CAPÍTULO 8 Conflitos regionais, socialismo e descolonização

Os espaços geográficos são muito importantes para o desenvolvimento das sociedades. O espaço sobre o qual um Estado exerce sua soberania, delimitado por fronteiras políticas, é denominado território.

Vários territórios são alvos de disputas entre diferentes grupos sociais. Há pessoas ligadas por laços étnicos, históricos e culturais que lutam para ocupar um território e se organizar nele de fórma livre e independente. Isso ocorre, por exemplo, com o povo palestino, no Oriente Médio, desde a segunda metade do século vinte.

Em vários momentos da história, grupos sociais tiveram de lutar para usufruir dos mesmos direitos que os demais. Isso ocorreu, por exemplo, na África do Sul, durante o apartheid, um regime de segregação racial implementado no país entre 1948 e 1994.

Fotografia. No primeiro plano, pessoas em uma manifestação na rua. Carregam cartazes amarelos com palavras de ordem em inglês pendurados ao corpo.
Manifestação contra o apartheid em Nova Iorque, Estados Unidos. Foto de 1991. Nos cartazes está escrito: “África do Sul livre”.
Fotografia. No primeiro plano, mulheres reunidas em manifestação de rua. Elas carregam cartazes e sinalizadores com fumaça vermelha. Algumas usam máscara de proteção facial. A mulher à frente usa um lenço encobrindo parcialmente a cabeça. Nos cartazes, palavras de ordem escritas em inglês.
Protesto pela libertação da Palestina após o aumento da violência do Estado de Israel, em Londres, Reino Unido. Foto de 2021. No cartaz do lado esquerdo da imagem, está escrito: “Acabe com o apartheid”.
Ícone. Ilustração de um ponto de interrogação indicando questões de abertura de capítulo.

Responda oralmente.

  1. O que as manifestações retratadas nas imagens têm em comum?
  2. Como as reivindicações dos manifestantes se relacionam ao espaço?
  3. Em sua opinião, por que o termo apartheidainda é utilizado para denunciar fórmas de segregação? Cite um exemplo estudado por você em que esse termo poderia ser aplicado.

A questão judaico-palestina: passado e presente

Desde a segunda metade do século vinte, uma das regiões mais disputadas e potencialmente explosivas do planeta é o chamado Oriente Médio. As disputas políticas, econômicas, religiosas e fronteiriças na região são marcas de um processo histórico que remonta do final do século dezenove ao fim da Primeira Guerra Mundial.

Até o final da primeira metade do século vinte, a região foi controlada pelo Reino Unido sob a fórma de um protetorado, como você estudou no capítulo 1. Com o final da Segunda Guerra Mundial, e o anúncio da saída dos britânicos da região, a Organização das Nações Unidas (ônu) apresentou um plano para a divisão da Palestina em 1947.

A proposta original da ônu de 1947 previa a criação de dois Estados na região: um árabe (Palestina) e outro judaico (Israel).

Os palestinos e a Liga Árabe (organização formada por países vizinhos, de maioria islâmica) não aceitaram essa divisão. Diante disso, em 1948, os judeus criaram unilateralmente o Estado de Israel, desencadeando uma série de guerras entre judeus e árabes, que se configuram como uma das grandes feridas históricas do Oriente Médio.

Desde sua criação, o Estado de Israel adotou uma política expansionista, avançando sobre territórios reservados aos palestinos na proposta original da ônu.

Demografia na Palestina – 1800-1947

Ano

Judeus

Árabes

Total

1800

6.700

268.000

274.700

1880

24.000

525.000

549.000

1915

87.500

590.000

677.500

1931

174.000

837.000

1.011.000

1936

400.000

800.000

1.200.000

1947

630.000

1.310.000

1.940.000

FONTE: Séla, S. D. C. A. (edição). The continuum political encyclopedia of the Middle East. New York: Continuum, 2002. página 446.

Israel e territórios palestinos – 1946-2017

Mapa. Israel e territórios palestinos, 1946 a 2017. Destaque para a região da Palestina. Mapa em cinco momentos distintos. Mapa 1. 1946. Legenda. Laranja: Território palestino. Amarelo: Território judaico. Território palestino: ocupa quase toda a região destacada, incluindo a cidade de Jerusalém. Território judaico: algumas pequenas regiões em amarelo, espalhadas pelo território. Mapa 2. 1947. Legenda. Laranja: Proposta da ONU para o Estado Palestino. Amarelo: Proposta da ONU para o Estado Judaico. Proposta da ONU para o Estado palestino: região central do território destacado, incluindo a cidade de Jerusalém, uma pequena área ao norte e uma faixa que se estende da região da Faixa de Gaza a quase metade da fronteira com o Egito, além de um pequeno ponto no litoral do Golfo de Aqaba. Proposta da ONU para o Estado judaico: parte das regiões norte, central e sul do território destacado, incluindo boa parte do território na fronteira com a Jordânia. Mapa 3. 1948. Legenda. Laranja: Território palestino. Amarelo: Território israelense. Marrom: Plano de partilha da ONU. Território palestino: Faixa de Gaza e região da Cisjordânia, incluindo a cidade de Jerusalém. Território israelense: parte das regiões norte, central e sul do território destacado, incluindo boa parte do território na fronteira com a Jordânia. Plano de partilha da ONU: pequena área ao norte, faixa que se estende por quase metade da fronteira com o Egito e regiões ao redor da Cisjordânia, ocupados por Israel e que, pela proposta da ONU, seriam territórios palestinos. Mapa 4. 1967. Legenda: Laranja: Território ocupado. Amarelo: Território israelense. Território ocupado: Faixa de Gaza e Cisjordânia, incluindo a cidade de Jerusalém. Território israelense: engloba o território israelense do plano de partilha da ONU mais as áreas ocupadas no norte do território, ao redor da Cisjordânia e na fronteira com o Egito, além da região das Colinas de Golã, território sírio. Mapa 5. 1967-2017. Legenda. Laranja: Território palestino. Amarelo: Territórios controlados por Israel, incluindo as zonas ocupadas. Território palestino: Faixa de Gaza e pequenos pontos da Cisjordânia. Territórios controlados por Israel, incluindo as zonas ocupadas: engloba quase todo o território destacado, incluindo boa parte da Cisjordânia, incluindo a cidade de Jerusalém, e o território das Colinas de Golã. No canto direito, rosa dos ventos e escala de 0 a 90 quilômetros.

FONTES: FERREIRA, G. M. L. Atlas geográfico: espaço mundial. quinta edição São Paulo: Moderna, 2019. página 103; báutsmen, A. êti ól (edição). Atlas géopolitique mondial. Monaco: Éditions du Rocher, 2019. página 47.

Ícone. Ilustração de um símbolo de localização sobre um folheto aberto e em branco, indicando o boxe Se liga no espaço!

Se liga no espaço!

Responda no caderno.

Analisando o quadro e o mapa, considerando o que você estudou anteriormente, cite pelo menos um motivo para o aumento da população judaica na Palestina durante a primeira metade do século vinte e para o apôio da ônu à criação do Estado de Israel em 1948.

Guerras árabe-israelenses

A Primeira Guerra Árabe-Israelense ocorreu entre 1948 e 1949. O conflito envolveu o recém-criado Estado de Israel e uma liga de países árabes, representados por Egito, Síria, Iraque, Jordânia, Líbano e Arábia Saudita. Com a vitória no conflito, Israel ampliou significativamente seu território. Como consequência, pelo menos 711 mil palestinos se refugiaram em outros países, segundo estimativas da ônu.

Em 1956, o presidente do Egito, Ábdel Násser, promoveu a nacionalização do Canal de Suez – principal ponto de ligação entre o Mar Mediterrâneo e os oceanos Índico e Pacífico. Em razão disso, o Reino Unido e a França, que tinham interesses econômicos na região, apoiados por Israel, invadiram a Península do Sinai para garantir a livre navegação em Suez, iniciando a Segunda Guerra Árabe-Israelense.

Diante desses conflitos, em 1964 fundou-se a Organização para a Libertação da Palestina (ó éle pê), tendo como um dos principais líderes Iásser Arafát. Grupos vinculados à ó éle pê passaram a atuar de fórma paramilitar e a organizar a luta pelos interesses dos árabes na região.

