APRESENTAÇÃO

Talvez não haja educador que não tenha ouvido a seguinte pergunta de um aluno: “Por que preciso saber isso?”. A questão causa embaraço, mas temos muito a ganhar se a encararmos em vez de nos desviarmos dela. Afinal, por que ensinamos história? O que queremos desenvolver nos alunos? Certamente, esperamos que o aprendizado deles vá muito além da mera e estéril memorização de informações. Buscamos, acima de tudo, ajudar a formar cidadãos conscientes e responsáveis, capazes de agir eticamente em sociedade, e, com isso, contribuir para a construção das bases necessárias à consolidação de nossa jovem democracia. Trata-se, claro, de uma missão complexa.

O desafio é grande porque precisamos não só estabelecer estratégias de trabalho que dialoguem com alunos de diferentes perfis como também acompanhar as mudanças da legislação educacional, lidando com condições de trabalho que nem sempre são as mais adequadas (excesso de afazeres dentro e fóra da sala de aula, baixa remuneração, falta de recursos materiais nas escolas, entre outros problemas).

Considerando esse cenário, desenvolvemos esta coleção tendo em vista dois propósitos: aproximar os alunos dos temas apresentados estabelecendo relação entre o conteúdo abordado e a atualidade, com uma linguagem acessível, e oferecer aos professores subsídios para o trabalho em classe, como sugestões de práticas e estratégias. Esperamos, assim, que o processo de ensino-aprendizagem seja uma experiência significativa para todos.

Bom trabalho!

ORGANIZAÇÃO DESTE MANUAL

Organizado em duas partes (as orientações gerais da coleção e as específicas de cada volume), este manual tem o objetivo de apresentar a proposta e a estrutura da coleção, além de fornecer subsídios teóricos e práticos para o trabalho do professor em sala de aula. Conheça sua organização.

Orientações gerais

Expõem a estrutura do material de apôio ao professor; trazem reflexões sobre a história como área de pesquisa e componente curricular e sobre a prática docente. Também incluem as opções teóricas e metodológicas da coleção e como se realizam no livro do aluno, além de possibilidades e instrumentos para as avaliações e sugestões de gestão de sala de aula.


Páginas de livro. Destaque para as Orientações Gerais.
Página de livro. Destaque para o quadro Planejamento de aulas em conjunto.
Páginas de livro. Destaque para o esquema representando Temas Contemporâneos Transversais na Base Nacional Comum Curricular.
Páginas de livro. Destaque para o tópico A organização da coleção.

Orientações específicas

Nesta parte, são apresentados quadros que sintetizam de fórma organizada como as competências e habilidades da Bê êne cê cê são contempladas em cada um dos volumes da coleção, textos de aprofundamento para o professor, sugestões de consulta contextualizadas e, ao redor da reprodução das páginas do livro do aluno, a parte específica com comentários e sugestões para o trabalho em classe. Veja a seguir.


Página de livro. Destaque para as Orientações específicas.

Informa as Competências gerais da Educação Básica, as específicas de Ciências Humanas e as de História priorizadas em cada capítulo, além dos temas contemporâneos transversais abordados.


Páginas de livro. Destaque para o quadro Objetos de conhecimento e habilidades do nono ano.

Apresenta o quadro de objetos de conhecimento e habilidades da Bê êne cê cê para cada ano, assim como sua correspondência ao longo dos capítulos do respectivo volume.


Página de livro. Destaque para o quadro Sugestões de cronograma.

Propõe sugestões de cronograma, subsidiando o planejamento das aulas.


Página de livro. Destaque para o tópico Textos de aprofundamento.

Apresenta uma seleção de textos relacionados a alguns temas estudados no volume para dar subsídios teóricos ao trabalho do professor.


Página de livro. Destaque para o tópico Sugestões de consulta.

Disponibiliza sugestões contextualizadas de livros, artigos, sites, filmes e podcasts para aprofundar os temas estudados ao longo do volume.

Páginas de livro. Destaque para a reprodução do livro do estudante com abertura de unidade e orientações para o professor ao redor da reprodução.

Junto às páginas de abertura de cada unidade, há comentários e orientações que subsidiam a introdução do que será estudado e a justificativa da pertinência dos objetivos de cada um dos capítulos que a compõem.


Página de livro. Destaque para a reprodução do livro do estudante com abertura de capítulo e orientações para o professor com habilidades da Base Nacional Comum Curricular e objetivos de estudo ao redor da reprodução.

Junto às páginas de abertura de cada capítulo, há a indicação das habilidades da Bê êne cê cê e os objetivos de estudo contemplados, além de sugestões para a abordagem da imagem, do texto e das questões da abertura, oferecendo estratégias de trabalho para o levantamento dos conhecimentos prévios e o envolvimento dos alunos neste momento inicial do estudo do capítulo.


Páginas de livro. Destaque para as reproduções do livro do estudante com os boxes Recapitulando, Refletindo sobre e Explore, as seções Leitura complementar e Enquanto isso, e orientações para o professor com respostas das questões, comentários e destaques da Base Nacional Comum Curricular ao redor das reproduções.

Ao longo dos capítulos, são apresentados respostas, comentários e destaques da Bê êne cê cê em relação às questões dos boxes e seções.

Página de livro. Destaque para a reprodução do livro do estudante com texto didático e orientações para o professor com sugestões de abordagem e de atividade complementar ao redor da reprodução.

Comentários com sugestões de abordagem e atividades complementares oferecem estratégias opcionais para a exploração dos temas em classe.


Página de livro. Destaque para a reprodução do livro do estudante com texto didático e orientações para o professor com trecho de artigo acadêmico ao redor da reprodução.

Trechos de artigos acadêmicos, notícias e textos historiográficos, além das indicações de como os temas abordados estão relacionados às competências e às habilidades da Bê êne cê cê, dão subsídios para o trabalho do professor no desenvolvimento dos conteúdos.


Páginas de livro. Destaque para a reprodução do livro do estudante com a seção atividades e orientações para o professor com respostas, comentários e indicações de conteúdos interdisciplinares ao redor da reprodução.

Respostas, comentários e indicações de conteúdos interdisciplinares estão disponíveis nas páginas de atividades.


Páginas de livro. Destaque para a reprodução do livro do estudante com a seção Fazendo e aprendendo e orientações para o professor ao redor da reprodução.

A justificativa das propostas da seção “Fazendo e aprendendo”, sua relação com a Bê êne cê cê e as orientações de trabalho também são apresentadas.

SUMÁRIO

ORIENTAÇÕES GERAIS X

1. Material de apoio ao professor dez

Manual para o professor dez

2. A história como área de pesquisa: diferentes correntes historiográficas dez

O materialismo histórico dez

A História Social Inglesa dez

A Escola dos Annales onze

A História Cultural onze

A historiografia nacional doze

As opções desta coleção treze

3. A natureza do saber histórico treze

O historiador e o uso das fontes catorze

História e memória catorze

Realidade e representação quinze

4. Por que ensinamos história? quinze

Consciência histórica e a história como componente curricular escolar quinze

História e cidadania dezesseis

Diversidade, tolerância e promoção da cultura de paz dezessete

5. A história na sala de aula dezessete

O ensino de história e a produção acadêmica dezoito

Habilidades e competências dezoito

Os alunos no centro do processo de ensino-aprendizagem dezenove

Ensinar história vinte e três

O ensino de história da África, da cultura afro-brasileira e das populações indígenas vinte e três

Tempo, memória e fontes vinte e três

Ensino de história e interdisciplinaridade vinte e cinco

O ensino de história e as novas tecnologias vinte e seis

Dinamismo e flexibilidade nas aulas vinte e oito

Avaliação: processos e concepções vinte e oito

Formas de abordagem da coleção trinta

6. A sala de aula para além da história trinta

Gestão do tempo de aula trinta e um

Gestão do espaço físico trinta e dois

Gestão do espaço para a aplicação de testes e provas trinta e dois

Organização para apresentação de material audiovisual trinta e três

Gestão do uso do celular em sala de aula trinta e quatro

Gestão de conflitos em sala de aula trinta e quatro

Orientações para uso crítico de material disponível na internet trinta e seis

7. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) trinta e seis

As Ciências Humanas na BNCC trinta e sete

A história na BNCC trinta e oito

O ensino de história nos anos finais do Ensino Fundamental trinta e nove

A BNCC na coleção quarenta

8. A organização da coleção quarenta e um

9. Bibliografia consultada quarenta e três

ORIENTAÇÕES ESPECÍFICAS XLVI

1. Introdução quarenta e seis

2. A BNCC neste volume quarenta e seis

Competências e temas contemporâneos transversais quarenta e seis

Objetos de conhecimento e habilidades do 9º ano quarenta e sete

3. Sugestões de cronograma cinquenta

4. Textos de aprofundamento cinquenta e dois

A crise do Encilhamento cinquenta e dois

Greves operárias no início do século XX cinquenta e três

A Primeira Guerra na África cinquenta e quatro

O socialismo por decreto no mundo soviético cinquenta e cinco

O totalitarismo e as massas cinquenta e seis

A Segunda Guerra Mundial na experiência de Eric Hobsbawm cinquenta e oito

O que trouxe de novo o Estado Novo? cinquenta e nove

Estado Unidos e União Soviética na “era dos extremos” sessenta

Desafios da África pós-colonial sessenta e dois

Jânio Quadros, o Congresso Nacional e o exército sessenta e três

A diplomacia brasileira durante o regime militar sessenta e quatro

Movimentos de 1968 sessenta e seis

Tancredo Neves e a articulação das elites sessenta e sete

O fim da Guerra Fria e o fim de uma era sessenta e oito

O Plano Real sessenta e nove

5. Sugestões de consulta setenta

6. Início do livro do estudante 1

Unidade 1 – Brasil e mundo na aurora do século XX 10

Capítulo 1 – A Primeira República no Brasil 12

Capítulo 2 – Cotidiano e cultura na Primeira República 25

Capítulo 3 – A Primeira Guerra Mundial 38

Capítulo 4 – A Revolução Russa 59

Unidade 2 – Totalitarismo, autoritarismo e guerra 78

Capítulo 5 – A crise do capitalismo e a ascensão do nazifascismo 80

Capítulo 6 – A Segunda Guerra Mundial 97

Capítulo 7 – O primeiro governo Vargas e o Estado Novo (1930-1945) 115

Unidade 3 – A Guerra Fria e seus desdobramentos 136

Capítulo 8 – A Guerra Fria 138

Capítulo 9 – A descolonização na África e na Ásia 158

Capítulo 10 – O Brasil entre duas ditaduras 174

Capítulo 11 – Experiências ditatoriais na América Latina e a ditadura civil-militar no Brasil 193

Unidade 4 – A construção do mundo contemporâneo 218

Capítulo 12 – Movimentos sociais e culturais da década de 1960 220

Capítulo 13 – A redemocratização na América do Sul 233

Capítulo 14 – Fim da Guerra Fria e os desafios do século XXI 248

Capítulo 15 – O Brasil depois da Constituinte de 1988 272

ORIENTAÇÕES GERAIS

1. Material de apôio ao professor

Manual para o professor

Organizado em duas partes, este manual tem o objetivo de apresentar a coleção e fornecer subsídios teóricos e práticos para o trabalho do professor em sala de aula.

Parte um – Orientações gerais

Na primeira parte, refletimos brevemente sobre a história como área de pesquisa, explicitando as opções teórico-metodológicas da coleção, fazemos uma exposição sobre o ensino de história considerando a Base Nacional Comum Curricular (Bê êne cê cê), o uso de metodologias ativas e o protagonismo juvenil, refletimos sobre a avaliação, sugerimos fórmas de gestão de sala de aula com o objetivo de contribuir com a prática docente e apresentamos a estrutura da coleção.

Parte dois – Orientações específicas

Na segunda parte, encontram-se as orientações específicas de cada volume: indicamos a relação dos conteúdos estudados com os respectivos objetos de conhecimento e habilidades da Bê êne cê cê; apresentamos abordagens que colaboram para o desenvolvimento das Competências gerais da Educação Básica e das Competências específicas de Ciências Humanas e de História e dos temas contemporâneos transversais; apresentamos sugestões de cronograma, textos de aprofundamento e sugestões contextualizadas de consulta complementar, que podem subsidiar o trabalho docente com os assuntos tratados em cada volume; e oferecemos propostas para o encaminhamento de atividades, assim como as respostas às questões do livro do aluno e comentários e citações que podem auxiliar no desenvolvimento das aulas, além de sugestões para a realização de atividades complementares. As orientações específicas estão inseridas ao redor da reprodução da respectiva página do livro do aluno para facilitar a consulta e, consequentemente, ajudar o docente em sala de aula.

2. A história como área de pesquisa: diferentes correntes historiográficas

Atualmente, a história é entendida como um campo de tensões e contradições no qual pessoas comuns, ocupando diferentes lugares na sociedade e com distintos pontos de vista, buscam pôr em prática projetos muitas vezes conflitantes. A própria historiografia – quer dizer, a produção científica da história – carrega consigo as marcas do seu tempo, sendo compreendida como resultado dessas tensões.

É longa a trajetória teórico-metodológica que produziu esse entendimento do conhecimento histórico. As correntes teóricas surgiram de demandas do momento em que foram criadas e procuraram, com diferentes métodos, chegar a uma compreensão mais ampla dos processos históricos.

Como resultado das reflexões de diversos pensadores ao longo do tempo, houve uma profunda renovação dos temas, dos problemas, das abordagens e dos objetos da história. Visitemos, brevemente, as linhas de estudo mais influentes na atualidade.

O materialismo histórico

Até o final do século dezenove e o início do vinte, predominou a visão positivista, que resumia a história às narrativas descritivas de fatos do passado, sobretudo dos feitos dos grandes líderes políticos e militares, considerados figuras heroicas.

Essa concepção de história começou a ser contestada em meados do século dezenove. A consolidação e a expansão do capitalismo na Europa foram acompanhadas pela crescente desigualdade social e econômica, o que fomentou as críticas à sociedade burguesa e estimulou o desenvolvimento de alternativas políticas e de novas fórmas de interpretar a dinâmica social. Entre elas, a mais influente foi o materialismo dialético de cál marcs e fréderique ênguels, cuja aplicação à interpretação da história originou o chamado materialismo histórico. Por meio desse método, buscou-se explicar a realidade social partindo das condições concretas da existência e das contradições engendradas por elas.

Analisando a dinâmica do mundo industrializado a partir dos antagonismos entre o trabalho e o capital, márks projetou a eclosão da revolução socialista, que instauraria a ditadura do proletariado. márks acreditava que, depois de assumir o contrôle sobre os meios de produção, os trabalhadores fundariam uma nova organização social, política e econômica que ele chamou de comunismo.

Apesar de dividir opiniões, as teorias e ideias marxistas ainda influenciam muitos estudiosos na atualidade.

A História Social Inglesa

Também conhecida como Escola Marxista Inglesa, essa corrente se desenvolveu em meados do século vinte, a partir das críticas aos rumos que o socialismo tinha tomado na antiga União Soviética. Mesmo depois de romper com o Partido Comunista Britânico, na década de 1950, um grupo de historiadores manteve, em linhas gerais, a defesa do socialismo e do modêlo marxista de análise das sociedades. Podemos destacar, dentre eles, éduard pálmer tompson, Érik Robsbaum, crístofer ril, ródini rílton e péry énderson.

Para esses estudiosos, a história não tem uma determinação de causas que se possa apreender por meio de leis rígidas, por isso o objeto de estudo histórico deve abarcar não somente as estruturas sociais, econômicas e políticas, mas também os aspectos culturais e a experiência vivida pelos seres humanos. É a chamada “história vista de baixo”, uma perspectiva de estudo que busca inserir as pessoas comuns na história e construir uma nova significação para a categoria de classe social. Os trabalhos vinculados à Escola Social Inglesa são referência para estudantes, professores e historiadores de todo o mundo. Entre as principais obras destacam-se A Revolução Inglesa de 1640, de crístofer ril, e A formação da classe operária inglesa, de Éduardi Tômpson.

A Escola dos Annales

Na França, nas primeiras décadas do século vinte, os pesquisadores lúciã févr e Marc Blok elaboraram uma crítica à história factual e política praticada pelos positivistas, incapaz, segundo eles, de explicar, particularmente, a crise geral que se instalou na Europa com o fim da Primeira Guerra Mundial.

Pretendendo ir além da história empírica, propuseram uma análise historiográfica mais abrangente, feita com a colaboração dos aportes de outras áreas, como a geografia e a sociologia. Ao mesmo tempo, puseram em discussão a neutralidade do historiador, expondo os referenciais que embasavam suas pesquisas. Eles também foram responsáveis pela ampliação do conceito de fonte histórica, estendendo-o a todo vestígio da ação humana no tempo, como gravuras, vestimentas, utensílios domésticos, fotografias etcétera

Na continuidade das pesquisas desenvolvidas pela Escola dos Annales, a história política acabou perdendo espaço para a história econômica e social. Também ganharam relevância os estudos interdisciplinares e a preocupação com a dimensão psicológica dos acontecimentos históricos, a qual originaria mais tarde a história das mentalidades.

Fotografia. Ambiente com parede e chão de pedras. No chão há alguns objetos com cor de ferrugem como uma grande bateia e uma pequena jarra, além de algumas plantas. Na parede há um quadro com fotografia em preto e branco de dois homens, um deles está deitado de barriga para baixo e o outro está sentado. Ambos olham para cima.
Fotografia e objetos utilizados no garimpo em exposição na Galeria Arte e Memória, antiga vila do Xique-Xique de Igatu ocupada por garimpeiros, em Andaraí, Bahia. Foto de 2021. Com a ampliação do conceito de fonte histórica, surgiram novos estudos, abordando temas antes esquecidos pela historiografia.

A segunda geração da Escola dos Annales foi liderada por fernã brôdél, após a Segunda Guerra Mundial. Ele retomou a categoria de tempo como estrutura da análise histórica e a dividiu em três dimensões: a história dos indivíduos e da política, que é a de curta duração; a história conjuntural, cíclica, da economia de mercado, isto é, a de média duração; e na base, sustentando todo o restante, a história das estruturas da sociedade, ou seja, a de longa duração. Com isso, Brôdél procurou demonstrar que apenas uma análise abrangente da sociedade, por meio do diálogo com outros campos de estudo, era capaz de dar conta dos vários fios que compõem a trama social da história.

A terceira geração da Escola dos Annales começou a se estruturar no fim da década de 1960. Os historiadores da chamada Nova História defendiam que não havia uma totalidade que pudesse ser apreendida nem uma categorização capaz de dar conta das várias temporalidades, por isso era preciso buscar a articulação dos diferentes problemas e objetos da história. Tal visão refletia a descrença nos grandes modelos explicativos elaborados nas décadas de 1960 e 1970 e substituía a pretensão de fazer uma história total por uma história fragmentada, que resultou em uma ampliação de temáticas e de estudos, bem como numa maior intersecção entre a história e outros campos de estudo. Assim, nos trabalhos da terceira geração da Escola dos Annales, novos grupos ganharam destaque, como as mulheres e as crianças, e muitos temas antes ignorados, que não eram vistos como matéria digna de análise científica, tornaram-se relevantes para os estudos historiográficos, como a alimentação, a morte, o vestuário, a sexualidade e a moda, entre outros. Entre os historiadores mais destacados dessa geração estão emanuél lo rói ladurrí, márc ferrô, Jaques Le Gófi, Gêórge Dubí e Filíparriés.

Na década de 1980, a Nova História foi alvo de muitas críticas, entre elas a de que havia perdido os referenciais que até então tinham balizado os estudos historiográficos e a de que havia diluído a memória nacional. Alguns historiadores, como piérre norrá, começaram a resgatar o valor da memória, estudando os vestígios de fatos, símbolos e lugares do passado que, permanecendo na memória coletiva, criam laços de identidade e um sentimento de pertencimento a uma comunidade.

A História Cultural

A História Cultural deu importantes contribuições à renovação historiográfica contemporânea. Embora seja geralmente identificada com a Escola dos Annales ou com a Nova História, a História Cultural remonta aos trabalhos do holandês Iôrrân Rêlzinrrá e do suíço iácôb burcrrart, entre o fim do século dezenove e o início do século vinte. Esses pensadores defendiam que, ao analisar a cultura, é preciso observar a relação entre as práticas culturais e suas representações, os objetos culturais e os usos e costumes que caracterizam as sociedades. Um dos objetivos da História Cultural é compreender como determinado fenômeno

cultural é construído, pensado e internalizado em diferentes lugares e momentos. Por essa razão, ela se preocupa com o terreno do simbólico e suas interpretações, com os mitos e as crenças, a fala, as manifestações artísticas, as práticas religiosas.

A História Cultural conferiu novo significado à história política, originando o que hoje se chama História Política Renovada. Os pesquisadores ligados a essa linha historiográfica investigam a contribuição de elementos culturais para o desenvolvimento de acontecimentos políticos, bem como para a formação de determinadas estruturas de poder, como a função dos símbolos utilizados pelas monarquias europeias na manutenção da autoridade real.

A metodologia de trabalho da História Cultural ampliou o diálogo com outras áreas, formando uma rede conceitual que não estabelece hierarquias entre os campos de estudo nem territorializa o conhecimento. Por conseguinte, os historiadores trabalham permanentemente em um lugar de fronteira, com o cruzamento de fontes, teorias e aparatos conceituais de várias áreas de pesquisa, buscando compreender os sentidos que seres humanos de outros tempos davam ao seu mundo.

A historiografia nacional

A formação do Brasil como nação é um fenômeno bastante recente e posterior à fundação do Estado brasileiro. Até a conclusão do processo de independência política, o que é hoje o Brasil era um punhado de unidades administrativas com pouco em comum. Não existia uma brasilidade propriamente dita, ou seja, um sentimento de pertencimento nacional dos homens e mulheres que viviam no território brasileiro – cuja definição não se completaria senão no século vinte. Isso significa que a ideia do Brasil como nação é produto de uma construção. Foi preciso encontrar, ou criar, os laços para unir os habitantes das diferentes províncias, e isso dependeu da elaboração de uma narrativa histórica. Conhecê-la é fundamental para que o cidadão seja capaz de se situar em debates importantes e definidores de políticas públicas hoje, uma vez que questões como as relacionadas ao racismo, à violência contra a mulher e à intolerância religiosa passam pelo entendimento de como se forjou a nação brasileira.

As primeiras histórias do Brasil, ou melhor, as crônicas assim batizadas, datam do período colonial. Nelas não havia nenhuma preocupação de encontrar traços definidores do que fosse o Brasil, já que nem sequer era entendido como unidade. Foi somente em 1838 que se criou o primeiro órgão com a função de estudar e descrever o território brasileiro, a fim de criar uma narrativa da história do país: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (í agá gê bê). Sediado no Rio de Janeiro, reuniu um seleto grupo de literatos. Um de seus integrantes, José Inácio de Abreu e Lima, foi o autor do primeiro compêndio de história do Brasil, publicado em 1843. O livro, um manual escolar para estudantes do Colégio Pedro segundo, recebeu duras críticas, em especial de Francisco Adolfo de vãrnrárrê, o Visconde de Porto Seguro. vãrnrárrê acusou Abreu e Lima de plagiar outra obra e não viu com bons olhos a inclusão da população nativa na categoria “brasileiros”, pois considerava que o termo deveria se restringir aos habitantes que, segundo ele, eram “civilizados” e não abranger os povos que, em seu entendimento, representavam a “incivilidade”. Em outras palavras, para vãrnrárrê, a palavra “brasileiros” só se aplicaria aos habitantes que encarnavam o modêlo civilizatório europeu.

