CAPÍTULO 5 REBELIÕES NA AMÉRICA PORTUGUESA

Você costuma usar redes sociais? Com que frequência? Talvez uma para assistir a vídeos, uma para compartilhar filmagens e fotos, outra para enviar mensagens a seus conhecidos, outra ainda para compartilhar textos curtos etcétera.

Atualmente, existem diversas possibilidades de receber e enviar informações com facilidade e rapidez utilizando a internet. Antigamente não era assim. Isso, porém, não significa que as informações e as ideias não circulavam de fórma ampla e, muitas vezes, sem contrôle.

No final do século dezoito, por exemplo, formou-se no Rio de Janeiro um grupo de pessoas, pertencentes à classe alta e intelectual da cidade, que divulgava aos escravizados que trabalhavam nas ruas os ideais iluministas que chegavam da Europa.

Ilustração. No cetro, o globo terrestre. Ao redor dele um monitor, um tablet e um celular. Entre eles, ao redor e sobre o globo, diversos ícones interligados por linhas pontilhadas. Os ícones têm desenhos de ônibus, carrinho de supermercado, botão liga/desliga, nota musical, avião, globo, chave, gráfico circular, gráfico de colunas, relógio, lupa, cruz, pasta, envelope, ferramenta, balão de fala, calculadora, entre outros.
Ilustração atual representando a difusão global de informações por meio da internet.
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Imagens em contexto!

A informação sempre circulou nas mais diversas sociedades. O que mudou com o passar do tempo foi a velocidade de propagação e o alcance dela. A internet e as redes sociais estão cada vez mais presentes no cotidiano das pessoas. Por isso, é importante desenvolver um olhar crítico e questionador sobre elas.

Ícone. Ilustração de ponto de interrogação indicando questões de abertura de capítulo.

Responda oralmente.

  1. Em sua opinião, como a circulação de ideias iluministas em grandes cidades como o Rio de Janeiro pode ter contribuído para mudar a sociedade da época?
  2. A propagação de informações atualmente é muito mais rápida do que no século dezoito. A internet contribuiu para que quase todos tenham acesso a informações de todos os tipos. Cite um aspecto positivo e outro negativo desse fato.
  3. Você sabe o que são fake news? Como é possível identificá-las?
Respostas e comentários

Abertura

Na abertura do capítulo, a circulação de informações na América portuguesa do século dezoito é associada às redes sociais da atualidade. Pretende-se, com esse trabalho, sensibilizar os estudantes para a necessidade de ter responsabilidade na disseminação de informações, além de incentivá-los a buscar modos de identificar fake news.

Atividades

1. De acordo com o texto da abertura do capítulo, grupos intelectualizados do século dezoito se reuniram para propagar entre os escravizados, no Rio de Janeiro, o ideário iluminista. Como as ideias iluministas eram a favor da liberdade individual, é possível que essa rede de divulgação de informações tenha contribuído para alavancar o movimento abolicionista.

2. Como aspectos positivos, os estudantes podem citar, por exemplo, a rápida divulgação de informações e o acesso amplo à informação, sem o filtro de órgãos oficiais ou de grandes conglomerados da mídia. Os aspectos negativos estão ligados aos positivos: a velocidade e o volume de informações podem dificultar a avaliação do que é, de fato, relevante e, por não haver processos de verificação de grande parte do conteúdo que é disponibilizado na internet e em redes sociais, muitas vezes é difícil confirmar a veracidade das informações, o que contribui para a disseminação de fake news.

3. Fake news são notícias falsas, boatos ou desinformações produzidos para difusão em massa. Incentive os estudantes a desenvolver um olhar crítico sobre as informações que recebem e a reconhecer que têm responsabilidade sobre o que publicam. A identificação de fake newsrequer pesquisa e verificação das fontes. Assim, é preciso investigar: a data e a origem primária da notícia; a autenticidade de sáites e de perfis nas redes sociais que a disseminam; a existência e a confiabilidade das fontes citadas nela. Encoraje os estudantes a pensar em outros métodos de verificação e a debatê-los.

Bê êne cê cê

A abertura do capítulo, ao propor que os estudantes pensem sobre as fake news, contribui para o desenvolvimento das Competências Gerais da Educação Básica nº 1, nº 5 e nº 10, das Competências Específicas de Ciências Humanas nº 2 e nº 6, e da Competência Específica de História nº 7.

As ideias iluministas em Portugal e na América portuguesa

O final do século dezoito foi marcado pela crise do Antigo Regime e do modo de vida relacionado a ele. A Revolução Francesa e a independência das Treze Colônias, que deram origem aos Estados Unidos, ajudaram a espalhar pelo mundo os ideais iluministas sobre a igualdade entre os indivíduos, a autonomia e a liberdade, desestabilizando as monarquias e servindo de inspiração para outros movimentos revolucionários.

Para diminuir as críticas e modernizar a economia, alguns monarcas, chamados déspotas esclarecidos, realizaram em seus reinos reformas combinando alguns ideais iluministas ao poder absolutista. Em Portugal, o rei dom José primeiro concedeu a execução dessas reformas ao marquês de Pombal.

Ao assumir o cargo equivalente ao de primeiro-ministro, Pombal teve de lidar com a grave crise econômica gerada pelo esgotamento da extração do ouro em Minas Gerais. Para resolver o problema, uma de suas estratégias foi o incentivo ao desenvolvimento das manufaturas e do comércio na América portuguesa a fim de transformar Portugal em uma moderna metrópole capitalista, como a Grã-Bretanha. Para isso, fundou na colônia a Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e do Maranhão, em 1755, e a Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e da Paraíba, em 1759.

Essas companhias incentivavam o desenvolvimento do comércio por meio de facilidades para os comerciantes, como financiamentos e boas condições de pagamento. Além disso, eram responsáveis pelo transporte de escravizados, respectivamente, até as capitanias do Grão-Pará e do Maranhão e de Pernambuco e da Paraíba, bem como pela organização da compra e da venda de produtos nesses locais, atividades sobre as quais tinham monopólio.

Para viabilizar as atividades relacionadas às compras e às vendas, foram inaugurados caminhos e rotas de comércio que interligavam localidades da região norte da colônia portuguesa.

Pintura. Em primeiro plano, à esquerda da pintura, um homem sentado sobre cadeira estofada em vermelho. Ele tem cabelos grisalhos até os ombros, com blusa de gola em branco, com casaca de mangas compridas, calça e sapatos em preto, com meias compridas em branco. O braço direito está sobre uma mesa de cor marrom com folhas em bege e canetas de pena, e o braço esquerdo voltado para trás, indica o fundo do local onde ele está, onde há uma grande pintura. Nela, há água em cinza e dezenas de embarcações de tamanho médio e outras pequenas, com mastros e velas ao fundo, além de construções em bege claro. No alto, céu em azul-claro, nuvens em cinza e outras mais escuras. Atrás dele, à esquerda, esculturas em cinza, estátua pequena em dourado, com tecido em vermelho, pendendo do teto. À direita, banqueta estofada em vermelho sobre a qual há várias folhas grandes com desenhos e algumas no chão.
Retrato de Sebastião José de Carvalho e Melo, primeiro marquês de Pombal, pintura de Luí Michél Van Lú e clôde jozêf vernê, 1766.
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Neste retrato do marquês de Pombal há referências a alguns dos principais desafios que Portugal enfrentava na segunda metade do século dezoito, como o contrôle do império ultramarino, representado pela esquadra portuguesa, e a reconstrução de Lisboa, que havia sido destruída por um forte terremoto em 1º de novembro de 1755. Os projetos representados à direitado marquês demonstram que ele liderou com êxito a reconstrução da cidade. Em razão desse feito, Pombal foi nomeado pelo rei para o cargo de secretário do Estado dos Negócios Interiores do reino de Portugal.

Respostas e comentários

Objetivos do capítulo

Caracterizar as medidas reformistas executadas pelo marquês de Pombal na segunda metade do século dezoito.

Reconhecer a influência das ideias iluministas na formação dos movimentos coloniais de contestação ao domínio da metrópole portuguesa.

Identificar a sociabilidade e o fluxo de ideias que caracterizaram as conjurações Mineira, Baiana e do Rio de Janeiro.

Caracterizar as conjurações Mineira, Baiana e Carioca considerando os espaços de sociabilidade, as redes e fórmas de comunicação, o fluxo de ideias e a heterogeneidade dos sujeitos históricos envolvidos, incluindo mulheres e homens negros (livres e escravizados).

Justificativa

Os objetivos pensados para esse capítulo sensibilizam os estudantes para a importância dos espaços de sociabilização como lugares onde circulam ideias, destacando a relevância dos fluxos de pensamento e da comunicação para as transformações sociais. Ao caracterizar as conjurações abordadas, destacando aspectos como a centralidade das ideias iluministas e a multiplicidade de sujeitos envolvidos, incentivam-se processos como os de identificação e de contextualização, os quais permitem aos estudantes o desenvolvimento do pensamento crítico relacionado à capacidade de compreender e caracterizar práticas e discursos que contextualizam um determinado movimento social.

Entre os produtos extraídos na região da capitania do Grão-Pará e do Maranhão destacavam-se as drogas do sertão, que compreendiam o cacau, o cravo, a salsaparrilha, a canela e o anis. A caça, a pesca, a agricultura e a criação de animais também eram atividades desenvolvidas, mas em escala menor.

A Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e do Maranhão forneceu condições para o desenvolvimento da produção agrícola na Amazônia, incentivando a exportação de algodão no Grão-Pará e de arroz no Maranhão. A produção foi tão influenciada pelo mercado externo que, no Maranhão, o comércio de arroz vermelho, abundante na região, foi substituído pelo do tipo carolina, mais aceito no mercado internacional.

O aumento do contrôle de Portugal

Para recuperar a economia e implementar as reformas planejadas, Pombal aumentou o contrôle sobre a colônia americana. Desse modo, na tentativa de centralizar as iniciativas da Coroa no sul da colônia, em 1763, Pombal transferiu a capital da América portuguesa de Salvador da Bahia para São Sebastião do Rio de Janeiro.

Pombal acreditava que os jesuítas haviam acumulado muitas riquezas e poder, podendo, por isso, ameaçar o domínio colonial de Portugal. Para ele, a tutela que os religiosos exerciam sobre os indígenas dificultava a utilização dessa mão de obra, atrasando o desenvolvimento das colônias. Então, em 1759, decretou a expulsão dos integrantes da Companhia de Jesus de todos os domínios portugueses.

Após a expulsão dos jesuítas, a Coroa portuguesa promoveu a ideia de integração dos indígenas à sociedade colonial por meio da homogeneização cultural. Para isso, entre outras estratégias, enfatizava a necessidade de casamentos entre indígenas e descendentes de europeus. Também foi imposta aos indígenas a utilização da língua portuguesa. Até início do século dezenove, porém, esse projeto não foi bem-sucedido. Os indígenas não se dispuseram a abandonar os próprios costumes, principalmente a língua.

Com a morte do rei dom João primeiro em 1777, o marquês de Pombal foi afastado de seu cargo. A política colonial portuguesa foi assumida por Martinho de Melo e Castro, que abandonou o sistema pombalino e fortaleceu as antigas práticas mercantilistas. Em 1785, proibiu as fábricas e as manufaturas na América portuguesa, causando descontentamento em diversos grupos que tinham interesses comerciais na colônia.