Em 1967, o Egito bloqueou alguns portos de Israel. Isso motivou o início da Terceira Guerra Árabe-Israelense, ou Guerra dos Seis Dias. Com apôio dos Estados Unidos, Israel rapidamente invadiu o Egito, a Síria e a Jordânia, passando a controlar os territórios do Sinai e da Faixa de Gaza (ao sul) e das Colinas de Golã (ao norte).

Com esses conflitos, criou-se um clima de tensão na região, e, em 1973, teve início a Quarta Guerra Árabe-Israelense, ou Guerra do iôn kipúr. O conflito terminou mais uma vez com a vitória de Israel, que manteve o contrôle sobre as regiões que havia conquistado (analise novamente o mapa da página anterior).

Fotografia em preto e branco. Multidão de pessoas se descolando, atravessando um curso de água. As pessoas carregam malas e outros objetos pessoais.
Palestinos que foram obrigados a deixar suas casas em busca de refúgio após a Primeira Guerra Árabe-Israelense, entre 1948 e 1949.

Dica

FILME

Promessas de um novo mundo

Direção: B. Z. gôldbérg e Justíne Chapiro. Israel e Estados Unidos, 2001. Duração: 85 minutos

O documentário trata do conflito entre o Estado de Israel e os palestinos pela perspectiva de crianças palestinas e israelenses.

Na década de 1980, iniciou-se uma forte resistência palestina ao contrôle cada vez maior da região por Israel. Formaram-se as chamadas intifadas: revoltas populares caracterizadas por conflitos entre as fôrças militares de Israel e a população civil palestina, geralmente armada com pedaços de pau e pedras.

Somente em 1993, as negociações de paz avançaram e deram origem ao Acordo de Oslo, assinado pelo então primeiro-ministro israelense ítzác rábin e por Iásser Arafát, líder da ó éle pê. Ao assinar o acordo, que foi intermediado pelo então presidente dos Estados Unidos, bil clínton, os palestinos reconheciam o Estado de Israel e os israelenses se comprometiam a retirar seus exércitos da Faixa de Gaza e da Cisjordânia, aceitando o direito dos palestinos a um Estado livre e autônomo na região.

A paz, no entanto, durou pouco. Na década de 2000, a tensão voltou a crescer com atentados comandados por grupos terroristas palestinos, como o ramás. Em 2002, com a justificativa de proteger-se dos atentados, o govêrno de Israel deu início à construção de um muro na divisa do país com a Cisjordânia, separando o território judaico do palestino.

Em 2018, o govêrno de dônald tramp, nos Estados Unidos, reconheceu Jerusalém, objeto de disputa entre palestinos e israelenses, como a capital de Israel, transferindo para a cidade a embaixada estadunidense, antes fixada em tél avívi. O episódio gerou enfrentamentos que resultaram em 55 pessoas mortas e pelo menos duas mil feridas. Até 2022, nenhuma das negociações de paz para a região havia acarretado o fim da violência e das disputas territoriais.

Fotografia. Em primeiro plano, mulher no alto, observa as casas e prédios em ruínas. No centro da imagem, algumas pessoas estão entre os escombros, observando o que restou do local.
Famílias palestinas diante dos escombros de suas casas, em Beit Hanoun, Gaza, após o cessar-fogo entre Israel e o grupo Hamas. Foto de 2021.
Ícone. Ilustração de uma lupa indicando o boxe Imagens em contexto!

Imagens em contexto!

O conflito entre o Estado de Israel e o povo palestino expõe a população civil a escaladas de violência. Em maio de 2021, por exemplo, uma onda de violência entre o govêrno de Israel e o grupo ramás atingiu a região. Uma das principais razões para o início do conflito foi a decisão dos tribunais israelenses de expulsar famílias palestinas que viviam no bairro de cheiqui djárrá, localizado na parte leste de Jerusalém, região reivindicada por grupos de colonos judeus. Após onze dias de violência e mortes que atingiram principalmente a população civil palestina, um cessar-fogo simultâneo, mediado pelo Egito, foi acordado entre Israel e o grupo ramás.

A Revolução Chinesa

Na época em que a ônu propôs o plano de partilha da Palestina, estava em curso, na China, a primeira grande revolução liderada por um partido comunista fóra da União Soviética.

Oficialmente, a Revolução Popular Chinesa teve início em 1946, após o fim da Segunda Guerra Mundial, assim que as tropas japonesas se retiraram do território do país. No entanto, a origem desse processo é mais antiga e está relacionada a uma série de disputas internas e à luta dos chineses contra a presença imperialista na região.

Você se recorda do que estudou sobre o imperialismo no 8º ano? Pois bem, desde a segunda metade do século dezenove, o território chinês foi cobiçado por países como Reino Unido, França, Estados Unidos e Japão. Em linhas gerais, a presença estrangeira era aceita e, até certo ponto, incentivada pela dinastia Qin, que governou a China por mais de 260 anos.

Em 1911, o império passou a sofrer forte oposição do Partido Nacionalista Chinês (cuomintâng). O que começou como uma revolta na cidade de Utiã, nas proximidades de Wuhan, logo se intensificou, provocando a deposição do imperador pu í, em 1912. A Revolução Chinêi, como ficou conhecida, instaurou a república na China, mas não resolveu os diversos conflitos internos que assolavam o país.

Nesse contexto, incentivado pelos acontecimentos da Revolução Russa de 1917, teve origem o Partido Comunista Chinês (pê cê cê). Fundado em 1921, ele disputou nas décadas seguintes o comando da China com o cuomintâng. Em 1925, o pê cê cê passou a ser fortemente perseguido pelos nacionalistas, tendo os seus integrantes de se retirar para o interior do país.

Em 1934, essa perseguição se transformou em campanha militar aberta contra os comunistas. Estes, liderados por iniciaram a retirada para o norte da China, conhecida como Longa Marcha.

Fotografia em preto e branco. Mao Tsé-Tung, senhor oriental de boina sentado em um cavalo. Homens armados estão a pé, ao redor dele. Um deles puxa as rédeas do cavalo.
máo tsé tung(a cavalo) e outros comunistas durante a Longa Marcha, na China. Foto de cêrca de 1935.
Ícone. Ilustração de uma lupa indicando o boxe Imagens em contexto!

Imagens em contexto!

A Longa Marcha aconteceu entre outubro de 1934 e outubro de 1935. Participaram dela aproximadamente 100 mil pessoas, que percorreram mais de 10 mil quilômetros enfrentando fome, frio e muitas batalhas. Durante esse percurso, os comunistas difundiram suas ideias entre os camponeses e conquistaram adeptos, o que foi importante para a efetivação da revolução.

Dica

LIVRO

Uma vida chinesa, deLi Cunú e Filipe Otiêi. São Paulo: dáblio ême éfe Martins Fontes, 2017.

Essa trilogia em quadrinhos conta a vida de uma família tendo como pano de fundo a história da China desde a criação da República Popular, sob o govêrno de máo tsé tung.

Os comunistas chegam ao poder

No início do século vinte, a China passou por uma violenta guerra civil em que se enfrentaram o cuomintâng, liderado por chiân cái chéqui, que dominava uma parte do território, e o pê cê cê, que controlava a outra parte.

As disputas entre nacionalistas e comunistas foram temporariamente suspensas em 1937, quando o território chinês foi invadido pelo Japão, que o dominou ao longo de toda a Segunda Guerra Mundial. No momento da invasão em 1937, as tropas de chiân cái chéqui, que se concentravam no sul da China, tiveram baixas significativas. Já os comunistas, concentrados no norte do país, não tiveram muitas perdas e seus exércitos ganharam o apôio da população, principalmente dos camponeses, conseguindo se organizar de fórma mais rápida e eficiente do que as tropas nacionalistas. Assim, pouco tempo depois da expulsão dos japoneses, em janeiro de 1949, o Exército de Libertação Popular (comunista) tomou Pequim e outras regiões sem muito esforço.

A revolução teve forte caráter popular e, em outubro de 1949, Máo proclamou a República Popular da China, com características socialistas. chiân cái chéqui e seus seguidores fugiram para a Ilha de taiuã, onde fundaram a República Nacionalista da China. Durante a Guerra Fria, enquanto a China de Máo se alinhou à União Soviética, o govêrno instaurado em taiuã recebeu apôio dos Estados Unidos.