Entre 1854 e 1857, vãrnrárrê publicou os dois volumes da obra História geral do Brasil, em que inventariou e organizou pela primeira vez um expressivo número de documentos oficiais, muitos deles garimpados em arquivos europeus. Em sua síntese da história brasileira, exaltou a colonização europeia e procurou criar um passado idealizado para o país recém-independente. O relato, cheio de heróis e grandes feitos, omite os conflitos e as contradições do passado.

Na passagem do século dezenove para o vinte, ocorreu um marco na historiografia nacional: a publicação das obras de João Capistrano Honório de Abreu, como Os caminhos antigos e o povoamento do Brasil (1899) e Capítulos de história colonial (1907). Capistrano de Abreu adotou uma postura crítica em relação à história positivista e analisou metodicamente suas fontes, considerando, em especial, os aspectos culturais da formação do Brasil. Em vez de celebrar grandes heróis, enfatizou o protagonismo do povo brasileiro na evolução histórica do país.

Sob a influência de Capistrano de Abreu, a historiografia brasileira das primeiras décadas do século vinte se ocupou, principalmente, de discutir a formação do povo brasileiro. No centro desse debate estiveram a questão racial e a natureza das relações construídas entre brancos, negros e indígenas no Brasil. O tema não era novo. Já no século dezenove, pensadores como o naturalista alemão cal fridrixi filip van marsius e Silvio Romero apontavam a miscigenação como característica marcante da formação do povo brasileiro, chegando a designar ao elemento branco o papel de orientá-lo em direção à civilização.

Nas décadas de 1920 e 1930, quando as teses eugenistas se difundiam pela Europa e pelos Estados Unidos, o debate ganhou impulso. Obras como Evolução do povo brasileiro (1923) e Raça e assimilação (1932), de Oliveira Vianna, e Casa-Grande & senzala (1933) e Sobrados e mucambos (1936), de Gilberto Freyre, influenciaram profundamente o pensamento brasileiro e a compreensão sobre a formação do país. De um lado, Oliveira Vianna defendeu a superioridade da raça branca sobre a negra e um plano de branqueamento racial. De outro, Freyre valorizou a mestiçagem e deu fórma ao conceito de democracia racial.

Outro pensador importante da década de 1930 foi Sérgio Buarque de Holanda, cuja obra Raízes do Brasil (1936) apontava o caráter predatório e violento da colonização portuguesa. Tomando um rumo contrário ao de outros intérpretes do Brasil, que exaltavam o projeto colonial lusitano, Sérgio Buarque de Holanda rejeitava qualquer julgamento de superioridade racial do branco em relação ao negro e ao indígena.

A década seguinte foi marcada pela inauguração do pensamento de linha marxista no Brasil. Caio Prado Júnior publicou em 1942 o livro Formação do Brasil contemporâneo, no qual, partindo de um viés econômico, porém sem desprezar os aspectos sociais e políticos, tentou explicar o país.

Da segunda metade do século vinte em diante, a produção historiográfica brasileira se divide em três vertentes principais: a tradicional, empirista, herdeira do positivismo e defensora de uma narrativa factual e descritiva da história; a marxista, com o materialismo histórico como metodologia básica, bastante forte no período da ditadura civil-militar; e a influenciada pela Escola dos Annales, que introduz novas linhas de pesquisa.

O fim do govêrno militar coincidiu com o crescimento da indústria cultural e editorial brasileira. A publicação de vários livros de história até então disponíveis somente em língua estrangeira e a possibilidade de inserção de autores nacionais no mercado editorial favoreceram a renovação da pesquisa histórica no Brasil. Além disso, houve um aumento da oferta de bolsas de estudo e a abertura de novos programas de pós-graduação, o que causou uma expansão significativa da produção historiográfica brasileira na década de 1990, marcadamente influenciada pela Nova História e pela Nova História Cultural.

As opções desta coleção

A proposta desta coleção é utilizar os aportes de várias linhas teóricas – como a História Social Inglesa, a História Cultural e a Nova História – naquilo que contribuem para tornar o conhecimento histórico significativo para os alunos do Ensino Fundamental.

Entendemos a história como algo dinâmico que, em permanente construção, comporta diversos aspectos da experiência humana ao longo do tempo. Para abarcar a complexidade das relações que estruturam os diferentes momentos da história, esta obra se propõe a manter uma articulação entre a política e o cotidiano, entre a economia e as relações sociais e entre a cultura formal e os aspectos simbólicos presentes nas sociedades estudadas.

Assim, além dos principais aspectos da política e da economia de cada período, a coleção trata, por exemplo, da religiosidade e da noção de sagrado nas sociedades humanas, desde a época anterior à invenção da escrita até a contemporaneidade. Também abre espaço para a história das ideias e sensibilidades, abordando aspectos como o respeito aos deuses por diferentes povos, em diferentes culturas e momentos históricos; a insegurança causada pela fome e pelos constantes conflitos na Europa da Idade Média, bem como a influência religiosa na cultura e nos modos de organização social medievais; o medo e as superstições dos navegadores que embarcaram (ou não) rumo ao desconhecido durante as expansões marítimas europeias; os impactos da Revolução Haitiana no imaginário das elites coloniais da época; a descrença no liberalismo e a crise social às vésperas da ascensão dos regimes totalitários na Europa. Esses exemplos ilustram as possibilidades que as novas abordagens históricas oferecem aos materiais didáticos.

Temas como a alimentação, o vestuário e os costumes aparecem como proposta de estudo em diferentes ocasiões: no 6º ano, quando tratamos dos gregos e dos romanos da Antiguidade, dos islâmicos e dos europeus medievais; no 7º ano, quando destacamos os escravizados africanos na América portuguesa; no 8º ano, quando abordamos as alterações dos costumes franceses da época da grande revolução; e no 9º ano, quando nos ocupamos dos movimentos contraculturais da década de 1960.

O destaque à presença feminina na história é uma constante em todos os volumes da coleção. Colocamos em evidência as diferenças da condição entre homens e mulheres desde o período Neolítico, quando se atribui às mulheres a responsabilidade pela domesticação de espécies vegetais, até a atualidade, sublinhando o protagonismo feminino em diversas situações. Não deixamos de tratar, por exemplo, das mulheres e sua posição na cultura islâmica, tema desenvolvido no 6º ano pela óptica da questão de gênero e da diversidade cultural.

A coleção ainda salienta o papel de grupos e camadas sociais que, na história tradicional e positivista, não eram contemplados, como os operários e os trabalhadores em geral, abordando seu cotidiano e modo de vida. Enfoca também a questão indígena − desde antes da chegada do europeu ao continente americano até a atualidade, quando diferentes povos indígenas usam tecnologias digitais − e a história e a cultura afro-brasileira, por meio das manifestações políticas, artísticas e sociais, chamando atenção para o protagonismo da população negra na conquista de direitos no país.

Ressaltamos que, sempre que pertinente ao tema estudado, damos destaque para a luta pela igualdade de direitos e pela defesa dos direitos humanos.

3. A natureza do saber histórico

As transformações que ocorreram na concepção e nos objetos de estudo da história não mudaram os princípios da boa historiografia: o historiador deve dominar o referencial teórico ao qual se filia e o aparato conceitual com o qual trabalha e, principalmente, deve trabalhar com método da investigação científica, baseado na análise crítica dos documentos, a partir da qual se elaboram hipóteses em busca de conclusões parciais, sujeitas a revisão e retificação.

É no permanente esfôrço de investigação, formulação de hipóteses, verificação e retificação de conclusões que reside o caráter científico do conhecimento histórico e a objetividade a que visa o historiador.

Não há certezas, não há caminhos que não possam ser refeitos de outra maneira, não há conclusões definitivas. Todas as fontes podem ser lidas novamente de outro modo, vir a ser comparadas com novas fontes disponíveis e revelar novas faces, antes ignoradas. O historiador deve interpretar as fontes, demolir sua aparente neutralidade, mas nunca as inventar.

O historiador e o uso das fontes

Até o século dezenove, só eram reconhecidos como fontes históricas os documentos escritos oficiais. Somente na primeira metade do século vinte os conceitos de documento histórico e fonte histórica foram revolucionados e ampliados pela Escola dos Annales. Sobre documento histórico, lúciã févr afirma:

“A história faz-se, sem dúvida, com documentos escritos. Quando há. Mas pode e deve fazer-se sem documentos escritos, se não existirem reticências. Faz-se com tudo o que a engenhosidade do historiador permite utilizar para fabricar o seu mel, quando faltam as flores habituais: faz-se com palavras, sinais, paisagens e telhas; com fórmas de campo e com más ervas, com eclipses da Lua e arreios; com peritagens de pedras, feitas por geólogos, e análises de espadas de metal, feitas por químicos. Em suma, com tudo o que, sendo próprio do homem, dele depende, lhe serve, o exprime, torna significantes a sua presença, atividade, gostos e maneiras de ser.”

févr lúciã. In: LE GÓFI, Jaques. História e memória. quinta edição Campinas: Editora da unicâmpi, 2003. volume 1, página 107.

A aproximação dos historiadores de outros campos de conhecimento favoreceu o ingresso de materiais que antes não eram considerados pertinentes para a história, como a literatura, as artes plásticas, a música, a moda, os rituais, os movimentos sociais e culturais, os símbolos e as tradições. Os jornais e os processos criminais, por exemplo, puderam servir de fonte para a análise histórica e gerar uma biografia. Um exemplo é o estudo de crístofer ril sobre a história de Óliver Crom-uél. Outro exemplo da ampliação da noção de fonte é a tese de fernã brôdél sobre a região do Mar Mediterrâneo, realizada com base em rotas de navegação, gráficos dos fluxos de comércio e aspectos do espaço geográfico da região.

As fontes orais também passaram a ter relevância para a pesquisa histórica, principalmente nos estudos de história do tempo presente, com a valorização do papel do sujeito no processo de tomada de decisões e na investigação das relações entre memória e história.

Outra mudança importante na postura do historiador perante as fontes primárias foi a admissão de que tais fontes não podem ser tomadas como testemunho inquestionável do passado, portadoras de toda a “verdade”. Hoje os historiadores entendem que as fontes precisam ser investigadas levando-se em conta as condições em que foram produzidas. Em outras palavras, reconhecem que as fontes os conduzem a determinado ponto de vista ou a um recorte particular de determinado tempo.

A história e as fontes digitais

Uma questão que se impôs mais recentemente é o trabalho do historiador na era da cultura digital. Que novas fontes estão hoje disponíveis no mundo virtual? Como isso altera os métodos de pesquisa utilizados pelo historiador? Segundo Rogê Chartiê:

“A textualidade eletrônica de fato transforma a maneira de organizar as argumentações históricas ou não, e os critérios que podem mobilizar um leitor a aceitá-las ou rejeitá-las. Quanto ao historiador, permite desenvolver demonstrações segundo uma lógica linear ou dedutiva reticências. Permite uma articulação aberta, fragmentada, relacional do raciocínio, tornada possível pela multiplicação das ligações hipertextuais. Quanto ao leitor, agora a validação ou rejeição de um argumento pode se apoiar na consulta de textos (mas também de imagens fixas ou móveis, palavras gravadas ou composições musicais) que são o próprio objeto de estudo, com a condição de que, obviamente, sejam acessíveis em fórma digital.”

Chartiê Rogê. A história ou a leitura do tempo. segunda edição Belo Horizonte: Autêntica, 2010. página 59-60.

A posição de Chartiê é reforçada pelo número cada vez maior de acervos de museus, arquivos, bibliotecas, universidades, órgãos governamentais, entre outros, que vêm sendo digitalizados e disponibilizados para a pesquisa. Chartiê dá o exemplo do historiador estadunidense róbert darntôn, que publicou um artigo na versão impressa e na versão digital de uma revista estadunidense; na versão digital, os leitores puderam ter acesso a uma quantidade maior de dados das fontes que o autor utilizou para fazer o trabalho. Esse fato, nas palavras de Chartiê,

reticências estabelece uma relação nova, mais comprometida com os vestígios do passado e, possivelmente, mais crítica com respeito à interpretação do historiador.”

Chartiê Rogê. A história ou a leitura do tempo. segunda edição Belo Horizonte: Autêntica, 2010. página 60.

Captura de tela. Site da Biblioteca Nacional Digital. Na parte superior, logotipo da Biblioteca Nacional Digital e campo de busca. Abaixo, as opções: ARTIGOS; DOSSIÊS; EXPOSIÇÕES; ACERVO DIGITAL; HEMEROTECA DIGITAL; SOBRE A BN DIGITAL. Abaixo, imagem de uma mulher de cabelo preso e usando vestido. Ao lado, o texto: Dona Maria Primeira. Portugal e o Brasil: elos de uma mesma corrente. Curadoria Mary del Priore. Em segundo plano, pintura de uma paisagem, com destaque para uma caravela portuguesa no mar.
Tela inicial do site bê êne Digital, que disponibiliza diversos documentos, fotografias, gravuras, jornais e revistas pertencentes ao acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Com a digitalização, um número maior de pessoas consegue acessar acervos da instituição.

História e memória

Para Jaques Le Gófi, a memória consiste em um conjunto de funções psíquicas que possibilita aos indivíduos conservar informações sobre o passado mediante um processo de reelaboração dessas informações, que envolve tanto a valorização e a seleção de alguns aspectos quanto o esquecimento de outros. Isso significa que a memória revela menos sobre o que de fato

aconteceu no passado e mais sobre o que os acontecimentos significam para quem os rememora. Por isso, a memória deve ser entendida como o resultado de uma construção social ligada à constituição de identidade, ou seja, o produto de uma operação cultural coletiva em que um grupo de pessoas produz, com base em elementos do passado, uma imagem de si.

Desde o final da década de 1970, a memória se tornou, por obra dos historiadores da Nova História, objeto de reflexão e pesquisa. Vários estudos têm procurado compreender as fórmas assumidas pela memória, bem como a maneira como ela articula passado e presente. A atenção desses estudiosos recai principalmente sobre a memória coletiva pelo fato de ela ser produto de um processo dinâmico de troca de lembranças individuais, interpretações da realidade elaboradas pelos meios de comunicação, recortes e reelaborações do passado, o qual resulta em um elemento identitário poderoso. Os estudos sobre a memória são particularmente importantes para as investigações sobre as sociedades ágrafas, nas quais a preservação do passado é fundamental para a manutenção de seus laços de união e, portanto, para a coesão do grupo.

Realidade e representação

A representação como categoria de análise não é nova e remete primeiramente ao trabalho do sociólogo êmile durcáim, sendo depois apropriada por historiadores como Rogê Chartiê e róbert darntôn, entre muitos outros. A representação, segundo Chartiê, é uma construção feita pelas pessoas sobre suas práticas, de modo que não há uma realidade que possa ser compreendida a prióri, mas apenas representações dela. Chartiê se coloca contra os estudos das mentalidades – que igualariam o imaginário de todas as camadas sociais, desconsiderando sua diversidade – e procura trazer historicidade para os sentidos que as pessoas dão às próprias vivências. Para ele é necessário,

reticências dar assim atenção às condições e aos processos que, muito concretamente, sustentam as operações de construção do sentido (na relação de leitura, mas também em muitas outras) é reconhecer, contra a antiga história intelectual, que nem as inteligências nem as ideias são desencarnadas e, contra os pensamentos do universal, que as categorias dadas como invariantes, quer sejam filosóficas ou fenomenológicas, devem ser construídas na descontinuidade das trajetórias históricas.”

Chartiê Rogê. O mundo como representação. In: Chartiê Rogê. À beira da falésia: a história entre incertezas e inquietude. Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2002. página 68.

Para Chartiê, portanto, o conteúdo de uma imagem, de um texto literário, de um filme e de outras manifestações das sociedades humanas não é cópia da realidade, mas uma representação dela, ou seja, uma construção que revela como ela foi percebida pelas pessoas segundo seus lugares na sociedade, em um momento histórico específico. Sendo assim, essas manifestações não podem ser vistas como objetos invariáveis no tempo e no espaço, pois expressam questões próprias ao contexto em que foram criadas.

róbert darntôn vê a representação como a maneira pela qual as pessoas comuns organizam a realidade mentalmente e expressam essa organização nos comportamentos e nas práticas sociais, formando um conjunto compartilhado de símbolos que constituem um idioma geral.

Ao estudar as representações na arte, na música, na literatura, nos documentos escritos ou em outras fontes históricas, o historiador busca apreender as diferenças e os significados que estão inscritos ali e que permitam perceber como as culturas formularam sua maneira de pensar e sua visão de mundo. Em síntese, as representações são criadas por pessoas inseridas em determinado contexto histórico e carregam significados que podem ser desvendados.

4. Por que ensinamos história?

Vivemos em um mundo multifacetado de identidades e de modos de vida, no qual as novas tecnologias digitais possibilitam trocas de informações em um ritmo nunca imaginado pelas gerações anteriores. Ante tal realidade, devemos procurar e selecionar informações com senso crítico e autonomia, agindo de maneira ética, sustentável e cidadã. Por isso, no Ensino Fundamental, é importante que a história dialogue com a atualidade e apresente referenciais aos jovens em formação, auxiliando-os a desenvolver competências e habilidades necessárias para que possam interpretar o mundo em que vivem e interagir nele responsavelmente. Mas como dotar o ensino de história dessa faculdade formadora necessária nos dias de hoje? A resposta exige uma reflexão sobre aspectos da prática pedagógica desse componente curricular.

Consciência histórica e a história como componente curricular escolar

A todo instante, os indivíduos se veem compelidos a projetar-se para o futuro e a fazer escolhas de acôrdo com os objetivos que definem para si. Entretanto, para isso, precisam encontrar referências que lhes permitam tomar decisões e agir com alguma sensação de segurança em um mundo instável e em constante transformação.

Essas referências podem ser encontradas em fatos, experiências e reflexões do passado; porém as lembranças e os vestígios do passado não se apresentam de imediato como um conjunto organizado e inteligível. Ao contrário, o passado, da maneira como aparece nas lembranças, tem um caráter fragmentário e caótico; por isso, é preciso conferir-lhe sentido, dotá-lo de coerência, encontrar uma articulação lógica entre os múltiplos elementos que compõem a experiência humana no tempo. É a consciência histórica que cria as condições para que os indivíduos tracem uma linha de coerência entre a experiência vivida e os projetos a serem realizados.

Mesmo aqueles que nunca tiveram contato com a história como componente curricular ou ciência desenvolvem, nas situações da vida prática, consciência histórica. Esta se fórma não só por meio do contato com os conhecimentos escolares, mas também por meio das experiências da realidade cotidiana: os saberes acumulados na memória coletiva e individual, as trocas nos grupos de convívio e da apreensão dos conteúdos históricos veiculados pela mídia (telejornais, jornais impressos, cinema, internet etcétera), por exemplo. Da síntese de informações colhidas de todas essas experiências se constitui a consciência histórica, que passa a ser responsável por ordenar as lembranças do passado e lhes conferir sentido, permitindo que os seres humanos analisem o presente, avaliem quais ações são as mais acertadas e decidam quais devem pôr em prática. Nas palavras do doutor em educação Daniel Medeiros,

reticências a consciência histórica não se resume a conhecer o passado. Ela oferece estruturas para que, através delas, o conhecimento histórico tenha o condão de agir como meio de compreensão do presente e antecipação do futuro. A consciência histórica é, ao mesmo tempo, o âmbito e o objetivo do aprendizado histórico.”

MEDEIROS, Daniel H. de. A formação da consciência histórica como objetivo do ensino de história no ensino médio: o lugar do material didático. 2005. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2005.

Em seus estudos, o historiador e filósofo alemão iórn russãn propôs classificar a consciência histórica em quatro categorias: a tradicional, a exemplar, a crítica e a genética. A primeira delas corresponde a um tipo de consciência em que o tempo é entendido como um contínuum, e situações e comportamentos tradicionais são repetidos sem interrupção no tempo, oferecendo lastro para a identidade de um grupo. Estamos aqui no campo das tradições. Já a consciência exemplar é aquela em que a experiência histórica é rememorada para explicar o presente. Em outras palavras, situações experimentadas no passado são refletidas no presente de modo anacrônico:

reticências o passado está repleto de uma multiplicidade de exemplos que servem para mostrar a validade e a utilidade de regras gerais de conduta. A relação entre passado, presente e futuro repousa na validade contínua dessas regras gerais. reticências. Neste sentido, as decisões tomadas são comunicadas por referência a casos precedentes através dos quais se deduzem regras.”

GAGO, Marília. Consciência histórica e narrativa na aula de história: conceções de professores. Porto: citissêm/ Afrontamento, 2018. página 69.

A terceira categoria é a crítica, que pressupõe um distanciamento entre o sujeito e o passado, e a relativização e ressignificação desse. Nesse tipo de consciência, o passado já não serve para legitimar o presente ou moldá-lo. Ao contrário, fornece elementos para se formular um questionamento das estruturas e modelos do presente. Por fim, a consciência genética é aquela em que o indivíduo compreende as relações entre presente e passado e consegue se situar em relação a diferentes temporalidades, movendo-se no presente a partir de referências tomadas de outros tempos sem que, no entanto, esteja preso a elas. Nas palavras dos historiadores Fernando Marrera e uíris Souza,

reticências [a consciência genética] ocorre quando o indivíduo está totalmente consciente do seu presente e de que está inserido em um mundo, onde seu presente é um reflexo parcial do que ocorreu no passado, de tal fórma que o que passou não voltará a passar, mas que algumas continuidades permanecem, de modo que, nesse processo de conscientização, o indivíduo não nega totalmente o passado (como propõe a consciência crítica), nem tenta inserir ou legitimar o presente através do mesmo (conforme propõe a consciência tradicional e exemplar), mas estabelece uma síntese entre ambos.”

MARRERA, Fernando Milani; SOUZA, uíris Alves de. A tipologia da consciência histórica em russãn. Revista Latino-Americana de História, São Leopoldo, volume 2, número 6, página 1076-1077, agosto 2013. Edição Especial.

A construção das duas últimas categorias da consciência histórica se dá mediante o trabalho de conteúdos que instigue o desenvolvimento de uma argumentação histórica crítica e que favoreçam a percepção das relações entre a experiência vivida, de modo que os alunos vejam a si mesmos como sujeitos históricos.

História e cidadania

Cidadania é uma palavra que deriva do termo latino tchívitas, que identificava, na Roma antiga, a cidade, a comunidade organizada politicamente. Atualmente, designa um conjunto de direitos políticos, econômicos e sociais usufruídos pelos indivíduos, que têm como contrapartida deveres em relação ao coletivo.

O exercício da cidadania pressupõe o indivíduo entender seu papel na coletividade e atuar nela de maneira sensata e responsável. Isso significa ter consciência de quem ele é, do lugar que ocupa na sociedade, de como seus interesses e projetos se articulam ou se contrapõem aos dos demais e do impacto que suas ações têm sobre a vida coletiva. Educar o indivíduo para essa consciência é um dos papéis da escola e, nela, o ensino de história ocupa um lugar de destaque. Por meio do estudo da história, o indivíduo desenvolve habilidades cognitivas importantes como a de compreender a sociedade na qual se insere a partir de uma perspectiva temporal, analisar os interesses políticos e econômicos que movem os diferentes atores sociais e se posicionar em relação a eles, comparar sociedades de variadas conformações e identificar características que as aproximam ou distanciam, entre outras. Sem tais habilidades, o indivíduo age em sociedade e toma decisões guiado pelo imediatismo e pela percepção impressionista dos fenômenos sociais. Muitas vezes, adota postura individualista, não conseguindo se enxergar como parte do coletivo. Por essa razão, o ensino de história também desempenha uma função importante na educação para a tolerância e a democracia.

