dos bandidos, poderiam voltar para suas terras e reconstruir seus engenhos.

De um total de 149 engenhos, 65 foram confiscados pela Companhia quando da chegada de Maurício [de Nassau] a Recife. Mas logo se revelou uma qualidade na gestão do conde: a brandura, que se devia, em grande parte, ao fato de os holandeses não saberem fazer açúcar. Sem a colaboração dos senhores de engenho luso-brasileiros, a empresa açucareira não tinha como vingar. Um resultado disso foi que tanto holandeses como luso-brasileiros compraram engenhos entre 1637 e 1638. Para isso, contaram com crédito abundante fornecido pela Companhia.

Os ‘privilégios’ concedidos aos moradores pelo conde visavam à reativação do sistema produtivo, desmantelado pela guerra de conquista e pelas investidas de companhistas vindos da Bahia. Além de perder o poder político, os senhores de engenho tiveram de suportar a ação intermitente daqueles companhistas, de salteadores e de negros aquilombados. Por outro lado, foi bastante bem-sucedida a política de ‘terra arrasada’ adotada pelas autoridades metropolitanas sediadas na Bahia em todas as fases do conflito.”

LOPEZ, A.; MOTA, C. G. História do Brasil: uma interpretação. São Paulo: Senáqui, 2008. página 134-135.

A tolerância religiosa

Outro ponto importante no governo de Nassau foi a tolerância religiosa, até então inédita na América portuguesa. Protestante, o governador estabeleceu liberdade de culto, sendo tolerante com católicos, judeus e os chamados cristãos-novos – que em razão da Inquisição ibérica e da proibição do judaísmo em Portugal muitas vezes mantinham as práticas religiosas judaicas, mas de fórma secreta.

A primeira sinagoga reconhecida nas Américas foi construída no Recife nesse período. Após escavações arqueológicas realizadas entre o final do século vinte e o início do vinte e um, hoje funciona no local o Museu Sinagoga karrál zur Israel, que pode ser visitado.

Comerciantes de origem judaica também atuavam nas possessões holandesas em Pernambuco, operando até mesmo como investidores da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais.

A relativa tolerância religiosa a judeus e católicos, contudo, teria ocorrido menos por princípios éticos e mais por questões comerciais. Os holandeses queriam obter lucros com seu empreendimento americano, e Nassau percebeu que uma das fórmas de garantir mais rendimentos era obter a simpatia dos senhores de engenho católicos que já viviam na região e tinham conhecimento e contrôle da produção. Em relação aos judeus, essa tolerância, que já existia nos Países Baixos, foi estendida aos domínios holandeses na América portuguesa.

Apesar de promissor, o governo de Nassau teve fim em 1644. O conde se desentendeu com os dirigentes da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais e teve de regressar à Europa.

Fotografia. Fachada de edifício amarelo-claro de dois pavimentos com quatro grandes portas vermelhas de madeira em formato de arco no térreo e quatro no andar superior que dão para sacadas. Na frente, a inscrição: Sinagoga Kahal Zur Israel.
Prédio da sinagoga karrál zur Israel, no Recife (Pernambuco). Foto de 2020.
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Imagens em contexto!

Os judeus sofreram com a perseguição religiosa nos territórios portugueses. No final do século quinze, foram obrigados a se converter ao catolicismo ou abandonar Portugal. Muitos migraram justamente para os Países Baixos. A perseguição se estendeu aos territórios americanos, onde a presença deles era proibida. Por isso, o ambiente de tolerância religiosa no Recife tinha um significado particular.

Respostas e comentários

Bê êne cê cê

Ao abordar a liberdade religiosa no Brasil holandês em contraste com a perseguição a judeus em terras portuguesas, o conteúdo do capítulo contribui para o desenvolvimento das habilidades ê éfe zero sete agá ih zero dois e ê éfe zero sete agá ih zero cinco, da Competência Específica de História nº 5, da Competência Específica de Ciências Humanas nº 5 e da Competência Geral da Educação Básica nº 9.

Interdisciplinaridade

A apresentação da imagem da sinagoga Kahal Zur Israel, que é um patrimônio histórico, e o conteúdo do boxe “Imagens em contexto!” contribuem para o desenvolvimento da habilidade do componente curricular arte ê éfe seis nove á érre três quatro – “Analisar e valorizar o patrimônio cultural, material e imaterial, de culturas diversas, em especial a brasileira, incluindo suas matrizes indígenas, africanas e europeias, de diferentes épocas, e favorecendo a construção de vocabulário e repertório relativos às diferentes linguagens artísticas”.