Fotografia. Cinco rapazes indígenas de bermuda e com pinturas faciais e colares, estão agachados e com as mãos sobre a nuca. Um deles salta, enquanto um outro, à direita, movimenta uma haste, próxima ao chão. Eles estão sorrindo.
Indígenas Guarani praticando a dança chondáro durante festival em Bertioga (São Paulo). Foto de 2018.
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Apesar das tentativas de aculturação por parte da metrópole portuguesa e, depois, do Estado brasileiro, as tradições indígenas são mantidas e transmitidas por meio de práticas como o chondáro.

Grafia dos nomes dos povos indígenas brasileiros

Nesta coleção, os nomes dos povos indígenas que vivem no Brasil foram grafados de acordo com a Convenção para a Grafia dos Nomes Tribais, aprovada em 1953 na Primeira Reunião Brasileira de Antropologia:

  • sem flexão de número ou gênero;
  • com inicial maiúscula quando usados como substantivo, sendo opcional quando usados como adjetivo.
Respostas e comentários

Bê êne cê cê

Ao tratar da transferência da capital da colônia, da imposição da língua portuguesa e da continuidade das políticas de assimilação dos povos indígenas – eventos relacionados às estruturas sociais, políticas e econômicas do Brasil –, o conteúdo favorece o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero oito agá ih um quatro e da Competência Específica de História nº 2.

O capítulo é iniciado com a apresentação das reformas dirigidas pelo marquês de Pombal, então ministro do rei dom José primeiro, a partir da segunda metade do século dezoito. Pombal pretendia, com muitas dessas medidas, tornar a administração colonial mais centralizada e eficaz. Espera-se, com essa apresentação, que os estudantes identifiquem, analisem e discutam algumas matrizes do iluminismo, debatendo sua relação com o desenvolvimento da colônia e avaliando criticamente seu conteúdo histórico no espaço colonial.

Curadoria

O projeto pombalino de imposição da língua portuguesa aos índios e a sua aplicação na América meridional (Artigo)

Elisa Garcia. Tempo, Niterói, volume 12, número 23,página 23-38, 2007.

Nesse artigo, Elisa Garcia aborda a política linguística do Diretório e as tentativas pombalinas de padronização da língua portuguesa e de proibição do guarani, que, com o objetivo de integrar os indígenas à sociedade colonial, visavam à eliminação das diferenças entre indígenas e não indígenas, ou seja, à extinção das culturas dos povos originários.

Os ideais iluministas na colônia

Após a saída de Pombal, as tensões entre a metrópole e a colônia aumentaram ainda mais em razão da disseminação das ideias iluministas, que chegavam à América portuguesa.

Essas ideias, combinadas com a insatisfação diante das políticas econômicas restritivas que Portugal passou a adotar e com a piora da crise do ouro na colônia, geraram frequentes manifestações de descontentamento.

Anteriormente, os saques, os motins e as revoltas na colônia ocorriam para contestar questões pontuais, como o aumento dos impostos, a falta de abastecimento ou a organização política local. A partir de então, as manifestações se ampliaram e a elite local passou a contestar o plano geral de administração portuguesa na colônia.

Inspirados pelos ideais iluministas, os colonos exigiam novas fórmas de ordenar a vida, a sociabilidade, a política e a economia. A crise do Antigo Regime chegava à América portuguesa.

Ideias de sediçãoglossário ou separação começavam a ser disseminadas. Alguns movimentos pela independência eram influenciados por um discurso patriótico, que vinculava os indivíduos à terra onde nasceram, ao passo que rejeitava ou questionava os laços com a metrópole.

Movimentos emancipacionistas

Hoje, os termos pátria e nação são usados basicamente como sinônimos, mas tinham significados bem diferentes no século dezoito. Pátria era o local de nascimento, o que, no mundo colonial, podia ser muito distante da metrópole. Nação era a gente (expressão da época) à qual se pertencia por afinidade de sangue.

No período colonial, muitos dos que viviam na América portuguesa não se consideravam pertencentes a uma unidade, reconhecendo-se como portugueses do Brasil. Eles desenvolviam sentimentos patrióticos, ou seja, de valorização de seu local de nascimento, de sua pátria, mas não negavam seu pertencimento à nação portuguesa.

Assim, os interesses dos participantes dos movimentos pela emancipação política variavam de acordo com o local onde se encontravam. Muitas reivindicações eram locais, mas ameaçavam o sistema colonial por defender princípios como o da liberdade individual e o do republicanismo. Por isso, esses movimentos foram denominados emancipacionistasglossário , e os principais foram a Conjuraçãoglossário Mineira, a Baiana e a do Rio de Janeiro.

Fotografia. Duas mulheres e dois homens, todos atletas paralímpicos. Eles usam máscara de proteção no nariz e na boca, vestem calças em azul escuro e blusa verde e amarela - o uniforme do Brasil - e seguram um buquê e uma medalha.
Equipe brasileira de revezamento da natação no pódio nos Jogos Paralímpicos de Tóquio, no Japão. Foto de 2021.
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A imagem retrata a conquista esportiva de brasileiros. Se atualmente a diferença entre ser ou não brasileiro é mais definida e perceptível, isso não ocorria no período colonial, quando a maioria daqueles que nasceram no território correspondente ao do Brasil atual se via como portugueses na América.

Respostas e comentários

A disseminação do iluminismo foi um fato relativo ao que alguns autores chamam de revoluções atlânticas dos séculos dezoito e dezenove. Comente com os estudantes que o movimento entre os espaços coloniais e metropolitanos era constituído pelo fluxo de mercadorias, pessoas e ideias.

No século dezoito, boa parte da população era nascida na colônia. Assim, aos poucos, um discurso mais alinhado a um sentimento patriótico começava a se formar em razão do questionamento dos vínculos com a metrópole.

Ampliando

No texto a seguir, o historiador ístivãn iânquisso trata da crise dos modos de vida do Antigo Regime.

“O esgotamento de padrões tradicionais que se revela nos enunciados e buscas de alternativas (poderosos sintomas de crise) perpassa o todo da vida social. Está presente no interesse por novas fórmas de organização do Estado, em especial aquelas resultantes das Revoluções Americana e Francesa, mas revela-se, também, na emergência de uma nova cultura política, assim como no aflorar de novas fórmas de sociabilidade. Comportamentos tidos por desviantes da boa ordem, antes motivos de escândalo e passíveis de rigorosa sanção, começam a ocorrer e, conquanto causando constrangimento, são, ainda que de modo reticente, tidos por assimiláveis. O anônimo autor de uma Relação da francezía formada pelos homens pardos da cidade da Bahia atribui ao governador a responsabilidade pelas dimensões da contestação que agitou a séde da capitania. Segundo ele, agravos à boa ordem afloravam cotidianamente, traduzindo-se em atentados aos nichos onde o povo se reunia, à noite, para rezar o terço, em exaltados excessos verbais contra a religião e os sacramentos da Igreja

iânquisso, I. A sedução da liberdade: cotidiano e contestação política no final do século dezoito. ín: NOVAIS, F. A.; SOUZA, L. de M. e S. (organizador). História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. página 392.

A Conjuração Mineira

A partir de 1760, ocorreu uma queda acentuada na quantidade de metais extraídos em Minas Gerais, gerando uma crise que abalou substancialmente a economia da metrópole e da colônia.

Com o declínio da mineração, as atividades agrícolas e pastoris, que haviam se desenvolvido para atender aos mineradores, ganharam mais importância. Houve ainda o empobrecimento de várias cidades, como Vila Rica; no entanto, a economia regional, apoiada em amplas propriedades rurais, sobreviveu e se transformou.

Quase metade da população da região mineira era composta de escravizados, enquanto o restante era de alforriados e livres. Os brancos correspondiam a apenas 18% da população, mas formavam uma elite que concentrava o poder político e econômico.

Durante as reformas pombalinas, diversos magnatas e comerciantes locais foram envolvidos na administração governamental, assumindo cargos como o de fiscalizadores da exploração de diamantes e sendo nomeados para as intendências coloniais do ouro. Nesses postos, nos quais não houve vigilância da Coroa portuguesa, eles permitiam que os pagamentos de impostos e contratos se atrasassem por anos, o que, aliado à crise do ouro, causou uma enorme dívida na Junta da Fazenda de Minas.

Em 1788, o governo de Minas foi assumido pelo Visconde de Barbacena, que chegou com a missão de promover uma reforma no sistema tributárioglossário de Minas Gerais. Ele anulou todos os contratos e declarou que os mineiros deviam fazer a derrama, ou seja, complementar e pagar os tributos devidos à Coroa. O valor desses tributos correspondia a 3,5 bilhões de réis nesse ano.

Com isso, aumentaram os conflitos dos mineiros com a metrópole, potencializados pelo fluxo de ideias iluministas e revolucionárias vindas da Europa, que formou um novo tipo de cultura política nas Minas Gerais. Começaram então a circular manuscritos que continham críticas aos antigos comportamentos sociais e expressavam o descontentamento com a falta de participação política dos colonos.

Fotografia. Dois edifícios conjugados que formam um largo à frente. São prédios amarelados e em branco, de dois ou três andares, com janelas, alpendre no primeiro andar e balcões no segundo, e telhado em marrom-avermelhado. À esquerda, uma torre com janelas e um relógio no topo. No centro, pórtico encimado por estrutura triangular. Na frente dele, uma escadaria. Algumas pessoas estão diante do prédio e, outras, fazem fila diante da entrada da torre.
Universidade de Coimbra, em Portugal. Foto de 2019.
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Jovens da elite colonial estudavam fóra da América portuguesa, em universidades como a de Coimbra. Em 1786, havia 27 brasileiros matriculados nessa universidade, doze dos quais eram mineiros. Lá, eles entraram em contato com as ideias iluministas e as notícias sobre a independência dos Estados Unidos. Ao voltar de viagens pela Europa, eles traziam livros proibidos no Brasil, fazendo as ideias revolucionárias circularem por aqui.

Respostas e comentários

Dados numéricos sobre a população de Minas Gerais no século dezoito e os tributos devidos pelos mineiros à Coroa portuguesa em 1788 foram retirados de: máquissuél, K. Conjuração mineira: novos aspectos. Estudos Avançados, São Paulo, volume 3, número 6, página 4-24, 1989. 

Tema Contemporâneo Transversal

Ao abordar a derrama e relacioná-la ao sistema tributário nas Minas, abre-se uma oportunidade para explorar o Tema Contemporâneo Transversal Educação fiscal, traçando aproximações entre esse sistema e os diversos tipos de tributação adotados no Brasil atualmente.

Ampliando

É necessário entender que o conceito de derrama é cercado de imprecisões, como assinala o historiador Luciano Figueiredo no texto a seguir.

reticências A primeira delas refere-se ao seu significado técnico pois, antes de tudo, ela está longe de ser mais um imposto. A obra Tributos, obrigações e penalidades pecuniárias de Portugal antigo bem situa as imprecisões: ‘Embora vulgarmente seja, às vezes, considerada como imposto, na realidade é mais uma fórma de lançamento e de arrecadação de tributos, onde o fisco fixa um total certo para uma determinada circunscrição, o qual deve ser repartido pelos contribuintes’.