Diversidade, tolerância e promoção da cultura de paz

Em 16 de novembro de 1995, na 28ª Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (unêsco), foi aprovada a Declaração de Princípios sobre a Tolerância. Nesse documento, os países signatários – entre eles, o Brasil – reafirmaram os princípios da Declaração Universal dos Direitos dos Homens e reconheceram que a missão de preservar a paz entre os povos não é possível sem uma firme defesa da tolerância, definida como:

reticências o respeito, a aceitação e o apreço da riqueza e da diversidade das culturas de nosso mundo, de nossos modos de expressão e de nossas maneiras de exprimir nossa qualidade de seres humanos. É fomentada pelo conhecimento, a abertura de espírito, a comunicação e a liberdade de pensamento, de consciência e de crença. A tolerância é a harmonia na diferença. Não só é um dever de ordem ética; é igualmente uma necessidade política e jurídica. A tolerância é uma virtude que torna a paz possível e contribui para substituir uma cultura de guerra por uma cultura de paz.”

unêsco. Declaração de princípios sobre a tolerância. Disponível em: https://oeds.link/VHhoTH. Acesso em: 14 fevereiro 2022.

O documento ainda sublinha o papel da educação como meio eficaz de combate à intolerância, na medida em que ela desfaz preconceitos, o solo fértil onde brotam o medo do diferente e a violência contra as minorias.

Seis anos depois, na 31ª Sessão da Conferência Geral da unêsco, foi assinada a Primeira Declaração Universal da Diversidade Cultural, na qual se reforça o documento de 1995 e propõe um plano de ação para a valorização e aceitação da diversidade criativa, além de destacar a importância da educação.

“Promover, por meio da educação, uma tomada de consciência do valor positivo da diversidade cultural e aperfeiçoar, com esse fim, tanto a formulação dos programas escolares como a formação dos docentes.”

unêsco. Declaração Universal Sobre a Diversidade Cultural e Plano de Ação. Disponível em: https://oeds.link/XYbD6Z. Acesso em: 30 maio 2022.

O compromisso de educar os jovens para a tolerância e o respeito à diversidade já estava previsto no Plano Nacional de Educação, em suas concepções e princípios da Educação Básica, e foi consubstanciado pela Bê êne cê cê (que abordaremos adiante) por meio das Competências gerais da Educação Básica. Trata-se de um dos mais importantes compromissos assumidos pelo Brasil perante os órgãos internacionais de defesa dos direitos humanos e no combate a toda fórma de discriminação.

O professor desempenha um papel central na consolidação desse compromisso, uma vez que a sociabilidade do indivíduo, em seus primeiros anos de formação, se desenvolve no espaço escolar. É na escola que a criança encontra, pela primeira vez, um ambiente marcado pela diversidade e tem de conviver e interagir diariamente e por várias horas com pessoas de fóra do círculo familiar, o que pode favorecer a eclosão de episódios de discordância, tensão e conflito. Crianças e jovens buscarão, no ambiente escolar, criar laços de identidade com seus pares e integrar-se socialmente por meio de gostos, valores, comportamentos etcétera Cabe ao professor assegurar que a sala de aula se imponha como um ambiente de escuta, onde a diversidade e as diferenças sejam acolhidas com respeito. A criação de um ambiente de acolhimento é fundamental para criar um vínculo de confiança entre o educador e seus alunos, e um espaço onde esses últimos possam se sentir protegidos para tratar das questões que os afligem e inquietam.

Situações de conflito, inevitáveis quando o contraditório emerge, se bem administradas, não são danosas; pelo contrário, são a oportunidade de educar os jovens para a convivência ética e democrática e promover a cultura de paz. Para isso, o professor precisa estar atento a toda manifestação de discriminação em sala de aula (étnico-racial, religiosa, de gênero, idade etcétera) e preparado para, lançando mão do conhecimento e da informação, desconstruir as bases sobre as quais as atitudes discriminatórias se sustentam e promover o entendimento e o diálogo entre os alunos.

Embora todos os professores, de todos os componentes curriculares, devam colaborar para a construção de um ambiente saudável de trocas e debate de ideias, o professor de história ocupa um lugar privilegiado para desempenhar esse papel porque os objetos de aprendizagem e as habilidades com os quais trabalha favorecem a reflexão sobre a diversidade, a compreensão das diferenças e a discussão sobre conceitos como os de democracia e autocracia, tolerância e intolerância, opressão e resistência, entre outros. Muitas vezes, é ao se reconhecer em situações experimentadas por outras pessoas em outros tempos e refletir sobre elas, buscando traçar analogias com o presente, que o jovem consegue olhar para si mesmo e avaliar as próprias ações. Por essa razão é tão importante, no estudo da história, ultrapassar a história factual e o estudo dos grandes modelos explicativos para dar atenção também a temas como o cotidiano, a infância e as sensibilidades.

A formação de cidadãos equilibrados e tolerantes, que busquem soluções pacíficas, por meio do diálogo, para os conflitos cotidianos e não disseminem discursos de ódio, depende de uma educação inclusiva, e o professor de história tem instrumentos para promovê-la.

5. A história na sala de aula

Para alcançar os objetivos do ensino de história, o professor em sala de aula precisa articular uma série de elementos e, fundamentalmente, conduzir um processo de ensino-aprendizagem significativo.

O ensino de história e a produção acadêmica

O conhecimento histórico e o rigor conceitual são indispensáveis para o ensino de história. Mas o professor não deve incorrer no erro de confundir a docência com a produção acadêmica. As aulas não podem ser uma simplificação de textos produzidos por especialistas, e tampouco os alunos devem ser considerados historiadores-aprendizes. O esfôrço para adaptar teses complexas ao nível de compreensão de adolescentes que ainda não dominam nem a linguagem nem o aparato conceitual e metodológico da academia pode conduzir a esquematismos e lugares-comuns que, quase sempre, se desdobram em simplificações e reducionismos indesejáveis.

O professor também deve ter o cuidado de não confundir a análise histórica com a repetição de modelos explicativos invariáveis, que criem nos alunos a impressão de que todos os acontecimentos históricos cumprem um mesmo “roteiro” e conduzem sempre aos mesmos resultados, levando-os a deduzir que a história está sempre se repetindo. Trabalhar a historicidade de cada momento, considerando suas especificidades, é fundamental para que os alunos percebam as transformações históricas como resultado da combinação de numerosos e contraditórios elementos característicos de cada época.

Nesse sentido, é importante se pautar por objetivos pedagógicos bem definidos, levando em conta que os alunos precisam não só compreender como se dá a construção do conhecimento histórico − a fim de que entendam que esse campo do conhecimento é dinâmico, está sujeito a mudanças e admite diferentes perspectivas de análise − como também perceber que a própria produção historiográfica está inserida na história e as questões propostas pelos historiadores de cada época se relacionam aos problemas e inquietações de seu tempo.

Do mesmo modo, é necessário questionar afirmações do senso comum, como a de que “estudamos o passado para compreender o presente”. Não se pode negar que a realidade que experimentamos é resultado de decisões tomadas por aqueles que nos precederam e pela combinação singular de um conjunto de fatores, mas deve-se evitar a ideia de que o passado comanda o presente, como se não pudéssemos fazer escolhas e redefinir o rumo que damos às nossas vidas. Assim, se o estudo do passado nos permite avaliar as possibilidades com as quais nossos antepassados contaram, bem como as escolhas que fizeram, nem por isso ele nos constrange a aceitar nosso presente como destino. Pelo contrário, o estudo do passado deve descortinar as diversas faces do presente e nos ensinar a olhar para todas as direções possíveis. Como diz jeãn chenô,

“se o passado conta, é pelo que significa para nós. reticências Ele nos ajuda a compreender melhor a sociedade na qual vivemos hoje, saber o que defender e preservar, saber também o que mudar e destruir.”

chenô jeãn. Devemos fazer tabula rasa do passado? São Paulo: Ática, 1995. página 24.

Também é importante ter em mente que a história se desenvolve como trama e não como uma sucessão de relações de causa e efeito, e que o historiador é incapaz de dar conta de todos os elementos que se articulam nessa trama, seja pela extrema complexidade dela, seja por causa das limitações e parcialidade das fontes. Decorre daí que nosso conhecimento sobre o passado é sempre incompleto e fragmentário. Além disso, os fatores que se combinaram no passado, bem como a maneira como essa combinação se deu, foram únicos e singulares. Isso significa que por mais semelhanças que possamos identificar entre nosso tempo presente e outros momentos históricos, os contextos não serão nunca idênticos e, portanto, os problemas e as soluções que afligiram nossos antepassados não se confundem com os que temos diante de nós.

Por conseguinte, não nos debruçamos sobre o passado para buscar nele respostas para o presente. Elas não estão lá. O que buscamos nele são parâmetros para nossas decisões e escolhas; são conhecimentos e reflexões que sirvam como pêso e medida para os posicionamentos que tomamos; são elementos que nos permitam relativizar as paixões, as certezas, os preconceitos aos quais nos apegamos, às vezes sem o saber, de maneira que nos tornemos mais tolerantes, compreensivos e transigentes em relação àqueles que são, de alguma maneira, diferentes de nós e, afinal, capazes de agir com mais justiça e parcimônia.

Habilidades e competências

A Base Nacional Comum Curricular foi elaborada como um instrumento para que a educação brasileira possa atingir seu objetivo de promover uma formação humana integral e a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva. O ensino de história desempenha um papel importante na consecução dessa meta.

Contudo, é preciso perguntar a que ensino de história nos referimos. A transmissão mecânica e automática de conteúdos informativos baseada apenas em uma tradição escolar não garante a formação integral de sujeitos éticos, críticos, tolerantes, criativos e participativos. Apenas um conhecimento histórico conectado com as questões do presente, derivado de um processo de reflexão e baseado na investigação e na experiência dialógica tem esse poder. Para garantir isso, a Bê êne cê cê definiu, de maneira clara e objetiva, competências e habilidades a serem desenvolvidas ao longo do Ensino Básico. Por habilidade se entende a capacidade de compreender, interpretar e/ou agir em relação a determinada situação, ou seja, as aprendizagens essenciais que devem ser asseguradas aos alunos nos diferentes contextos escolares. Já competência, conforme a definição da Bê êne cê cê, é:

reticências a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho.”

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 8.

Habilidades e competências são, portanto, aquisições, consequência de aprendizado. Por isso, a intervenção pedagógica é essencial. Durante as aulas, o professor precisa estar atento tanto ao que o aluno aprende quanto ao que ele faz com aquilo que aprende, ou seja, à capacidade de ele transferir o aprendizado para a compreensão de novas situações ou para a resolução de novos problemas.

Nesse contexto, o conteúdo informativo deixa de ser o foco do ensino e passa a estar a serviço de um exercício cognitivo, de uma experiência de entendimento da realidade. O que importa é entender o significado dos fatos históricos, abstrair conceitos a partir deles, compreender suas conexões com o presente e saber onde e como aplicar os novos conhecimentos.

A Bê êne cê cê estabeleceu as Competências gerais a serem desenvolvidas pelos alunos no decorrer da Educação Básica, as Competências específicas de cada área do conhecimento e seus respectivos componentes curriculares e as habilidades para cada ano do Ensino Fundamental.

Mas, antes de tratar da Bê êne cê cê, precisamos apontar características gerais do processo de aprendizagem dos alunos nos anos finais do Ensino Fundamental, as quais devem ser consideradas pelo professor.

Os alunos no centro do processo de ensino-aprendizagem

As ideias de que os alunos devem ocupar posição central no processo de ensino-aprendizagem e de que a escola desempenha um papel importante na formação dos cidadãos e na construção da democracia não são inéditas. Elas já eram defendidas no comêço do século passado por educadores filiados à chamada Escola Nova, que questionavam o formato das escolas tradicionais e seus métodos de ensino. Todavia, estudos na área da teoria da aprendizagem e, mais recentemente, da neurociência, contribuíram para um melhor entendimento de como se dá a aprendizagem e reforçaram a defesa de uma educação centrada nos alunos.

Uma das teorias mais importantes para explicar o processo de ensino-aprendizagem foi desenvolvida na década de 1960 pelo psicólogo da educação Dêivid Paul Aussubel. Segundo esse autor, todo conhecimento novo, para ser incorporado à estrutura cognitiva do aprendiz, precisa ser significativo. Como explicam Marco Antonio Moreira e Bernardo bufváits, Auzúbel define essa aprendizagem como

“um processo através do qual uma nova informação relaciona-se com um aspecto relevante da estrutura de conhecimento do indivíduo. Ou seja, esse processo envolve a interação da nova informação com uma estrutura de conhecimento específica, a qual Auzúbel define como conceitos subsunçores”.

MOREIRA, Marco Antonio; bufváits, Bernardo. Mapas conceituais: instrumentos didáticos, de avaliação e de análise de currículo. São Paulo: Editora Moraes, 1987. página 17.

A imagem que Auzúbel projeta é a de uma teia, cuja trama se torna mais firme e resistente à medida que mais fios se somam e entrelaçam. Para ele, informações novas que não encontrem nessa teia lugar onde possam se amarrar, tendem a não ser consistentes nem permanentes, logo se desprendendo – daí alunos que demonstraram bom rendimento em uma prova tradicional não serem capazes, pouco tempo depois, de se lembrar dos conteúdos avaliados. Quando, por outro lado, as novas informações ligam-se a conhecimentos prévios, integram-se à rede de conhecimentos do sujeito, que se alarga e se torna mais complexa. Caso o aprendiz não tenha conhecimentos prévios que funcionem como subsunçores, o educador deve lançar mão do que Auzúbel chama de organizadores prévios – isto é, elementos familiares ao aprendiz ou derivados da sua experiência – que possam funcionar como pontes cognitivas, ligando os novos conhecimentos a outros, mesmo que mais distantes e com laços mais frágeis em um primeiro momento.

Considerando as demandas escolares, os conteúdos a serem explorados e os objetivos de aprendizagem que fazem parte do currículo de uma escola, como a teoria da aprendizagem significativa pode auxiliar na formação de alunos críticos, participativos e atuantes? E qual é, de fato, o verdadeiro significado quanto ao protagonismo, indicando que os alunos devem ocupar posição central no processo de ensino-aprendizagem?

Para uma melhor compreensão desses processos, é necessário entender o sentido de protagonismo, o destaque que a escola dá para as culturas juvenis e qual o papel do professor que, reconhecendo tudo isso, faz uso de metodologias e estratégias específicas que visam tornar o aluno mais participativo e atuante naquilo que for possível.

Culturas juvenis

O termo culturas juvenis se refere a diferentes maneiras como os adolescentes conduzem suas vidas e pode estar relacionado a interesses, estilos, comportamentos, música, crenças, vocabulário, roupas, esportes e características dos encontros e festas dos quais participam. O reconhecimento desta ideia nos faz refletir que, quase à parte das regras de conduta da sociedade, existe uma subcultura com normas, costumes, comportamentos e valores, diferentes do que talvez seja esperado por grande parte da sociedade.

Considerar as culturas juvenis como parte da formação do adolescente implica trazer para a sala de aula a legitimidade dessa realidade, integrando-a, quando possível, aos objetivos de aprendizagem e aos conteúdos trabalhados, possibilitando o exercício da reflexão com atividades que extrapolam o espaço da sala de aula. Isso acontece, por exemplo, quando tomamos como base a prática do isqueite para refletir sobre o uso de fontes históricas e o trabalho do historiador.

A análise de problemas reais e a busca de soluções, considerando o conhecimento teórico aprendido, pode ser o caminho não apenas para compreender a realidade, como também para interagir e tentar buscar soluções para as demandas da vida em uma sociedade global.

O que é ser protagonista

Desde a implementação da Bê êne cê cê, o termo protagonismo vem sendo bastante discutido, destacando-se nas Competências gerais e específicas desde a Educação Infantil até o Ensino Médio.

Esse termo, muito utilizado no contexto da dramaturgia, nos remete ao personagem principal, que se sobressai durante toda a narrativa. O mesmo ocorre em outros contextos, como nos esportes, onde o protagonista é quem joga melhor e se destaca.

No contexto escolar, no entanto, não devemos compreender o jovem como aquele que se destaca ou que vai liderar tudo o que ocorre na escola. A instituição e os professores são os responsáveis pelo currículo e pelo encaminhamento das programações destinadas a cada faixa etária. A concepção de protagonismo nos remete ao contexto da aprendizagem, destacando que a realidade vivenciada pelo jovem deve estar inserida nas programações didáticas, de modo que ele possa comprometer-se, refletir e atuar na sociedade em que vive, além de responsabilizar-se por seu processo de aprendizagem, incluindo os processos avaliativos.

Nessa concepção, o jovem deixa de ser apenas ouvinte ou receptor de informações e o professor passa a atuar como mediador da aprendizagem, uma vez que considera a vivência e a realidade do jovem para planejar e provocar a reflexão acerca de realidades e conflitos atuais e a tomada de decisão com relação aos caminhos que serão percorridos.

Tornando-se responsável e apropriando-se dos processos de aprendizagem, o educando tem a oportunidade de exercer a capacidade de fazer suas próprias escolhas, de resolver problemas, de adaptar-se a diferentes cenários, de trabalhar em grupo, de pensar criticamente, de comunicar e expressar-se, de confiar em seu potencial e de tornar-se proativo mediante situações das quais faz parte, demonstrando iniciativa, criticidade e responsabilidade.

Fotografia. Meninos e meninas em pé, um ao lado do outro, em ambiente escolar. Alguns seguram folhas de papel. À direita, uma menina segura um microfone em uma das mãos e uma folha de papel na outra.
Alunos da Escola Estadual Quilombola Professora Tereza Conceição de Arruda apresentam-se em homenagem ao Dia Internacional da Mulher. Quilombo Mata Cavalo, Nossa Senhora do Livramento, Mato Grosso. Foto de 2020. O comprometimento com a realização de atividades individuais e coletivas é uma fórma de exercício do protagonismo.

Metodologias ativas

Um recurso importante no processo de ensino-aprendizagem é o uso de metodologias ativas, que favorecem o estabelecimento de conexões cognitivas e emocionais para que a aprendizagem seja significativa. Como defende José Moran,

“a aprendizagem mais profunda requer espaços de prática frequentes (aprender fazendo) e de ambientes ricos em oportunidades. Por isso, é importante o estímulo multissensorial e a valorização dos conhecimentos prévios dos estudantes para ‘ancorar’ os novos conhecimentos. reticências A aprendizagem ativa aumenta a nossa flexibilidade cognitiva, que é a capacidade de alternar e realizar diferentes tarefas, operações mentais ou objetivos e de adaptar-nos a situações inesperadas, superando modelos mentais rígidos e automatismos pouco eficientes.”

Baciqui, Lilian; MORAN, José (organizador). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018. página 3.

Nas metodologias ativas, o professor é deslocado do lugar de detentor do conhecimento para o de mediador, sendo responsável por planejar e organizar as atividades que os alunos desempenharão para construir o conhecimento, apropriar-se dele e mobilizá-lo.

Entre as metodologias ativas sugeridas na coleção, há propostas de escrita criativa, de debates, de pesquisa, de entrevistas, de construção de relatórios, de criação de blog, entre outras, cuja concretização exigirá que os alunos mobilizem informações históricas e as articulem com autonomia. Há também indicações de situações-problema para as quais os alunos deverão buscar solução por meio de investigação ou do inter-relacionamento de informações e conceitos de diferentes componentes curriculares. Além disso, podem-se utilizar estratégias como a sala de aula invertida, delegando aos alunos tarefas individuais para serem realizadas antes da aula, reservando o tempo na escola para atividades coletivas como debates e pesquisas em grupo.

Ao preparar-se previamente para as aulas, os alunos desenvolvem habilidades como a autonomia, a capacidade da resolução de problemas, o senso crítico, a organização e a gestão do tempo. A aula, por sua vez, passa a ser um debate de dúvidas em que o professor atua na mediação da construção do conhecimento, podendo discutir a aplicabilidade dos conceitos em situações reais e práticas.

Argumentação

O reconhecimento dos alunos como protagonistas do processo de ensino-aprendizagem demanda que sejam incentivados ao exercício do pensamento e ao enfrentamento de situações em que precisem mobilizar seus conhecimentos.

Para desenvolver a argumentação, os alunos devem ser orientados a selecionar informações coerentes com o ponto de vista que pretendem defender e concatená-las de maneira lógica, objetiva e clara, construindo um raciocínio convincente. Além disso, é importante que sejam incentivados a realizar uma escuta ativa, a fim de compreender o pensamento de seu interlocutor e a linha de raciocínio seguido.

Essas são habilidades a serem desenvolvidas ao longo dos anos. Assim, em diversos momentos da coleção, os alunos são convidados a mobilizar seus conhecimentos na construção de argumentos e a sustentar seus pontos de vista.

Nesses momentos, sempre que possível, é recomendável incentivar que as práticas de argumentação, orais ou escritas, sejam fundamentadas no conhecimento científico. No caso da aprendizagem em história, convém ter em mente que o acesso a acervos digitalizados aumenta o subsídio para a construção de argumentos fundamentados, como exposto no item “A história e fontes digitais” deste manual.

Investigação científica

A investigação científica favorece a ativação de diversas habilidades cognitivas, na medida em que o aluno deve, movido por uma situação desafiadora – a situação-problema –, propor uma hipótese e encontrar, selecionar e sistematizar dados e informações que subsidiem a resposta buscada. No ensino de história, as situações-problema podem servir para aproximar passado e presente e colaborar para o desenvolvimento do pensamento histórico. Por exemplo, ao apresentar aos alunos uma situação de violência no campo e pedir que busquem soluções para pacificar e democratizar as relações nessas áreas, eles terão de pesquisar a formação da estruturação fundiária nacional, o perfil da sociedade agrária brasileira, as relações entre colonizador e populações originárias, entre outros aspectos, para entender a origem e a natureza da violência no campo, com o objetivo de propor uma solução. Deve-se lembrar que, nos anos finais do Ensino Fundamental, os estudantes ainda estão em fase de desenvolvimento de autonomia e por essa razão as pesquisas devem ser orientadas e guiadas por uma relação de perguntas, a fim de que eles não se percam e fujam do foco ou se limitem a imprimir páginas aleatórias de sites da internet.

No conjunto dos quatro volumes desta coleção, os alunos terão contato com noções introdutórias de práticas de pesquisa como revisão bibliográfica, análise documental, construção e uso de questionários, estudo de recepção, entrevista, análise de mídias sociais e observação, tomada de nota e construção de relatório. Trata-se de um trabalho preparatório para que essas práticas sejam retomadas e aprofundadas na etapa do Ensino Médio.

Leitura inferencial

A leitura inferencial pressupõe a percepção das sutilezas dos textos e o entendimento daquilo que está em suas entrelinhas, o que está sugerido e até o que foi omitido. No início dos anos finais do Ensino Fundamental, muitos estudantes ainda apresentam dificuldade para realizá-la. Assim, é importante que o professor trabalhe a leitura de textos e imagens tanto no nível da compreensão quanto no da interpretação, buscando criar, sempre que possível, situações de aprendizagem em que alunos com mais dificuldade trabalhem na companhia de colegas com nível de leitura mais amadurecido. Os alunos do 8º e 9º ano podem ser expostos com mais frequência a textos e imagens cuja interpretação exija que ativem conhecimentos já aprendidos. Por exemplo, ao estudar o Iluminismo, o professor pode selecionar dois artigos atuais com temática econômica ou política, um de inspiração liberal e outro não, e solicitar aos alunos que indiquem o texto cujas ideias se identificam com o liberalismo.

Partindo da ideia de que o pensamento inferencial é reconhecido como um processo de percepção e elaboração da informação que leva à produção de uma série de conclusões que não estão explícitas no texto lido, o professor pode fazer uso de estratégias que, gradativamente (e de maneira contínua) estimulem o desenvolvimento dessa habilidade.