Atividade complementar

Organize a turma em grupos de cinco estudantes. Peça a cada grupo que pesquise, em jornais, periódicos, portais de jornalismo etcétera, informações sobre atos de intolerância religiosa no Brasil e no restante do mundo. Após a pesquisa, peça-lhes que selecionem pelo menos duas histórias, de preferência, de 2015 em diante, para contá-las aos colegas em sala de aula no dia determinado. Em seguida, proponha-lhes que opinem sobre os atos de intolerância que relataram e ouviram e sobre o que pode ser feito para melhorar a relação entre pessoas de diferentes religiões e as que não têm religião etcétera É importante debater a liberdade religiosa no Brasil atualmente, destacando os direitos dos praticantes de religiões de matriz africana. Por fim, converse com os estudantes a respeito das perseguições religiosas características da Idade Moderna e de outros períodos da história. Poderá ser útil a seguinte cartilha: PINTO, F. (organizador). Liberdade religiosa e direitos humanos. Rio de Janeiro: Universidade Federal Fluminense, 2017. Disponível em: https://oeds.link/wN7qDS. Acesso em: 22 março 2022.

A crise do governo holandês na América portuguesa

Os governadores da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais que sucederam a Nassau adotaram medidas duras contra os produtores de açúcar, cobrando antigas dívidas e cortando gastos considerados desnecessários, como o investimento nos engenhos da região.

Eles buscavam lucro a curto prazo e não entendiam que a estabilidade do governo holandês em Pernambuco dependia, em certo sentido, desse custoso financiamento e das medidas adotadas pelo governo anterior em favor da população local.

Diante do descontentamento com o governo, teve início a Insurreição Pernambucana, um movimento de expulsão dos holandeses da América portuguesa. Entre 1645 e 1654, ocorreram as chamadas Guerras de Restauração, da qual participaram líderes como André Vidal de Negreiros, João Fernandes Vieira, Henrique Dias e Felipe Camarão.

Portugal tinha recuperado a independência da Espanha em 1640, mas os conflitos foram financiados com capital próprio da colônia. As batalhas mais importantes ocorreram em 1648 e em 1649, no Morro dos Guararapes, ao sul do Recife, e foram vencidas pelas tropas fiéis à Coroa portuguesa.

Pintura. Vista de uma cena de batalha. No centro, um grupo de homens com calças, camisas, botas e capacetes empunham sabres e os apontam em direção a dois homens montados em cavalos, com espadas, e vestindo calças, camisas, botas e chapéus com pena. Um dos cavalos está levantado e com as duas patas da frente fora do chão. Ele se assusta e se esquiva da ponta das lanças. Ao redor, há homens caídos no chão, outros sendo derrubados, e lanças e espadas erguidas em movimento. Há fumaça no segundo plano e, ao fundo, árvores de tamanhos diferentes.
Batalha dos Guararapes, pintura de Victor Meirelles, 1875-1879.
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Imagens em contexto!

O conflito travado no Morro dos Guararapes foi fundamental para o fim da presença holandesa nessa região da América portuguesa. No século dezenove, momento de afirmação da identidade brasileira após a independência, a batalha dos Guararapes foi retomada como marco histórico da construção da nação e representada em obras como a pintura de Victor Meirelles. Vale lembrar que a guerra foi travada como demonstração de lealdade à Coroa portuguesa, e não por amor ao Brasil, que nem existia de fórma autônoma na época.

Respostas e comentários

O líder indígena Felipe Camarão, possivelmente da etnia Potiguara, participou ativamente da expulsão dos holandeses do Nordeste brasileiro. As cartas em língua tupi trocadas entre os irmãos Camarão – Diogo Camarão, aliado dos portugueses, e Pedro Poti (sobrenome derivado de camarão em tupi), aliado dos holandeses – são consideradas os documentos de autoria indígena mais antigos da América portuguesa. Além disso, registram a fragmentação de um grupo indígena em decorrência da aliança com diferentes grupos europeus.

Ampliando

No texto a seguir, Boris Fausto aborda a disputa pela produção e pelo comércio do açúcar durante a ocupação holandesa no Nordeste brasileiro e na costa da África, bem como trata das articulações entre indígenas, africanos e colonos portugueses para a expulsão dos holandeses da América.