A derrama, porém, foi algo mais que a fixação de um total certo para determinada circunscrição, expediente que alude à finta, com a qual aparece aqui confundida. Tratava-se, isto sim, da operação de cobrança dessa cota fixada. Assim, se o total fosse alcançado, dispensar-se-ia a derrama.”

FIGUEIREDO, L. R. de A. Derrama e política fiscal ilustrada. Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, volume 41,página. 32-33, julho a dezembro2005.

O deslocamento dos luso-brasileiros era intenso. Logo após a reforma da Universidade de Coimbra e a criação de várias academias de ciências, muitos jovens (homens) da elite se mudaram para Portugal a fim de ingressar nos estudos superiores. Depois, com a chegada da família real ao Rio de Janeiro, em 1808, essa elite ilustrada ocupou vários cargos políticos.

A fim de situar os fatos em uma conjuntura mais ampla, apresenta-se um panorama dos acontecimentos políticos que reverberavam na América. As insatisfações de parte da elite política colonial no final do século dezoito somadas às ideias iluministas que despontavam com fôrça contribuíram para as chamadas rebeliões emancipacionistas.

Os espaços de sociabilidade e o desenvolvimento da conjuração

Duas características que diferenciaram a sociedade mineradora dos outros núcleos populacionais da colônia foram a ampla teia de cidades e as particularidades que lá se desenvolveram. Poucas regiões eram tão urbanizadas quanto a de Minas Gerais, pois na maioria das capitanias predominavam as grandes fazendas e os engenhos de açúcar baseados na monocultura extensiva.

Mesmo em regiões mais urbanizadas, como Salvador e Rio de Janeiro, as fórmas de sociabilidadeglossário eram diferentes daquelas das minas. Apesar de também ser uma sociedade escravista, a mineira apresentava melhor distribuição de riquezas.

Nas cidades das Minas Gerais, as casas se tornaram os principais lugares de convivência das pessoas livres. Era comum os comerciantes e outros negociantes morarem nos mesmos edifícios em que trabalhavam, o que facilitava os encontros nesses locais.

O jogo de cartas era uma das principais atividades recreativas. Grupos de advogados, escritores e intelectuais se reuniam frequentemente na capitania para jogar e discutir filosofia, poesia e as notícias que chegavam de outras regiões da colônia, da Europa e de outros locais da América.

Apesar de saberem que debater tais temas era perigoso, os colonos contavam com a privacidade oferecida pelas casas. Como o espaço doméstico naquela época era administrado exclusivamente pelas mulheres, muitas delas se envolveram na conjuração.

Uma dessas mulheres foi Hipólita Jacinta Teixeira de Mello, casada com o fazendeiro Francisco de Oliveira Lopes. Ela tinha aproximadamente 40 anos quando se envolveu com a conspiração, e sua casa era um ponto de encontro seguro e estratégico para as reuniões dos conspiradores.

Gravura em preto e branco. Vista de uma casa e da rua diante dela. Há diversas pessoas reunidas na rua. À esquerda, um homem descalço e usando um chapéu toca violão. Perto dele, um homem descalço e de gravata está com duas crianças fantasiadas. No centro, um homem montado a cavalo, usando um grande chapéu e uma túnica larga. Em pé, à frente do cavalo, um homem de cartola e capa. À direita um grupo de mulheres. Elas usam vestido, chapéu e adornos florais. Ao fundo, pessoas na janela. Na parte inferior, o título da gravura.
Festa da rainha, in Minas, gravura de frâns quissáver nachtmân, século dezenove.
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É importante compreender que privacidade não era algo comum naquela época. Só as pessoas com muitos recursos tinham esse privilégio. Os espaços de convivência das camadas mais pobres eram as ruas, como representado na gravura. Já para as reuniões secretas, as pessoas procuravam os locais mais afastados.

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Ampliando

Na sociedade colonial, o espaço público era reservado às figuras masculinas, enquanto o espaço privado era considerado domínio das mulheres. Nesse contexto, compreendia-se o casamento como o principal meio de fornecer às mulheres brancas proteção social e financeira. As mulheres escravizadas, no entanto, permaneciam às margens dos acordos nupciais.

reticências formavam famílias e laços de compadrio no ambiente adverso da escravidão. Forçadas à reprodução, à lactação, à prostituição, as negras escravas também eram submetidas à labuta do roçado, ao trabalho da construção civil, às lides do serviço doméstico ou à refrega do comércio ambulante, conforme determinado pelos proprietários. Mas as duras limitações impostas pela longa travessia do Atlântico e pelo cotidiano entre a casa-grande e a senzala engendraram mecanismos de adaptação e resistência. reticências

O ganho foi, efetivamente, uma das principais portas para a emancipação de mulheres escravizadas e tornou-se um meio de vida para as libertas quando o cativeiro se tornou passado em suas vidas. Em Minas Gerais, no século dezoito, a extração de metais impulsionou o crescimento populacional e a urbanização da região, fomentando a oferta de serviços que dessem apoio às atividades mineradoras. reticências Como essas atividades não eram executadas pelas mulheres brancas, tampouco por homens, a médio prazo o negócio dos tabuleiros facultou-lhes a compra da liberdade e, em alguns casos, até mesmo o enriquecimento. Livres e autônomas, as mais prósperas tornaram-se proprietárias de sobrados e de escravos, desafiando as regras socialmente previstas para as mulheres. À frente de seus núcleos familiares, concederam ou propiciaram, após a morte, alforrias aos próprios escravos. A trajetória singular dessas ‘sinhás pretas’ foi, no entanto, um produto das cidades mineiras enriquecidas em decorrência da mineração. Na sociedade escravista colonial, a figura feminina era, na esmagadora maioria dos casos, submetida à ordem patriarcal. Mas como se pode apreender de algumas peças do precioso acervo documental do Arquivo Nacional, reagiram aos mandos e abusos do poder masculino, direta ou indiretamente.”

SANTOS, G. Papéis passados: a história das mulheres a partir da documentação arquivística. O Arquivo Nacional e a História Luso-Brasileira, 7 maio 2020. Disponível em: https://oeds.link/JHfkWM. Acesso em: 3 maio 2022.

Os revoltosos

Faziam parte dos grupos de revoltosos mineradores, profissionais liberais, soldados, religiosos, burocratas e fazendeiros. Os soldados organizaram a luta armada; os intelectuais e os religiosos cuidaram da formulação de teorias e de questões jurídicas; os integrantes mais ricos contribuíram na parte financeira.

Também fazia parte do grupo o alferesglossário Joaquim José da Silva Xavier, que serviu o exército durante 14 anos sem receber promoção ou reconhecimento, razão pela qual dizia ter aderido à revolta. Depois, trabalhou como minerador, explorador do sertão e dentista; por isso era conhecido como Tiradentes.

Tiradentes contribuiu para disseminar as ideias de revolução, pois frequentava os altos e os baixos círculos sociais da colônia. Visitava estalagens, fazendas, ranchos e até tavernas. Como na sociedade colonial a maioria das pessoas não era alfabetizada, a oralidade tinha muita importância para a troca de ideias, conversas, acordos e conjurações.

A revolta que não ocorreu

O grupo de Vila Rica não era o único envolvido no movimento. No dia 10 de dezembro de 1788, representantes de diversos grupos revoltosos da capitania de Minas Gerais se reuniram para planejar um levante armado contra Portugal.

A revolta seria iniciada logo que ocorresse a derrama, pois os conjurados esperavam a reação da população à cobrança forçada para criar uma confusão. Nesse momento, assassinariam o governador e, logo em seguida, proclamariam a república independente. Para isso, teriam o apoio do regimento da cavalaria de Minas, cujo comandante encontrava-se entre os conspiradores.

Nas reuniões para planejar o que aconteceria após a revolta, os revoltosos decidiram que: a capital da república seria São João dél-Rei; seriam implantadas manufaturas e fábricas; a exploração do minério de ferro seria incentivada; haveria eleições anuais.

Uma das propostas mais radicais para a época foi a criação de uma universidade em Vila Rica. Sobre o fim da escravidão, não houve consenso. Apesar de serem inspirados por ideais iluministas, como o da igualdade entre todos os seres humanos, os conspiradores eram, na maioria, senhores de escravizados, de modo que essa medida contrariava seus interesses.

Bandeira. Triângulo verde contido em um retângulo branco. Em torno dos lados do triângulo, inscrição em latim.
Bandeira da Conjuração Mineira. A frase em latim significa “Liberdade, ainda que tardia”.
Fotografia. Casa em estilo colonial, em uma esquina. Tem dois pavimentos, paredes em branco, janelas com molduras em azul. A casa tem três portas em arco, de madeira. No andar de cima várias janelas. A rua é de paralelepípedo.
Casa de Cláudio Manuel da Costa, em Ouro Preto (Minas Gerais). Foto de 2022.
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Imagens em contexto!

Entre os revoltosos de Vila Rica, destacaram-se na articulação ideológica da conjuração o advogado Cláudio Manuel da Costa, duas vezes secretário do governo de Minas, o poeta e ouvidor Tomás Antônio Gonzaga e o padre Luís Vieira da Silva. Os três possuíam bibliotecas com livros sobre liberalismo, a independência dos Estados Unidos e até mesmo a Declaração dos Direitos dos Cidadãos dos Estados Unidos, escrita por Thomas Jefferson. As ideias revolucionárias contidas nesses livros circularam no grupo que se reunia frequentemente na casa de Cláudio Manuel da Costa.

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Interdisciplinaridade

Ao abordar a participação de Tomás Antônio Gonzaga na Conjuração Mineira, é possível desenvolver um trabalho interdisciplinar com língua portuguesa, utilizando para isso a obra Cartas chilenas. As cartas que compõem o livro são escritas em formato de poemas satíricos e narram o despotismo do suposto governador chileno Fanfarrão Minésio, personagem que representa Luís da Cunha Meneses, então governador de Minas Gerais. Espera-se que, analisando a composição linguística dos versos e observando as críticas e as denúncias contidas na obra, os estudantes compreendam a importância histórica da arte para a sociedade. Assim, eles poderão desenvolver a habilidade do componente curricular língua portuguesa ê éfe seis nove éle pê quatro quatro – “Inferir a presença de valores sociais, culturais e humanos e de diferentes visões de mundo, em textos literários, reconhecendo nesses textos formas de estabelecer múltiplos olhares sobre as identidades, sociedades e culturas e considerando a autoria e o contexto social e histórico de sua produção”.

Tomás Antônio Gonzaga nasceu na cidade do Porto, em Portugal, em 1744. Em 1751 mudou-se com o pai para Pernambuco e depois para a Bahia. Em 1761 retornou a Portugal para estudar direito. Foi um dos mais importantes representantes do Arcadismo brasileiro, um movimento literário que rompeu com o Barroco por meio de uma linguagem mais simples e de temas voltados ao campo. Entre suas obras mais conhecidas, estão Marília de Dirceu e Cartas chilenas, publicadas, respectivamente, em 1792 e 1845 (as cartas circularam em 1789, sendo publicadas postumamente por Santiago Nunes Ribeiro). Por ter participado da Conjuração Mineira, Gonzaga foi preso e condenado ao exílio em Moçambique, em 1792.