Ao longo da década de 1950, a China recebeu o apôio da União Soviética, mas empreendeu uma via socialista independente, com base no incentivo à educação da população, na reforma agrária e na organização de cooperativas de camponeses. Em 1960, desavenças políticas entre a União Soviética e o govêrno chinês contribuíram para o afastamento da China do bloco socialista soviético.

A Revolução Chinesa – 1949

Mapa. A Revolução Chinesa, 1949. Destaque para o território chinês.
Legenda: 
Áreas comunistas: 
Amarelo: Em 1945.
Verde: Em julho de 1948.
Laranja: Em dezembro de 1949.
Rosa: Territórios controlados depois de 1949.
Seta vermelha: Ofensiva dos comunistas em 1949.
Nacionalistas: 
Quadrados e círculos pretos: Cidades ocupadas pelos nacionalistas em 1946.
Linha vermelha: Área dos nacionalistas.
Seta lilás: Retirada nacionalista.
Lilás: Região sob controle nacionalista em 1950.
No mapa.
Áreas comunistas em 1945: regiões ao norte, no centro e no nordeste do país, incluindo as cidades de Tianjin, Qingdao e Jinan.
Em julho de 1948: regiões ao redor das áreas anteriormente descritas, incluindo as cidades de Changchun e Shenyang.
Em dezembro de 1949: regiões sudeste e sul do território chinês, incluindo as cidades de Pequim, Nanquim, Xangai, Wuhan, Chongqing e Cantão.
Territórios controlados depois de 1949: sul e oeste do território chinês, incluindo as regiões de Sinkiang, Tibete, Qinghai, Sichuan e Yunnan, além da Ilha de Hainan.
Ofensiva dos comunistas em 1949: saindo da região central do país em direção a oeste, ao centro, ao sul, ao sudeste e à Ilha de Formosa, atual Taiwan.
Cidades ocupadas pelos nacionalistas em 1946: Changchun, Shenyang, Pequim, Tianjin, Qingdao, Jinan, Nanquim, Xangai, Wuhan, Chongqing e Cantão.
Área dos nacionalistas: área que circunda a região sudeste do país, além de um pequeno trecho da Ilha de Hainan.
Retirada nacionalista: saída de Nanquim em direção à Ilha de Formosa, atual Taiwan.
Região sob controle nacionalista em 1950: Ilha de Formosa, atual Taiwan.
No canto inferior esquerdo, rosa dos ventos e escala de 0 a 380 quilômetros.

FONTE: VICENTINO, C. Atlas histórico: geral e Brasil. São Paulo: Scipione, 2011. página 150.

Ícone. Ilustração de uma lupa indicando o boxe Imagens em contexto!

Imagens em contexto!

Entre 1946 e 1949, as fôrças lideradas por máo tsé tung ampliaram consideravelmente o território sob seu domínio. O exército comunista contou com forte mobilização dos camponeses, que, organizados, pressionaram o Partido Comunista a incorporar a suas pautas políticas um programa agrário. Com isso, conseguiram o fim do direito de propriedade e a distribuição de terras entre associações de camponeses pobres. Isso explica, em parte, por que as fôrças nacionalistas ficaram isoladas nas grandes cidades, enquanto a popularidade de máo tsé tung crescia nas áreas rurais da China.

Grande Salto para a Frente

Com a saída do bloco, a China deixou de receber apôio econômico e tecnológico da União Soviética. Entre 1958 e 1960, o govêrno de máo tsé tungcolocou em prática um plano de desenvolvimento econômico chamado de Grande Salto para a Frente. O objetivo do govêrno era transformar a China em uma nação desenvolvida, com distribuição de riquezas, no menor prazo possível.

Para tanto, o govêrno apostou em programas de reforma agrária e coletivização do campo e também na industrialização urbana. No entanto, com o afastamento entre China e União Soviética, essa campanha não obteve bons resultados.

O saldo desse plano de desenvolvimento nacional foi a escassez generalizada de alimentos, que se deveu ao processo forçado de coletivização das terras e ao deslocamento de camponeses para as cidades a fim de trabalhar na produção de ferro e aço. Com isso, de 15 a 55 milhões de chineses morreram de fome, aumentando as insatisfações sociais e a oposição ao govêrno de máo tsé tung.

Fotografia em preto e branco. Vista de um campo aberto com pessoas preparando o solo para o plantio.
Camponeses da Comuna de Tan Tiá, em Lóqui, na China, fertilizando um campo de trigo. Foto de 1960.
A Revolução Cultural Chinesa

Na segunda metade dos anos 1960, máo tsé tung se convenceu de que, para atingir uma mudança radical na sociedade, era necessário desburocratizar e fortalecer o Estado. Em sua perspectiva, era preciso defender a revolução dos resquícios do sistema capitalista como fórma de colocar a China no rumo do comunismo.

Assim, o líder chinês lançou, em 1966, a chamada Revolução Cultural. Mobilizando a população do país, particularmente os estudantes, ele passou a perseguir os opositores do govêrno e a incentivar o culto a sua personalidade. Por meio da Guarda Vermelha, as ideias maoistas eram popularizadas em escolas, universidades e aldeias.

Diante das críticas aos antigos costumes chineses e ao mundo ocidental, milhares de pessoas passaram a destruir produtos ocidentais em atos públicos e a perseguir os suspeitos de não viver de acordo com os costumes comunistas. Nesse contexto, o Livro vermelho – composto de citações nas quais máo tsé tung criticava, entre outros aspectos, os supostos inimigos da revolução e ressaltava a importância da fidelidade ao govêrno – passou a ser venerado, assim como o líder, chamado a partir daquele momento de O Grande Timoneiro.

Cartaz. Na parte direita da imagem, ilustração de menino chinês sorridente. Tem olhos estreitos, nariz largo e boca pequena. Está sorrindo. Usa um quepe com uma estrela vermelha. Carrega uma arma pendurada nas costas. À esquerda, jovens chineses enfileirados. No começo da fila, uma menina segura um megafone e um folheto.
Cartaz de propaganda política chinesa durante a Revolução Cultural, produzido em 1975.
Ícone. Ilustração de uma lupa indicando o boxe Imagens em contexto!

Imagens em contexto!

O cartaz faz referência ao garoto Pem Dônzi, protagonista do filme chinês Estrela vermelha cintilante, lançado em 1974. Pem é filho de um oficial do exército comunista, e o filme enaltece a bravura do garoto na luta contra Ru Rânsam, um burguês que incendeia a casa de Pem e causa a morte de sua mãe.

A China pós-Máo: abertura econômica e repressão política

máo tsé tung faleceu em 1976. Durante o período em que esteve à frente da República Popular da China, a mortalidade infantil no país foi reduzida, a população duplicou e as matrículas nas escolas aumentaram a níveis nunca vistos. Em contrapartida, seu govêrno foi responsável pela morte de milhões de pessoas.

Em 1978, a liderança da China foi assumida por dãn chiáo pín, que iniciou um processo de “desmaoização” da sociedade, repudiando o período da Revolução Cultural e o culto à personalidade demáo tsé tung.

chiáo pín também deu início a um período de abertura econômica ao lançar um programa de modernização focado na agricultura, na indústria, na defesa, na ciência e na tecnologia. Com isso, alcançou excelentes resultados, atraindo muitos investimentos externos, além de se aproximar diplomaticamente dos Estados Unidos. Em 1971, a China foi admitida na ônu.

No entanto, a estrutura de govêrno, comandada pelo pê cê cê, não foi modificada. As medidas colocadas em prática por chiáo pín, como a adoção da economia de mercado e a integração da China ao capitalismo globalizado, contrastavam com a falta de liberdade política. Diante dessa situação, em 1989, ocorreram vários protestos em Pequim. Os manifestantes, em sua maioria estudantes, ocuparam a Praça da Paz Celestial exigindo liberdade de expressão e de manifestação.

O govêrno reprimiu duramente os protestos, matando e ferindo milhares de manifestantes. Durante esse episódio, conhecido como Massacre da Praça da Paz Celestial, foi registrada uma das cenas mais marcantes do século vinte: um indivíduo, sozinho e desarmado, se coloca em frente a uma fileira de tanques de guerra que se dirigiam aos protestos.