“O principal centro de revolta contra a presença holandesa localizou-se em Pernambuco, onde se destacaram as figuras de André Vidal de Negreiros e João Fernandes Vieira, este último um dos mais ricos proprietários da região. A eles se juntaram o negro Henrique Dias e o índio Felipe Camarão. Depois de alguns êxitos iniciais dos luso-brasileiros, a guerra entrou em um impasse, prolongando-se por vários anos. Enquanto os revoltosos dominavam o interior, Recife permanecia em mãos holandesas. […]

reticências Tão logo conseguiram estabilizar razoavelmente a indústria açucareira no Nordeste, os holandeses trataram de garantir o suprimento de escravos, controlando suas fontes na África. Na verdade, houve duas frentes de combate, muito distantes geograficamente, mas interligadas. Vários pontos da Costa da Mina foram ocupados em 1637. Uma trégua estabelecida entre Portugal e Holanda logo após a Restauração foi rompida por Nassau, com a ocupação de Luanda e Benguela, em Angola (1641). Foram tropas luso-brasileiras, sob o comando de Salvador Correia de Sá, as responsáveis pela retomada de Angola em 1648. Não por acaso, homens como João Fernandes Vieira e André Vidal de Negreiros estiveram à frente da administração portuguesa naquela colônia africana.”

FAUSTO, B. História concisa do Brasil. 2. edição São Paulo: êduspi, 2021. página 46-47.

O fim do domínio holandês

Em 1654, as fôrças holandesas foram finalmente derrotadas e se retiraram da América portuguesa. No entanto, os Países Baixos passaram a produzir açúcar na região das Antilhas, na América Central, e se tornaram concorrentes diretos do produto português na Europa.

Por causa dessa concorrência, os preços do açúcar baixaram no mercado internacional, criando problemas econômicos para Portugal.

Gravura. Em primeiro plano, várias caravelas no mar. Em segundo plano, do lado esquerdo, uma fortaleza em uma ilha com explosão de canhões e, ao lado, uma embarcação também com explosão de canhão. Do lado direito, terra com casas à beira-mar e, atrás delas, coqueiros. Ao fundo, algumas montanhas.
Gravura representando a Ilha de Santo Eustáquio, no Mar do Caribe, produzida no século dezoito.
Ícone. Ilustração de uma lupa indicando o boxe Imagens em contexto!

Imagens em contexto!

A experiência com a produção do açúcar na América portuguesa permitiu aos holandeses ampliar seus negócios na região das Antilhas. O açúcar produzido no Caribe, em ilhas como a de Santo Eustáquio, tinha custo mais baixo de produção devido à isenção de impostos sobre a mão de obra escravizada. Além disso, como os holandeses dominavam o refino e a distribuição do produto na Europa, tornaram-se grandes concorrentes dos portugueses.

Agora é com você!

Responda no caderno.

  1. Explique qual foi a estratégia adotada pelos holandeses para concentrar as atividades relacionadas ao comércio de açúcar.
  2. Cite três iniciativas adotadas pelo conde Maurício de Nassau que tinham o objetivo de aproximar os moradores do Recife do projeto de dominação holandesa.
  3. Caracterize o fim da ocupação da América portuguesa pelos holandeses e os impactos de sua expulsão para o comércio do açúcar brasileiro.
Respostas e comentários

Se possível, destaque os impactos da expulsão holandesa da América portuguesa para o comércio internacional do açúcar brasileiro. Com a instalação de engenhos holandeses nas Antilhas, o produto brasileiro passou a disputar espaço com o açúcar antilhano, acarretando queda no preço da mercadoria. No século seguinte, isso trouxe muitos prejuízos para os produtores brasileiros e para a Coroa portuguesa.

Agora é com você!

1. Além de tomar dos portugueses grandes áreas produtoras de açúcar, os holandeses ocuparam pontos importantes do litoral africano, nos quais os portugueses buscavam escravizados, a principal mão de obra utilizada nos engenhos da América.

2. Nassau concedeu empréstimos aos senhores de engenho e até perdoou antigas dívidas deles. Também modernizou a cidade, construindo canais, diques, pontes e palácios. Além disso, incentivou atividades culturais e de pesquisa, e estabeleceu a liberdade de culto aos católicos e judeus.