A imagem da casa de Cláudio Manuel da Costa pode ser explorada como evidência do patrimônio na construção da memória nacional. O caso de Ouro Preto como um todo é paradigmático. Toda a cidade foi convertida em monumento nacional em 1933, sendo seu tecido urbano, com as edificações civis e religiosas dos séculos dezoito e dezenove, tombado em 1938. A elevação de Ouro Preto à condição de cidade patrimônio marcou a criação das políticas patrimoniais no Brasil.

A descoberta da revolta

A revolta foi descoberta antes de acontecer, por ter sido denunciada provavelmente pelo contratante Joaquim Silvério dos Reis, que era um dos conspiradores. Suas muitas dívidas foram perdoadas pela Coroa depois que o movimento foi descoberto.

Tiradentes, que havia sido incumbido de assassinar o governador, foi preso no Rio de Janeiro em 10 de maio de 1789. A notícia de sua prisão foi recebida primeiramente por Hipólita Jacinta Teixeira de Mello, que enviou um bilhete informando a situação aos outros conspiradores. Nesse bilhete, ficou documentada sua participação ativa na conjuração.

Com o plano em perigo, Hipólita, que conhecia a estratégia militar da revolta, deu instruções para que a rebelião fosse deflagrada em vários lugares da capitania sob os gritos de “viva o povo”. A estratégia, entretanto, não deu certo, e a conjuração não foi posta em prática.

Tropas da Coroa portuguesa foram deslocadas à região das minas para prender os conspiradores. O julgamento deles, que durou três anos, foi realizado por meio da devassa, um tipo de processo judicial semelhante às inquisições, em que os acusados não tinham direito de defesa.

Em 1792, ao final do julgamento, onze conspiradores foram condenados à morte, mas dez deles tiveram a pena trocada pelo exílio. Apenas um foi executado: Tiradentes. Ele foi enforcado e esquartejado em 21 de abril daquele ano, e partes de seu corpo foram exibidas em diversos locais públicos para amedrontar outros possíveis revoltosos.

Hipólita, por sua vez, teve todos os bens confiscados. Como seu marido havia partido para o exílio perpétuo em Angola, ela ficou sem nada. Esse castigo foi considerado exemplar para uma mulher que se atreveu a participar da esfera política no século dezoito. De qualquer modo, ela não se conformou com a situação e, por volta de 1804, conseguiu reaver a maioria de seus bens.

Fotografia. Sobre uma plataforma em meio a um gramado, escultura em cinza escuro de um homem de chapéu, casaca, camisa e colete, calças e par de botas. Ao fundo, um muro branco e uma construção de estilo colonial com duas janelas e uma porta de madeira, em azul, e telhado escuro.
Escultura em homenagem a Tiradentes no circuito turístico Trilha dos Inconfidentes, em Tiradentes (Minas Gerais). Foto de 2018.
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Após a proclamação da república, em 1889, Tiradentes passou a ser considerado herói e mártir da Conjuração Mineira pelos integrantes do governo republicano, que utilizou diferentes simbolismos para resgatar e mitificar sua figura.

Agora é com você!

Responda no caderno.

  1. O que foram as reformas pombalinas? Liste três delas.
  2. O que eram os movimentos emancipacionistas na América portuguesa?
  3. Resuma o papel de Hipólita Jacinta Teixeira de Mello na Conjuração Mineira.
Respostas e comentários

Bê êne cê cê

Ao tratar do desfecho da Conjuração Mineira, o conteúdo favorece o desenvolvimento da habilidade ê éfe zero oito agá ih zero cinco.

Orientação para as atividades

Para realizar as atividades 1, 2 e 3, serão necessários, respectivamente, os seguintes procedimentos: enumeração de elementos e explicação de um processo; explicação do princípio dos movimentos políticos anticoloniais; descrição do papel de um personagem histórico em um processo. Avalie a qualidade dos textos resultantes e aproveite a atividade 3 para tratar do papel das mulheres na história.

Agora é com você!

1. As reformas pombalinas foram medidas administrativas implantadas pelo marquês de Pombal para modernizar a economia portuguesa, conter as revoluções liberais e diminuir as críticas aos monarcas. Entre essas medidas, estavam: o incentivo às manufaturas e ao comércio na América portuguesa; a transferência da capital de Salvador para o Rio de Janeiro; a expulsão dos jesuítas de todos os domínios portugueses em 1759; a tentativa de homogeneização cultural dos indígenas a fim de assimilá-los à sociedade colonial.

2. Eram movimentos cujos participantes reivindicavam a emancipação política em relação a Portugal. Eles ameaçavam o sistema colonial por defender princípios como a liberdade individual e o republicanismo.

3. Assim como outras mulheres, Hipólita forneceu uma rede de apoio para os conjuradores. Após a prisão de Tiradentes, ela deu instruções para que a tropa de Serro fosse levada para o lado dos conspiradores e para que a rebelião fosse deflagrada em vários lugares da capitania.

Curadoria

Os inconfidentes (Filme)

Direção: Joaquim Pedro de Andrade. Brasil, 1972. Duração: 100 minutos.

Gravado na cidade de Ouro Preto (Minas Gerais) e tendo como base os Autos da Devassa, o Romanceiro da Inconfidência, da poetisa Cecília Meireles, e poemas de Tomás Antônio Gonzaga, Alvarenga Peixoto e Cláudio Manuel da Costa, o filme representa a Conjuração Mineira, com foco, sobretudo, no período em que os inconfidentes estiveram encarcerados durante seu julgamento.

A Conjuração Baiana

Assim como a capitania de Minas Gerais, no fim do século dezoito, a Bahia enfrentava os impactos da crise do açúcar e era contagiada pelas ideias iluministas. Essa crise causou muitos prejuízos à economia da região, mas seus efeitos foram amenizados pela intensa atividade comercial e pelo aumento da produção agrícola a partir de 1770.

Contudo, essa recuperação econômica favoreceu apenas a camada mais rica da população, composta de latifundiários, senhores de engenho e grandes comerciantes. Naquela época, havia em Salvador, aproximadamente, 40 mil habitantes. Nos subúrbios da cidade, viviam 26 mil pessoas. A maior parte dessa população era formada por brancos e pardos pobres, negros alforriados e escravizados. Negros e pardos compunham 78% da sociedade baiana.

A maioria das pessoas que viviam em Salvador sofria com a falta de alimentos, o alto custo de vida e o preconceito racial, uma combinação que causava agitações constantes.

Os manuscritos e a circulação de ideias

Assim como na região das Minas Gerais, em Salvador as ideias circulavam rapidamente em razão da grande população urbana. Os princípios iluministas eram divulgados por grupos que debatiam temas como a Revolução Francesa e a independência dos Estados Unidos, por livros que circulavam e pelas leituras coletivas em voz alta, comuns no Brasil colonial.

Havia, porém, uma prática que diferençava os grupos baianos daqueles da sociedade mineira: a ampla circulação dos livros manuscritos. Trechos de livros eram traduzidos – geralmente do francês – e ditados para várias pessoas ao mesmo tempo. Essas pessoas transcreviam o conteúdo em cadernos avulsos e se encarregavam de produzir o livro e distribuir cópias dele.

Fotografia. Vista de uma ladeira de paralelepípedo, que se estende até o fundo da fotografia horizontal. A ladeira é ladeada por construções coloridas de dois ou três pavimentos, em estilo colonial, com portas em forma de arco e janelas com molduras. À direita, destacam-se duas torres em azul, com sino, que fazem parte de uma igreja.
Rua do bairro Pelourinho, no centro histórico de Salvador (Bahia). Foto de 2020.
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A cidade de Salvador foi capital da América portuguesa até 1763, quando perdeu esse posto e sua importância política, passando a receber menos investimentos e atenção da Coroa portuguesa, o que exacerbou a crise do açúcar.

Respostas e comentários

Dados numéricos sobre a população de Salvador no fim do século dezoito foram retirados de: istárlin, H. M. Ser republicano no Brasil colônia: a história de uma tradição esquecida. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. página 224, 228.

Bê êne cê cê

Ao tratar da Conjuração Baiana, destacando o papel dos escravizados e da circulação de ideias iluministas nesse movimento, o conteúdo contribui para o desenvolvimento das habilidades ê éfe zero oito agá ih zero cinco e ê éfe zero oito agá ih um quatro.

Ampliando

No texto a seguir, ístivãn iânquisso trata da participação de escravizados na Conjuração Baiana.

reticências Escravos envolvem-se na sedição, mas a clivagem social não desaparece, matizando-se em outras ambiguidades. Excetuando Antônio José, escravo boleeiro do tenente-coronel Caetano Maurício Machado, reticências o envolvimento dos outros dez escravos no processo instaurado por ordem de dona Fernando José de Portugal revela diferenças e matizes significativos no trato desses com os homens livres de baixa condição com quem privavam.

Entre os outros dez escravos envolvidos na devassa, nove eram homens pardos nativos da terra. Apenas um, o escravo de aluguel Vicente, alfaiate por ofício, era, entre os processados, negro e africano. Este Vicente trabalhava na oficina de João de Deus mediante duas patacas por semana, pelo que se tornava submisso às ordens do mestre que o alugara, e é nessa condição que se vê envolvido em ações vinculadas à trama sediciosa. João de Deus serve-se dele para enviar recados a outros sediciosos, determinando-lhe, pois é de seu direito por alugá-lo, que o acompanhe à reunião do Campo do Dique do Desterro, motivo, afinal, de sua prisão. Luís Henrique Dias Tavares anota com acuidade que, ao contrário do que se percebe entre os homens pardos, independentemente de sua condição de livres, forros ou escravos, e que mantinham entre si relações de amizade e camaradagem, frequentando juntos reuniões políticas, festas, bailes ou ‘funções de raparigas’ pelas noites da Bahia, o tratamento dispensado ao africano escravo de aluguel era, da parte de João de Deus, de estrito distanciamento e rigoroso contrôle.

Por mais que professassem ideais revolucionários, a generalização do escravismo acabava por levar os mais extremados sediciosos, caso do mestre-alfaiate, a se ajustarem ao sistema que projetavam suprimir. Não se deve esquecer que todos que tinham posses suficientes para tanto eram possuidores de escravos, sem que isso os tornasse menos radicais na contestação do Antigo Regime na Colônia. O lavrante Luís Pires, ainda que nunca tivesse tido escravo que lhe servisse, comprou um moleque de nome Francisco Angola para que o fizesse à sua mãe Damásia Maria da Conceição (ela mesma ex-escrava), moleque que, para grande pesar dela, veio a falecer de ‘diarreia de sangue’, provavelmente cólera. reticências

O escravismo perpassava de tal fórma o cotidiano que, de tão generalizado e onipresente, transformava-se, na Colônia, na limitação maior à privacidade dos senhores. Nas Minas Gerais, e em especial nas cidades, os escravos não eram apenas as mãos e os pés dos senhores como queria Antonil no início do século dezoito, mas eram quase sua sombra, olhos e ouvidos aos quais nada escapava.”

iânquisso, I. A sedução da liberdade: cotidiano e contestação política no final do século dezoito. ín: NOVAIS, F. A.; SOUZA, L. de M. e S. (organizador). História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. página 431-433.