Fotografia. Pessoa parada em pé, no meio da rua, obstruindo a passagem de tanques de guerra.
Manifestante no caminho dos tanques de guerra que se dirigiam à Praça da Paz Celestial para reprimir os protestos, em Pequim, China. Foto de 1989.

Agora é com você!

Responda no caderno.

  1. Explique como foi fundado o Estado de Israel e por que sua criação desencadeou uma série de conflitos.
  2. O que foi a Revolução Cultural chinesa? Justifique sua resposta analisando as medidas adotadas para sua efetivação.

O terceiro-mundismo

No capítulo 7, você estudou a Revolução Cubana. Após a consolidação do novo govêrno na ilha, o plano de Fidel Castro foi tirar os estrangeiros do comando das finanças de Cuba e priorizar os cubanos na tarefa de controlar o país, nacionalizando fazendas e bancos que tinham como principais acionistas os estadunidenses.

Como resposta, os Estados Unidos impuseram um embargo econômico à ilha, vigente até a atualidade, proibindo os outros países do continente americano de comercializar com Cuba, sob a ameaça de cortar relações diplomáticas com eles.

Sem aliados comerciais e com o risco de fracassar, o govêrno cubano passou a fazer amplas reformas – na distribuição das terras, na educação e na saúde – e a perseguir membros da antiga administração de Fulgencio Batista, conter os movimentos contrarrevolucionários e censurar a imprensa.

Ao mesmo tempo, Cuba passou a ser vista por muitas lideranças de esquerda da América Latina como exemplo a ser seguido e ganhou apôio popular, principalmente por causa das reformas que favoreceram a população mais pobre. A ilha também se tornou referência ao posicionar-se como país do terceiro mundo e aproximar-se especialmente de nações africanas. Nesse momento, portanto, pareceu manter-se ao lado do que se convencionou chamar de países não alinhados.

O movimento dos não alinhados era composto, principalmente, de países asiáticos e africanos que tinham alcançado havia pouco tempo a independência das antigas potências imperialistas, enfraquecidas após a Segunda Guerra Mundial, como você estudará a seguir.

De acordo com esse movimento, o mundo dividia-se em países ricos e pobres, de modo que os capitalistas e desenvolvidos foram considerados de primeiro mundo, os socialistas foram incluídos na denominação segundo mundo, sendo os demais classificados como de terceiro mundo, por não estarem alinhados aos anteriores.

A ideia de terceiro-mundismo foi uma alternativa para que esses países pudessem dialogar com os dois polos da Guerra Fria, buscando superar a condição de antigas colônias e alcançar o desenvolvimento segundo as próprias estratégias.

Fotografia. No primeiro plano, três pessoas passando em uma calçada. No segundo plano, um mural representando, à direita, três homens sorridentes e, à esquerda, pessoas aglomeradas carregando uma bandeira de Cuba. No centro do mural, uma frase cuja tradução é Viva Cuba livre...
Mural com desenhos sobre revolução em Havana, Cuba. Foto de 2018.
Ícone. Ilustração de uma lupa indicando o boxe Imagens em contexto!

Imagens em contexto!

Nas décadas de 1960 e 1970, Cuba passou a representar o ideal da América Latina na luta contra o imperialismo, a injustiça e o atraso social. Pessoas comuns e intelectuais celebraram-na como a realização da utopia, desconsiderando, muitas vezes, os problemas internos do país, como a censura e a perseguição política.

Pintura. Silhuetas de pessoas celebrando, tocando instrumentos, dançando, discursando. Ao fundo, focos luminosos, plantas e construções.
Aspectos da vida do negro: da escravidão à reconstrução, pintura de Aaron Douglas, 1934.
Ícone. Ilustração de uma lupa indicando o boxe Imagens em contexto!

Imagens em contexto!

Nas décadas de 1920 e 1930, nos Estados Unidos, artistas como Aaron Douglas buscaram recriar a imagem do negro estadunidense. O orgulho racial e a valorização de raízes africanas passaram a ser os principais temas de sua pintura. A produção de Douglas demonstrou que a cultura podia incentivar uma importante reflexão sobre a valorização da identidade negra e das raízes africanas na América. Houve intensa movimentação de intelectuais e artistas negros também no Caribe, com forte presença africana. Nomes como o do intelectual estadunidense Uílham Du Boá e o do jamaicano Márcus Gárvise destacaram no período e são ícones do movimento pan-africano.

O fim dos impérios coloniais na Ásia e na África

Ao longo do século vinte, sobretudo após as guerras mundiais, as colônias europeias na África e na Ásia passaram a reivindicar a independência política e o direito de autodeterminação.

Alguns países, como o Reino Unido, utilizaram a descolonização como estratégia para manter as ex-colônias em sua zona de influência. Outros, como a França, travaram violentos conflitos contra as fôrças de libertação nacional. Houve também países, como Portugal, que fizeram o possível para adiar a independência das colônias na África por meio da guerra.

A devastação provocada pela Segunda Guerra Mundial impediu a Europa de conter os movimentos nacionalistas que desejavam a emancipação. Ao mesmo tempo, a participação de africanos e asiáticos nessa guerra incentivou correntes de pensamento como a pan-africanista e a da negritude, que desde o final do século dezenove se opunham à segregação racial e à dominação colonial dos africanos.

O pan-africanismo

Na primeira metade do século vinte, os idealizadores do pan-africanismo e da negritude passaram a expressar a busca por uma identidade compartilhada entre os negros da América e os da África na luta contra todas as fórmas de opressão racial.

Principalmente após o Quinto Congresso Pan-Africano, realizado em 1945 em Manchester, no Reino Unido, a solidariedade racial e a luta contra o colonialismo passaram a ser os principais temas do movimento que se expandia internacionalmente. Nessa ocasião, falou-se abertamente pela primeira vez em independência, com a apresentação de propostas políticas e econômicas, tornando o pan-africanismo a base ideológica dos movimentos pela independência das colônias africanas.

Muitos africanos que eram parte da elite intelectual de seus países e que naquele momento viviam em outros locais – como o ganês cuâme nicrúma, o queniano Diômo Queniata, o senegalês leopôld sângôr e o congolês Patríce Lumúmba – assumiram depois desse encontro a liderança do movimento pela independência e o governo dos Estados recém-libertados do domínio colonial.

A Conferência de bandúngui

A ônu também contribuiu de maneira significativa na luta de países africanos e asiáticos contra as antigas metrópoles ao defender os princípios de autodeterminação dos povos e de defesa dos direitos humanos. Todas essas questões confluíram, em 1955, na realização da Conferência de bandúngui, na Indonésia.

No polarizado contexto da Guerra Fria, líderes de 29 países independentes firmaram compromisso contra todas as fórmas de colonialismo, contra o racismo e contra o alinhamento aos Estados Unidos ou à União Soviética. Eles conceberam, dessa fórma, a noção de terceiro mundo como um grupo de países que se declaravam não alinhados ao capitalismo estadunidense nem ao socialismo soviético e rejeitavam, portanto, a lógica bipolar característica das relações internacionais do período. Essa conferência fortaleceu os processos de descolonização na Ásia e, sobretudo, na África.

Fotografia em preto e branco. Homens reunidos em um grande salão. Estão em cadeiras dispostas em longas fileiras.
Delegados reunidos na Conferência de bandúngui, na Indonésia. Foto de 1955.
Fotografia. No primeiro plano, homens de túnica branca e de terno vistos de lado, andando em uma rua. No segundo plano da imagem, um mural colorido com o retrato de 5 homens e a informação em inglês cuja tradução é: Comemoração da 60° Conferência Asiática-Africana.
Delegados de nações asiáticas e africanas em frente ao outdoor produzido para celebrar os 60 anos da Conferência de bandúngui, na Indonésia. Foto de 2015.
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Nos anos que se seguiram à primeira conferência realizada na Indonésia, diversos países africanos e asiáticos alcançaram independência em relação às suas metrópoles europeias.

A descolonização na Ásia

Na Ásia, boa parte dos territórios coloniais europeus alcançou a independência logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, momento em que países como a França e o Reino Unido estavam fragilizados em virtude dos conflitos na Europa.

O Líbano se libertou da França em 1943. Pouco tempo depois, entre 1946 e 1948, teve fim o Mandato Britânico da Palestina, com a independência da Transjordânia (atuais Jordânia e Síria) e da Palestina (com a criação do Estado de Israel). Índia e Paquistão, territórios coloniais britânicos, tornaram-se independentes em 1947.