3. Os governadores da dáblio i cê que sucederam Nassau adotaram medidas mais enérgicas contra os produtores de açúcar, cobrando antigas dívidas e cortando gastos considerados desnecessários, como o investimento nos engenhos da região. Nesse momento, iniciou-se a Insurreição Pernambucana, com as chamadas Guerras de Restauração. Os líderes do movimento foram Felipe Camarão e André Vidal de Negreiros, mas a guerra mobilizou boa parte da sociedade local. Os holandeses foram derrotados, retirando-se do Brasil em 1654 e dirigindo-se às Antilhas, para onde levaram seus conhecimentos sobre a produção de açúcar.

Orientação para as atividades

As atividades do boxe “Agora é com você!” demandam os procedimentos de identificação e enumeração, explicação e caracterização de um processo histórico. Provavelmente, a esta altura, os estudantes já incorporaram os procedimentos de releitura e sistematização das informações necessários à elaboração autônoma das respostas. Se necessário, porém, considere a possibilidade de inverter a ordem das atividades, visto que a 2 é menos complexa, pois envolve a enumeração de eventos específicos. Pontue diferencialmente as respostas segundo as capacidades de identificar, explicar e caracterizar, valorizando o esforço mais simples e as elaborações mais complexas e autônomas.

Atividades

Responda no caderno.

Organize suas ideias

1. Copie o esquema em seu caderno e complete os campos a, e .

Esquema. Esquema formado por trechos de frase a serem completadas. As partes que devem ser completadas são indicadas pelas letras a, b e c.
Invasões holandesas resultaram na formação do chamado Brasil holandês, localizado no (letra a), cujas principais atividades econômicas eram o plantio e o comércio da cana-de-açúcar.
Invasões holandesas ocorreram durante a União Ibérica (1580 a 1640), definida como um: (letra b).
Invasões holandesas resultaram na formação do chamado Brasil holandês, governado pelo conde Maurício de Nassau (1637 a 1644), cujo governo tinha algumas diretrizes, como: (letra c).
  1. Leia as afirmações a seguir sobre Maurício de Nassau. Em seu caderno, identifique as verdadeiras e as falsas.
    1. Enfrentou resistência dos senhores de engenho locais em virtude das diferenças religiosas entre holandeses protestantes e portugueses católicos.
    2. Foi reconhecido pelo financiamento dos engenhos, perdão de antigas dívidas e investimentos urbanos na cidade do Recife.
    3. Dedicou atenção aos negócios do açúcar, contribuindo para aumentar o lucro dos senhores de engenho, mas impediu o desenvolvimento artístico e cultural local.
    4. Enfrentou forte resistência da população local contrária ao projeto urbanístico implantado em Recife e Olinda, que elevou a carga tributária e o custo de vida.
    5. Alcançou muita popularidade em razão do ambiente de tolerância religiosa, aceitando a realização de cultos judaicos, islâmicos, protestantes e indígenas.
Respostas e comentários

Atividades

Organize suas ideias

1. a) Nordeste do atual território brasileiro;

b) Período em que as Coroas ibéricas estiveram unidas;

c) Financiamento e reconstrução de engenhos, investimentos em melhorias urbanas, promoção da vinda de artistas holandeses ao Brasil e tolerância religiosa.

2. a) F; b) V; c) F; d) F; e) F.

Aprofundando

3. Analise a imagem a seguir e depois faça o que se pede.

Pintura. Vista de cima de um grande campo de batalha. Diversas pessoas brancas, indígenas e negras vindo da esquerda para direita em um campo aberto, divididas em batalhões. Os batalhões estão organizados em vários grupos nos quais os soldados estão enfileirados e seguem alguns homens à frente com escudo e espadas. Alguns padres estão próximos a esses líderes. No centro da pintura, há um batalhão manuseando canhões e, logo atrás dele, vêm um batalhão montado a cavalo. No canto superior esquerdo, próximo aos portugueses, há a imagem de Nossa Senhora dos Prazeres do Monte, uma mulher com uma túnica segurando um bebê que está em pé em seu colo. Ela observa a cena de cima. No canto inferior direito, uma criança com uma capa vermelha está atrás de uma placa ornada em dourado com um texto.
Ex-voto (Batalha dos Guararapes), pintura atribuída a João de Deus Sepúlveda, de 1758.
  1. Descreva a imagem e o evento a que ela faz referência.
  2. Explique por que, nessa imagem, Nossa Senhora e os padres estão próximo aos portugueses (que não portam bandeiras da Holanda).
  3. Por que é possível identificar essa obra como uma produção artística portuguesa, e não holandesa?