Com isso, as ideias revolucionárias se espalhavam pelas ruas com mais facilidade, alcançando pessoas pobres livres, comerciantes, advogados, fazendeiros e até mesmo escravizados. Assim, pode-se afirmar que a Conjuração Baiana foi socialmente heterogêneaglossário .

Características dos grupos conspiradores

Os grupos que se reuniam para debater as ideias iluministas e conspirar contra a Coroa portuguesa contavam com milicianosglossário , religiosos, homens de negócios, comerciantes, profissionais liberais, fazendeiros e muitas pessoas que não pertenciam à elite nem eram letradas. Esses grupos eram inspirados pela ideia iluminista de que todos os indivíduos eram iguais.

Dessa maneira, pessoas que antes se reuniam apenas com integrantes da mesma condição social passaram a conviver e compartilhar opiniões políticas com indivíduos de outras camadas sociais.

A superação das diferenças sociais, porém, não alcançou os negros escravizados que participaram da conjuração. Eles eram tratados com desconfiança e preconceito, maneira bastante diferente da conferida aos homens brancos e pobres.

Mesmo inspirados pelas ideias de liberdade e igualdade, portanto, os revoltosos baianos reproduziram no interior do movimento as relações de superioridade e preconceito que caracterizavam essa sociedade escravista.

A maioria dos escravizados que se envolveram na revolta o fez a mando de seus senhores. Eles transmitiam recados aos conspiradores e frequentavam com eles eventos como bailes e reuniões políticas. Grande parte deles estava envolvida em atividades urbanas e sabia ler e escrever.

Gravura. Vista geral de local aberto de frente para uma construção grande, de paredes em bege. Ao centro da construção, uma porta mais alta ladeada por duas outras, mais baixas, com uma cruz na ponta. À esquerda da construção, casas de paredes em cinza e bege e telhados triangulares em marrom. Ao lado dessa construção há uma outra, geminada a ela, mais baixa, com pequenas janelas em verde, acessada por uma rampa na lateral à direita. Na parte superior, atrás dessa construção, vê-se uma outra parcialmente, com uma cúpula em verde encimada por uma pequena torre, com uma cruz. Ao lado, uma torre de paredes em branco, com telhado em verde. À frente da construção principal, há dezenas de pessoas em pé, homens vestidos com roupa e chapéu, casaca e calça e mulheres de vestidos longos. Alguns homens com roupas de soldados, casaca verde, chapéu preto e calça branca sobre cavalos. Na ponta da direita, dois homens negros, com chapéu bege sobre a cabeça, blusa branca e colete laranja, calças, levam nos braços uma liteira, estrutura de madeira com poltrona ao centro e cortina em bege tampando. No alto, céu em azul e coberto por nuvens em cinza.
Igreja do Hospício de Nossa Senhora da Piedade da Bahia, gravura de iôrram mórritis ruguendás, cêrca de 1835.
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A Igreja do Hospício de Nossa Senhora da Piedade fazia parte do bairro Piedade, em Salvador, no qual havia intensa circulação de pessoas e troca de ideias. No espaço representado na imagem, os líderes dos conjurados foram enforcados. Hoje, o local abriga a Praça da Piedade, na qual há esculturas em homenagem aos executados.

Respostas e comentários

Curadoria

Conflitos coloniais – Salvador durante a Conjuração Baiana de 1798 (Mapa)

Disponível em: https://oeds.link/5Z098V. Acesso em: 3 maio 2022.

Nesse mapa do Atlas histórico do Brasil, produzido pelo Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (cê pê dóc), da Fundação Getulio Vargas (éfe gê vê), é possível localizar a região onde ocorreu a Conjuração Baiana e analisá-la por meio da observação de seus aspectos geográficos e históricos.

O desenvolvimento da conjuração

Um dos grupos mais engajados na difusão das ideias iluministas foi a Academia Brasílica dos Renascidos, que, no fim da década de 1790, promovia encontros para debater assuntos como a abolição da escravidão, a diminuição dos impostos e a extinção de privilégios políticos e sociais.

Esses temas também eram abordados em panfletos distribuídos nas ruas com materiais, que difundiam principalmente as notícias sobre a Revolução Francesa.

De modo geral, nos panfletos eram abordados temas como soberania popular e a instalação de uma república com base, principalmente, nas ideias do grupo mais radical da Revolução Francesa: o dos jacobinos. Em razão de tal influência, esses panfletos assumiram uma característica radical, que era observada no tom de advertência e na escolha das palavras utilizadas, como “o povo manda, ordena e quer”.

Nesse contexto, os conjuradores baianos conseguiram articular contatos com o governo francês do Diretório por meio do capitão antuâne lachê, que esteve em Salvador em 1796 com um exemplar da Constituição Francesa. Quando voltou para a França, lachê apresentou ao Diretório um plano de intervenção militar na Bahia, o qual não foi efetivado. No entanto, isso demonstra que os temores por parte do governo português de um ataque francês na região tinham fundamento. O clima em Salvador era tenso.

Diante da falta de alimentos e das precárias condições de vida da população, Salvador foi palco de diversas agitações entre 1797 e 1798. Ocorreram vários saques a armazéns e assaltos, além de um episódio, em 1798, que demonstrou a profundidade das insatisfações populares: a queima da um dos símbolos da repressão e do poder colonial, na região do Pelourinho.

Ilustração. Homens de chapéu, casaca e calça escuras, reunidos em um ambiente fechado, iluminado pela luz que entra através de uma janela à esquerda. Eles estão em pé ao redor de um dos homens que tem um papel nas mãos. À direita uma mulher sentada em um banco. À esquerda, abaixo da janela, outra mulher sentada em um banco. Ao fundo, um homem sem chapéu, com  camisa e calça claras.
Ilustração atual representando um encontro de membros da Academia Brasílica dos Renascidos.

FONTE: PESSOTI, B. C. Academia dos Renascidos: o saber como poder na Bahia setecentista. Dia-Logos, Rio de Janeiro, número 5, página 67-77, outubro 2011.

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Os membros da loja maçônica Cavaleiros da Luz fundaram na Bahia a Academia Brasílica dos Renascidos, em 1759. O nome foi inspirado na Academia Brasílica dos Esquecidos, que havia sido extinta.

Dica

SITE

Olodum

Disponível em: https://oeds.link/dEFCcR. Acesso em: 4 abril 2022.

O grupo Olodum expressa-se por meio da música e engloba projetos que fortalecem a cultura afro-brasileira. No site, é possível conhecer esses projetos e a discografia do grupo, que contempla a canção “Revolução dos Búzios”, em homenagem ao evento e seus principais participantes.

Respostas e comentários

As ideias revolucionárias francesas causaram tal impacto nas autoridades da época que passaram a ser chamadas por estas de francesias, nome que deixa entrever os sentimentos de desprezo e terror que despertavam. Sabia-se que elas circulavam principalmente por meio de livros proibidos e panfletos, os quais, ao lado da oralidade, são destacados ao longo de todo o capítulo como os principais instrumentos de difusão das ideias revolucionárias e liberais na colônia. A sensibilização dos estudantes para esse processo lhes permite compreender a importância da circulação das ideias, dos conhecimentos e de instrumentos como os livros.

Ampliando

Sobre a relação entre a falta de alimentos e a devastação do meio ambiente, a historiadoraméri délPriore afirma que:

“Ainda nos séculos dezesseis e dezessete, a Mata Atlântica, que abastecia os engenhos de madeira, parecia inextinguível. Como qualquer colônia de exploração, o Brasil sofreu a dilapidação brutal de seus recursos naturais. O impacto direto das atividades coloniais sobre os ecossistemas existentes causou imediatos prejuízos

Um dos desdobramentos do problema foi a falta de gêneros de primeira necessidade. A Bahia, em alguns períodos do século dezoito, com todo o seu fausto, não tinha o que comer. Faltava mandioca, alimento de pobres e ricos, livres e escravos, razão pela qual mandaram os governadores das capitanias, nos textos das sesmarias, incluírem a cláusula de que ficava o proprietário obrigado ‘a plantar mil covas de mandioca por cada escravo que possuísse empregado na cultura da terra’. Repetiam, assim, providências tomadas no século dezessete, por Maurício de Nassau, com relação aos lavradores e senhores de engenho de Pernambuco.”

PRIORE, M. dél. Histórias da gente brasileira. volume 1: Colônia. São Paulo: Lêia, 2016. página 79-81.

Ampliando

O texto a seguir analisa a Academia dos Renascidos dentro da lógica da sociedade do Antigo Regime.

“A Academia dos Renascidos surgiu em um momento histórico em que certas peias que entravavam as possibilidades de ascensão social e de acesso a cargos nobiliárquicos estavam sendo paulatinamente eliminadas. Crescia, assim, o número de súditos que poderiam almejar novas posições na hierarquia social, ao passo em que aumentava a quantidade de oportunidades em que serviços e préstimos oferecidos pelos vassalos poderiam gerar a requisição de mercês e recompensas. Do estatuto renascido pode-se inferir que os acadêmicos nutriam a expectativa de serem agraciados com benesses decorrentes dos préstimos que a Academia ofereceria ao rei.

A produção erudita era uma atividade subsidiária de outras funções que os membros desempenhavam no corpo administrativo ou na hierarquia eclesiástica colonial e nenhum dos sócios se dedicava exclusivamente aos trabalhos acadêmicos o que faria da produção intelectual renascida, um novo elemento que poderia vir a aumentar a folha de serviços prestados ao rei. reticências nas sociedades do Antigo Regime, as redes de informação se inseriam na lógica hierárquica que retroalimentava a procura por privilégios e distinção e que ‘como qualquer serviço prestado à realeza, o conhecimento era parte de uma troca, de um negócio entre o rei e seus súditos’. Os membros da Academia estavam dispostos a mostrar que os seus trabalhos intelectuais poderiam figurar na economia das trocas como serviços diretamente relacionados aos interesses da monarquia e, como tais, passíveis de serem convertidos em elementos de barganha e solicitação de mercês.”

PESSOTI, B. C. Academia dos Renascidos: o saber como poder na Bahia setecentista. Dia-Logos, Rio de Janeiro, número 5, página67-77, outubro 2011. página68.

Alguns meses depois da queima da , em 12 de agosto de 1798, os principais pontos da cidade de Salvador amanheceram tomados de panfletos manuscritos que incitavam o rompimento com o pacto colonial.

Nos panfletos apreendidos pelas autoridades foram escritas as reivindicações dos conspiradores, como a liberdade de comércio, o aumento da remuneração das tropas, a instauração de um governo igualitário baseado no merecimento individual e a fundação da República Bahiense, em que todos seriam iguais, com liberdade, igualdade e fraternidade, um dos lemas da Revolução Francesa. Além disso, diferentemente dos participantes da Conjuração Mineira, os revoltosos baianos solicitavam a libertação dos escravizados.

As prisões e as execuções

Após investigar a autoria dos panfletos, as autoridades prenderam o soldado pardo Luís Gonzaga das Virgens e Veiga. Na casa dele, foram encontrados diversos papéis que o relacionavam ao movimento.