Já a Indochina teve a independência reconhecida pela França apenas em 1954, resultando na formação de três países no Sudeste Asiático – Vietnã, Camboja e Laos –, como você estudou no capítulo 7.

O processo de independência da Índia e do Paquistão será abordado na sequência.

O processo de independência da Índia

A Índia, até 1947, foi um dos territórios coloniais mais importantes do vasto Império Britânico por ser um grande centro consumidor de manufaturas e tecidos do Reino Unido.

Em 1885, foi fundado o Congresso Nacional Indiano, organização que lutava pela independência política da Índia. Seus líderes, entre eles Mahatma Gandhi, pregavam a não violência e a desobediência civil como estratégias de resistência. Dessa fórma, para protestar contra a dominação, realizavam boicotes aos produtos britânicos e greves, deixavam de pagar impostos e desobedeciam às leis britânicas na Índia.

Em 1920, Gandhi assumiu a liderança do movimento e conduziu uma campanha maciça de não pagamento de impostos e boicote aos produtos e às instituições britânicas. As primeiras campanhas se estenderam até o ano de 1922. Nesse período, foram organizadas pelo menos 396 greves, envolvendo aproximadamente 600 mil trabalhadores. Houve também o abandono em massa de escolas e faculdades britânicas na Índia, e pelo menos 30 mil indianos foram presos por motivos políticos, entre eles Gandhi.

Fotografia em preto e Branco. Mahatma Gandhi, senhor de óculos, mago, careca, com o corpo envolto em um tecido claro. Está descalço. Se apoia em um cajado. Atrás dele, homens e mulheres.
Marrátma Gândi e seus seguidores durante um protesto pacífico na Índia. Foto de 1930.

Além do Congresso Nacional Indiano, outros movimentos nacionalistas tiveram destaque, como o da Liga Muçulmana, liderada por Muhammad Ali Jinnah, que defendia a criação de um Estado independente para a minoria muçulmana na região (cérca de 30% da população).

O Reino Unido tentou, sem sucesso, enfraquecer os movimentos pela independência, incentivando os conflitos entre hindus e muçulmanos, prendendo líderes políticos, reprimindo violentamente greves e ações de boicote. Pressionado pelo desenrolar da Segunda Guerra Mundial e pelos movimentos de resistência, porém, o Reino Unido teve de ceder e, em 1947, reconheceu formalmente a independência da Índia e iniciou um plano de partilha que deu origem ao Paquistão.

Charge em preto e branco. À esquerda da imagem, homem de casaco e nariz grande está na porta de uma cela. Dentro dela, preso, está Gandhi. O homem na porta olha para a direita, na direção de uma multidão, composta por incontáveis homens parecidos com Gandhi.
O dilema de , charge de , 1933.
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A foto de 1930 mostra um protesto liderado por Gândi contra a lei que obrigava os indianos a consumir exclusivamente o sal importado do Reino Unido. No protesto, nomeado como Marcha do Sal, Gândi percorreu quase 400 quilômetros a pé em direção ao mar, atraindo, durante a caminhada, milhares de pessoas.

Ao longo de sua luta pela independência da Índia, Gândi foi preso diversas vezes por insubordinação. Da cadeia, continuou a liderar o movimento. Na charge de 1933, o dilema de Lóde Uílindan, governador-geral e vice-rei da Índia, entre 1931 e 1936, estava no fato de que, ao prender o líder hindu, acabou provocando uma reação em massa, fazendo surgir diversos outros personagens como ele.

A divisão política do subcontinente indiano

Com a formação de dois Estados independentes – a República da Índia, de maioria hindu, e a República do Paquistão (em suas porções ocidental e oriental), de maioria muçulmana –, houve um dos maiores deslocamentos populacionais de que se tem notícia. Aproximadamente 15 milhões de muçulmanos migraram para o Paquistão. Durante o processo, pelo menos quinhentas mil pessoas morreram. Pouco tempo depois, em 1948, Gândi foi assassinado por um nacionalista hindu, crítico de sua visão conciliadora em relação aos muçulmanos.

Divisão da Índia e rota de deslocamento – 1947

Mapa. Divisão da Índia e rota de deslocamento, 1947. Destaque para região do subcontinente indiano, para os países Paquistão,Índia e Bangladesh e para a região da Caxemira. Legenda. Linha dupla vermelha: Fronteira da Índia em 1945. Seta vermelha: Movimento dos refugiados hindus. Seta verde: Movimento dos refugiados muçulmanos. Fronteiras da Índia em 1945: território dos atuais Paquistão, Índia e Bangladesh, incluindo a região da Caxemira. Movimento dos refugiados hindus: do Paquistão e de Bangladesh em direção à Índia. Movimento dos refugiados muçulmanos: da Índia em direção ao Paquistão e a Bangladesh. No canto inferior esquerdo, rosa dos ventos e escala de 0 a 550 quilômetros.

FONTE: CHALIAND, G.; RAGEAU, J. Atlas politique du XXe siècle. Paris: Seuil, 1988. página 154.

Em 1971, o govêrno indiano apoiou a independência do território oriental do Paquistão, originando um novo país: bãngladéch. As tensões entre hindus e muçulmanos na região ainda são intensas e se potencializam na disputa do território da Caxemira, região norte do subcontinente indiano, de maioria muçulmana, que abriga as nascentes dos rios Ganges e Indo, principais fontes de recursos hídricos dos dois países. Essa região está, hoje, dividida entre Índia, Paquistão e China.

No cenário atual, a Índia é caracterizada como uma potência emergente, pois apresenta elevadas taxas de crescimento econômico e grande investimento no setor de Tecnologia da Informação (tê Í), sendo considerada em 2021 a sexta maior economia do mundo, segundo o Fundo Monetário Internacional (éfe ême í).

Essa prosperidade econômica, contudo, não se reflete em benefício para a maioria de sua população, pois a Índia é um dos países com maior taxa de desigualdade em distribuição de renda do mundo, segundo dados do Laboratório sobre Desigualdade Mundial de 2018, e muitos indianos vivem em condição de extrema pobreza.

Fotografia. No primeiro plano da imagem, moradias de baixa renda, inacabadas e sem manutenção. Ao fundo, grandes prédios.
Vista de Mumbai, na Índia. Foto de 2019. Na imagem é perceptível a presença de extremos sociais nos mesmos espaços.
Ícone. Ilustração de um símbolo de localização sobre um folheto aberto e em branco, indicando o boxe Se liga no espaço!

Se liga no espaço!

Responda no caderno.

Que aspecto representado no mapa motiva as tensões territoriais no subcontinente indiano?

A descolonização na África

Os processos de independência na África seguiram, grosso modo, caminhos semelhantes aos observados na Ásia. A emancipação dos territórios coloniais do Reino Unido ocorreu majoritariamente de fórma gradual e negociada entre 1957 e 1965.

Com exceção da independência das colônias do país na África Oriental Britânica (atuais Tanzânia, Quênia e Uganda), não houve enfrentamento significativo entre as fôrças locais e a metrópole. A estratégia de manter laços diplomáticos e econômicos com as ex-colônias resultou no fim do Império Britânico na África entre os anos de 1957 e 1965.

Na África Ocidental Francesa, a independência de países como o Marrocos, em 1956, a Tunísia, em 1956, e a Guiné, em 1958, ocorreu de fórma negociada e sem muitos enfrentamentos. Na Argélia, porém, a violenta guerra de independência entre o exército francês e a Frente de Libertação Nacional vitimou cêrca de trezentas mil pessoas. Após anos de confronto, a França assinou, em 1962, o Acordo de Evian, estabelecendo o cessar-fogo e uma votação popular que garantiu a independência da Argélia.

Conflitos violentos também ocorreram no Congo, de colonização belga, onde os movimentos de libertação, comandados por Patríce Lumúmba, obrigaram a retirada das fôrças de ocupação colonial em junho de 1960. Dezesseis outros países africanos alcançaram a independência em 1960, que ficou, em razão disso, conhecido como o Ano da África.