Durante a leitura, prepare perguntas que exijam que os alunos tirem suas próprias conclusões (uma vez que a resposta não estará explícita) e peça para explicarem o porquê de tal conclusão (ou com base em quais fatos eles podem sustentar sua explicação). Nesse momento, é importante estar atento aos alunos com mais dificuldade em realizar inferências e, se necessário, formular novas perguntas para estimular que estabeleçam relações entre o texto e seus conhecimentos.

A inferência se sustenta na elaboração de teorias e hipóteses acerca da leitura, comparando-a a vivências e conhecimentos que os alunos já têm. Por isso, oportunidades em que eles tenham que explicitar seus pensamentos também são de fundamental importância.

Pensamento computacional

O termo pensamento computacional está associado à linguagem de programação, cuja aplicação na educação é vista por parte dos educadores como capaz de favorecer uma aprendizagem significativa e eficiente. Ele se estabeleceu na década de 1980, mas se popularizou apenas em 2006, quando passou a ser empregado como referência a uma maneira específica como os cientistas da computação pensam o mundo. Em 2016, com base nas proposições anteriores, bárbara cúrshãn definiu o pensamento computacional como

“uma distinta capacidade criativa, crítica e estratégica humana de saber utilizar os fundamentos da computação, nas mais diversas áreas do conhecimento, com a finalidade de identificar e resolver problemas, de maneira individual ou colaborativa, através de passos claros, de tal fórma que uma pessoa ou uma máquina possam executá-los eficazmente.”

Bréquiman cristian palman. Desenvolvimento do pensamento computacional através de atividades desplugadas na Educação Básica. 2017. Tese (Doutorado em Informática na Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017. página 29.

Apesar de sua associação evidente com o universo das tecnologias digitais, o pensamento computacional não está limitado a ele, podendo ser entendido também como o conjunto de processos cognitivos envolvidos na formulação e na resolução

de problemas. As habilidades operatórias ativadas pelo pensamento computacional são várias: identificar, analisar, decompor, verificar padrões, generalizar, entre outras. Em linhas gerais, elas podem ser organizadas em quatro etapas fundamentais:

  • Decomposição: na primeira etapa, deve-se identificar um problema complexo e decompô-lo em problemas menores.
  • Reconhecimento de padrão: procede-se, então, à análise de cada problema menor e à sua comparação com outros problemas similares para os quais já há solução.
  • Abstração: atenta-se apenas para os aspectos mais importantes de cada problema, ignorando-se os detalhes irrelevantes.
  • Algoritmos: com base nos passos anteriores, pode-se criar regras ou passos para orientar a solução de problemas similares.

Nessa coleção, algumas dessas habilidades operatórias ativadas pelo pensamento computacional são empregadas, por exemplo, em atividades de sistematização e análise de dados, como aquelas que envolvem pesquisas quantitativas e a necessidade de obter dados estatísticos; em propostas de comparação entre determinados elementos de diferentes civilizações; na resolução de situações-problema, entre outras oportunidades.

Estudo de campo e visitas guiadas

O estudo de campo e a realização de visitas guiadas são atividades importantes para estimular a curiosidade dos alunos e trabalhar procedimentos de investigação e sistematização de dados. Todavia, seu bom aproveitamento no processo de ensino-aprendizagem depende da maneira como são realizados, pois também nessas situações o aluno deve ocupar posição de centralidade. É fundamental que essas atividades sejam precedidas por uma preparação, na qual os estudantes pesquisem ou recebam informações básicas sobre o lugar para onde vão, o que encontrarão, qual será o objetivo da atividade etcétera Eles também devem ser orientados sobre as informações ou dados que devem coletar e o modo como fazer isso (anotações, registros fotográficos, ficha etcétera). Além disso, é importante que os dados coletados sejam analisados pelos alunos, a fim de chegarem a uma conclusão.

Diferentes perfis de estudante e projeto de vida

A valorização do protagonismo do estudante com o uso de estratégias que o colocam no centro do processo de ensino-aprendizagem não retira do professor a necessidade de estar atento às particularidades dos alunos. Pelo contrário, a posição de mediador requer mais atenção do professor em um contexto de postura ativa dos alunos na execução de algumas atividades.

Desse modo, o desenvolvimento de competências relacionadas a autonomia de pensamento, capacidade de produzir análises críticas e criativas, empatia, cooperação, argumentação, entre outros, deve considerar os diferentes perfis dos estudantes.

Nesse sentido, é preciso estar alerta ao fato de que cada aluno tem experiências específicas fóra da escola (familiares e comunitárias) e que, no ambiente escolar, expressa de maneira única suas visões de mundo enquanto influencia e é influenciado pelos colegas. É tarefa do professor observar com sensibilidade os comportamentos individuais e em grupo para identificar potencialidades e fragilidades, de modo a promover a integração de todos num ambiente de cooperação em que os alunos mais aptos em determinada tarefa possam contribuir para o desenvolvimento dos demais, sobretudo no trabalho com turmas numerosas, por exemplo, com mais de 40 pessoas.

Para garantir a criação desse ambiente, cabe ao professor, ainda, cuidar para que não haja qualquer tipo de constrangimento, seja de natureza socioeconômica ou relativa a atitudes e valores, desestimulando quaisquer sinais de desrespeito à individualidade dos estudantes. Espera-se, dessa maneira, contribuir para a consolidação da escola como espaço de cidadania participativa.

reticências Atenta a culturas distintas, não uniformes nem contínuas dos estudantes dessa etapa, é necessário que a escola dialogue com a diversidade de formação e vivências para enfrentar com sucesso os desafios de seus propósitos educativos. A compreensão dos estudantes como sujeitos com histórias e saberes construídos nas interações com outras pessoas, tanto do entorno social mais próximo quanto do universo da cultura midiática e digital, fortalece o potencial da escola como espaço formador e orientador para a cidadania consciente, crítica e participativa.

Nessa direção, no Ensino Fundamental – Anos Finais, a escola pode contribuir para o delineamento do projeto de vida dos estudantes, ao estabelecer uma articulação não somente com os anseios desses jovens em relação ao seu futuro, como também com a continuidade dos estudos no Ensino Médio. Esse processo de reflexão sobre o que cada jovem quer ser no futuro, e de planejamento de ações para construir esse futuro, pode representar mais uma possibilidade de desenvolvimento pessoal e social.”

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 61-62.

Nesta coleção, diversos recursos articulados com as culturas juvenis propiciam ao aluno refletir sobre as questões sociais de sua época, podendo orientá-lo em suas escolhas pessoais e em seu projeto de vida, na medida em que permitem aproximá-lo da ideia sobre quem ele quer ser no futuro.

Exemplos desses recursos são as diversas atividades que apresentam tirinhas (linguagem dos quadrinhos), charges, memes ou exploram a linguagem das redes sociais; e também as que solicitam aos alunos a criação de materiais desses tipos, incluindo versão de música, com base nos referenciais culturais deles. A coleção também apresenta diversas imagens, como os grafites e reproduções de cenas de filmes e animações, e sugestões de filmes, livros e jogos que fazem parte das culturas juvenis, propiciando possibilidades de conexão entre a aplicação dos conhecimentos concernentes ao componente curricular história e os anseios dos estudantes.

Ensinar história

Ensinar história é trabalhar pela compreensão dos processos que se desenvolveram no decorrer do tempo para dar fórma à realidade vivida no presente, auxiliando os alunos a perceberem as conexões que conferem sentido a diferentes aspectos da realidade. É também contribuir para que identifiquem seu lugar e papel no mundo, e assumam seu protagonismo, tomando decisões com autonomia. Nesse processo, é importante que os jovens se apropriem de uma fórma específica de conhecimento, que depende, principalmente, da capacidade de estabelecer relações temporais. Essa apropriação somente ocorre se exercitarem o pensamento, pondo em prática determinados procedimentos que, aos poucos, constroem sua formação histórica.

A compreensão dos processos históricos depende, entre outras coisas, da consciência de que o passado pode ser interpretado de diferentes maneiras e de que o conhecimento histórico é dinâmico. Em outras palavras, o estudante precisa entender que o conhecimento histórico se transforma à medida que surgem novas evidências e os historiadores percorrem caminhos de interpretação antes ignorados ou insuficientemente explorados. Como nos lembra chênô,

reticências os fatos históricos são cognoscíveis cientificamente, mas essa exigência deve levar em conta seus caracteres específicos. Por um lado, os fatos históricos são contraditórios como o próprio decorrer da história; eles são percebidos diferentemente (porque diferentemente ocultados) segundo o tempo, o lugar, a classe, a ideologia. Por outro lado, escapam à experimentação direta por sua natureza passada; são suscetíveis apenas de aproximações progressivas, sempre mais próximas do real, nunca acabadas nem completas.”

chenô jeãn. Devemos fazer tábula rasa do passado? São Paulo: Ática, 1995. página 67.

Para que os alunos compreendam o caráter dinâmico e plural do conhecimento histórico, é importante que sejam frequentemente apresentados a diferentes interpretações de um mesmo acontecimento, bem como a estudos que abordam aspectos distintos de uma mesma realidade. Assim, desenvolverão a habilidade de ponderar e avaliar com autonomia interpretações históricas fóra do ambiente escolar.

Da mesma fórma, é importante que, no decorrer de sua formação, os alunos entendam que as fontes históricas não são um espelho da realidade de seu tempo, e sim uma representação dela, e sua compreensão e sua análise também passam por interpretações, o que põe em xeque a crença na objetividade absoluta do conhecimento histórico. Além disso, o ensino de história deve proporcionar aos alunos a percepção de que a história combina diferentes temporalidades e de que as transformações, por exemplo, na vida política podem não ser acompanhadas de mudanças nas estruturas econômicas ou na fórma de pensar. Por fim, para que vejam a si mesmos como sujeitos da história, é necessário conhecer, além de figuras consagradas na memória coletiva, personagens comuns, com os quais possam estabelecer uma identificação.

O ensino de história da África, da cultura afro-brasileira e das populações indígenas

O ensino de história e cultura africana, afro-brasileira e indígena em todo o currículo escolar da Educação Básica tornou-se obrigatório desde a implementação das Leis número .10639, de 2003, e número .11645, de 2008. Apesar de reconhecer a relevância dessas leis e considerar que a temática contribui para combater o racismo, o preconceito, a discriminação e os estereótipos, favorecendo a construção de uma sociedade pautada no respeito à diversidade e à pluralidade, incorporá-la aos currículos tem sido um desafio constante para toda a comunidade escolar.

Segundo o relatório Educação: um tesouro a descobrir, publicado pela unêsco, o conhecimento escolar deve ser pautado em quatro pilares: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. Nesse sentido, é importante que, durante as aulas, os alunos sejam incentivados a:

  • “aprender a conhecer” conceitos relacionados à história da África, à história e cultura afro-brasileira e das populações indígenas que tenham interferido na formação das sociedades e culturas em que vivemos atualmente;
  • “aprender a fazer”, colocando em prática os conhecimentos adquiridos sobre a história da África, a história e cultura afro-brasileira e das populações indígenas, utilizando-os como subsídios para analisar, por si mesmos, os acontecimentos históricos relacionados à nossa sociedade e às populações minoritárias;
  • “aprender a viver juntos” ou a “conviver”, percebendo que as diferenças devem ser respeitadas e valorizadas;
  • “aprender a ser”, compreendendo que todos têm o direito de expressar suas crenças, seus modos de vida e suas culturas, sem sofrer qualquer tipo de distinção ou segregação.

Se estivermos atentos a esses pontos, poderemos contribuir com uma prática de ensino da história que favoreça a reflexão, o debate, a criticidade e que prepare os jovens para valorizar a diversidade e construir uma sociedade mais justa e igualitária.

Tempo, memória e fontes

O tempo é a categoria estruturante da história, seja como área de pesquisa, seja como componente curricular. Estamos nos referindo ao tempo histórico, um tempo de mudanças, de permanências, de ocorrências simultâneas, formado pelo desenvolvimento das sociedades humanas ao longo do tempo cronológico.

A compreensão do tempo histórico é uma construção abstrata e complexa, que se fórma em grande parte no decorrer da vida escolar, da infância até a juventude. Trata-se de um conceito fundamental para o conhecimento histórico, em virtude das ideias de ruptura e continuidade entre o passado e o presente (e dos distintos ritmos de mudança entre acontecimentos simultâneos). Para a apreensão do conceito, é necessário um longo aprendizado, porque há camadas e dimensões temporais que ora se superpõem, ora se distanciam. Em um primeiro momento, os alunos deverão situar sua vida pessoal em um contexto social para, só depois, expandir a consciência para outros tempos e espaços. Nessa experiência, os alunos vivem a passagem do tempo-calendário para o tempo histórico e social, trajetória realizada, em grande parte, nas aulas de história.

Além do entendimento do tempo histórico, outra categoria importante no ensino de história é a memória. Como tratamos anteriormente, os estudos que têm a memória como objeto procuram identificar a construção coletiva de memórias e os usos políticos do passado pelo presente.

Discutir a construção da memória é fundamental para a reflexão sobre o ensino de história, principalmente quando são abordadas questões contemporâneas ou festejos de datas cívicas, ocasiões em que, muitas vezes, se recorre à história para elaborar projetos ou promover atividades que possam contribuir para cristalizar ideias e afirmar uma memória coletiva sem posicionamento crítico.

“O pêso do dever de memória pode eliminar a necessária reflexão acerca do que se ensina, ou seja, ‘os conteúdos’. Quantas vezes o que parece importante per sê impede de avaliar a pertinência do tema e o recurso didático, ou seja, a resposta à pergunta sobre a utilidade do tema em curso? Os ‘valores’ que se procuram transmitir (e, nesse sentido, o ensino das ciências sociais foi um veículo habitual para eles) o são em função de determinados processos que são históricos e requerem um contexto para sua compreensão reticências.”

lorênz, Federico Guilhermo. O passado recente na Argentina: as difíceis relações entre transmissão, educação e memória. In: CARRETERO, Mario e outros (organizador). Ensino da história e memória coletiva. Porto Alegre: artimédi, 2007. página 240.

Em razão disso, o professor, ao definir a abordagem de cada tema, deve proporcionar possibilidades variadas de análise, mostrando aos alunos como o mesmo acontecimento pode ser visto de diversos ângulos e, de cada ângulo, adquirir diferentes valores, recebendo mais ou menos atenção. A execução de Tiradentes, por exemplo, pode ser supervalorizada em uma época e ser quase banida em outra, dependendo das condições históricas presentes no momento em que o tema é tratado. As lutas operárias e as revoluções do século vinte foram muito valorizadas pela historiografia das décadas de 1970 e 1980, quando a Guerra Fria despertava paixões revolucionárias. No entanto, a partir do final do século vinte, com o fim da Guerra Fria, temas ligados à cultura e ao cotidiano ganharam destaque como objeto de estudo, o que reduziu as pesquisas sobre os movimentos políticos e sociais.

O trabalho com fontes históricas

Uma das tarefas que mais exigem a atenção do professor de história é o trabalho com fontes. É muito tentador utilizá-las apenas como elemento de ilustração das explicações dadas em sala de aula, especialmente quando se trata de fontes imagéticas. Contudo, ao fazer isso, o professor perde a oportunidade de trabalhar com os alunos a construção do saber histórico, fundamental para o desenvolvimento do olhar analítico.

Hoje não se admite que uma fonte seja tratada como portadora fiel de uma verdade histórica. Na análise de uma fonte deve estar presente a preocupação com as condições de sua produção.

O historiador Eduardo França Paiva destaca a importância de nos perguntarmos quais são as lacunas, os vazios e os silêncios que permeiam a construção de um material que servirá como fonte histórica e como essa fonte foi apropriada ao longo do tempo, de acôrdo com o contexto em que seus usuários a observaram. Ele enfatiza:

“Ora, sem aplicar esses procedimentos às fontes e, evidentemente, às fontes iconográficas, os historiadores e os professores de história transformam-nas em reles figurinhas e ilustrações de fim de texto e, pior, emprestam-lhes um estatuto equivocado e prejudicial ao conhecimento histórico. Refiro-me ao estatuto da prova e de verdades irrefutáveis, tudo apresentado a partir de uma falsa autoridade tomada a uma história que assim o permitisse. Mas a armadilha iconográfica parece ser mais sedutora que as armadilhas de outras fontes. Talvez seja a própria beleza da imagem reticências. A imagem, bela, simulacro da realidade, não é a realidade histórica em si, mas traz porções dela, traços, aspectos, símbolos, representações, dimensões ocultas, perspectivas, induções, códigos, cores e fórmas nela cultivadas. Cabe a nós decodificar os ícones, torná-los inteligíveis o mais que pudermos identificar seus filtros e, enfim, tomá-los como testemunhos que subsidiam a nossa versão do passado e do presente, ela também, plena de filtros contemporâneos, de vazios e de intencionalidades.”

PAIVA, Eduardo França. História e imagens. segunda edição Belo Horizonte: Autêntica, 2006. volume 1, página 18-19. (Coleção História e Reflexões).

Em sala de aula, o professor não pode perder de vista que toda fonte primária tem de ser interrogada com base nas condições de sua produção. Assim, deve estimular os alunos a questionar o material sob análise com perguntas com nível adequado de complexidade. Alguns exemplos de questionamentos relevantes são:

  • Quem produziu a fonte? Que lugar essa pessoa ocupava na sociedade?
  • Trata-se de um documento oficial, ou seja, emitido por meio de alguma instituição governamental do período?
  • Em que contexto a fonte foi produzida?
  • Qual seria a intenção da pessoa responsável pela produção da fonte?
  • A quem a fonte se destinava?
  • Que valores ou princípios fundamentam sua produção?

Os alunos, sobretudo no 6º e no 7º ano, precisam do auxílio do professor na articulação das várias respostas que obtiverem interrogando as fontes, para que, ao interpretá-las, desenvolvam a capacidade de perceber inclusive o que não está explícito no material analisado.

No processo de aprendizagem também necessitam ser constantemente lembrados de que a fonte é um recorte, um ponto de vista, um aspecto da realidade, e não seu espelho − é a representação da realidade experimentada pelo autor, em um contexto histórico específico.

Ensino de história e interdisciplinaridade

Muito se tem falado sobre interdisciplinaridade na educação, principalmente após a publicação do relatório produzido para a unêsco pela Comissão Internacional sobre Educação para o Século vinte e um, em 1998, chamado Educação: um tesouro a descobrir. No Brasil, a publicação do relatório influenciou a criação do Exame Nacional do Ensino Médio (enêm) e a adoção da matriz de competências e habilidades, por áreas do conhecimento, estabelecida como referência para o exame.

O tema tem sido discutido já há algum tempo. Existe a preocupação de diminuir tanto a compartimentação do conhecimento quanto a crescente especialização, processo que teve início nos séculos dezoito e dezenove com o surgimento da grande indústria e da produção em massa.

Na área de história, como vimos, os trabalhos de pesquisa vêm sendo produzidos com o aporte de várias áreas diferentes desde a primeira metade do século vinte, o que demonstra os limites da perspectiva disciplinar da ciência e do ensino formal.

No Brasil, discute-se a interdisciplinaridade desde a década de 1970. São referências os trabalhos de rilton japiassú, que trata de questões teóricas sobre o assunto, e de Ivani Fazenda, que aborda o tema em seu aspecto pedagógico. Segundo japiassú,

reticências a interdisciplinaridade caracteriza-se pela intensidade das trocas entre os especialistas e pelo grau de interação real das disciplinas no interior de um mesmo projeto de pesquisa.”

japiassú rilton. Interdisciplinaridade e patologia do saber. Rio de Janeiro: Imago, 1976. página 74.

A interdisciplinaridade é motivo de polêmica e objeto de críticas, tanto por quem vê nela o caminho para desvencilhar a ciência dos impasses do mundo globalizado quanto por quem aponta seus limites, sua falta de definição e suas contradições. Atualmente, reconhece-se que o conceito é polissêmico e a aplicação dele depende das possibilidades de manter um olhar que se aproxime de um objeto de pesquisa por diferentes perspectivas e com concepções teóricas apropriadas.

Em consequência, é mais acertado pensar em atitude interdisciplinar. Isso não significa eliminar os componentes curriculares, mas fazer com que dialoguem, partindo do pressuposto de que são concebidos como processos históricos e culturais de constituição do conhecimento e de negociação de significados. É possível respeitar os limites teóricos e metodológicos de cada componente curricular e, ao mesmo tempo, construir pontes entre eles, estabelecendo relações de complementaridade, de convergência e de interconexão.

Podemos, assim, falar em momentos de interdisciplinaridade, estabelecidos após definição de objetivos, planejamento de etapas, tarefas e cronogramas pelos professores dos diversos componentes curriculares envolvidos, em consonância com a prática em sala de aula, a partir da qual se estabelecem as necessidades de cada momento. A realização de experiências interdisciplinares, por meio de projetos compartilhados, de trabalhos investigativos, da reflexão permanente, deve ser balizada pelos professores, de modo que contribua para que os alunos se capacitem para a vida em sociedade e construam uma visão ampla do mundo em que vivem.

Trabalhando nesse sentido, em todos os capítulos desta coleção são apresentadas questões que podem ser desenvolvidas com professores de outros componentes curriculares. Essas questões são acompanhadas de comentários que identificam as habilidades contempladas do componente curricular indicado. Essa indicação pode servir de subsídio para a construção de aulas em conjunto com professores de outros componentes curriculares e áreas do conhecimento. Para facilitar o diálogo com o professor de outro componente, sugere-se a construção de um quadro para direcionar a ação pedagógica conjunta.

PLANEJAMENTO DE AULAS EM CONJUNTO

História

Outro componente

Habilidade

Reprodução do código e do texto da habilidade de história a ser trabalhada

Reprodução do código e do texto da habilidade do outro componente a ser trabalhada

Conteúdo

Descrição sucinta do conteúdo relacionado

Descrição sucinta do conteúdo relacionado

Material didático

Localização do conteúdo no livro ou em outros recursos (númeração de página, endereço de site, minutagem de vídeo etc.)

Localização do conteúdo no livro ou em outros recursos (númeração de página, endereço de site, minutagem de vídeo etc.)

Ação conjunta

Descrição da atividade envolvendo os dois professores, com os procedimentos a serem realizados, a duração, os objetivos a serem alcançados e a definição da estratégia de avaliação dos resultados


O quadro é apenas uma sugestão, podendo ser adaptado de acôrdo com os objetivos e as prioridades adotadas pela escola e pelos professores em seus respectivos cursos.

Temas contemporâneos transversais

Outra maneira de desenvolver a abordagem interdisciplinar é a partir de temas transversais, cuja abrangência – seja em escala local, regional ou global – possibilita um trabalho integrador com diferentes componentes curriculares e áreas do conhecimento.

Com base em alguns pareceres, resoluções e leis federais, a Bê êne cê cê elencou temas contemporâneos a serem incorporados nos currículos e nas propostas pedagógicas. Posteriormente, em 2019, o Ministério da Educação publicou Temas contemporâneos transversais: contexto histórico e pressupostos pedagógicos, organizando os temas em seis macroáreas temáticas.

Esquema. No centro, um boxe na cor azul escura com o texto escrito em branco: Temas contemporâneos transversais na Base Nacional Comum Curricular. Ao redor, setas na cor azul clara ligando o boxe central a boxes laterais em amarelo com texto em preto descrevendo os títulos e seus respectivos subtemas. Da parte superior no centro em direção à direita, entram os seguintes boxes: Título: MEIO AMBIENTE; subtemas: Educação ambiental; Educação para o consumo. Título: ECONOMIA; subtemas: Trabalho; Educação financeira; Educação fiscal. Título: SAÚDE; subtemas: Saúde; Educação alimentar e nutricional. Título: CIDADANIA E CIVISMO; subtemas: Vida familiar e social; Educação para o trânsito; Educação em direitos humanos; Direitos da criança e do adolescente; Processo de envelhecimento, respeito e valorização do idoso. Título: MULTICULTURALISMO; subtemas: Diversidade cultural; Educação para valorização do multiculturalismo nas matrizes históricas e culturais brasileiras. Título: CIÊNCIA E TECNOLOGIA; subtema: Ciência e tecnologia.