4. Em sua passagem pela região, no século dezessete, o artista holandês álbert équirráut pintou uma série de telas sobre os habitantes do Brasil. Em dupla, analise as pinturas a seguir para responder às questões.

Pintura. Vista de uma mulher indígena em pé, com uma saia branca que vai até o joelho e os pés descalços. Perto dela, no chão de terra, há um sapo. Ela carrega um bebê e uma cabaça na mão direita. O bebê usa uma fita no cabelo. Na mão esquerda a mulher segura um cesto de palha quadrado que está apoiado em sua cabeça. No cesto há alguns objetos, como uma rede e uma cuia. A mulher está olhando para o pintor. Do lado direito da imagem, há uma bananeira com frutos e, ao fundo, uma plantação, animais pastando e uma casa de fazenda.
Mulher Tupi, pintura de álbert équirráut , 1641.
Pintura. Vista de uma mulher indígena em pé, sem roupa e com algumas folhagens sobre o corpo. Ela tem cabelo curto, preto e uma franja reta sobre a testa. Ela está olhando para o pintor e carrega nas costas um cesto de fibra vegetal colocado por meio de uma tira na cabeça. Dentro do cesto há uma cuia e uma perna humana. Na mão direita, ela segura um braço humano e na mão esquerda um ramo de folhas. No chão, perto dela, há um cachorro tomando água em um pequeno curso de água. Perto dela também há uma árvore e uma planta arbustiva frutíferas.
Mulher Tapuia, pintura de álbert équirráut , 1641.
  1. Descreva como a mulher Tupi é representada na primeira imagem.
  2. Descreva como a mulher Tapuia é representada na segunda imagem.
  3. Compare a fórma como o artista representou as mulheres Tupi e Tapuia. Elabore uma justificativa para as diferenças entre essas representações.
  4. Identifique e analise dois elementos dessas obras que expressam o olhar europeu sobre a América portuguesa.
Respostas e comentários

Aprofundando

3. a) A pintura representa a Batalha dos Guararapes, evento que marcou o fim do domínio holandês no nordeste da América portuguesa. A obra está relacionada à origem da Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres do Monte dos Guararapes, construída em ação de graças pela vitória sobre os holandeses. A imagem representa muitos combatentes. Além disso, são representados cavalos do lado holandês e, no canto superior, está a imagem de Nossa Senhora, próxima aos portugueses, como se os estivessem abençoando.

b) A imagem é uma representação colonial, feita no território da América portuguesa. Assim, seria previsível que elementos relacionados à ação divina benéfica aos vencedores fossem usados. O fato de a pintura ser um ex-voto (um agradecimento a um pedido feito a um santo) reforça ainda mais a presença de elementos da religiosidade católica na obra, pois transmite a ideia de agradar a um santo ou a Deus em troca de recebimento de favores ou bênçãos divinas.

c) Os holandeses eram em sua maioria protestantes e, assim, não tinham crença na Virgem Maria. Por isso, a presença da santa católica no canto superior da imagem, abençoando a cena representada, é um indício que impossibilita relacionar essa produção artística aos holandeses.

4. Pretende-se com essa atividade de leitura inferencial focar na análise iconográfica, promovendo o exercício de operações inferenciais pelos estudantes. A ideia é levá-los a identificar nos quadros a fórma como os europeus imaginaram e representaram os povos nativos da América. Para isso, nos itens a a c, são propostas operações progressivas de análise: primeiro, a que envolve o exame e a descrição de cada quadro; depois, a que envolve a comparação das duas obras e a sugestão de possibilidades de interpretação das diferenças encontradas. No item d, por fim, propõe-se a análise mais ampla das obras, considerando o olhar europeu sobre os povos originários americanos.

a) A personagem é representada ao lado de uma bananeira com frutos. Está descalça, usa tranças no cabelo – que é longo – e veste uma saia branca de tecido rústico. Segura, em um braço (direito), uma cabaça, usada como recipiente para água. Na cabeça, apoiando com o outro braço (esquerdo), porta um cesto de palha decorado cheio de itens: uma rede, uma cuia e, aparentemente, um tipiti. Leva uma criança (que porta uma fita no cabelo) no colo. Ao fundo, é possível divisar uma plantação, animais pastando e uma casa de fazenda. Próximo aos pés da mulher, no caminho de terra batida, há um sapo.