África: independência das colônias europeias – 1936-1990

Mapa. A descolonização da África, de 1936 a 1990. Destaque para o continente africano. Legenda. Verde escuro: de 1936 a 1955. Verde: de 1956 a 1957. Verde claro: de 1958 a 1960. Amarelo: de 1961 a 1970. Laranja claro: de 1971 a 197. Laranja escuro: de 1977 a 1980. Vermelho: Territórios dependentes. Cinza: Territórios não colonizados. No mapa. Colônias africanas que conquistaram a independência: de 1936 a 1955: Líbia, Egito; de 1956 a 1957: Marrocos, Tunísia, Sudão, Gana; de 1958 a 1960: Mauritânia, Senegal, Guiné, Costa do Marfim, Mali, Burkina Fasso, Níger, Chade, Nigéria, Togo, Benin, Camarões, República Centro-Africana, Gabão, Congo, Zaire, Somália, Madagascar; De 1961 a 1970: Argélia, Serra Leoa, Guiné Equatorial, Uganda, Quênia, Ruanda, Burundi, Tanzânia, Zâmbia, Malauí, Botsuana, Suazilândia, Lesoto, África do Sul; De 1971 a 1976:  Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Saara Ocidental, Seychellles, Comores, Gâmbia, Guiné-Bissau, Cabo Verde; De 1977 a 1990: Namíbia, Zimbábue, Djibut. Territórios dependentes: Ilha da Madeira, Ilhas Maurício. Territórios não colonizados: Etiópia, Libéria. No canto inferior esquerdo, rosa dos ventos e a escala de 0 a 750 quilômetros.

FONTE: dubí, G. Atlas historique mondial. Paris: Larousse, 2003. página 219.

A independência das colônias portuguesas

Na década de 1960, quando boa parte das colônias francesas e britânicas na África havia se tornado independente, nada parecia mudar nas colônias portuguesas. Territórios como os de Guiné-Bissau, Moçambique, Angola, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde foram os últimos a alcançar o státus de Estados independentes. Nesses locais, a luta por independência política se estendeu até meados dos anos 1970 e foi marcada por intensos e violentos conflitos, que chegaram a consumir até 40% do orçamento nacional português.

Para os portugueses, esses territórios eram estratégicos para a exploração das plantações de cana-de-açúcar, milho, café e amendoim e de recursos naturais, como o ferro e as valiosas minas de diamantes de Angola.

As rebeliões africanas contra a presença e o contrôle português eram frequentes. Em 1953, diante dos rumores de uma conspiração de trabalhadores em São Tomé, as tropas coloniais portuguesas mataram, segundo fontes locais, pelo menos mil trabalhadores. O episódio, conhecido como Massacre de Batepá, foi considerado um dos eventos fundadores do nacionalismo africano em território colonial português.

Para organizar o movimento nacionalista, na primeira metade dos anos 1950, formou-se em Lisboa o Centro de Estudos Africanos, liderado por um grupo de jovens universitários, como Amílcar Cabral, da Guiné-Bissau e de Cabo Verde, Agostinho Neto e Mário Pinto de Andrade, de Angola, e Francisco Tenreiro, de São Tomé e Príncipe.

Ilustração. PORTUGAL NÃO É UM PAÍS PEQUENO. Mapa da Europa com destaque para Portugal, na costa oeste. Em vermelho, sobrepostos a boa parte da Europa, os mapas de Angola, Moçambique e outros territórios africanos.
Gravura, produzida por volta de 1935, que compara o tamanho de Portugal ao de suas colônias na África.
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Portugal, durante todo o período que abrangeu o processo de emancipação política das colônias africanas, viveu sob o regime salazarista, vigente no país desde 1932, quando Antonio de Oliveira Salazar assumiu o poder. O govêrno de Salazar alinhava-se ao de Francisco Franco, na Espanha, ao da Itália fascista e ao da Alemanha nazista até o fim desses regimes.

Essa geração de intelectuais africanos formada no exílio ficou conhecida como a Geração de 50 e foi duramente perseguida pela polícia política do regime salazarista. Entre o final dos anos 1950 e o início da década de 1960, esses intelectuais retornaram para a África e lideraram movimentos de libertação em seus países de origem.

Em Angola, a resistência foi organizada sob a liderança de Agostinho Neto, que, em 1956, criou o Movimento Popular para a Libertação de Angola (ême pê éle a). Havia ainda dois outros agrupamentos políticos: a Frente de Libertação Nacional (éfe êne éle a), liderada por Ôlden Roberto, e a União Nacional para a Independência de Angola (Unita), liderada por Jonas Savímbi. Apesar da coexistência dos três grupos políticos, foi a ême pê éle a de Agostinho Neto que proclamou a República Angolana, em novembro de 1975.

Já em Moçambique, o movimento de libertação se fortaleceu em 1962, com a criação da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), sob a liderança de Eduardo Mondlane e Samôra Machél. Este se tornou o primeiro presidente moçambicano, em 1975, quando o país alcançou formalmente a independência. No mesmo período, entre 1974 e 1975, foi a vez de Guiné-Bissau e Cabo Verde se tornarem independentes.

Em Portugal, o salazarismo, desgastado pela mudança geopolítica ocorrida após o fim da Segunda Guerra Mundial, ficava cada vez mais enfraquecido e isolado internacionalmente com a ascensão dos movimentos pela independência na África.

O golpe fatal no colonialismo português no continente africano foi dado em 1974: em 25 de abril desse ano, um grupo de jovens oficiais das fôrças armadas – a maioria dos quais havia lutado nas guerras coloniais –, contando com forte apôio popular, derrubou o regime autoritário vigente, no episódio conhecido como Revolução dos Cravos. Essa revolução provocou grandes mudanças em Portugal e impulsionou ainda mais a luta pela emancipação das colônias. Após esse episódio e o fim da ditadura, o govêrno português renunciou à política colonial e reconheceu a independência das diversas colônias da África portuguesa.

Fotografia. Soldados de uniforme e chapéu. Tem cravos vermelhos nos bolsos dos uniformes e nos canos das armas.
Soldados com flores recebidas durante a Revolução dos Cravos, em Lisboa, Portugal. Foto de 1974.
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Durante os eventos que levaram ao fim do regime salazarista em Portugal, a população saiu às ruas de Lisboa portando cravos e distribuindo-os aos soldados. Essas flores se tornaram um dos principais símbolos da revolução.

Dica

LIVRO

Terra sonâmbula, de Mia Couto. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.

No Moçambique pós-independência, mergulhado em uma devastadora guerra civil, o velho Tuahir e o menino Muidinga empreendem uma viagem recheada de fantasias míticas.

A luta contra o apartheid na África do Sul

A África do Sul é uma nação plural, caracterizada pela diversidade cultural, religiosa, social e linguística. Você sabia que nesse país há onze línguas oficiais? Uma delas é o africânder, de matriz europeia. É desse idioma o termo apartheid. Inicialmente aplicado ao contexto específico sul-africano, hoje ele é utilizado de fórma mais ampla para designar fórmas de segregação em diversas épocas e lugares.

No fim do século dezenove, depois de vencer os colonos holandeses (boêres), que dominavam a região, o Reino Unido assumiu o contrôle e fundou, em 1910, a União Sul-Africana. Pouco tempo depois, britânicos e africâneres (descendentes de holandeses nascidos na África) se reconciliaram e fecharam o primeiro acordo para a criação de leis segregacionistas contra a população negra, mestiça e asiática. Pelo Native Land Act (“Lei de Terras Nativas”), aprovado em 1913, aproximadamente 90% das terras disponíveis ficaram sob contrôle da minoria branca.

Os negros eram vistos por essa elite branca como obstáculos ao que ela entendia como progresso da civilização. Esse pensamento racista passou a fazer parte das leis do país a partir de 1948. Com a chegada ao poder do Partido Nacional, a África do Sul desenvolveu uma das políticas de discriminação mais violentas que o mundo conheceu.