Fonte: BRASIL. Ministério da Educação. Temas contemporâneos transversais na Bê êne cê cê. Contexto histórico e pressupostos pedagógicos. Brasília: Méqui, 2019. página 12.

Além de corroborar a ideia de que o espaço escolar deve ser um espaço cidadão, o documento preconiza que os temas contemporâneos transversais, trabalhados de fórma integrada, possam instrumentalizar os estudantes para o entendimento da sociedade em que vivem.

Nos quatro volumes desta coleção, no manual do professor, destacam-se oportunidades em que as temáticas desenvolvidas no contexto do componente curricular história ensejam o trabalho com os temas contemporâneos transversais, explicitando a articulação entre eles.

O ensino de história e as novas tecnologias

A sociedade atual é a da informação, na qual circulam rapidamente quantidades enormes de conteúdo, que se combinam e se reconfiguram em um fluxo dinâmico. Também é a da cultura digital: dos celulares, tablets e da web. A tecnologia atualmente sustenta redes horizontais de poder e conhecimento, estimulando a colaboração para a construção de saberes, ferramentas e técnicas.

É nesse contexto social que a escola está inserida, que alunos e professores estudam e trabalham, estabelecem relações, se divertem e realizam seus planos. No entanto, pela própria velocidade das mudanças, algumas pessoas das gerações mais velhas se sentem inseguras diante das inovações tecnológicas, ao passo que os indivíduos das gerações mais novas vivem na expectativa de alcançar benefícios com o uso das tecnologias digitais, sejam eles sociais, informacionais ou educativos.

Refletindo sobre as mudanças e incertezas dos dias atuais, muitos estudiosos da educação perguntam se é possível afirmar que o uso das novas tecnologias da informação na escola tem contribuído para desenvolver o espírito crítico e investigativo e ampliar a produção de conhecimento e qual será o papel do professor nessa nova conformação.

O historiador Rogê Chartiê, reconhecido por seus estudos sobre a história do livro e da leitura, tem se debruçado sobre a emergência de questões ligadas à tecnologia, como a produção e o armazenamento de conhecimento, os suportes de leitura e as modificações que eles trazem. Ele chama a atenção para a recepção quase simultânea que um texto pode ter na internet. Não há mais necessidade de fazê-lo passar pelas etapas de edição, impressão, divulgação e venda do material impresso. A facilidade de publicar textos na internet permite que o próprio leitor se transforme em escritor e divulgue seus textos instantaneamente, sem intermediários, fenômeno bastante presente nos blogs, por exemplo.

Outra mudança que Chartiê destaca é a

reticências possibilidade da biblioteca universal, entendendo por isso que, se cada um dos textos escritos ou impressos do patrimônio textual é transformado em um texto eletrônico, não há razão para que não se possa propor uma universal disponibilidade do patrimônio textual por meio da transmissão eletrônica.”

Chartiê Rogê. Cultura escrita, literatura e história: conversas de Rogê Chartiê com Carlos aguírre anaia, Jesús Anáia Rosíque, Daniel Goldin e Antonio saborit. Porto Alegre: artimédi, 2001. página 146.

Esses pontos nos levam a pensar em questões como autoria/autoridade vérçus horizontalidade do conhecimento. Hoje em dia, qualquer pessoa pode se tornar autor, e a palavra escrita pode ser questionada quase imediatamente. As mudanças também afetam o papel do professor em sala de aula e a sua credibilidade, pois ele já não é aquela autoridade que domina uma bibliografia de difícil acesso e tem a missão de revelar seu conteúdo aos alunos. Informações e conhecimentos estão disponíveis para todos ao toque de uma tecla. E aos montes. Na internet proliferam textos. É para isso que, falando sobre a biblioteca universal eletrônica, Chartiê adverte:

“Há muitos riscos. Por exemplo, o de dar uma dimensão inédita, original, nova, ao tema que identificamos na discussão em torno do temor do excesso textual: um mundo textual que não possa ser manejado, que esmague o leitor mais do que o ajude, um mundo proliferante e incontrolável. Aqui, os bancos de dados e os terminais desta biblioteca universal, ao menos virtual, seriam uma figura particularmente extrema deste excesso de textos.”

Chartiê Rogê. Cultura escrita, literatura e história: conversas de Rogê Chartiê com Carlos aguírre anaia, Jesús Anáia Rosíque, Daniel Goldin e Antonio saborit. Porto Alegre: artimédi, 2001. página 147.

A advertência feita por Chartiê nos remete a um dos papéis centrais do professor na atualidade: mediar a excessiva oferta de informações existente e, ao mesmo tempo, qualificá-la, propondo trajetórias de leitura e maneiras de analisar o material disponível, de acôrdo com uma proposta de trabalho que seja clara nos fundamentos, na metodologia e nos objetivos.

Perdida a autoridade vertical, o professor pode compartilhar seu conhecimento com os alunos, estabelecendo uma troca estimulante – até porque os alunos também terão um papel mais ativo na busca por informações. A nova relação, porém, não dispensa o conhecimento do componente curricular e o uso de estratégias adequadas para trabalhar com um grupo específico de alunos. Sem isso, não há aparato tecnológico que viabilize o aprendizado na Educação Básica.

Garantidas certas condições, a tecnologia digital pode ser utilizada de maneira muito criativa, possibilitando, por exemplo, experiências que muitos alunos talvez não pudessem vivenciar de outra fórma − como visitas virtuais a museus e a sítios arqueológicos, consulta a arquivos, entre outras. São muitas as propostas possíveis para os alunos: criação de um blog para discutir temas ou compartilhar resultados de pesquisa, elaboração de aulas on-line pelos grupos ou a comunicação on-line com alunos de outras escolas, formando redes de pesquisa, por exemplo. O professor, por sua vez, pode trabalhar em conjunto com um profissional da área de tecnologia na escola, quando houver, para desenvolver projetos nessa área.

Só não podemos cair na falácia de acreditar que a tecnologia, por si só, revolucionará a educação e dispensará os recursos humanos. Até porque não é apenas conteúdo o que se ensina e se aprende na escola. Conforme adverte Otacíllio Ribeiro:

“A máquina precisa do pensamento humano para se tornar uma ferramenta auxiliar no processo de aprendizado. É necessário integrá-la às mais diferentes atividades, pois ela pode ser entendida enquanto instrumento de expansão do pensamento. Que sirva para envolver os estudantes em projetos práticos, desafiadores e que estimulam o raciocínio humano. Hoje, o papel da escola é ensinar a pensar, preparando o aluno para lidar com situações novas, problematizando, discutindo e tomando decisões. Sobretudo, cabe à educação resgatar o homem de sua pequenez, ampliando horizontes, buscando outras opções, tornando as pessoas mais sensíveis e comunicativas.

Ao pensar o processo pedagógico mediado pela tecnologia, não se pode esquecer que a centralidade da ação deve estar nos sujeitos, e não nas técnicas.”

RIBEIRO, Otacíllio J. Educação e novas tecnologias: um olhar para além da técnica. In: coscaréli, Carla; RIBEIRO, Ana Elisa (organizador). Letramento digital: aspectos e possibilidades pedagógicas. terceira edição Belo Horizonte: Autêntica/ceále, 2011. página 94. (Coleção Linguagem e Educação).

Assim, viver na sociedade do conhecimento e da cultura digital abre possibilidades que não dispensam a escola e menos ainda o professor, mas exigem deles uma readequação. Quanto antes enfrentarmos esses desafios, mais rápido os alunos se sentirão integrados ao mundo no qual nasceram, seja porque a tecnologia já faz parte da sua vida fóra da escola, seja porque, muitas vezes, eles não teriam acesso a ela sem a escola.

Dinamismo e flexibilidade nas aulas

Existe ainda resistência de parte de alguns professores em abandonar o modêlo tradicional da aula expositiva por acreditar que, sem sua explanação, os alunos não entenderão os conteúdos que devem aprender. Contudo, ainda que a aula expositiva seja eficiente em determinadas situações – por exemplo, quando for necessário sistematizar um conjunto de informações acessadas pelos alunos por meio de atividades de uma sequência didática –, seu emprego como único (ou quase único) método didático tende a ser pouco eficiente para promover a aprendizagem. Além de monótona e pouco estimulante, a repetição de aulas expositivas não permite que sejam criadas situações novas e desafiadoras que atendam às necessidades de grupos heterogêneos de estudantes, cuja aprendizagem ocorre por diferentes meios. Segundo Julia Andrade e Juliana Sartori, se o professor enfatiza exclusivamente atividades nas quais o aluno permanece passivo, no papel de mero receptáculo do conhecimento transmitido, ele

“tende a não formar memórias de longa duração, não se vincula emocionalmente ao trabalho escolar e não tem condições de construir ativamente seu próprio conhecimento e conectá-lo com sua vida. Sua tendência é criar memórias operatórias de curto e médio prazo reproduzindo mecanicamente informações para atender a uma demanda externa a ele e, após testes e avaliações, esquece tudo o que estudou.”

Baciqui, Lilian; MORAN, José (organizador). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018. página 180.

Por outro lado, a oferta de aulas dinâmicas e variadas, mas sem estarem articuladas para atingir um objetivo pedagógico claro, tende a produzir um efeito caótico, favorecendo a dispersão e dificultando a concatenação dos conteúdos estudados para que estejam a serviço do desenvolvimento de habilidades e da construção de competências.

Desse modo, para conseguir um resultado favorável, o professor precisa planejar minuciosamente o percurso que pretende fazer com seus alunos. Nesse planejamento, deve-se observar uma relação de itens:

  • Qual é o objetivo das aulas?
  • Que objetos do conhecimento é preciso mobilizar para atingir esse objetivo?
  • Quais são os conceitos históricos estruturantes desses objetos?
  • Que atividades posso propor para conduzir o aluno até meu objetivo e em que sequência elas serão propostas?
  • Que materiais usarei para essas atividades?
  • Em que espaço as atividades serão trabalhadas?
  • De quantas aulas precisarei?
  • Como os alunos serão organizados para a realização das atividades?
  • Como avaliarei os resultados das atividades?
  • O que é possível fazer caso algum aluno não atinja o objetivo esperado?

Ao responder a cada uma dessas questões, o professor não deve se prender à sequência de capítulos nem de atividades do livro didático, mas reorganizá-los de acôrdo com seu objetivo. Assim, suponhamos que o objetivo seja trabalhar a habilidade ê éfe zero seis agá ih zero sete da Bê êne cê cê (Identificar aspectos e fórmas de registro das sociedades antigas na África, no Oriente Médio e nas Américas, distinguindo alguns significados presentes na cultura material e na tradição oral dessas sociedades) com os alunos do 6º ano. Para isso, o professor não precisará trabalhar individualmente os capítulos do livro didático, nem seguir a sequência exata em que estão apresentados. É possível, por exemplo, selecionar o texto “Tradição oral e patrimônio imaterial” (capítulo 2), sobre as sociedades ágrafas e o papel dos griôs, para uma aula dialógica com a turma; depois propor a leitura individual do texto didático “Saberes incas” (capítulo 5), sobre o quipo, para fazer uma comparação entre as duas fórmas de transmissão de conhecimento; a seguir, pode-se sugerir a análise em grupo da charge “A evolução da escrita”, de Luiz Fernando Cazo (capítulo 4); por fim, com a participação dos alunos, pode-se elaborar uma tabela na lousa sobre as várias fórmas de registro.

O professor, portanto, tem autonomia para realizar recortes e recombinar os materiais disponibilizados pelo livro didático, podendo também associá-los a outros materiais e desenvolver atividades complementares. Essa flexibilidade na utilização do material didático e na preparação das aulas permite dar dinamismo às aulas, planejá-las em função dos conhecimentos prévios e dos interesses dos alunos e orientar melhor o trabalho em função dos objetivos selecionados.

Avaliação: processos e concepções

A avaliação, com seus problemas, dificuldades e métodos, é um tema complexo e que suscita várias abordagens e proposições. O que avaliar, de que maneira e que resultado esperar são questões há muito tempo debatidas e que devem permanecer na pauta dos debates na área da educação, porque a avaliação faz parte do processo de ensino-aprendizagem e acompanha toda e qualquer mudança nos critérios que norteiam a prática pedagógica.

Atualmente, enfatiza-se que a avaliação não pode ser tratada somente como uma medida quantitativa de quais conteúdos o aluno aprendeu, mas sim como um instrumento pedagógico que também incorpore aspectos qualitativos, sendo diagnóstica e processual, para que o professor tenha noção do percurso percorrido pelo aluno na aprendizagem e também da eficiência da metodologia que está utilizando. Assim, em vez de instrumento de classificação quantitativa da aprendizagem, a avaliação defendida atualmente possui uma característica híbrida, ou seja, combina aferição quantitativa com percepção qualitativa, colocando o foco mais no processo do que no resultado final. Trata-se de uma via de mão dupla, pela qual professores e alunos têm a oportunidade de revisar o trabalho e, se necessário, corrigir a trajetória durante o percurso.

Por isso, avaliações não devem ser realizadas somente em momentos estabelecidos no calendário escolar, e sim em diversas ocasiões, com os mais variados recursos, práticas e estratégias, desde os mais subjetivos, como a observação do cotidiano do aluno e da sua capacidade para resolver problemas, até os mais objetivos, como provas “oficiais”, seminários e relatórios de pesquisa. O importante é oferecer aos alunos diferentes possibilidades de manifestar suas habilidades, respeitando as diferenças de ritmos e características cognitivas de cada um. Há alunos que preferem se expressar oralmente, outros preferem escrever, outros ainda se sentem mais confortáveis realizando atividades de pesquisa ou análise de textos. Enfim, a melhor fórma de avaliação é aquela que permite aproveitar as habilidades dos alunos de diferentes perfis e lhes serve de incentivo para investir no processo de aprendizagem, e não aquela que os desqualifica.

Entre as orientações apresentadas pelos manuais do professor desta coleção, que subsidiam propostas de avaliação, estão as abordagens concebidas para trabalho com aberturas de unidade e capítulo. No início de cada unidade, ao redor da reprodução das páginas do livro do estudante, os textos apresentam as temáticas que serão desenvolvidas e a justificativa de pertinência dos objetivos dos capítulos que a compõem. Estas informações, associadas à exploração das imagens pelos alunos, podem ser usadas para diagnosticar os conhecimentos deles que poderão ser mobilizados para dar início ao trabalho da unidade. De modo semelhante, as aberturas de capítulo contam com exploração de texto e imagem e com questões que podem ser aproveitadas para avaliar os conhecimentos dos alunos, possibilitando um planejamento mais assertivo das aulas seguintes, com base em eventuais fragilidades individuais ou coletivas.

Um dos principais objetivos do ensino de história é levar os alunos a compreender o método de pesquisa dessa ciência, recuperando o fazer historiográfico. Segundo as professoras Maria Auxiliadora ximít e Tânia Braga Garcia,

reticências o ensino de história requer introduzir o aluno no método histórico, cujos elementos principais que deverão estar presentes em todo o processo didático são: aprender a formular hipóteses; aprender a classificar e analisar as fontes; aprender a analisar a credibilidade das fontes históricas; aprender relações de causalidade e a concluir a explicação histórica.”

ximít, Maria Auxiliadora; GARCIA, Tânia Braga. O trabalho histórico em sala de aula. História e Ensino. Revista do Laboratório de Ensino de História/cê éle cê agá/uél, Londrina, volume 9, página 229.

Considerando esses objetivos, nesta coleção, o professor conta com várias atividades de apropriação do conhecimento histórico, entre elas pesquisa com fontes, análise crítica de textos e imagens, seminários e elaboração de esquemas explicativos. Essas atividades estão distribuídas no decorrer dos capítulos, nos boxes Explore, e também na seção Atividades, ao final de cada capítulo.

Quando uma atividade ou um conjunto de atividades é selecionado pelo professor para avaliar um conhecimento ou habilidade específica, recomenda-se realizar a seguinte sequência de ações com os alunos, quando possível. O processo de avaliação começa com a explicitação do objetivo para que os alunos compreendam o que se espera deles; em seguida, passa-se pela etapa de acompanhamento, na qual são observados pelo professor, que conversa com eles para conhecer suas dificuldades e os resultados que estão obtendo; e termina com uma autoavaliação, em que podem dizer o que aprenderam, que postura tiveram, se acreditam que atingiram o objetivo e o que podem melhorar. Esse tipo de avaliação, processual e compartilhada, tende a comprometer os alunos com o que foi proposto e confiar-lhes um papel ativo e de responsabilidade com a própria aquisição do conhecimento.

Ao longo de todo o processo avaliativo, os alunos que mostrarem algum tipo de dificuldade devem receber atenção diferenciada. Alguns exemplos de estratégias que podem ser empregadas são a realização de atividades complementares; a atenção personalizada do professor durante a realização de atividades individuais ou em grupo; e o apôio de alunos-tutores, designados pelo professor para acompanhar os colegas com alguma dificuldade.

Vale mencionar, ainda, que a seleção de conteúdos e de atividades desta coleção contribui para que os alunos se preparem para a realização de exames de larga escala. Esse tipo de avaliação permite construir um retrato da aprendizagem, fornecendo dados que auxiliam e orientam a promoção de políticas educacionais, em âmbito regional ou nacional.

Nos anos finais do Ensino Fundamental, o principal exame de larga escala é o Sistema de Avaliação da Educação Básica (saébi), que visa construir um diagnóstico da Educação Básica em nosso país e identificar fatores que possam interferir no desempenho dos discentes. Embora tenha sido criado na década de 1990, o saébi passou a avaliar a área de Ciências Humanas apenas em 2019, por meio de testes aplicados aos alunos do 9º ano. Em consonância com a Bê êne cê cê, a Matriz de Referência de Ciências Humanas – anos finais – do saébi foi dividida em seis eixos do conhecimento, conforme o quadro a seguir.

EIXOS DO CONHECIMENTO

1. Tempo e espaço: fontes e formas de representação

2. Natureza e questões socioambientais

3. Culturas, identidades e diversidades

4. Poder, Estado e instituições

5. Cidadania, direitos humanos e movimentos sociais

6. Relações de trabalho, produção e circulação


Além dos eixos do conhecimento, o saébi apresenta três eixos cognitivos: reconhecimento e recuperação; compreensão e análise; e avaliação e proposição.

Os conteúdos apresentados ao longo dos quatro volumes desta coleção contribuem para o desenvolvimento dos eixos do conhecimento do saébi em diversos momentos do texto didático, dos boxes, das seções e das atividades. Os eixos cognitivos, por sua vez, também são contemplados respeitando a faixa etária dos alunos e a progressão do nível de dificuldades.

Em relação às atividades, vale ressaltar que, em vários capítulos, orientamos os alunos a identificar alternativas corretas ou incorretas, a fim de familiarizá-los com o formato de testes utilizados nos exames de larga escala. Considerando os anos finais do Ensino Fundamental como uma etapa preparatória para o Ensino Médio, também apresentamos aos alunos de 8º e 9º ano questões do Enem e de vestibulares, de modo a habituá-los, paulatinamente, a esses exames.

Formas de abordagem da coleção

Apresentaremos adiante a estrutura da coleção, especificando a função de cada elemento. Antes, porém, adiantaremos aqui algumas de suas características com o intuito de exemplificar de que fórma sua abordagem facilita a consecução dos objetivos traçados.

A coleção parte do pressuposto de que os alunos necessitam desenvolver uma consciência histórica para que possam se afastar do senso comum e agir com autonomia e consciência. Tendo isso em vista, cria condições (por meio do texto-base, das seções, dos boxes e das atividades) para que compreendam a história como ciência em construção, propiciando a gradual aquisição de habilidades como comparar, contextualizar, interpretar, analisar, inferir e argumentar, essenciais ao exercício do pensamento crítico e à formação de cidadãos éticos, que respeitem e valorizem a diversidade, ajam de fórma sustentável e promovam a cultura de paz.

Sempre que possível, a obra apresenta diferentes interpretações sobre os assuntos estudados, bem como aspectos distintos do mesmo contexto. As seções e propostas de atividade trazem, de maneira progressiva, situações que possibilitem o exercício da comparação, da contextualização, da análise, do levantamento de hipóteses, da leitura inferencial, da argumentação e do pensamento computacional.

Em relação à gradação de dificuldade, a coleção respeita as diferenças das etapas de desenvolvimento dos alunos nos anos finais do Ensino Fundamental, o que se reflete tanto na abordagem do conteúdo e nas propostas de atividade quanto no formato visual do material: nos dois primeiros volumes, o tamanho das fontes e o espaçamento utilizado são maiores em comparação com os dos demais volumes, para que, principalmente, a passagem do 5º para o 6º ano seja tranquila para os alunos.

A seleção de conteúdos contempla a relação entre as diferentes dimensões da história (política, econômica, social e cultural), explorando temas que favoreçam a aproximação com questões contemporâneas e a reflexão crítica dos alunos sobre eles mesmos e a própria realidade.

Vejamos um exemplo de cada volume: no 6º ano, abordando a importância e a valorização dos mais velhos nas sociedades ágrafas, levamos os alunos a refletir sobre a condição dos idosos em sua comunidade; no 7º ano, tratamos sobre a importância da invenção da prensa de tipos móveis na difusão de ideias e de estudos, e incentivamos os alunos a pensar sobre o papel da imprensa na atualidade e sobre sua postura individual em relação aos conteúdos veiculados pela mídia; no 8º ano, podemos citar a reflexão sobre a relação humana com o meio ambiente na atualidade a partir do contexto da Revolução Industrial; no 9º ano, propomos uma análise crítica sobre a questão da compra de votos, uma prática da Primeira República que, por meio de diferentes recursos, infelizmente contamina a estrutura política atual, afrontando os princípios democráticos.

A obra exige dos alunos, além da conexão temporal, o estabelecimento de nexo entre conteúdos e conceitos já estudados e aqueles que entram em pauta, propiciando o desenvolvimento da capacidade de transferência do aprendizado para a compreensão de novas situações. Orientações e sugestões para o professor efetuar a retomada de conhecimentos estão disponíveis junto à reprodução das respectivas páginas na parte específica deste suplemento.

Quanto à leitura de fontes e à interdisciplinaridade, em todos os capítulos há propostas de análise de fontes e atividades que dialogam com outros componentes curriculares. Essas atividades são acompanhadas das indicações das habilidades do componente a ser trabalhado em conjunto com história e de comentários para o professor.

Por fim, existem várias propostas para a utilização das tecnologias digitais, e, ao mesmo tempo, para a reflexão sobre os usos dessas tecnologias. Os objetivos e métodos definirão a qualidade do resultado do uso da tecnologia, que, por si só, não é boa nem ruim.

6. A sala de aula para além da história

A construção do papel das crianças e dos adolescentes como estudantes ocorre ao longo do Ensino Fundamental. É nessa etapa que os alunos adquirem o repertório conceitual básico dos diferentes componentes curriculares e que as relações de troca intelectual com os colegas e professores intensificam-se e se tornam mais frequentes, promovendo o desenvolvimento de sua capacidade de negociação, cooperação e diálogo.

Justamente pela natureza formativa do Ensino Fundamental, o papel do professor como mediador do processo de aprendizagem é muito relevante. É o educador quem facilita para os estudantes o acesso à informação e o desenvolvimento de habilidades e competências, e da capacidade de organização para o estudo, além de coordenar os trabalhos realizados em sala de aula e intermediar conflitos.

Por essas razões, a organização e a gestão das aulas precisam ser bem administradas para que o tempo seja aproveitado ao máximo e os objetivos do processo de ensino e aprendizagem sejam atingidos. Levando esses aspectos em consideração, sugerimos algumas fórmas de gestão de aula com o objetivo de contribuir para tornar a prática docente mais assertiva.