Os demais participantes, receosos de que a repressão das autoridades acabasse com o levante, marcaram uma reunião logo em seguida, no dia 25 de agosto de 1798, para decidir a data do início da revolta.

A reunião, porém, não aconteceu. Assim como ocorreu em Minas Gerais, os revoltosos foram denunciados e presos. Entre eles estavam cinco mulheres: as pardas forras Ana Romana Lopes e Domingas Maria do Nascimento, as negras forras Lucrécia Maria gercênt e Vicência e a parda livre Luiza Francisca de Araújo.

As prisões se estenderam até fevereiro de 1799, e as autoridades concluíram que os líderes do movimento eram Luís Gonzaga das Virgens e Veiga, o soldado Lucas Dantas do Amorim Torres, João de Deus do Nascimento e Manuel Faustino dos Santos Lira. Como os dois últimos eram alfaiates, a conjuração também ficou conhecida como Revolta dos Alfaiates. Assim como Tiradentes, os quatro acusados foram condenados à , no dia 8 de novembro de 1799. O corpo deles foi esquartejado e exposto em praça pública.

Fotografia. Destaque para as mãos de uma pessoa jogando búzios. Há conchas e pedras dentro de um círculo formado por cordões coloridos. Dentro do círculo uma vela acesa. Do lado de fora do círculo, vista parcial de uma boneca, usando um longo e largo vestido com detalhes em dourado.
Sacerdotisa realizando o jogo de búzios, utilizado nas religiões tradicionais africanas, em Salvador (Bahia). Foto de 2022.
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Imagens em contexto!

Outro nome dado à Conjuração Baiana foi Revolução dos Búzios, pois os participantes utilizavam búzios de Angola para se identificar. Como o búzio – que você pode identificar na foto – é um importante símbolo das religiões afro-brasileiras, como o candomblé, pode-se considerar que a revolta, além de política, era religiosa e étnica.

Dica

JOGO

Revolta dos Búzios 220 Anos

Disponível em: https://oeds.link/grIcf5. Acesso em: 17 maio 2022.

O jogo aborda a história da Conjuração Baiana, destacando personagens como Domingas Maria do Nascimento, Luiza Francisca de Araújo, Luís Gonzaga das Virgens e Veiga e Lucrécia Maria gercênt.

Respostas e comentários

Temas contemporâneos transversais

Ao abordar a centralidade dos búzios, presente até hoje na sociedade e na cultura brasileira, um dos símbolos das religiões africanas e afro-brasileiras, para a identificação dos conspiradores, ressalta-se a relevância da diversidade cultural para a compreensão da história brasileira, mobilizando os Temas Contemporâneos Transversais Diversidade cultural e Educação para valorização do multiculturalismo nas matrizes históricas e culturais brasileiras.

Curadoria

Combates pela história da Conjuração Baiana de 1798: ideias de crise e revolução no século vinte (Artigo)

Patrícia Valim. História Social, Campinas, volume 17, página 23-49, 2009.

Nesse artigo, a historiadora Patrícia Valim analisa a construção da memória historiográfica acerca da Conjuração Baiana em estudos desenvolvidos de meados do século dezenove ao fim do século vinte.

Vamos pensar juntos?

Você já visitou estátuas, museus ou feiras realizadas para lembrar as tradições da sua comunidade ou apresentar à população comidas, danças e culturas diferentes?

Esses elementos podem parecer muito diferentes uns dos outros, mas apresentam uma característica importante em comum: revelam uma vontade de memória, ou seja, são construídos ou realizados para preservar a memória de um indivíduo ou de uma coletividade, possibilitando às pessoas do presente entrar em contato com essa lembrança, utilizá-la para compreender o mundo em que vivem e produzir sua identidade.

As esculturas reproduzidas a seguir foram feitas em homenagem a João de Deus do Nascimento, Lucas Dantas do Amorim Torres, Luís Gonzaga das Virgens e Veiga e Manuel Faustino dos Santos Lira, considerados os líderes da Conjuração Baiana; por isso, podem ser entendidas como lugares de memória. Elas ficam expostas na Praça da Piedade, em Salvador. Isso demonstra que, mesmo após duzentos anos, a conjuração e as pessoas que participaram dela têm muita importância para a sociedade brasileira.

Com base nisso, pode-se refletir sobre a importância da valorização das histórias desses conjuradores, que incentivam, na atualidade, o protagonismo dos negros e dos grupos sociais menos favorecidos, demonstrando que, assim como no passado, eles têm o potencial de transformar a sociedade e de lutar por direitos.

É possível, porém, ampliar essa reflexão com a seguinte pergunta: por que não há bustos para homenagear as mulheres que participaram da conjuração? A resposta está relacionada à falta de representatividade que elas têm na sociedade atual.

Para resolver esse problema, um dos passos importantes é valorizar a memória delas, que pode inspirar as mulheres de hoje a enfrentar o mundo com a coragem que tiveram Ana Romana Lopes, Domingas Maria do Nascimento, Lucrécia Maria gercênt, Vicência e Luiza Francisca de Araújo.

Fotografia. Busto de homem de cabelo curto, rosto largo, olhos grandes e lábios grossos.
Busto de João de Deus do Nascimento na praça da Piedade, em Salvador (Bahia). Foto de 2021.
Fotografia. Busto de homem de cabelo cacheado penteado para trás, testa larga com rugas. Tem olhos pequenos e cavanhaque.
Busto de Lucas Dantas do Amorim Torres na praça da Piedade, em Salvador (Bahia). Foto de 2021.
Fotografia. Busto de homem de rosto arredondado, calvo, testa franzida, olhos grandes e barba.
Busto de Luís Gonzaga das Virgens e Veiga na praça da Piedade, em Salvador (Bahia). Foto de 2021.
Fotografia. Busto de homem de cabelo curto, queixo estreito. Tem olhos grandes.
Busto de Manuel Faustino dos Santos Lira na praça da Piedade, em Salvador (Bahia). Foto de 2021.

Responda no caderno.

  1. O que é a vontade de memória?
  2. Explique por que é importante preservar e difundir a memória dos conjurados baianos.
  3. Por que seria importante produzir lugares de memória para as mulheres que participaram da Conjuração Baiana?
Respostas e comentários

Vamos pensar juntos?

A seção apresenta um debate sobre os lugares de memória: há uma aproximação entre o cotidiano dos estudantes e a visitação a estátuas, museus ou feiras tradicionais para ressaltar a importância desses elementos como espaços que têm vontade de memória, ou seja, intenção de preservar e comunicar memórias para que os indivíduos se apropriem delas na produção de suas identidades. Evidencia-se o papel dos bustos dos conjuradores baianos, exibidos na Praça da Piedade, em Salvador (Bahia), no empoderamento atual dos negros e de outros grupos sociais menos favorecidos, enfatizando a necessidade de valorizar também as mulheres que participaram da Conjuração Baiana, com o objetivo de aumentar a representação feminina na sociedade atual.

Atividades

1. Trata-se da intenção de preservar e comunicar a memória de um indivíduo ou de uma coletividade para que as pessoas do presente utilizem-na para a compreensão do mundo e para a produção da própria identidade.

2. Para valorizar o protagonismo dos negros e dos grupos sociais menos favorecidos, pois a preservação e a difusão dessa memória demonstram que, assim como no passado, esses grupos têm o potencial de transformar a sociedade e de lutar por direitos.

3. Para suprir a falta de representatividade dessas mulheres na sociedade. A valorização da memória das participantes da Conjuração Baiana pode encorajar as mulheres da atualidade a lutar por seus direitos.

Bê êne cê cê

Por trabalhar com questões relacionadas à memória histórica, inclusive pensando-a na contemporaneidade, a seção contribui para mobilizar as Competências Gerais da Educação Básica nº 1 e nº 9, as Competências Específicas de Ciências Humanas nº 1 e nº 6 e as Competências Específicas de História nº 1 e nº 3.

A Conjuração do Rio de Janeiro

Em 1763, o Rio de Janeiro se tornou a capital do Brasil. Com isso, a séde do governo foi transferida para lá, e a cidade ganhou grande importância política, além de se tornar o principal entreposto comercial da América portuguesa.

A população do Rio de Janeiro, em 1794, era de cêrca de 43 mil pessoas. Destas, 15 mil eram escravizadas e 28 mil livres. Por lá passavam a maioria dos produtos importados que seriam distribuídos na colônia e grande parte das riquezas produzidas internamente, como o ouro e os diamantes.

Com isso, a cidade começou a crescer, e a zona urbana ultrapassou os morros de Santo Antônio, São Bento, Conceição e Castelo. Foram abertos caminhos, como o de Mata-Porcos e o de Mata-Cavalos, que deram lugar às ruas Carioca e Riachuelo.

Entre as tensões presentes na época, marcadas pelas relações escravistas e pelos preconceitos relacionados à população negra e mestiça, o fluxo de ideias iluministas preocupava as autoridades.

Entre os diversos objetos que desembarcavam quase todos os dias no porto do Rio de Janeiro, havia livros e outros impressos sobre o pensamento de autores iluministas e as últimas notícias da Revolução Francesa. Estas circulavam principalmente em revistas e jornais, como a Gazeta de Lisboa (de Portugal) e o Mercure de France (jornal francês que era proibido na colônia).

Fotografia. Um portão de grades em preto, ornadas com curvas. Acima do portão, mais grades ornamentadas e um símbolo oval, em dourado. O portão é sustentado por duas colunas em cinza, com detalhes em branco, mais altas do que ele. Nas extremidades, mais grades verticais, sobre uma mureta de concreto. Ao fundo, vegetação. Do lado de fora, um homem à direita, vestido de preto, caminha na direção esquerda-direita.
Portão na entrada do Passeio Público, no Rio de Janeiro (Rio de Janeiro). Foto de 2019.
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Imagens em contexto!

Durante o processo de urbanização, as picadasglossário que eram abertas para chegar às praias transformaram-se em ruas estreitas e pavimentadas. Foi nessa época que os alagados começaram a ser aterrados. A Lagoa do Boqueirão da Ajuda, por exemplo, foi aterrada para a construção do Passeio Público, primeiro parque público da cidade.

Respostas e comentários

Dados numéricos sobre a população do Rio de Janeiro em 1794 foram retirados de: istárlin, H. M. Ser republicano no Brasil colônia: a história de uma tradição esquecida. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. página 210.

Ampliando

No fim do século dezoito, o movimento no porto do Rio de Janeiro era intenso. Nele circulavam livros, ouro, prata e escravizados, entre muitas outras mercadorias. No texto a seguir, a historiadora méri dél Priore descreve a dinâmica por trás de algumas dessas atividades.

“A produção das Minas, grande consumidora de mão de obra africana, atuava diretamente sob a demanda de escravos e mercadorias nas cidades portuárias. Os tropeiros, camboeiros e comissários volantes realizavam a ligação do Rio de Janeiro com as minas, oferecendo às populações mineradoras além de trabalhadores, louças e porcelanas, damascos e tapeçarias da China e da Índia, brocados, vinhos, azeites e uma infinidade de outros artigos. Do mesmo modo, o ouro transportado, legalmente ou não, pelos mesmos agentes era conduzido ao porto do Rio e de lá para o exterior.