Entre as diversas medidas tomadas então pelo govêrno estavam:

  • a proibição da participação política de negros, que foram impedidos de votar e de se candidatar a cargos públicos;
  • a obrigação de negros viverem em bairros separados dos brancos ou nos chamados bantustões (reservas tribais);
  • a obrigação de trabalhadores negros possuírem autorização para circular nas áreas reservadas aos brancos sul-africanos;
  • a proibição de casamentos inter-raciais;
  • o uso separado de espaços públicos, como praias, bibliotecas, parques, escolas e sistemas de transporte.
Fotografia em preto e branco. No primeiro plano, mulheres negras em um protesto. Carregam diversos cartazes com dizeres e palavras de ordem.
Sul-africanas protestando na Cidade do Cabo contra a obrigação de portar cartões de identificação, chamados pass law, que funcionavam como uma espécie de ficha policial. Foto de 1956.
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A Lei do Passe (no inglês, pass law) obrigava homens e mulheres negros sul-africanos a portar um documento semelhante a um passaporte. Nele, havia um conjunto de informações pessoais – fotografia, impressões digitais, endereço residencial – e profissionais – nome do empregador e da empresa de trabalho, tempo de serviço etcétera O documento funcionava como um mecanismo de contrôle indicando os lugares em que esses indivíduos poderiam circular. Muitos sul-africanos violavam os limites espaciais estabelecidos nesses documentos, à procura de emprego ou de ajuda médica para seus familiares. No entanto, ao fazerem isso, podiam ser presos ou assediados por autoridades locais. Nos cartazes estão escritas as frases: “Mulheres não querem passes”, “Com passes, nós somos escravas”, “Unidas contra a Lei do Passe” e “A Carta da Liberdade diz: abaixo a Lei do Passe”.

O endurecimento da segregação e do contrôle sobre a população não branca, com a criação de leis que vedavam direitos básicos aos negros, foi sempre acompanhado de muita contestação e resistência.

As primeiras manifestações contra as leis de segregação foram organizadas pelo Congresso Nacional Africano (cê êne á), partido que liderava atos de desobediência civil e resistência pacífica.

A África do Sul era independente desde a década de 1930, mas ainda reconhecia o monarca do Reino Unido como soberano. Isso mudou na década de 1960, quando foi proclamada a república. Com isso, o país radicalizou ainda mais seu regime de apartheid, o que levou também à intensificação dos movimentos de resistência. Nesse período, o Congresso Pan-Africano, cujo lema era “África para os africanos”, fortaleceu-se e passou a organizar várias campanhas de desobediência civil. Homens e mulheres negros passaram, por exemplo, a frequentar espaços proibidos, desrespeitando as leis racistas do país. Esses atos foram reprimidos, boa parte das vezes, com extrema violência.

Um dos líderes do cê êne á, o jovem advogado Nelson Mandéla, foi detido em 1962. Condenado à prisão perpétua por sua participação nos movimentos de resistência ao apartheid ele se tornou um dos principais símbolos da luta contra o racismo e a segregação na África do Sul. Mandela permaneceu preso até 11 de fevereiro de 1990, quando o cê êne á promoveu uma campanha, com forte apôio da opinião pública internacional, por sua libertação. Mandéla tinha então 72 anos.

Fotografia. Vista da entrada de uma cela. A porta é de grade e tem uma janela com grades. Dentro um pano no chão e um travesseiro.
Cela de Nelson Mandéla no presídio de segurança máxima em Robben Island, África do Sul. Foto de 2016.
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Mandéla ficou encarcerado no presídio de segurança máxima na ilha de Robben Island por dezoito anos. O local fica a aproximadamente 20 minutos de barco da Cidade do Cabo e hoje é visitado por turistas do mundo todo, que recebem dos guias, alguns deles ex-detentos do local, informações sobre o regime do apartheid e o cotidiano no presídio.

Na época, o país era governado por Frêderric Vílem de Clérc, que, ao tomar posse, em 1989, havia prometido promover a conciliação nacional. Em 1992, ele convocou um plebiscito, no qual a população decidiu pelo fim do Apartháide. No ano seguinte, Mandéla e De Clérc receberam o Prêmio Nobél da Paz.

Em 1994, foram convocadas eleições multirraciais na África do Sul e Mandéla foi eleito presidente com 62% dos votos válidos.

Fotografia. No primeiro plano, Nelson Mandela, senhor negro, sorridente. Saudando uma multidão com o braço direito estendido para cima e o punho cerrado. Atrás dele dois homens.
Nelson Mandéla na Cidade do Cabo, África do Sul. Foto de 1995. 

Desafios da África contemporânea

A dominação colonial e a descolonização deixaram marcas no continente africano que perduram até os dias de hoje. Em muitos países, por exemplo, as rivalidades entre lideranças e grupos locais se intensificaram no processo de emancipação, ocasionando diversas guerras civis.

Além disso, uma vez independentes, os Estados africanos tiveram de lidar com uma série de problemas, como a fragmentação político-territorial, o subdesenvolvimento econômico e a exploração de suas riquezas naturais por empresas estrangeiras.

Em razão desses e de outros fatores, o Produto Interno Bruto (Píbi) total da África corresponde a 1% do Píbi mundial. Esse cenário tem sido determinante na ampliação dos fluxos migratórios em direção aos países da Europa e aos Estados Unidos. Diante do número de africanos que têm deixado seus países de origem, muitos especialistas afirmam que está ocorrendo uma nova diáspora africana.

Com o objetivo de combater esses problemas foi formada, em 2002, na cidade de Durban, na África do Sul, a União Africana. Essa organização internacional é composta de 55 Estados comprometidos com a integração continental em diferentes áreas, como a política, a econômica e a cultural.

Os países da União Africana se esforçam para criar um Parlamento Pan-Africano e um sistema financeiro próprio, com instituições como o Banco Central Africano, além de promover a democracia e a defesa dos direitos humanos no continente.

Fotografia aérea. Vista de cidade com muitos prédios, de tamanhos variados e longas avenidas.
Centro financeiro da cidade de Joanesburgo, na África do Sul. Foto de 2019.
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Pense por um momento nas informações que você tem sobre a África. Nos filmes, nas histórias em quadrinhos, nos seriados de tê vê e nos noticiários, o continente é representado sempre como um local exótico, com animais selvagens e uma população assolada pela fome, por epidemias, por guerras e por governos opressores. Em muitos filmes, os países do continente africano são representados majoritariamente como lugarejos e aldeias, reforçando a lógica de uma organização política primitiva. Como é possível notar na imagem, porém, a África é um continente plural, com diversas paisagens, que incluem grandes cidades.

Agora é com você!

Responda no caderno.

  1. O que foi o movimento dos países não alinhados? Qual é a relação entre esse movimento e o chamado terceiro-mundismo?
  2. Qual foi o impacto da Segunda Guerra Mundial na luta contra a dominação colonial na Ásia e na África?
  3. Resuma a importância dos movimentos artísticos e intelectuais do pan-africanismo e da negritude.
  4. De que fórma ocorreu o processo de independência da Índia?

Analisando o passado

A seguir, são reproduzidos trechos de uma palestra, feita pela escritora nigeriana chimamanda adiqui em 2009, que mais tarde se transformou no livro O perigo de uma história única. Leia o texto e depois faça o que se pede.

“SOU UMA CONTADORA DE HISTÓRIAS. Gostaria de contar a vocês algumas histórias pessoais sobre o que eu gosto de chamar de ‘o perigo de uma história única’. reticências

Sou de uma família nigeriana convencional, de classe média. Meu pai era professor universitário e minha mãe era administradora. Tínhamos, como era comum, empregados domésticos que moravam em nossa casa e que, em geral, vinham de vilarejos rurais próximos. No ano em que fiz oito anos, um menino novo foi trabalhar lá em casa. O nome dele era Fáide. A única coisa que minha mãe nos contou sobre ele foi que sua família era muito pobre. Minha mãe mandava inhames, arroz e nossas roupas velhas para eles. Quando eu não comia todo o meu jantar, ela dizia: ‘Coma tudo! Você não sabe que pessoas como a família de Fide não têm nada?’. E eu sentia uma pena enorme deles.

Certo sábado, fomos ao vilarejo de Fáide fazer uma visita. Sua mãe nos mostrou um cesto de palha pintado com uns desenhos lindos que o irmão dele tinha feito. Fiquei espantada. Não havia me ocorrido que alguém naquela família pudesse fazer alguma coisa. Eu só tinha ouvido falar sobre como eram pobres, então ficou impossível para mim vê-los como qualquer coisa além de pobres. A pobreza era minha história única deles.