Gestão do tempo de aula

A passagem do 5º para o 6º ano do Ensino Fundamental é uma fase delicada da vida escolar, pois coincide com o momento em que os pré-adolescentes passam por um conjunto de mudanças hormonais, físicas, psicológicas e cognitivas, o que colabora para que experimentem um estado de inquietação e dispersão maior que em anos anteriores. Além disso, marca a adaptação a uma nova dinâmica escolar, com mais professores, componentes curriculares e tarefas.

Em virtude de tantas mudanças, o papel de “organizador” dos professores tende a ser mais relevante e determinante para o sucesso escolar dos alunos. Assim, ao longo dos 6º e 7º anos, é necessário ao professor manter rigoroso contrôle sobre o tempo da aula para evitar que ele se esvaia e as atividades planejadas acabem sendo seguidamente adiadas, prejudicando o cumprimento do currículo.

Uma prática que favorece a dinâmica da aula, reduzindo o tempo despendido na organização inicial da turma, é a adoção de uma rotina. Principalmente na abertura da aula, o professor deve repetir sempre uma sequência de ações que permita que os estudantes se organizem mais rápido e sejam capazes de se preparar para as tarefas seguintes. Assim, fazer todos os dias a chamada, escrever na lousa a data e o título da aula e listar no quadro o que está previsto para acontecer naquele dia, por exemplo, são práticas que proporcionam aos alunos serenidade e segurança antes do início dos trabalhos propriamente ditos. A adoção de uma rotina pode contribuir para que os alunos desenvolvam autonomia por meio da apropriação da organização de seu tempo, o que lhes garante bases mínimas para pensar além das tarefas mecânicas.

A boa gestão do tempo depende também da diversificação das tarefas a serem realizadas na aula, principalmente ao longo do 6º ano e no início do 7º, pois o nível de concentração dos mais jovens ainda é baixo. Nesse caso, é contraproducente uma aula expositiva de 45 a 50 minutos, pois a tendência é os alunos se cansarem após 15 ou 20 minutos, tornando-se dispersivos e agitados. É, portanto, mais adequado planejar a aula para que haja pequenas interrupções, chamando a turma à participação sob sua mediação.

Outro recurso que favorece o uso racional do tempo é evitar propor trabalhos para serem feitos em sala de aula com prazos estendidos de entrega. Os alunos mais jovens dimensionam mal o tempo de que precisam para realizar as atividades e, por isso, organizam-se melhor ao realizar tarefas curtas, para serem entregues ao final da aula. Assim, parcelar os trabalhos em etapas ajuda a controlar a cadência das aulas e o desenvolvimento de trabalhos dentro dos prazos.

O período entre o 8º e o 9º anos coincide com a entrada plena dos estudantes na adolescência. Nessa fase, os questionamentos em relação às determinações dos professores tendem a crescer, pois os alunos anseiam por maior autonomia e desejam participar das decisões que os afetam. Por essa razão, aconselha-se manter uma rotina em sala, mas abreviada: após fazer a chamada e registrar na lousa o tema da aula, o professor pode dedicar algum tempo às negociações de cronograma, tarefas e prazos com os alunos, tomando o cuidado de ser objetivo e não permitir que elas se estendam para além de alguns minutos. Uma sugestão para melhor organizar o tempo de aula dos alunos mais velhos é elaborar planos de trabalho para períodos de 15 dias, como no exemplo a seguir:

PLANO DE TRABALHO (MARÇO)

DATA

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

ATIVIDADE

LOCAL

ATENÇÃO

11/3

Revolução Industrial

Análise de imagens: o sistema doméstico e o sistema fabril.

Sala de aula.

Para a próxima aula, ler as páginas 19 a 22 do livro didático.

14/3

Revolução Industrial

Aula: A Revolução Industrial.

Sala de aula.

Fazer as atividades 2, 4 e 5 das páginas 33 e 34 do livro didático.

18/3

Revolução Industrial

• Correção das atividades.
• Análise de trecho do romance
Oliver Twist.

Sala de informática.

Atividade em duplas.

21/3

Revolução Industrial

Discussão sobre o trecho lido de Oliver Twist.

Sala de aula.

Atividade de debate.

O plano de trabalho é uma estratégia eficiente para ensinar os adolescentes a planejarem seus estudos em prazos mais longos, e para registrar suas responsabilidades pedagógicas a fim de que não as negligenciem.

Para as atividades realizadas em sala, sugere-se estender um pouco o tempo de finalização dos trabalhos – por exemplo, para duas aulas, mas deve-se ter em mente que adolescentes facilmente se dispersam em conversas paralelas ao longo do tempo de execução de tarefas, o que faz com que o tempo efetivo de produção seja encurtado. Por essa razão, os trabalhos em sala devem ser continuamente monitorados e o tempo disponível até o término da aula alertado pelo professor.

A boa administração do tempo de aula garante ao professor condições para ter o contrôle sobre seu planejamento e desenvolver sequências didáticas sem precisar interrompê-las antes de atingir seu objetivo ou prolongá-las além do necessário.

Gestão do espaço físico

Nos anos finais do Ensino Fundamental, com distintos professores e vários componentes curriculares, a sala de aula passa a ser partilhada por muitas pessoas. É necessário, por consequência, que se construa esse espaço de maneira coletiva, a fim de atender às necessidades de todos.

Durante as aulas, pode-se dispor de diferentes organizações do espaço, a depender da proposta de trabalho que se pretende realizar. A tradicional disposição das carteiras, enfileiradas e com os alunos sentados olhando para a frente, é apenas uma das maneiras possíveis de utilizar o espaço.

Um debate ou uma aula expositiva dialogada pode ser feita com outra organização do espaço. A disposição das cadeiras em círculo ou em U funciona muito bem para esse tipo de proposta: possibilita ao professor que se coloque junto dos alunos, em uma mesma condição, tornando o ambiente mais democrático.

Além disso, permite que todos se vejam enquanto estão falando ou ouvindo. Com isso, a interação se torna mais intensa, e, naturalmente, o processo de aprendizagem pode ser mais significativo nessas circunstâncias.

Fotografia. Meninos e meninas sentados em carteiras escolares dispostas em semicírculo. Alguns estão com a mão levantada. Ao centro há uma mulher em pé.
Aula com carteiras organizadas em formato de U, na Escola Estadual Francisco Mignone, no município de São Paulo, São Paulo. Foto de 2019.

Em outras circunstâncias, como quando os alunos executam tarefas em grupo, por exemplo, pode-se organizar a classe em blocos, juntando as carteiras e formando os grupos (claramente identificados), para facilitar o trabalho dos alunos e o acompanhamento pelo professor.

No momento de uma atividade individual, quando manter o foco é importante e a dispersão em diálogos paralelos com outros colegas pode atrapalhar o cumprimento da tarefa, a disposição em fileiras pode ser utilizada de fórma a ampliar a possibilidade de concentração.

Não se deve esquecer, também, de que a sala de aula é um espaço onde a produção dos alunos deve fazer parte do ambiente. Esse elemento faz com que sintam que o espaço lhes pertence e é construído a partir das suas necessidades e interesses. Por isso, a sala de aula deve ser um lugar em que alunos e professores partilhem saberes, se envolvam em tarefas instigantes e mantenham um relacionamento saudável e de confiança. A dimensão socioemocional, nesse caso, não pode ser ignorada. A sala de aula precisa ser acolhedora e inclusiva, representar um espaço onde os diferentes sujeitos se sintam acolhidos para poder participar de fórma significativa das atividades, expressando seus aprendizados e suas dificuldades livremente.

Principalmente no 9º ano, é interessante, caso as regras da escola permitam, delegar tarefas aos grupos de alunos para serem realizadas em espaços diversos da escola. Desse modo, é possível atribuir a um grupo uma tarefa para ser feita na biblioteca enquanto outro grupo se dirige à sala de informática. A prática de permitir que alunos trabalhem por conta própria, sem a presença contínua do professor ao seu lado, favorece o ganho de autonomia e o desenvolvimento de responsabilidade.

Antes de fazer uma proposta de trabalho que dê liberdade para os alunos se moverem sozinhos pelos espaços escolares, é preciso avaliar a maturidade do conjunto dos alunos, preparar propostas claras, objetivas e que possam ser realizadas pelos estudantes. Além disso, recomenda-se propor atividades que possam ser finalizadas e entregues ao professor ao final da aula e que funcionários da escola sejam previamente avisados sobre o trânsito incomum dos estudantes pelos corredores e espaços escolares.

Gestão do espaço para a aplicação de testes e provas

Um dos momentos mais tensos da relação dos alunos com a aprendizagem é o da avaliação por meio de testes ou provas. Sabemos que avaliar o aprendizado é um processo constante e contínuo, mas isso se faz, em geral, sem o conhecimento direto dos alunos. Entretanto, a consciência de que estão sendo avaliados provoca tensão, já que muitas vezes a insegurança e o receio do processo são mais difíceis de ser absorvidos por eles que o conhecimento em si. Por isso, é fundamental que o professor conduza esse momento de fórma a torná-lo o mais tranquilo possível, sem abrir mão do rigor necessário

do processo avaliativo. Isso porque eles enfrentarão, na vida acadêmica e profissional, outros momentos de avaliação, em provas escritas, apresentações orais, trabalhos em grupo etcétera Assim sendo, é importante que sejam preparados para tais situações vivenciando-as na escola, conforme suas possibilidades e de acôrdo com a faixa etária.

Sugerimos, então, que sejam utilizadas estratégias que envolvam os alunos na avaliação, mas sem transformá-la em algo que os iniba. Deve-se criar condições para que demonstrem as suas potencialidades. No caso da avaliação escrita individual, é importante que o docente oriente os alunos sobre a estrutura da avaliação e, anteriormente, dê-lhes, nas aulas e em tarefas de casa, atividades similares àquelas que serão exigidas na prova ou no teste. Na realidade, provas e testes devem ser constituídos com base nas atividades realizadas ao longo do período em avaliação, e não o contrário.

Caso a avaliação tenha questões discursivas e objetivas, é importante que ambos os tipos tenham sido apresentados aos alunos ao longo das aulas, de modo que tenham compreendido a dinâmica e a fórma de resolução desses tipos de questão. Se tudo isso for feito, no momento da avaliação os alunos se sentirão confiantes e preparados, pois não estarão diante de nenhuma novidade, e sim realizando uma tarefa para a qual vinham sendo preparados durante as aulas.

Por fim, o professor deve ajudá-los a se concentrar na própria avaliação. Para tanto, se possível, o docente deve solicitar aos alunos que todo o material seja guardado nas mochilas, exceto o necessário para realizar a prova. Além disso, deve organizar o espaço da sala de aula dispondo as carteiras de modo que facilite a atenção na tarefa. Essas medidas contribuem bastante para o sucesso dos alunos, já que a concentração e o foco são necessários para alcançar os objetivos da avaliação.

Caso em algum momento o professor realize uma avaliação em dupla, é importante que as duplas sejam dispostas na sala de aula com a mesma preocupação, isto é, a garantia do foco e da organização. Pode-se colocar os alunos lado a lado, ou de frente um para o outro, dependendo do espaço disponível e da tarefa a ser executada. Se a tarefa for escrita, é melhor a primeira opção, já que ambos os alunos podem interferir no texto de maneira mais sistemática. Também é importante orientá-los quanto à comunicação, que deve ser mantida estritamente com o colega de dupla.

Para avaliação em grupo, uma sugestão é organizar os alunos em círculos ou retângulos, com os membros de cada grupo voltados para o espaço interno formado pelo círculo ou pelo retângulo. Isso se faz necessário para facilitar a comunicação entre os integrantes e evitar que os grupos interfiram no trabalho uns dos outros.

Por fim, um aspecto decisivo dos processos avaliativos é a devolução das tarefas aos alunos, com comentários individuais, se possível, inclusive para os que tiveram bom desempenho. Requerem atenção especial e cuidado aqueles que não tiveram desempenho satisfatório. É crucial mostrar tanto os caminhos pelos quais esses alunos possam melhorar quanto aquilo em que eles conseguiram evolução, mesmo que insuficiente. Mantê-los motivados é importante no momento de retorno de uma avaliação e para produções futuras.

Organização para apresentação de material audiovisual

Os recursos audiovisuais são amplamente utilizados por professores em sala de aula, constituindo um bom instrumento pedagógico caso esteja articulado de fórma orgânica e coerente com o conteúdo e os objetivos em questão. A relevância do uso desse tipo de material deve ser a primeira questão a pautar o professor na decisão de aplicá-lo ou não em sala. Isso porque, caso não seja bem pensado, o uso dessa ferramenta pode ser inócuo, desestimulante e desinteressante.

Em primeiro lugar, é importante que o professor notifique de antemão e prepare a turma para a atividade com o recurso audiovisual. Os alunos devem ser informados sobre os objetivos do uso daquele instrumento, as razões pedagógicas e os resultados a que se pretende chegar. Assim, eles terão clareza de todo o processo e identificarão o audiovisual como um recurso do processo de ensino-aprendizagem, e não como fórma encontrada pelo professor para “passar o tempo” ou demais ideias equivocadas dessa natureza.

Tomada a decisão da utilização de trechos de audiovisuais na aula, o professor deve pensar no modo como isso será feito. O espaço da sala de vídeo ou da sala de aula deve ser organizado de acôrdo com a necessidade da tarefa proposta. Dessa fórma, caso o recurso seja usado para exibir um filme e, em seguida, propor um debate, a configuração da sala em U é a mais adequada para que o debate flua naturalmente após a exibição do vídeo. Já no caso de se pretender que os alunos produzam um texto ao final da exibição, é interessante o formato em fileiras, para garantir que a turma se concentre na tarefa após o encerramento da exibição do vídeo.

É importante, também, que o professor pense na utilização dos recursos audiovisuais com base em sua funcionalidade. Trechos de filmes ou animações, por exemplo, devem ser vistos com concentração e foco. Já se o recurso é mais interativo, é importante coordenar a participação dos alunos durante a exibição, permitindo a manifestação deles à medida que a interatividade se realize.

Uma estratégia que pode ajudar o professor nessa tarefa é, além de estabelecer um objetivo pedagógico claro ao utilizar o recurso audiovisual, o de procurar materiais que sejam adequados à faixa etária e atraentes à turma, pois, para que sejam atingidos os objetivos pedagógicos, os alunos precisam se envolver com a proposta. Além disso, o docente deve assistir ao recurso audiovisual antes de exibi-lo aos alunos, procurando assim novas ferramentas ou intenções para o trabalho e verificando sua funcionalidade em sala de aula.

Recomenda-se fortemente atentar para a adequação do material audiovisual exibido, levando-se em consideração a faixa etária, a maturidade e o perfil dos alunos. Para os alunos mais novos, dos 6º e 7º anos, é interessante preparar um roteiro de observação do material a ser exibido, pontuando com clareza exatamente o que se deseja que os estudantes observem: o uso de cores em um filme, um diálogo em especial, um determinado cenário etcétera Esse recurso garante que os alunos assistam ao material exibido com mais foco, o que assegura um melhor aproveitamento pedagógico do recurso.

Gestão do uso do celular em sala de aula

Em um mundo cada vez mais tecnológico, as novas gerações já assimilaram muitos aparelhos eletrônicos em seu cotidiano. Muitas tarefas que eram, em outros tempos, realizadas sem a mediação da tecnologia digital ou por aparelhos diferentes e específicos estão concentradas em um só dispositivo: o celular.

A utilização de celular em sala de aula tem sido motivo de polêmica. Parte dos educadores condena o uso do aparelho, ao passo que outros admitem sua utilização com finalidade pedagógica. A permissão do uso do celular em sala de aula deve ser decidida pela coordenação ou equipe docente a fim de evitar que os alunos façam comparações entre condutas diferentes dos professores e criem, com isso, situações de constrangimento para os educadores. Para o bom funcionamento de qualquer escola, a unidade dos professores e a harmonia entre eles são fundamentais.

Caso a decisão da equipe seja pela proibição, as regras devem ser expostas claramente. Cada professor que entra na sala de aula deve reforçar, diariamente, a orientação para que os alunos desliguem seus aparelhos e mantenham-nos guardados na mochila. É prudente avisar os alunos sobre a atitude que será tomada caso alguém desrespeite a regra e, uma vez identificado o aluno infrator, o que foi estabelecido deve ser prontamente aplicado de maneira impessoal e sem alarde.

A equipe pode, todavia, admitir o uso de celular em situações específicas. O uso de agenda, por exemplo, pode ser importante para a organização do aluno. O registro fotográfico da lousa, por sua vez, assegura a redução do tempo gasto com cópias, permitindo a dinamização da aula. Caso o professor considere importante o registro escrito da aula no caderno, é possível, por exemplo, orientar os alunos a fazer anotações da aula expositiva (explicações) e usar a câmera do celular para o registro de resumos expostos na lousa.

Uma das mais importantes funções do celular, porém, é facilitar atividades de pesquisa. O acesso à internet permite atividades desafiadoras e proporciona independência aos alunos.

A oferta de situações-problema para ser solucionadas em grupo estimula a pesquisa e a troca de informações entre os estudantes, favorecendo o aprendizado. Por meio da internet, os alunos podem ainda trocar informações com outros grupos e realizar trabalhos mais complexos, de maneira integrada.

Contudo, existe sempre o risco de o celular ser mal utilizado: fotos feitas durante a aula sem a permissão dos envolvidos, conversas paralelas que não têm relação com o trabalho proposto, acesso a conteúdo inapropriado, tudo isso pode ocorrer. Por essa razão, a opção de permitir o uso do aparelho celular em sala de aula deve sempre ser acompanhada de orientações sobre ética digital para que os estudantes entendam as implicações do mau uso do aparelho nesse ambiente. Mesmo que os jovens tenham familiaridade com as novas tecnologias, ainda estão em formação e precisam ser constantemente lembrados de suas responsabilidades e limites.

Gestão de conflitos em sala de aula

A adolescência é uma fase de ruptura, em que o jovem deixa para trás os laços de dependência do núcleo familiar e arrisca-se em novas experiências relacionais, ampliando seu círculo de convivência social e buscando construir uma identidade. É também o momento em que se descobre capaz de pensar por si e de tomar decisões, o que o coloca diante de uma sensação de liberdade.

Essa liberdade é sentida, primeiro, como a ultrapassagem dos limites que lhe são impostos pela família e, depois, como uma experimentação das suas possibilidades de ação no mundo além do círculo doméstico. Até onde pode ir? Quem ou o que o deterá? De que “tamanho” é a liberdade da qual desfruta? Questões assim estimulam o adolescente a testar limites – o que significa enfrentar, seja pelas palavras, seja pelo comportamento, a autoridade dos adultos e as regras que lhe são impostas.

Em sala de aula, os alunos adolescentes podem se tornar agentes de uma série de situações conflituosas e, frequentemente, desgastantes. A agitação, a impulsividade, o imediatismo, a resistência ao trabalho pedagógico, a irreverência e, não raramente, a agressividade são muitas vezes percebidos e sentidos pelo educador como empecilhos à tarefa de ensinar. Entretanto, existem estratégias que podem favorecer a convivência pacífica em sala de aula.

Antes de tudo, o professor deve se reconhecer como a autoridade em sala de aula e estar seguro de que é a pessoa responsável pelos estudantes. Essa autoridade não deve ser transferida para outros sujeitos, como os pais ou a coordenação, sob o risco de os alunos não a identificarem mais no educador. No entanto, autoridade não se confunde com autoritarismo. É preciso conquistar a confiança dos alunos. Firmeza – jamais se deve prometer o que não se pode ou não se deseja cumprir –, justiça nas decisões e temperança são atitudes necessárias em sala de aula. Além disso, mostrar domínio de seus conhecimentos e segurança em sua profissão é fundamental para conquistar a confiança dos alunos.

Todavia, mesmo quando a relação do professor com a turma é positiva, podem acontecer situações de confronto, e lidar com elas é sempre delicado. Primeiramente, é importante que o professor evite o embate direto. Enfrentar um aluno diante dos colegas tende a favorecer uma reação de solidariedade do grupo, potencializando o risco de generalização do conflito. O docente deve evitar levantar a voz e procurar dialogar com os alunos de modo

privado, ao final da aula ou, se for necessário, tão logo ocorra a intervenção. Nesse diálogo, é necessário evitar julgamentos. Deve-se criticar a atitude impertinente dos alunos, mas não os julgar.

Recomenda-se, ainda, que o professor procure escutar os adolescentes antes de repreendê-los. A escuta atenta possibilita o entendimento do ponto de vista dos alunos para que se possa construir uma contra-argumentação, indicando que foi levada em consideração a alegação deles, tirando-os da posição defensiva que assumirão se forem advertidos sem ser ouvidos. Ao fim da conversa, se possível, é importante que o docente estabeleça um pacto com os alunos, mostrando-se confiante na capacidade de colaboração deles.

Há, contudo, situações em que o conflito envolve vários alunos ao mesmo tempo. Nessas horas, o contrôle é dificultado pela agitação e pelo falatório da turma. É prudente que o professor mantenha a calma e procure resolver a questão em assembleia. Para tanto, é necessário definir-se a regra de que só poderá falar quem estiver com determinado objeto na mão (um chaveiro, um estojo de tecido ou qualquer objeto que possa ser passado de mão em mão sem quebrar nem machucar alguém). Ao término da fala, um aluno deverá passar o objeto a outro que deseje se pronunciar. Se possível, o docente deve sair do foco da discussão e incentivar os alunos a debater o problema gerador do conflito, retomando o contrôle do debate para fazer o fechamento da solução.

Em todas as situações, é importante o professor ter em mente o fato de que é o adulto da relação e, por conseguinte, deve buscar ser o elemento de equilíbrio na sala de aula, promovendo a cultura de paz no ambiente escolar.

O combate ao bullying

Mesmo reconhecendo os conflitos como algo esperado entre os adolescentes, é preciso estar atento ao dia a dia dos alunos, observando seu relacionamento em momentos dentro e fóra da sala de aula, pois algumas manifestações do grupo, ou especificamente de algum aluno, podem revelar atos de violência mais sérios, como o bullying – palavra de origem inglesa que remete à intimidação sistemática.

O bullying caracteriza-se por uma agressão intencional e repetitiva, protagonizada por um ou mais alunos, e pode ser agravado quando o grupo todo atua como espectador das agressões, contribuindo indiretamente para sua continuidade.

A vítima de bullying pode sofrer com ataques físicos, comentários vexatórios, apelidos pejorativos, ameaças, exclusão ou outras fórmas de violência, permanecendo em um estado de opressão, forte tensão e sofrimento físico e psicológico. Por sentir-se constrangida, com medo ou culpada, a vítima deixa de pedir ajuda a familiares, colegas ou profissionais que atuam na escola.

O Programa de Combate à Intimidação Sistemática foi instituído pelo govêrno federal em novembro de 2015, com a assinatura da Lei número .13185, que estabelece algumas medidas para coibir o bullying nas escolas. A mesma lei caracteriza outra modalidade de agressão, o cyberbullying, quando a violência e os ataques são feitos no meio virtual,

“mediante o uso de instrumentos para depreciar, incitar a violência, adulterar fotos e dados pessoais com o intuito de criar meios de constrangimento psicossocial.”

BRASIL. Lei número .13185, de 6 de novembro de 2015. Institui o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying). Disponível em: https://oeds.link/mmwTsj. Acesso em: 17 março 2022.

O primeiro passo para combater o bullying e o cyberbullying é reconhecer sua existência e atuar de maneira educativa e formativa, promovendo ações preventivas, mas também assertivas e efetivas.