A intensidade de negócios, o número de embarcações ancoradas nos portos, o formigueiro de artesãos e pequenos comerciantes engajados na atividade mercantil impressionavam. Um oficial do navio L’Arc em Ciel, de passagem por aqui em 1748, observou:

‘Quase todo o comércio do Brasil depende dos produtos vindos da Europa. Em matéria de gêneros alimentícios, o país recebe de Portugal medíocres quantidades de farinha, de vinho do Porto e de especiarias, o suficiente para satisfazer a frugalidade portuguesa. O comércio de produtos de luxo é infinitamente mais significativo. Importa-se de tudo: estofos bordados a ouro e prata, galões, peças de seda, belos tecidos, telas finas e uma infinidade de outras mercadorias da moda, produzidas, na sua maioria, pelas manufaturas francesas. Uma vez por ano, entre os meses de setembro e outubro, Lisboa envia para a sua colônia, sob escolta de três ou quatro navios de guerra, uma frota carregada com os produtos referidos. Essa frota, depois de distribuir a sua carga pela Bahia de Todos os Santos, Pernambuco e Rio de Janeiro, é carregada com ouro e alguns diamantes – provenientes dos direitos do rei ou pertencentes a alguns particulares interessados em remeter suas riquezas para Portugal – e volta a reunir-se na Bahia em dezembro ou janeiro, retornando daí para a Europa. Do país, os navios mercantes portugueses levam, além do ouro e da pedraria, somente tabaco, açúcar e algodão – esse último ao que parece produzido contra a vontade da metrópole’.”

PRIORE, M. dél. Histórias da gente brasileira: colônia. São Paulo: Lêia, 2016. volume 1, página 93-94.

A Sociedade Literária

O comércio clandestino de revistas e jornais no Rio de Janeiro apavorou as autoridades, pois o pensamento revolucionário estava em expansão e ameaçava a monarquia portuguesa.

Nesse contexto, em 1794, o poeta Manuel Inácio da Silva Alvarenga obteve autorização do vice-rei, o conde de Resende, para reabrir a Sociedade Literária do Rio de Janeiro, que havia sido criada em 1786 e desativada em 1790.

Alvarenga era pardo, sua mãe era escravizada e seu pai, músico em Vila Rica. Ele estudou em Coimbra e, depois, se mudou para o Rio de Janeiro, onde trabalhava como professor dos filhos de colonos ricos que se preparavam para ingressar em universidades europeias.

Frontispício. Página branca com inscrições em letras pretas, em português: ÀS ARTES. POEMA QUE A SOCIEDADE LITERARIA DO RIO DE JANEIRO RECITOU NO DIA DOS ANNOS DE S. MAGESTADE FIDELISSIMA. Dona Maria primeira. Por Manuel Ignácio da Silva Alvarenga, Secretário da Sociedade. Segunda Edição. LISBOA 1821.
Frontispício da edição publicada em 1821 do poema composto por Silva Alvarenga em 1788, recitado na Sociedade Literária do Rio de Janeiro.

Desde o início, os integrantes dessa sociedade se dedicaram a estudos em diversos campos científicos, como a astronomia e a botânica. Inspirados por ideais iluministas, um de seus principais objetivos era a utilização da ciência para o bem comum, o que incentivou diversos estudos sobre as fontes de água e as plantas nativas do Rio de Janeiro.

Quando foi reaberta, a Sociedade Literária incorporou a esses interesses os debates a respeito dos princípios políticos e filosóficos vinculados à Revolução Francesa. O estatuto da associação foi modificado por essas ideias, sendo retiradas dele as restrições a debates políticos e a assuntos religiosos. Além disso, no estatuto se utilizou a palavra “democracia” com significado muito parecido ao atual, o que era ousado para a época.

Os membros da associação defendiam a ideia de que o poder não poderia ser exercido por apenas um indivíduo. Defendiam, assim, o princípio iluminista da igualdade e a extinção dos privilégios sociais.

Participavam das reuniões professores, literatos, químicos, naturalistas e outros indivíduos com os mesmos interesses políticos, intelectuais e culturais. Por enquanto, não se sabe se houve participação de mulheres nessas reuniões.

Pintura. Vista do alto para um local aberto. Três edifícios ladeiam o largo, todos com muitas janelas, três pavimentos e telhado em marrom avermelhado. Ao fundo, uma torre com cúpula em azul, ao lado de uma construção mais baixa, encimada por uma estrutura triangular. Na parte inferior, muro em cinza com uma torre triangular ao centro, ladeada por duas escadarias. Atrás do muro, o Largo do Paço, com muitos militares perfilados. Alguns estão a cavalo.
Revista Militar no Largo do Paço, pintura de Leandro Joaquim, século dezoito.
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Imagens em contexto!

Nesta pintura, está representado o Chafariz do Mestre Valentim, no Largo do Paço. O local, por onde circulavam as ideias iluministas, era um dos mais movimentados da cidade durante a Conjuração do Rio de Janeiro.

Respostas e comentários

Atividade complementar

Para complementar o debate a respeito da valorização das histórias e das memórias das mulheres desenvolvido ao longo do capítulo, proponha aos estudantes uma atividade que incentive a percepção de que a história é feita no dia a dia por todas as pessoas.

Peça-lhes que pesquisem o nome e a história de uma mulher que tenha realizado um feito considerado importante para a sociedade: uma iniciativa relevante para a comunidade, a conquista de um diploma, algum trabalho que os estudantes considerem significativo, a superação de limitações sociais e preconceitos, entre outros. Após a pesquisa, peça aos estudantes que proponham a criação de um lugar de memória para a pessoa pesquisada, justificando a escolha e descrevendo a importância da preservação da história dela.

Curadoria

Cultura científica e sociabilidade intelectual no Brasil setecentista: um estudo acerca da Sociedade Literária do Rio de Janeiro (Artigo)

Lorelai Brilhante cúri e osvaldo Munteal Filho. Acervo, São Paulo, volume 8, número 1-2, página105-122,janeiro a dezembro1995.

Nesse artigo, Lorelai Brilhante cúri e osvaldo Munteal Filho propõem uma reflexão acerca do papel ocupado pela cultura letrada brasileira no fim do século dezoito, com destaque para a Sociedade Literária do Rio de Janeiro.

As reuniões ocorriam no primeiro andar da casa de Manuel Inácio da Silva Alvarenga, localizada no local correspondente à atual Rua Sete de Setembro, em um trecho movimentado da cidade. Essa característica favoreceu a transmissão oral dos debates realizados por esses intelectuais.

Com o tempo, os boticários também passaram a organizar reuniões para debater a política e a filosofia relacionadas à Revolução Francesa, aumentando ainda mais o fluxo dessas informações pela cidade. Assim, apesar de a Sociedade Literária ser composta de um grupo de letrados, as ideias revolucionárias foram compartilhadas por meio de uma rede que conectou diversas camadas da sociedade.

A Sociedade Literária foi extinta pouco depois de sua reabertura pelo conde de Resende ainda em 1794, mas seus membros continuaram a se reunir. Ao descobrir que a origem das ideias revolucionárias que se espalhavam era a casa de Alvarenga, Resende ordenou a prisão de vários participantes, acusando-os de disseminar ideias subversivas.

Assim como em Minas Gerais e na Bahia, instalou-se uma devassa para investigar o movimento. Durante o processo foram ouvidas diversas testemunhas. Entre os acusados de participar do movimento estavam Alvarenga, o médico Jacinto José da Silva, o professor João Marques Pinto, o sapateiro Antônio Gonçalves dos Santos e o futuro marquês de Maricá, Mariano José Pereira da Fonseca.

No entanto, após três anos de investigações, nos quais os suspeitos ficaram presos, a devassa não conseguiu provar que eles tinham intenção de organizar um levante. Assim, foram libertados em 1797 e considerados culpados apenas de difundir ideias perigosas contra a monarquia.

Gravura. Um homem negro, de costas, de casaco longo em azul segura o chapéu com a mão esquerda, e apoia a direita sobre um guarda-corpo em madeira, ornamentado com formas vazadas. Uma portinhola está aberta neste guarda-corpo. Para além dele, à esquerda, há três homens sentados ao redor de uma mesa. À direita, um homem mexe em uma grande jarra de vidro. Há dezenas de prateleiras com vidros de formatos, tamanhos e cores diversos.
Botica, gravura de Jãn Batiste Dêbret, 1823.
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Imagens em contexto!

Nas proximidades da casa de Alvarenga havia muitas boticas. Elas eram frequentadas pelos médicos e naturalistas que eram membros da Sociedade Literária. Naquela época, as boticas eram os únicos estabelecimentos nos quais era permitido comercializar drogas medicinais. Assim, a maioria dos habitantes da cidade passava por elas e acabava entrando em contato com os debates realizados na sociedade.

Agora é com você!

Responda no caderno.

  1. Que outros nomes são dados à Conjuração Baiana? Por que eles conferem características sociais e étnicas a essa revolta?
  2. De que fórma ocorreu a disseminação das ideias iluministas no Rio de Janeiro?
  3. Qual era a importância das boticas como espaço de sociabilidade no Rio de Janeiro?
Respostas e comentários

Orientação para as atividades

Provavelmente, os estudantes já estão familiarizados com os procedimentos de releitura do texto-base e elaboração das respostas, sendo capazes de identificar e explicar elementos com certa facilidade. As atividades, porém, apresentam conceitos que talvez precisem ser explicados: o de etnia e o de espaços de sociabilidade. Essa é, portanto, uma oportunidade para reforçar a apropriação de conceitos e desenvolvimento da linguagem própria das ciências humanas.

Agora é com você!

1. Outros nomes dados à Conjuração Baiana são Revolução dos Búzios e Revolta dos Alfaiates, que remetem, respectivamente, ao fato de os participantes utilizarem búzios de Angola para se identificar e à profissão de dois dos quatro que foram considerados líderes do movimento: João de Deus do Nascimento e Manuel Faustino dos Santos Lira, que eram alfaiates. Como os búzios são importantes símbolos das religiões afro-brasileiras, pode-se afirmar que a revolta apresentava características étnicas e sociais, além de políticas.

2. A disseminação das ideias ocorreu pelo porto do Rio de Janeiro, por onde chegavam os livros, os jornais e as revistas, muitas vezes proibidos, com notícias sobre a Revolução Francesa e as ideias iluministas. 

3. As boticas eram os únicos lugares em que se podia comercializar drogas medicinais. Como a maioria dos habitantes da cidade passavam por elas, as boticas configuraram importantes espaços para a circulação das ideias e debates sociais.

Ampliando

Segundo ístivãn iânquisso, a cultura de contestação política podia ser observada em todos os lugares, inclusive nos mais inusitados.

No Rio de Janeiro, apenas dois anos passados da comoção gerada pela execução do alferes Joaquim José da Silva Xavier, discutia-se acaloradamente em boticas, praças, portas de igrejas e até junto à banca de peixes do cais da cidade, lugar dos mais públicos, acerca dos acontecimentos revolucionários da França, e não temiam alguns reticências defender publicamente e em altas vozes a sacrílega ideia de que os franceses ‘haviam feito muito bem em matar o Rei’reticências’’.

iânquisso, I. A sedução da liberdade: cotidiano e contestação política no final do século dezoito. ín: NOVAIS, F. A.; SOUZA, L. de M. e S. (organizador). História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. página 399.