b) A mulher Tapuia é representada ao lado de uma árvore (com frutos em fórma de vagem), em cujo tronco um pé de maracujá floresce. A mulher está nua, coberta apenas por um tufo de folhas, calçando sandálias de fibras naturais. Ela tem cabelos curtos, com a franja cortada rente à testa. Na cabeça, preso por uma tira, porta um cesto de fibra vegetal, no qual há uma cuia e uma perna humana decepada. Carrega na mão direita um braço humano, referência à antropofagia. Na mão esquerda, segura um ramo de folhas. Aos pés da mulher, um cão toma água em um veio de água que fórma uma pequena queda.

c) Retome com os estudantes as características observadas por eles. Pergunte-lhes: “Que diferenças chamaram mais a atenção de vocês?”. Eles podem mencionar as vestimentas, o plano de fundo, as espécies vegetais e animais. Depois, pergunte a eles: “Que semelhanças vocês observam entre as imagens?”. Os estudantes podem ressaltar a semelhança das cores, a presença da natureza e de animais, o fato de as duas mulheres carregarem cestos com pertences, entre outras possibilidades. Comente com eles que, enquanto a mulher Tapuia é representada sem vestimentas (critério que indica, segundo a lógica europeia, baixo grau de civilização), carregando no cesto pedaços de corpos humanos (referência à antropofagia), diante de uma paisagem em que o único sinal humano é um grupo de guerreiros indígenas dançando, a mulher Tupi é apresentada com um tipo de saia e carregando, além da criança, vários utensílios. Ela está diante de uma paisagem com diversos sinais de presença humana, com destaque para o tipo de ocupação primordial executado pelos europeus na América: uma casa de fazenda, com criação de animais e monocultura. Desse modo, na representação da mulher Tupi, parece que o pintor procurou aproximar a personagem do ideal de civilização de acordo com o olhar europeu dos séculos dezesseis e dezessete. Entre as diferenças, os estudantes podem citar a oposição no modo como os holandeses encaravam o povo Tapuia e o Tupi. Ao analisar o fundo dos dois quadros, eles podem verificar, por exemplo, que os Tupi estavam mais próximos dos holandeses que ocuparam o território (pois a mulher Tupi estava diante de uma fazenda). Podem considerar também que os holandeses estabeleceram alianças com os Tupi. Outros grupos aliaram-se aos portugueses e foram combatidos pelos holandeses com o auxílio dos Tupi. Tapuia, por exemplo, não designa uma etnia específica, mas o modo pelo qual todos os grupos indígenas que não falavam tupi eram chamados pelos holandeses.

d) Entre outras possibilidades, é possível que os estudantes observem a representação de uma natureza exuberante, com espécies vegetais tropicais e animais, e de indígenas, elementos centrais da descrição europeia sobre o continente americano. Pela lógica do olhar dos europeus, ainda que muitas vezes procurassem estabelecer alianças com as populações indígenas, os nativos da América eram selvagens e incivilizados. Explique que essa visão idílica foi amparada nos pressupostos religiosos que guiavam o olhar dos viajantes europeus que chegavam à América. Além disso, chamam a atenção na segunda pintura as referências à antropofagia, observada nos pedaços de corpo humano carregados pela indígena tapuia, costume que despertava muitas críticas por parte dos europeus.

Glossário

Companhias de comércio e navegação
: empresas formadas por capital privado e recursos do Estado. Tinham privilégios como monopólios comerciais (venda do chá, do açúcar, de especiarias etcétera) e o direito de controlar e administrar determinadas faixas dos territórios coloniais.
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Sucessório
: relativo à sucessão. Neste caso, à transmissão do trono real.
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Usurpar
: apossar-se de algo indevidamente.
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Aclamar
: escolher de fórma unânime, atribuir cargo ou reconhecer a condição especial de alguém.
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Recrudescimento
: ato ou efeito de tornar-se mais intenso, aumentar.
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Entreposto
: centro de comércio internacional, armazém.
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Empresar
: financiar, participar como empresário.
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Subalterno
: subordinado, inferior.
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Altiplano
: região plana e elevada próxima a cadeias de montanhas. Neste caso, refere-se ao altiplano andino, região da Bolívia e de parte do Peru situada na Cordilheira dos Andes.
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Oneroso
: que causa gastos, que impõe despesas.
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Batavo
: indivíduo do povo germânico que, na Antiguidade, se fixou no delta do Rio Reno, onde hoje estão os Países Baixos. Por isso, quem é dessa região também recebe o nome de batavo. 
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