Anos depois, pensei nisso quando saí da Nigéria para fazer faculdade nos Estados Unidos. Eu tinha dezenove anos. Minha colega de quarto americana ficou chocada comigo. Ela perguntou onde eu tinha aprendido a falar inglês tão bem e ficou confusa quando respondi que a língua oficial da Nigéria era o inglês. Também perguntou se podia ouvir o que chamou de minha ‘música tribal’, e ficou muito decepcionada quando mostrei minha fita da Maraia Kéuri. Ela também presumiu que eu não sabia como usar um fogão.

O que me impressionou foi: ela já sentia pena de mim antes de me conhecer. Sua postura preestabelecida em relação a mim, como africana, era uma espécie de pena condescendente e bem-intencionada. Minha colega de quarto tinha uma história única da África: uma história única de catástrofe. Naquela história única não havia possibilidade de africanos serem parecidos com ela de nenhuma maneira; não havia possibilidade de qualquer sentimento mais complexo que pena; não havia possibilidade de uma conexão entre dois seres humanos iguais.”

Adichie, C. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. página 11, 14-17.

Responda no caderno.

  1. Segundo os argumentos utilizados por chimamanda adiqui, por que o cesto feito pela família de Fáide surpreendeu-a?
  2. De que maneira essa surpresa de Adichie explica o que ela chama de “história única”?
  3. De que fórma “o perigo de uma história única” se fez presente na vida de chimamanda adiquinos Estados Unidos?
  4. Em outro trecho dessa palestra, a escritora afirmou que a “consequência de uma única história é esta: ela rouba das pessoas sua dignidade”. Levando em consideração os temas estudados no capítulo, explique o significado dessa declaração.

Atividades

Responda no caderno.

Organize suas ideias

  1. Analise as afirmações a seguir. Todas dizem respeito aos conflitos no Oriente Médio envolvendo fôrças árabes palestinas e israelenses. Em seguida, identifique, no caderno, as verdadeiras e as falsas.
    1. Em razão dos diversos conflitos no Oriente Médio, foi criada, em 1964, a ó éle pê, cujo principal líder foi Iásser Arafát.
    2. O plano de partilha da Palestina, proposto pela ônu em 1947, foi aceito pelos árabes palestinos e refutado por israelenses, que, unilateralmente, proclamaram o Estado de Israel em 1948.
    3. Em 2018, o então presidente dos Estados Unidos, dônald tramp, reconheceu Jerusalém, objeto de disputa entre palestinos e israelenses, como a capital de Israel, transferindo a embaixada estadunidense para lá. O episódio foi o estopim para novos enfrentamentos, nos quais morreram 55 pessoas e pelo menos duas mil ficaram feridas.
    4. Em 1993, as negociações de paz avançaram na região e deram origem ao Acordo de Oslo, intermediado pelo então presidente dos Estados Unidos, bil clínton. Desde então, a convivência pacífica entre palestinos e judeus tem se fortalecido como política de Estado em ambos os lados.
  2. Sobre a independência da Índia, identifique, no caderno, as alternativas corretas.
    1. O processo de divisão política do subcontinente indiano no século vinte causou um enorme deslocamento populacional.
    2. Uma das fórmas de resistência indiana foi a de não colaboração com o colonizador, deixando de pagar impostos e boicotando produtos britânicos.
    3. O Reino Unido tentou impedir a independência, mas mudou de opinião com o crescimento do poder muçulmano na região, passando a apoiar os hindus.
    4. Atualmente, a Índia é um país rico, com igualdade na distribuição de renda entre a população, diferentemente do Paquistão, em que a distribuição de renda é muito desigual.

Aprofundando

3. (éfe gê vê-Rio de Janeiro – adaptado)

“A Palestina é nossa inesquecível pátria histórica. Só escutar seu nome resulta numa evocação poderosamente comovedora para nosso povo. Se Sua Majestade o Sultão nos concedesse a Palestina, nos comprometeríamos a sanear as finanças da Turquia. Para a Europa, formaríamos ali parte integrante do baluarte contra a Ásia: constituiríamos a vanguarda da cultura em seu combate contra a barbárie. Como Estado neutro, manteríamos relações com toda a Europa que, por sua parte, teria que garantir nossa existência reticências Nossa gente há de emigrar em grupos. Em grupos de famílias e de amigos. Ninguém está obrigado a juntar-se com o grupo do lugar em que tem vivido até agora reticências Possivelmente alguém opinará que existirá um enorme inconveniente por não possuirmos um idioma em comum. Temos de falar hebraico entre nós? Quem de nós sabe suficiente hebraico para pedir um bilhete de trem? reticências Apesar de tudo, o assunto é muito simples. Cada um conserva o seu próprio idioma, que é a pátria de seus pensamentos. A Suíça constitui um exemplo definitivo da possibilidade de um federalismo linguístico reticências O idioma que resulte mais útil na vida cotidiana se imporá, sem violência, como idioma principal.”

Rêrzel, Tê. La cuestón rudía. In: VIDAL, C. Textos para la Historia del pueblo judio Madri: Cátedra, 1995. página 259-260.

O texto citado foi publicado na Europa em 1890. Após a leitura, responda às questões propostas.
  1. A qual grupo étnico e religioso o texto faz referência?
  2. Em qual período histórico as reivindicações de téodor rérs (autor do texto) foram atendidas? Caracterize o contexto em que se deu a criação desse Estado.

4. No texto citado, que faz parte de um projeto iniciado, em 1964, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (unêsco) sobre a história da África, a Segunda Guerra Mundial é relacionada à política do apartheid na África do Sul. Leia-o e faça o que se pede.

“Em relação à questão racial na África Austral, podemos afirmar que a sub-região apresenta-se como o último grande campo de batalha do confronto racial no continente. Mas, como pano de fundo da evolução desta região africana, dissimula-se uma tragédia mundial, a estranha história da reencarnação de um demônio político. Se os anos compreendidos entre 1935 e 1945 marcaram o sucesso de uma luta mundial contra o fascismo e a perseguição racial na Europa, o ano de 1948 representa um marco no avanço de uma nova fórma de fascismo e de perseguição racial na África, modalidade esta que receberia o nome de apartheid Com a derrota de Rítler e de Mussolini, na primeira metade dos anos 1940, a ‘supremacia ariana’ e a política do genocídio haviam conhecido o revés decisivo na Europa. Em contrapartida, no ano de 1948, o triunfo do Nationalist Party, na África do Sul, foi uma vitória para a ‘supremacia branca’ e favoreceu a concretização de um genocídio no sul da África. O ritlerismo reencarnava-se em solo africano. ‘O Fuhrer está morto! Viva o Fuhrer!’

É evidente que os africanos não aceitariam este renascimento com resignação. A cruzada armada final contra o ‘fascismo’ e o ‘nazismo’, travada à época, reveste-se de um particular significado, associando a luta contra o apartheid à ação, todavia inconclusa, da Segunda Guerra Mundial.”

Mas rúi, A. A.; Uôndí, C. (edição). África desde 1935. segunda edição Brasília: unêsco, 2010. volume oito, página 297. (Coleção História Geral da África).

  1. Explique este trecho do texto: “O Fuhrer está morto! Viva o Fuhrer!”.
  2. O que foi a política do apartheid na África do Sul?
  3. De acordo com o texto, os africanos não aceitaram essa política resignadamente. Cite e explique um movimento de resistência ao apartheid na África do Sul.

5. Em abril de 2019, uma foto postada nas redes sociais do professor e ativista ugandês Milton Alimádi viralizou. Nela, o professor de história africana radicado nos Estados Unidos, em visita ao Reino Unido, colocou-se na figura do colonizador. Nomeando o Tâmisa, em Londres, de Rio Gulú, Alimádi propôs uma espécie de descobrimento às avessas. Sua ironia trouxe à tona uma discussão muito importante no continente africano: qual deve ser o espaço ocupado pela memória colonial? É importante entender que nomear significou tomar posse, pois há diferenças entre quem nomeia (aquele que domina) e quem é nomeado (aquele que é dominado). Assim, a presença europeia em continentes como a América, a Ásia e a África se fez à custa de um processo de encobrimento dos povos originários e de suas tradições, culturas, línguas e subjetividades. Refletindo sobre o ato do professor e o que você estudou neste capítulo, escreva um texto argumentativo dissertativo sobre o tema: “Por que a mudança dos nomes pode ser um gesto de descolonização”. Para enriquecer seu texto, pesquise nomes de países africanos que mudaram após o processo de independência, relacionando essa mudança à criação de uma identidade africana pós-colonial.