A observação dos alunos em diferentes espaços, principalmente nos quais se sentem menos observados é uma tarefa para a qual toda a equipe da escola deve estar preparada. É importante que professores, assim como demais colaboradores estejam atentos a maneira como os adolescentes se relacionam, se há alguém que está sempre isolado, como se subdividem em grupos, se há mudanças ou não nesses grupos, entre outros aspectos. Reações de raiva, choro, algum machucado sem explicação, perda de material, muitas vezes podem ser indícios de que algo não vai bem.

Em suas aulas, o professor pode organizar trabalhos em grupo diversificando os critérios de organização, de modo a evitar que os mesmos alunos fiquem sempre isolados ou sem grupo: por ordem alfabética, por preferências de assuntos, por separação de habilidades, elegendo alunos para registro escrito, ilustrações ou exposição oral. Se esta for uma prática habitual, os alunos terão maior oportunidade de conhecer-se. Além disso, indiretamente, a prática de evidenciar quem tem maior dificuldade é inibida.

Assuntos relacionados ao bullying e ao cyberbullying também podem ser discutidos em assembleias e palestras, envolvendo os alunos na tarefa de responsabilizar-se uns pelos outros. Algumas ações possíveis são a formação de grupos responsáveis por cuidar para que nenhum aluno fique sozinho, a eleição de alunos mediadores de conflitos e de grupos responsáveis pelo acolhimento e pela integração de novos alunos, a adoção de boas práticas no ambiente virtual etcétera Também é importante que os alunos discutam situações reais, baseados em notícias do cotidiano e que possam exercitar a empatia, a solidariedade e a cooperação.

Outra medida fundamental é fortalecer os alunos para se posicionar contra o agressor, pedir ajuda, denunciar e levar qualquer situação ao conhecimento de professores ou da equipe gestora. A criação de um clima de confiança e empatia é essencial, pois possibilita que o aluno tenha espaço para externar seus sentimentos e sinta-se apoiado por colegas e pela equipe da escola. Ao mesmo tempo, deve-se garantir oportunidades de reflexão, retificação e a busca de novas condutas para quem pratica esses atos de violência.

Nos espaços de convivência coletiva, todos devem responsabilizar-se pelo combate à violência e a promoção da cultura de paz, compreendendo que o convívio com a diferença favorece a formação de uma sociedade mais saudável e verdadeiramente inclusiva.

Orientações para uso crítico de material disponível na internet

Atualmente, a velocidade com que a informação se dissemina pelos meios digitais e o comportamento imediatista do leitor diante de uma avalanche de textos, imagens e sons produziram um cenário no qual os fatos se tornaram irrelevantes, e as “verdades” passaram a se sustentar exclusivamente em convicções. Sites são utilizados para veicular notícias falsas, as chamadas fake news, que rapidamente contaminam as redes sociais e, de tanto serem repetidas, são assimiladas por parte da população como verdades incontestáveis. Muitas dessas notícias não chegam a ser totalmente mentirosas, mas são distorcidas, tiradas de contexto ou acompanhadas de interpretações maliciosas.

Em um cenário como esse, os jovens, se não têm parâmetro para selecionar informações, tornam-se vítimas fáceis das fake news, que comprometem até a mais simples pesquisa pela internet. Por essa razão, os estudantes devem ser orientados desde cedo sobre como proceder a checagem de informações. Afinal, o desenvolvimento de um pensamento crítico e autônomo depende da capacidade dos indivíduos de reconhecerem informações confiáveis e descartarem o que é improcedente. Certos procedimentos reduzem bastante as chances de o leitor ser enganado. São eles:

• Desconfiar

As notícias falsas e os boatos apelam frequentemente às emoções, que fazem o leitor agir por impulso, sem refletir. Por essa razão, deve-se desconfiar de textos e imagens apelativos e sensacionalistas. Texto escrito em caixa-alta, com abuso de adjetivos, também é indicativo de que a notícia pode ser mentirosa ou exagerada.

As fake news, geralmente fabricadas às pressas, não recebem os cuidados dispensados pelos veículos de imprensa sérios; por conseguinte, na maioria dos casos contêm muitos erros gramaticais e ortográficos, contradições, lacunas (falta de data na notícia, omissão de autoria etcétera), dados incorretos e informações vagas (por exemplo, afirmar que uma importante instituição de pesquisa divulgou determinada informação, mas não identificar a instituição citada).

Além disso, a oferta de vantagens excepcionais, como premiações de valor muito alto, costuma ser sugestiva de se tratar de vírus ou site malicioso.

• Cruzar informações

É aconselhável fazer uma pesquisa nos sites de busca para saber se a notícia ou informação suspeita foi confirmada por outros veículos. É comum que fake news sejam reproduzidas por várias fontes, por isso é preciso se assegurar da confiabilidade dos veículos consultados. Não se deve dar crédito a blogs e sites desconhecidos ou com nomes apelativos. Deve-se dar preferência a pesquisas feitas em sites de instituições renomadas, como universidades, órgãos internacionais e institutos de pesquisa, e veículos de imprensa prestigiados. Para checar se imagens não foram retiradas de seu contexto, deve-se consultar um buscador de imagens.

Consultar sites especializados em checagem de informação

Na internet, existem agências especializadas em checar informações e combater a disseminação de boatos e de notícias falsas. Na dúvida, sempre vale consultá-las.

• Ter cautela com informações enviadas por amigos ou parentes

Muitas vezes, os internautas dão crédito a informações recebidas pelas redes sociais porque foram enviadas por pessoa de confiança. Todavia, amizade e parentesco não garantem a lisura das fontes. Um amigo ou parente também pode ter sido enganado. Por isso, ao receber uma informação ou antes de repassar, é necessário checar a fonte original.

• Não ler somente as manchetes

Muitos veículos de informação procuram atrair a atenção do leitor com manchetes que distorcem a notícia, induzindo-o a uma interpretação equivocada. Por isso, não se pode deixar de ler todo o texto noticioso.

• Conferir a data

Criadores de fake news muitas vezes requentam notícias antigas, difundindo-as em outro contexto. Por essa razão, conferir a data é um procedimento básico de checagem de informação.

• Evitar a impulsividade

Como as notícias falsas ou maliciosas são frequentemente exageradas ou apelativas, causam surpresa e indignação, provocando emoções que impedem o leitor de fazer uma pausa reflexiva antes de divulgá-las. O contrôle da impulsividade é uma das ações mais importantes para não cair nas armadilhas criadas pelos produtores de fake news.

7. A Base Nacional Comum Curricular (Bê êne cê cê)

Prevista na Constituição Federal (1988), na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (éle dê bê, de 1996) e no Plano Nacional de Educação (pê êne é, de 2014), a Bê êne cê cê para a Educação Infantil e o Ensino Fundamental foi homologada em 2017 e a parte referente ao Ensino Médio incluída em 2018.

O documento estabelece o conjunto das aprendizagens essenciais a que todos os estudantes têm direito, e, por ser de caráter normativo, deve ser seguido na elaboração ou adequação dos currículos escolares em todo o Brasil.

O objetivo da Bê êne cê cê é garantir que todas as crianças e adolescentes do país tenham a mesma formação escolar, reduzindo as desigualdades verificadas pelas avaliações de larga escala nacionais e internacionais. Essa formação escolar deve assegurar o desenvolvimento de dez Competências gerais pelos estudantes para que se tornem capazes de mobilizar valores, habilidades e conhecimentos diversos na análise e resolução de situações cotidianas e para que exerçam plenamente a cidadania.

AS COMPETÊNCIAS GERAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA

1. Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade, continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva.

2. Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas.

3. Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico-cultural.

4. Utilizar diferentes linguagens − verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital −, bem como conhecimentos das linguagens artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo.

5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.

6. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade.

7. Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta.

8. Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física e emocional, compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas.

9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza.

10. Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.

Fonte: BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 9-10.


Além de estabelecer as Competências gerais para Educação Básica, a Bê êne cê cê organizou o Ensino Fundamental em duas etapas: anos iniciais (1º ao 5º ano) e anos finais (6º ao 9º ano). O trabalho durante esses ciclos deve propiciar o desenvolvimento integral do aluno por meio de cinco áreas do conhecimento: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Ensino Religioso. Essas áreas articulam conhecimentos e saberes relativos a um ou mais componentes curriculares, como mostra o quadro a seguir.

ÁREAS DO CONHECIMENTO E RESPECTIVOS COMPONENTES CURRICULARES (BNCC)

Área do conhecimento

Componentes curriculares

Linguagens

Língua portuguesa

Arte

Educação física

Língua inglesa

Matemática

Matemática

Ciências da Natureza

Ciências

Ciências Humanas

História

Geografia

Ensino Religioso

Ensino religioso

Fonte: BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 27.

As Ciências Humanas na Bê êne cê cê

Cada área do conhecimento tem Competências específicas a serem desenvolvidas ao longo da Educação Básica. Para o Ensino Fundamental, a área de Ciências Humanas é composta dos componentes curriculares história e geografia, tendo como conceitos fundamentais tempo e espaço, pois se entende que a ação humana se dá em determinado tempo e em certo espaço, sob circunstâncias específicas.

“O raciocínio espaço-temporal baseia-se na ideia de que o ser humano produz o espaço em que vive, apropriando-se dele em determinada circunstância histórica. A capacidade de identificação dessa circunstância impõe-se como condição para que o ser humano compreenda, interprete e avalie os significados das ações realizadas no passado ou no presente, o que o torna responsável tanto pelo saber produzido quanto pelo contrôle dos fenômenos naturais e históricos dos quais é agente.”

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 351.

Assim, entende-se que o ensino da história e geografia deve propiciar o desenvolvimento de condições para os alunos adquirirem uma melhor compreensão de mundo, autonomia de pensamento e capacidade de intervenção responsável no meio em que vivem. Para tanto, articuladas às Competências gerais da Educação Básica, definiram-se sete Competências específicas de Ciências Humanas a serem desenvolvidas ao longo do Ensino Fundamental.

COMPETÊNCIAS ESPECÍFICAS DE CIÊNCIAS HUMANAS PARA O ENSINO FUNDAMENTAL

1. Compreender a si e ao outro como identidades diferentes, de forma a exercitar o respeito à diferença em uma sociedade plural e promover os direitos humanos.

2. Analisar o mundo social, cultural e digital e o meio técnico-científico-informacional com base nos conhecimentos das Ciências Humanas, considerando suas variações de significado no tempo e no espaço, para intervir em situações do cotidiano e se posicionar diante de problemas do mundo contemporâneo.

3. Identificar, comparar e explicar a intervenção do ser humano na natureza e na sociedade, exercitando a curiosidade e propondo ideias e ações que contribuam para a transformação espacial, social e cultural, de modo a participar efetivamente das dinâmicas da vida social.

4. Interpretar e expressar sentimentos, crenças e dúvidas com relação a si mesmo, aos outros e às diferentes culturas, com base nos instrumentos de investigação das Ciências Humanas, promovendo o acolhimento e a valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza.

5. Comparar eventos ocorridos simultaneamente no mesmo espaço e em espaços variados, e eventos ocorridos em tempos diferentes no mesmo espaço e em espaços variados.

6. Construir argumentos, com base nos conhecimentos das Ciências Humanas, para negociar e defender ideias e opiniões que respeitem e promovam os direitos humanos e a consciência socioambiental, exercitando a responsabilidade e o protagonismo voltados para o bem comum e a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva.

7. Utilizar as linguagens cartográfica, gráfica e iconográfica e diferentes gêneros textuais e tecnologias digitais de informação e comunicação no desenvolvimento do raciocínio espaço-temporal relacionado a localização, distância, direção, duração, simultaneidade, sucessão, ritmo e conexão.

Fonte: BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 357.


Nas áreas compostas de mais de um componente curricular, como as Ciências Humanas, cada um deles também tem Competências específicas a serem desenvolvidas.

A história na Bê êne cê cê

O entendimento explicitado pela Bê êne cê cê sobre a produção do conhecimento da história é o mesmo desta coleção, já exposto anteriormente: todo o conhecimento sobre o passado, como produto do presente, é também um conhecimento sobre o presente elaborado por sujeitos distintos. Como destacado pela Bê êne cê cê,

“A relação passado/presente não se processa de fórma automática, pois exige o conhecimento de referências teóricas capazes de trazer inteligibilidade aos objetos históricos selecionados. Um objeto só se torna documento quando apropriado por um narrador que a ele confere sentido, tornando-o capaz de expressar a dinâmica da vida das sociedades. Portanto, o que nos interessa no conhecimento histórico é perceber a fórma como os indivíduos construíram, com diferentes linguagens, suas narrações sobre o mundo em que viveram e vivem, suas instituições e organizações sociais.”

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 397.

Assim como a produção do conhecimento histórico não pode ser dissociada de seu tempo, o ensino de história não pode deixar de considerar as demandas, os desafios e a configuração do mundo contemporâneo.

“As questões que nos levam a pensar a história como um saber necessário para a formação das crianças e jovens na escola são as originárias do tempo presente. O passado que deve impulsionar a dinâmica do ensino-aprendizagem no Ensino Fundamental é aquele que dialoga com o tempo atual.”

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 397.

Considerando as características da produção do saber histórico e dos objetivos do ensino de história, deve-se incentivar a indagação sobre a produção do conhecimento e a própria produção dele por meio da identificação, comparação, contextualização, interpretação e análise, estimulando a autonomia de pensamento.

O esfôrço para o desenvolvimento da autonomia de pensamento exige o conhecimento básico da epistemologia da história, ou seja,

reticências a natureza compartilhada do sujeito e do objeto de conhecimento, o conceito de tempo histórico em seus diferentes ritmos e durações, a concepção de documento como suporte das relações sociais, as várias linguagens por meio das quais o ser humano se apropria do mundo. Enfim, percepções capazes de responder aos desafios da prática historiadora presente dentro e fóra da sala de aula.”

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 400-401.

Tendo em vista esses pressupostos para o ensino de história, em articulação com as Competências gerais da Educação Básica e as Competências específicas de Ciências Humanas, a Bê êne cê cê definiu sete Competências específicas a serem desenvolvidas em história.

COMPETÊNCIAS ESPECÍFICAS DE HISTÓRIA PARA O ENSINO FUNDAMENTAL

1. Compreender acontecimentos históricos, relações de poder e processos e mecanismos de transformação e manutenção das estruturas sociais, políticas, econômicas e culturais ao longo do tempo e em diferentes espaços para analisar, posicionar-se e intervir no mundo contemporâneo.

2. Compreender a historicidade no tempo e no espaço, relacionando acontecimentos e processos de transformação e manutenção das estruturas sociais, políticas, econômicas e culturais, bem como problematizar os significados das lógicas de organização cronológica.

3. Elaborar questionamentos, hipóteses, argumentos e proposições em relação a documentos, interpretações e contextos históricos específicos, recorrendo a diferentes linguagens e mídias, exercitando a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos, a cooperação e o respeito.

4. Identificar interpretações que expressem visões de diferentes sujeitos, culturas e povos com relação a um mesmo contexto histórico, e posicionar-se criticamente com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.

5. Analisar e compreender o movimento de populações e mercadorias no tempo e no espaço e seus significados históricos, levando em conta o respeito e a solidariedade com as diferentes populações.

6. Compreender e problematizar os conceitos e procedimentos norteadores da produção historiográfica.

7. Produzir, avaliar e utilizar tecnologias digitais de informação e comunicação de modo crítico, ético e responsável, compreendendo seus significados para os diferentes grupos ou estratos sociais.

Fonte: BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 402.

O ensino de história nos anos finais do Ensino Fundamental

Segundo a Bê êne cê cê, o ensino de história nos anos finais do Ensino Fundamental deve ser pautado por três procedimentos básicos:

“1. Pela identificação dos eventos considerados importantes na história do Ocidente (África, Europa e América, especialmente o Brasil), ordenando-os de fórma cronológica e localizando-os no espaço geográfico.

2. Pelo desenvolvimento das condições necessárias para que os alunos selecionem, compreendam e reflitam sobre os significados da produção, circulação e utilização de documentos (materiais ou imateriais), elaborando críticas sobre fórmas já consolidadas de registro e de memória, por meio de uma ou várias linguagens.

3. Pelo reconhecimento e pela interpretação de diferentes versões de um mesmo fenômeno, reconhecendo as hipóteses e avaliando os argumentos apresentados com vistas ao desenvolvimento de habilidades necessárias para a elaboração de proposições próprias.”

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, 2018. página 416.

Além disso, o documento definiu unidades temáticas e objetos de conhecimento para cada ano desta etapa do curso. Resumidamente, no 6º ano são estudados as fórmas de registro e os procedimentos próprios da história, bem como os registros e os modos de vida das primeiras comunidades humanas, a Antiguidade Clássica e o contraponto com outras sociedades, as lógicas de organização social e política e as manifestações culturais até o período medieval; no 7º ano, o mundo moderno, as conexões entre as sociedades africanas, americanas e europeias e os seus reflexos na dinâmica e na organização do poder no mundo colonial americano; no 8º ano, a crise do chamado Antigo Regime e

as conformações da história contemporânea no século dezenove; por fim, no 9º ano, a história republicana brasileira até a atualidade, além do contexto internacional nesse período (as grandes guerras, as crises econômicas, conflitos regionais etcétera). Os temas permitem a compreensão da configuração do mundo atual e a valorização dos direitos humanos e o respeito às diferenças.

Para assegurar que esses conhecimentos sejam os mesmos para todos os currículos escolares nacionais, a Bê êne cê cê listou um conjunto de habilidades que expressam as aprendizagens essenciais de cada ano. Cada uma delas é identificada por um código composto de letras e números. Por exemplo:

Esquema. No topo está escrita a habilidade EF06HI01. Dela, saem quatro fios, cada um para um quadro diferente. No primeiro, da esquerda para a direita, está escrito: O primeiro par de letras indica a etapa do ensino; neste caso, o Ensino Fundamental. No segundo quadro, está escrito, O primeiro par de números indica o ano a que se refere a habilidade; neste caso, o 6º ano; no terceiro quadro, está escrito, O segundo par de letras indica o componente curricular; neste caso, história; e no quarto e último quadro está escrito: ‘O segundo par de números indica a posição da habilidade na sequência do ano’.

O código ê éfe zero seis agá ih zero um designa a seguinte habilidade: “identificar diferentes fórmas de compreensão da noção de tempo e de periodização dos processos históricos (continuidades e rupturas)”. Em cada um dos volumes da coleção, reproduziremos o quadro com as respectivas unidades temáticas, objetos de conhecimento e habilidades.

A Bê êne cê cê na coleção

Conforme o que já foi exposto, é possível perceber como a concepção da coleção sobre o ensino de história e seus objetivos estão de acôrdo com as aprendizagens essenciais definidas pela Bê êne cê cê. Quanto à organização dos conteúdos, considerando os procedimentos básicos estabelecidos pelo documento para o ensino de história, esta coleção apresenta uma organização cronológica, relacionando o estudo da história do Brasil com o da história geral, localizando devidamente os eventos e processos no tempo, com a indicação de duração, relação de anterioridade e posterioridade, e facilitando a compreensão dos alunos sobre as interações, continuidades e rupturas da história.

A coleção concilia os estudos de história com o desenvolvimento das Competências gerais da Educação Básica na medida em que fornece subsídios para que os alunos compreendam e analisem criticamente o mundo em que vivem, reflitam sobre si mesmos e suas fórmas de interação com o mundo, conheçam fórmas de investigação científica, diferentes criações artísticas e linguagens textuais e utilizem os recursos tecnológicos disponíveis para a investigação e a criação de conteúdo. O objetivo é lhes proporcionar os meios para que possam contribuir para uma sociedade mais justa e inclusiva.

Quanto às Competências específicas de Ciências Humanas, poderíamos elencar diversas situações em que cada uma delas é contemplada ao longo da coleção. Como esse trabalho é realizado e indicado sistematicamente ao longo dos volumes, apresentaremos agora apenas alguns exemplos envolvendo a competência número 1 (“compreender a si e ao outro como identidades diferentes, de fórma a exercitar o respeito à diferença em uma sociedade plural e promover os direitos humanos”). No 6º ano, tal competência é desenvolvida quando abordamos a construção da história, a memória e a relação dos patrimônios culturais materiais e imateriais com as diferentes sociedades; no 7º ano, no trabalho com os conteúdos sobre a interação dos diferentes povos e grupos sociais nas dinâmicas coloniais na América; no 8º ano, no momento em que tratamos as tensões e rupturas decorrentes dos processos revolucionários e as construções das diferentes identidades nacionais ao longo do século dezenove; no 9º ano, ao destacarmos os conflitos mundiais, as repressões ideológicas, as perseguições de populações, e ao explorarmos a diversidade de expressões de crenças, costumes e suas manifestações na contemporaneidade.

Da mesma fórma, mencionaremos alguns exemplos de como uma das Competências específicas de História é tratada ao longo da coleção. A primeira (“compreender acontecimentos históricos, relações de poder e processos e mecanismos de transformação e manutenção das estruturas sociais, políticas, econômicas e culturais ao longo do tempo e em diferentes espaços para analisar, posicionar-se e intervir no mundo contemporâneo”) é fortemente trabalhada durante toda a coleção por meio das abordagens sobre continuidades e rupturas da história em seus múltiplos aspectos. No início do 6º ano, isso ocorre, principalmente, da perspectiva da longa duração, ou seja, pela abordagem estrutural

dos processos históricos e da construção do conhecimento sobre eles. No 7º ano, ao explorarmos o contato entre povos (exclusões, interações e trocas) nas diferentes conformações sociais e econômicas no período que se convencionou chamar de modernidade. No 8º ano, quando abordamos a ebulição causada por novos referenciais intelectuais e, consequentemente, políticos e sociais, que levaram aos processos revolucionários e à formação de novas nações, bem como as diferenças de interesses e contradições sociais de algumas dessas nações. No 9º ano, pela quantidade e variedade dos conteúdos abordados, o estudo passa a ser o do tempo mais curto (das guerras, dos conflitos, das greves e movimentos sociais diversos e suas implicações na configuração do mundo no qual vivemos), e por meio dele é que se desenvolve a primeira competência específica.

O trabalho com as competências e habilidades fica evidente no texto-base, nas propostas das seções e nas atividades. No início das orientações específicas de cada livro, há um quadro-resumo indicando os capítulos em que cada competência foi trabalhada. Ao longo dos capítulos, junto à reprodução das respectivas páginas do livro do aluno, também há anotações e comentários sobre o desenvolvimento das competências, além de sugestões de atividades complementares.

8. A organização da coleção

Os livros desta coleção foram organizados em unidades que agrupam capítulos pela inter-relação de seus assuntos.