Atividades

Responda no caderno.

Organize suas ideias

  1. Leia as afirmações a seguir e identifique-as como verdadeiras ou falsas. Depois, reescreva as afirmativas erradas, corrigindo-as.
    1. Os movimentos emancipacionistas do final do século dezoito eram inspirados pelo sentimento nacionalista.
    2. A capital da colônia foi transferida para o Rio de Janeiro em 1763 para impulsionar o desenvolvimento dessa cidade.
    3. A homogeneização cultural foi a estratégia adotada pela Coroa portuguesa para promover a assimilação dos indígenas à sociedade colonial após a expulsão dos jesuítas.
    4. Com a disseminação das ideias iluministas, as contestações na colônia da América ganharam outro caráter, pois passaram a abranger a administração da monarquia, e não apenas aspectos pontuais, como a alta de impostos.
  2. No caderno, desenhe um quadro como o do modelo a seguir contendo informações sobre as três conjurações estudadas neste capítulo.

Conjuração Mineira

Conjuração Baiana

Conjuração do Rio de Janeiro

Ano

Contexto populacional

Composição dos grupos conspiradores

Modo de divulgação das ideias iluministas

Algumas ideias defendidas

Houve intenção de organizar um levante?

Aprofundando

3. De acordo com o historiador José Murilo de Carvalho, todos os regimes políticos promovem o culto aos heróis, pois eles são figuras que sensibilizam as pessoas e legitimam os governos. Leia a seguir trechos de um texto desse historiador a respeito da mitificação de Tiradentes, analise a pintura e, depois, faça o que se pede.

“Durante o desfile de 1890 [início do período republicano no Brasil], Décio Villares, pintor positivista, distribuiu uma reticências gravura em que aparecia o busto de Tiradentes, corda ao pescoço, ornado com a palma do martírio e os louros da vitória. Barba e cabelos longos, ar sereno, olhar no infinito, era a própria imagem de Cristo. reticências

Não existia nenhum retrato de Tiradentes feito por quem o tivesse conhecido pessoalmente. reticências

A aceitação de Tiradentes veio, assim, acompanhada de sua transformação em herói nacional, mais do que em herói republicano. Unia o país através do espaço, do tempo, das classes. Para isso, sua imagem precisava ser idealizada, como de fato o foi.”

CARVALHO, J. M. de. A formação das almas: o imaginário da República no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. página 65, 71.

Respostas e comentários

Bê êne cê cê

Por envolver a elaboração de um manual de combate à desinformação que tem como característica a ampla circulação na internet, a atividade 4 contribui para o desenvolvimento da Competência Específica de Ciências Humanas nº 2.

Atividades

Organize suas ideias

1. a) ; b) ; c) V; d) V.

Correções: a) Os participantes dos movimentos emancipacionistas tinham interesses diferentes dependendo do local. Eles não se identificavam como brasileiros nem se entendiam como pertencentes à mesma unidade.

b) A capital foi transferida de Salvador para o Rio de Janeiro com o objetivo de aumentar o contrôle de Portugal sobre a colônia.

2. Ao produzirem o quadro, os estudantes podem estabelecer a estrutura a seguir.

• Ano: Conjuração Mineira – 1789; Conjuração Baiana –1798; Conjuração do Rio de Janeiro – 1794.

• Contexto populacional: Conjuração Mineira – 363 mil habitantes na capitania, sendo 48% escravizados. As mulheres e os homens brancos eram apenas 18% da população, mas concentravam o poder político e econômico; Conjuração Baiana – cêrca de 40 mil habitantes em Salvador e 26 mil nos subúrbios da cidade. Negros e pardos perfaziam 78% da sociedade baiana; Conjuração do Rio de Janeiro – 43 mil habitantes. Destes, 15 mil eram escravizados e 28 mil, livres.

• Composição dos grupos conspiradores: Conjuração Mineira – mineradores, profissionais liberais, soldados, religiosos, burocratas e fazendeiros, além de algumas mulheres; Conjuração Baiana – milicianos, religiosos, comerciantes, profissionais liberais, fazendeiros, escravizados; Conjuração do Rio de Janeiro – principalmente intelectuais e outros indivíduos que partilhavam dos mesmos interesses políticos, intelectuais e culturais.

• Modo de disseminação das ideias iluministas: Conjuração Mineira – principalmente por meio de livros e manuscritos que circulavam em grupos de intelectuais; Conjuração Baiana – em grupos nos quais circulavam livros sobre a independência dos Estados Unidos e a Revolução Francesa, cujo conteúdo era transmitido por meio de leitura em voz alta e de cópias manuscritas; Conjuração do Rio de Janeiro – as ideias eram debatidas durante as reuniões da Sociedade Literária e, depois, difundidas nas boticas.

• Algumas ideias defendidas: Conjuração Mineira – proclamação de uma república independente com capital em São João dél-Rei e implantação de manufaturas; Conjuração Baiana – fundação da República Bahiense e libertação dos escravizados; Conjuração do Rio de Janeiro – utilização da ciência para o bem comum, princípio iluminista da igualdade e extinção dos privilégios sociais.

• Houve intenção de organizar um levante? Conjuração Mineira – sim; Conjuração Baiana – sim; Conjuração do Rio de Janeiro – não.

Pintura. Imagem vertical em que se vê parcialmente um cadafalso de madeira, com um homem esquartejado. Acima, a cabeça, com cabelos castanho claro, barba e bigode, olhos fechados e o rosto pálido, está sobre um pano branco ensanguentado. Ao lado dela um crucifixo preto, com a figura de Jesus Cristo. Uma corda pende do alto, com nós. É possível também ver correntes e uma algema. Na parte de baixo, o torso na horizontal, com o braço direito pendente; o pé direito está próximo à cabeça; um tecido azul está sobre o quadril. A perna esquerda está presa com cordas em uma estaca de madeira afixada no cadafalso, à direita. Um osso está visível na parte superior dessa perna.
Tiradentes esquartejado, pintura de Pedro Américo, 1893. 
  1. De que modo a imagem de Tiradentes passou a ser representada em quadros e gravuras?
  2. As ideias e as concepções políticas com que Pedro Américo representou Tiradentes não correspondiam aos objetivos do conjurado. Essa afirmação está correta? Justifique sua resposta.
  3. Qual era o objetivo por trás dessas representações? Justifique sua resposta com trechos do texto e elementos da pintura produzida por Pedro Américo.
  1. Neste capítulo, você estudou episódios da história do Brasil em que a circulação de ideias e informações influenciaram a transformação de parte da sociedade. Com o objetivo de promover a responsabilidade das pessoas diante da grande circulação de informações pela internet, reúna-se com três ou quatro colegas para criar um manual de combate às fake news. Para isso, percorram as etapas a seguir.
    • Prevejam as tarefas necessárias para a criação do manual e dividam-nas entre vocês. São exemplos de tarefas: reunir outros manuais de combate a problemas da atualidade para usar como exemplo; decidir qual vai ser o formato e o layout do manual (impresso ou digital/cartazes, slides etcétera); escrever as informações no manual; divulgar o documento.
    • Depois, pesquisem, em uma biblioteca ou na internet, manuais para verificar o que eles têm em comum e compreender o formato desse tipo de documento.
    • Em seguida, definam o que vocês consideram relevante e irrelevante no material pesquisado para constar no manual. Selecionem as informações relevantes e descartem as que não são.
    • É hora de botar a mão na massa: com base nas informações pesquisadas e seguindo o padrão estabelecido para o manual nas etapas anteriores, produzam o documento. Lembrem-se de que vocês devem, ao final da produção dos textos, da seleção de fotos, gráficos, tabelas, ilustrações e outros elementos que utilizarão, revisar tudo antes da produção final do manual.
    • Por último, produzam um relatório contendo o passo a passo utilizado por vocês para criar esse manual. Esse relatório deve funcionar como um guia detalhado para a produção de qualquer tipo de manual. Após isso, divulguem o manual de combate às fake news e o relatório em formato impresso na escola, com a devida autorização, ou em formato digital, nas redes sociais.
Respostas e comentários

Aprofundando

3. a) No quadro, Tiradentes foi representado com acessórios católicos e traços semelhantes aos de Jesus Cristo.

b) Sim. O quadro de Pedro Américo produz uma representação sacralizada de Tiradentes, como a de um mártir, mas a luta desse conjurado não estava relacionada à defesa da religião católica, mas sim a objetivos emancipacionistas como a diminuição de impostos e a extinção de privilégios políticos e sociais.

c) O objetivo era torná-lo um herói nacional que representasse o regime republicano. A pintura foi produzida no início da república e contém vários elementos visuais planejados para sacralizar a figura do inconfidente: no alto da imagem, está a cabeça de Tiradentes, cujo sangue escorre sobre um tecido branco. À direita há um crucifixo, elemento que promove um tom sacro, com uma corda desfeita em nós, como sinal da morte por enforcamento, além das correntes e das algemas do prisioneiro. Logo abaixo, à esquerda, está um dos pés e parte do tronco do inconfidente. A perna, por sua vez, remete a um crucifixo. Há forte similaridade entre a representação da face do conjurado e a imagem tradicional consolidada de Jesus Cristo. Podem ser citados estes trechos: “A aceitação de Tiradentes veio, assim, acompanhada de sua transformação em herói nacional, mais do que em herói republicano” e “sua imagem precisava ser idealizada, como de fato o foi”.

4. Trata-se de uma atividade baseada na lógica do pensamento computacional. Espera-se que os estudantes percebam a importância de assumir a responsabilidade pelas informações que transmitem e se reconheçam como sujeitos transformadores do meio em que vivem ao combater a circulação das fake news. A primeira etapa do trabalho é a de decomposição do problema em tarefas menores. Nesse momento, incentive os estudantes a perceber a importância da divisão de tarefas para a resolução de problemas complexos. Na segunda etapa, incentive-os a pesquisar manuais de diversos tipos. Na etapa de abstração, eles deverão dar fórma ao manual, selecionando os tipos de informação que lhes parecerem adequados e ignorando os outros. Para produzir o manual, deverão indicar práticas de combate às fake news, como a verificação das fontes.

De posse de todos os relatórios, na última etapa – de produção de instruções (algoritmo) –, reúna todos os grupos para debater as instruções necessárias para a produção do manual de fake news. Peça aos grupos que se reúnam e, com base nessas instruções, produzam um manual para toda a turma. Por meio desse processo, eles poderão testar o algoritmo criado na última etapa da atividade, analisando o que funciona bem e o que não funciona. Por fim, incentive-os a difundir o documento para o maior número possível de pessoas. 

Glossário

Sedição
: reação ou contestação coletiva a uma autoridade ou a um poder estabelecido.
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Emancipacionista
: relacionado à defesa da independência e do fim de qualquer tutela.
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Conjuração
: compromisso assumido por várias pessoas contra um governo.
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Tributário
: relativo aos impostos.
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Sociabilidade
: característica dos modos de viver em sociedade.
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Alferes
: patente de oficial inferior à de tenente.
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Heterogêneo
: composto de partes diferentes.
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Miliciano
: que pertence a uma organização militar.
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Picada
: caminho estreito por entre o mato.
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