6º ANO

Unidade 1 − A construção da história e a origem da humanidade

Capítulo 1: Tempo, memória e história

Capítulo 2: A origem da humanidade

Unidade 2 − As primeiras civilizações

Capítulo 3: Os primeiros habitantes da América

Capítulo 4: Civilizações fluviais na África e na Ásia

Capítulo 5: Sociedade, economia e cultura dos povos nativos americanos

Unidade 3 − Antiguidade Clássica

Capítulo 6: Origens da Antiguidade Clássica

Capítulo 7: Transformações no mundo grego antigo

Capítulo 8: Roma republicana

Capítulo 9: Roma imperial

Unidade 4 − África e Europa medieval

Capítulo 10: A expansão do islã e os reinos africanos

Capítulo 11: A Europa feudal

Capítulo 12: Transformações na Europa medieval

7º ANO

Unidade 1 − O surgimento da modernidade

Capítulo 1: Os Estados europeus e o absolutismo monárquico

Capítulo 2: Humanismo, Renascimento e Reformas Religiosas

Capítulo 3: Expansão marítima europeia

Unidade 2 − A conexão entre mundos

Capítulo 4: Expansão portuguesa na África e na Ásia

Capítulo 5: Colonizações espanhola e inglesa na América

Capítulo 6: A colonização portuguesa na América

Unidade 3 − A construção do Império Português na América

Capítulo 7: Nordeste açucareiro

Capítulo 8: Sociedade escravista e cultura afro-brasileira

Capítulo 9: Expansão das fronteiras da América portuguesa

Unidade 4 − Mudanças na economia do mundo ocidental

Capítulo 10: A mineração na América portuguesa

Capítulo 11: Mercantilismo: uma economia de transição

8º ANO

Unidade 1 − O mundo ocidental em transformação

Capítulo 1: Das Revoluções Inglesas à Revolução Industrial

Capítulo 2: Novas ideias: o Iluminismo e os fundamentos do liberalismo econômico

Unidade 2 − Revoluções e independências

Capítulo 3: A independência dos Estados Unidos

Capítulo 4: França: revolução e era napoleônica

Capítulo 5: Independências na América espanhola

Unidade 3 − Brasil: da crise do sistema colonial ao Segundo Reinado

Capítulo 6: Das rebeliões coloniais às lutas pela emancipação na América portuguesa

Capítulo 7: Do Primeiro Reinado às Regências

Capítulo 8: O Segundo Reinado

Unidade 4 − Transformações no século XIX

Capítulo 9: Revoluções e novas teorias políticas do século XIX

Capítulo 10: Os Estados Unidos no século XIX

Capítulo 11: A nova ordem econômica e o imperialismo

9º ANO

Unidade 1 − Brasil e mundo na aurora do século XX

Capítulo 1: A Primeira República no Brasil

Capítulo 2: Cotidiano e cultura na Primeira República

Capítulo 3: A Primeira Guerra Mundial

Capítulo 4: A Revolução Russa

Unidade 2 − Totalitarismo, autoritarismo e guerra

Capítulo 5: A crise do capitalismo e a ascensão do nazifascismo

Capítulo 6: A Segunda Guerra Mundial

Capítulo 7: O primeiro governo Vargas e o Estado Novo (1930-1945)

Unidade 3 − A Guerra Fria e seus desdobramentos

Capítulo 8: A Guerra Fria

Capítulo 9: A descolonização na África e na Ásia

Capítulo 10: O Brasil entre duas ditaduras

Capítulo 11: Experiências ditatoriais na América Latina e a ditadura civil-militar no Brasil

Unidade 4 − A construção do mundo contemporâneo

Capítulo 12: Movimentos sociais e culturais da década de 1960

Capítulo 13: A redemocratização na América do Sul

Capítulo 14: Fim da Guerra Fria e os desafios do século XXI

Capítulo 15: O Brasil depois da Constituinte de 1988


Os textos, as seções e os recursos gráfico-visuais objetivam oportunizar aos alunos o contato com os conteúdos por diferentes vias. Assim, os capítulos trazem mapas, fotografias, reproduções de obras de arte, de cenas de filmes, de objetos da cultura material, charges, gráficos, tabelas e quadros organizadores, entre outros recursos. A exploração deles ocorre em questões apresentadas no boxe Explore e na seção Atividades.

Destacamos, como importantes ferramentas, os mapas, que auxiliam os alunos na orientação espacial (não só na localização de cidades ou povos, mas também na visualização de deslocamentos humanos, religiões, produtos econômicos, rotas de comércio, fronteiras geopolíticas e suas variações, que mostram que a definição dos territórios possui uma historicidade), e as histórias em quadrinhos e as charges, que representam acontecimentos com ironia, humor e, muitas vezes, de maneira crítica, possibilitando, por meio de sua leitura, a compreensão de variados assuntos.

Também tivemos a preocupação de inserir trechos de livros da historiografia adequados à faixa etária dos alunos. Com isso quisemos acrescentar informações e análises consistentes sobre o assunto trabalhado e, além de favorecer o desenvolvimento da atitude historiadora, familiarizar os alunos com textos historiográficos.

A seguir, apresentamos cada uma das partes que compõem os capítulos desta coleção.

  • Abertura de unidade: apresenta aos alunos o que será estudado por meio de imagens, um sumário e um breve texto que estabelece os nexos entre os capítulos da unidade.
  • Abertura de capítulo: por meio de uma imagem (muitas vezes relacionada a elementos das culturas juvenis, como filmes, charges, jogos, agá quês e esportes), textos e questões, introduz o tema ou os temas a serem estudados, estabelecendo relação com algum aspecto da atualidade, de modo a despertar o interesse dos alunos, dando um sentido para o estudo; além disso, propicia o levantamento dos conhecimentos prévios deles, facilitando o trabalho do professor na identificação de ideias do senso comum que precisam ser desconstruídas.
  • Recapitulando: ao longo do capítulo, apresenta questões para verificação da compreensão e sistematização dos conteúdos, favorecendo a fixação do que foi estudado pelos alunos de fórma gradativa e facilitando o trabalho docente na identificação de pontos que devem ser reforçados com a classe ou individualmente.
  • História em construção: voltada para a compreensão do saber histórico como algo em construção, inicialmente a seção fornece informações sobre fontes e métodos de pesquisa, e, gradativamente, passa a propor a análise de fontes e de textos historiográficos que ajudam a problematizar o assunto estudado por meio da prática de uma atitude historiadora.
  • Explore: questões que propõem a análise de material apresentado ao longo do capítulo, como mapas, citações, tabelas e imagens, auxiliando na compreensão mais ampla dos conteúdos, além de favorecer o desenvolvimento da compreensão leitora de diversos tipos de linguagem.
  • Refletindo sobre: propostas de reflexão crítica sobre algum aspecto do cotidiano dos alunos ou assunto da atualidade relacionado ao conteúdo estudado com o objetivo de desenvolver o autoconhecimento, o reconhecimento das diferenças, o desenvolvimento da empatia, tendo em vista as Competências gerais da Educação Básica, as Competências específicas de Ciências Humanas e os temas contemporâneos transversais.
  • Saiba mais: com o objetivo de dinamizar o estudo dos conteúdos desenvolvidos, este boxe apresenta informações complementares e/ou curiosidades relacionadas ao assunto estudado.
  • Leitura complementar e Enquanto isso: seções com inserções alternadas entre os capítulos. A primeira apresenta leituras de fontes reconhecidas, que enriquecem o estudo do tema, e a segunda trabalha a noção de simultaneidade, explorando eventos ou processos históricos ocorridos ao mesmo tempo dos que foram apresentados no texto-base, mas em espaços distintos. Nas duas seções,

questões auxiliam a exploração do conteúdo apresentado, que foi selecionado levando em consideração a faixa etária dos alunos.

  • Conexão: ao final de cada capítulo, a seção apresenta sugestões de livros, filmes, quadrinhos, sites e jogos, oferecendo alternativas para diversificação e enriquecimento das aulas.
  • Atividades: ao final dos capítulos, apresenta questões que mobilizam habilidades mais complexas, como demonstrar, analisar, comparar e explicar, entre outras, além de apresentar noções introdutórias de algumas práticas de pesquisa. A seção é constituída de três divisões fixas: Aprofundando, que corresponde às questões de aprofundamento com interpretação de textos, dados estatísticos e imagens, demandando análise, comparação, a relação do conteúdo com conceitos e a elaboração de argumentos; Aluno cidadão, que relaciona o conteúdo estudado a questões da atualidade, propondo uma reflexão crítica e desenvolvendo competências, ao mesmo tempo que aborda temas contemporâneos transversais como educação ambiental, alimentar e nutricional, educação para o trânsito e para a valorização das relações étnico-raciais, valorização do idoso etcétera; Conversando com, que aborda os temas de fórma interdisciplinar, destacando para o professor as habilidades trabalhadas do outro componente curricular indicado. Além disso, a seção Atividades apresenta subdivisões variáveis, relacionadas a cada etapa do aprendizado: nos volumes do 6º e 7º ano, Mão na massa e Você é o autor reforçam o trabalho com metodologias ativas e a valorização do protagonismo dos alunos de fórma lúdica; nos volumes do 8º e do 9º ano, os alunos são desafiados a testar seus conhecimentos com questões do enêm e de vestibulares de todo o país, selecionadas de acôrdo com a proficiência esperada para cada etapa, familiarizando os alunos com questões aplicadas em exames de larga escala.
  • Fazendo e aprendendo: no fechamento das unidades, esta seção apresenta tutoriais e desafia os alunos a desenvolverem propostas relacionadas a metodologias ativas, como elaborar uma linha do tempo, um quadro comparativo, um pequeno roteiro para encenação, criação de pôster e de reportagem e a realização de pesquisa entre outros, dando espaço para a criatividade e o protagonismo juvenil ao mesmo tempo que favorece o desenvolvimento das competências socioemocionais relacionadas ao trabalho em equipe e à cooperação.

9. Bibliografia consultada

Documentos normativos

Para a elaboração deste manual do professor, foram consultadas os seguintes decretos, leis e publicações oficiais:

BRASIL. Decreto número .7037, de 21 de dezembro de 2009. Aprova o Programa Nacional de Direitos Humanos – pê êne dê agá três e dá outras providências. Disponível em: https://oeds.link/NhFnOM. Acesso em: 30 abril 2022.

Texto integral do decreto que institui o Programa Nacional de Direitos Humanos no Brasil.

BRASIL. Lei número .13005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação (pê êne é) e dá outras providências. Disponível em: https://oeds.link/FgvmSh. Acesso em: 30 abril 2022.

Íntegra da lei que estabelece o Plano Nacional da Educação (pê êne é).

BRASIL. Lei número .13185, de 6 de novembro de 2015. Institui o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying). Disponível em: https://oeds.link/mmwTsj. Acesso em: 17 março 2022.

Oferece diretrizes para o combate à intimidação sistemática (bullying).

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Méqui, sébi, 2018.

Documento normativo que define o conjunto de aprendizagens essenciais a serem desenvolvidas ao longo da Educação Básica.

BRASIL. Ministério da Educação. Temas contemporâneos transversais na Bê êne cê cê. Contexto histórico e pressupostos pedagógicos. Brasília: Méqui, 2019.

Publicação que contextualiza e orienta a abordagem dos temas contemporâneos transversais.

unêsco. Declaração de princípios sobre a tolerância. Disponível em: https://oeds.link/VHhoTH. Acesso em: 14 fevereiro 2022.

Texto integral da Declaração de princípios sobre a tolerância, aprovado pela unêsco em 1995.

unêsco. Declaração universal sobre a diversidade cultural e plano de ação. Disponível em: https://oeds.link/XYbD6Z. Acesso em: 30 maio 2022.

Apresenta a íntegra da Declaração universal sobre a diversidade cultural, aprovada pela unêsco em 2002, e as linhas gerais de um plano de ação para implementá-la.

unêsco. Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a unêsco da Comissão Internacional sobre educação para o século vinte e um. Brasília: Unesco, 2010.

Relatório que apresenta horizontes, princípios e orientações para a educação no século vinte e um.

Teoria da história

As obras a seguir subsidiaram as discussões sobre as transformações da historiografia e sobre o conhecimento histórico.

Bloque, Marc. Apologia da história ou O ofício do historiador. Rio de Janeiro: Jorge zarrár, 2001.

Tece importantes considerações sobre o ofício do historiador, discutindo métodos, fontes e o objeto da história.

Broudel, Fernan. Escritos sobre a história. São Paulo: Perspectiva, 1978.

Discute a relação entre a história e outros campos do saber, as diferentes dimensões temporais e as contribuições da Escola dos Annales para a historiografia.

Bãrke, Peter (organizador). A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Editora Unésp, 1992.

Aborda aspectos mais recentes da pesquisa histórica, como a micro-história, a história das mulheres e o papel da narrativa.

Chartiê Rogê. A história ou a leitura do tempo. segunda edição Belo Horizonte: Autêntica, 2010.

Discute as relações entre verdade e conhecimento histórico e entre memória e história, bem como o impacto das tecnologias digitais sobre a pesquisa histórica.

Chartiê Rogê. À beira da falésia: a história entre incertezas e inquietude. Porto Alegre: Universidade da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2002.

Reúne ensaios sobre questões sensíveis ao trabalho do historiador, como a interdisciplinaridade.

Chartiê Rogê. Cultura escrita, literatura e história: conversas de Rogê Chartiê com Carlos aguírre anaia, Jesús Anáia Rosíque, Daniel Goldin e Antonio saborit. Porto Alegre: artimédi, 2001.

Debate a cultura escrita em seus múltiplos aspectos, bem como a relação entre ela e o conhecimento histórico.

chenô jeãn. Devemos fazer tábula rasa do passado? São Paulo: Ática, 1995.

Discute a relação entre presente e passado, o papel da história nas disputas pelo poder, entre outros assuntos.

dôce franssôá. A história à prova do tempo: da história em migalhas ao resgate do sentido. São Paulo: Editora Unésp, 2001.

Conjunto de ensaios que enfocam a relação entre o estruturalismo e a história.

févr lúciã. Combates pela história. segunda edição Lisboa: Editorial Presença, 1985.

Reúne as principais ideias defendidas por lúciã févr, alinhadas à Escola dos Annales.

FREITAS, Marcos Cezar (organizador). Historiografia brasileira em perspectiva. São Paulo: Contexto, 1998.

Analisa a historiografia nacional desde o século dezenove, debatendo temas como a construção da nacionalidade e a escravidão.

rãnt, lín. A Nova História Cultural. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

Enfoca a Nova História Cultural, discutindo a importância da intersecção entre a história e outras áreas do conhecimento.

LE GÓFI, Jaques. História e memória. Campinas: Editora da unicâmpi, 1990.

Aborda temas do debate historiográfico, como o caráter científico da história e a relação entre presente e passado.

ROMANO, Rugiero direção Enciclopédia Einaudi. volume 1: Memória – História. Porto: Imprensa Nacional, 1985.

Explora conceitos fundamentais do campo da história, como memória, história, calendário, passado/presente, documento/monumento.

russãn iórn. A razão histórica: teoria da história – fundamentos da ciência histórica. Brasília: Editora ú êne bê, 2001.

Busca identificar as características do conhecimento científico e o alcance e os limites da interpretação histórica.

veine pou. Como se escreve a história. Brasília: Editora ú êne bê, 1998.

Aborda os limites do historiador para alcançar uma história global e determinar uma verdade histórica totalizante.

Pedagogia e psicologia da aprendizagem

As discussões sobre o processo de ensino-aprendizagem e sobre o uso de metodologias ativas na educação foram fundamentadas nas seguintes obras.

Baciqui, Lilian; MORAN, José (organizador). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018.

Explica o que são metodologias ativas, oferecendo referências, exemplos e sugestões de trabalho.

Bréquiman cristian palman. Desenvolvimento do pensamento computacional através de atividades desplugadas na Educação Básica. 2017. Tese (Doutorado em Informática na Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017.

Investiga fórmas de desenvolver o pensamento computacional na Educação Básica, sem a mediação de recursos digitais.

japiassú rilton. Interdisciplinaridade e patologia do saber. Rio de Janeiro: Imago, 1976.

Discute a interdisciplinaridade e maneiras como ela pode ser promovida em sala de aula.

mingué, Pilar A. (organizador). A construção do conhecimento na educação. Porto Alegre: artimédi, 1988.

Reúne artigos a respeito dos principais referenciais teóricos do socioconstrutivismo, como piagê, Auzúbel e vigótisqui.

MOREIRA, Marco Antonio; bufváits, Bernardo. Mapas conceituais: instrumentos didáticos, de avaliação e de análise de currículo. São Paulo: Editora Moraes, 1987.

Apresenta a teoria de Auzúbel sobre aprendizagem significativa, aplicando-a na construção de mapas conceituais.

PERRENÔ, Fílipe. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: artimédi, 1999.

Defende o foco do ensino na formação de competências, bem como o trabalho por projetos e a avaliação formativa.

RODRIGUES, Rivanilson da Silva. Um estudo sobre os efeitos do pensamento computacional na educação. 2017. Dissertação (Mestrado em Ciência da Computação) – Universidade Federal de Campina Grande, Paraíba, 2017.

Investiga a introdução do pensamento computacional na Educação Básica e seus resultados em diferentes áreas do conhecimento.

Ensino de história

As obras a seguir balizaram as discussões sobre o ensino de história e a produção do saber histórico em sala de aula.

ABREU, Marta; Soirret, Raquel (organizador). Ensino de história, temáticas e metodologias. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2003.

Discute conceitos importantes para o ensino de história, como identidade, cultura e cidadania, além de propor experiências didáticas.

CARRETERO, Mario e outros (organizador). Ensino da história e memória coletiva. Porto Alegre: artimédi, 2007.

Discute a relação entre ensino de história e memória na construção de identidades e na formação da cidadania.

GAGO, Marília. Consciência histórica e narrativa na aula de história: concepções de professores. Porto: citissêm/ Afrontamento, 2018.

Com base nas ideias de J. russãn, investiga as relações entre o que professores da Educação Básica entendem por consciência histórica e suas concepções de narrativa histórica.

MARRERA, Fernando Milani; SOUZA, uíris Alves de. A tipologia da consciência histórica em russãn. Revista Latino-Americana de História, São Leopoldo, volume 2, número 6, agosto 2013. Edição especial.

Debate os diferentes tipos de consciência histórica existentes de acôrdo com a categorização proposta por jóta riuzen.

MEDEIROS, Daniel H. de. A formação da consciência histórica como objetivo do ensino da história no ensino médio: o lugar do material didático. 2005. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2005.

Problematiza o papel dos livros didáticos na formação da consciência histórica dos estudantes.

PAIVA, Eduardo França. História & imagens. segunda edição Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

Reflete sobre a importância da análise iconográfica na pesquisa e no ensino de história.

ximít, Maria Auxiliadora; GARCIA, Tânia Braga. O trabalho histórico em sala de aula. História e Ensino. Revista do Laboratório de Ensino de História/cê éle cê agá/uél, Londrina, volume 9, outubro 2003.

Analisa a influência, na prática docente, da formação do professor de história como pesquisador.

Uso da tecnologia da informação e da comunicação na educação

As obras a seguir embasaram a reflexão sobre o uso da tecnologia da informação e da comunicação na educação e seus efeitos no processo de ensino-aprendizagem.

COSCARELLI, Carla; RIBEIRO, Ana Elisa (organizador). Letramento digital: aspectos e possibilidades pedagógicas. terceira edição Belo Horizonte: Autêntica/ceále, 2011.

Discute o uso das tecnologias de informação e comunicação em sala de aula.

PRIOSTE, Cláudia. O adolescente e a internet: laços e embaraços no mundo virtual. São Paulo: êduspi, fapésp, 2016.

Aborda a relação dos jovens com os meios digitais, discutindo, por exemplo, o uso das redes sociais e o ciberbullying.

rôjo, Roxane; MOURA, Eduardo (organizador). Multiletramentos na escola. São Paulo: Parábola Editorial, 2012.

Subsidia a prática docente em relação ao ensino e à orientação sobre o uso responsável e competente das novas tecnologias de informação e comunicação pelos alunos.

Combate ao bullying

As reflexões sobre o bullying e as estratégias para combatê-lo no ambiente escolar tiveram como referência as seguintes obras:

búduã, M. N.; têilor, M. Bullying e desrespeito: como acabar com essa cultura na escola. Porto Alegre: artimédi, 2006.

Oferece informações sobre a prática do bullying e suas consequências, bem como propostas para combatê-la.

CALHAU, Lélio Braga. Bullying: o que você precisa saber. Identificação, prevenção e repressão. segunda edição Niterói: Impetus, 2010.

Orienta como identificar o bullying, o que fazer para evitá-lo e como agir para solucionar o problema.

FANTE, C. Fenômeno bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. Campinas: Editora Verus, 2005.

Caracteriza o bullying, trata de seus efeitos e oferece orientações para evitá-lo e combatê-lo.

ORIENTAÇÕES ESPECÍFICAS

1. Introdução

As orientações específicas deste manual do professor evidenciam de modo detalhado as articulações entre os objetivos, as justificativas e as principais competências e habilidades trabalhadas no volume, tendo por base a abordagem teórico-metodológica apresentada nas orientações gerais.

No início de cada capítulo, acompanhando a reprodução do livro do estudante, os textos relacionam os objetivos e as habilidades da Bê êne cê cê a serem mobilizados pelo conteúdo e pelas atividades propostas. Na abertura de unidade, a pertinência dos objetivos dos capítulos que a compõem é justificada de modo unificado, oferecendo um panorama sobre o trabalho a ser desenvolvido.

No decorrer dos capítulos, além das respostas das atividades e das orientações pedagógicas, são destacadas as principais competências e habilidades mobilizadas, bem como as sugestões de abordagem dos temas contemporâneos transversais.

O item a seguir apresenta um mapeamento de aspectos da Bê êne cê cê trabalhados neste volume, de modo a facilitar o planejamento didático do ano, de acôrdo com o cronograma adotado no desenvolvimento do curso.

2. A Bê êne cê cê neste volume

Competências e temas contemporâneos transversais

O quadro a seguir apresenta os principais destaques de cada capítulo do volume do 9º ano.

Capítulos

Competências gerais da Educação Básica

Competências específicas de Ciências Humanas

Competências específicas de História

Temas contemporâneos transversais

1. A Primeira República no Brasil

1, 2, 7, 9

5, 6

2, 3

• Direitos da criança e do adolescente
• Educação financeira
• Vida familiar e social

2. Cotidiano e cultura na Primeira República

1, 4, 6, 7, 9, 10

1, 2, 5, 6

1, 2, 3, 4

• Saúde
• Trabalho

3. A Primeira Guerra Mundial

1, 4, 7, 8, 9, 10

4, 5, 6

1, 4, 6

• Ciência e tecnologia
• Vida familiar e social

4. A Revolução Russa

1, 2, 5, 7, 9

2, 4, 5, 6

1, 3, 6

• Educação em direitos humanos

5. A crise do capitalismo e a ascensão do nazifascismo

4, 5, 6, 7, 8, 9

1, 2, 4, 6

3

• Direitos da criança e do adolescente
• Diversidade cultural
• Educação em direitos humanos
• Educação para o consumo

6. A Segunda Guerra Mundial

1, 2, 4, 7, 9

1, 2, 3, 6

1, 2

• Ciência e tecnologia
• Educação em direitos humanos
• Trabalho

7. O primeiro governo Vargas e o Estado Novo (1930-1945)

1, 2, 4, 5, 7, 9

1, 2, 5, 6

1, 4, 5, 7

• Educação ambiental
• Educação em direitos humanos

8. A Guerra Fria

1, 2, 4, 5, 7, 9, 10

2, 3, 5, 6

1, 4, 5, 7

• Ciência e tecnologia
• Educação ambiental
• Educação financeira
• Educação para o consumo
• Trabalho

9. A descolonização na África e na Ásia

1, 2, 4, 7, 9

1, 2, 3, 4, 6

1, 2, 5

• Diversidade cultural
• Educação em direitos humanos

10. O Brasil entre duas ditaduras

1, 2, 3, 4, 7

1, 2, 6

1, 3

• Diversidade cultural
• Educação ambiental

Capítulos

Competências gerais da Educação Básica

Competências específicas de Ciências Humanas

Competências específicas de História

Temas contemporâneos transversais

11. Experiências ditatoriais na América Latina e a ditadura civil-militar no Brasil

1, 4, 5, 7, 9

1, 2, 6

1, 7

• Educação em direitos humanos

12. Movimentos sociais e culturais da década de 1960

1, 2, 4, 7, 8, 9, 10

1, 2, 3, 4, 6

1

• Diversidade cultural
• Educação ambiental
• Educação em direitos humanos
• Educação financeira
• Educação para o consumo
• Vida familiar e social

13. A redemocratização na América do Sul

2, 3, 4, 6, 7, 9

2, 6

3, 4, 6

• Educação financeira
• Trabalho
• Vida familiar e social

14. Fim da Guerra Fria e os desafios do século XXI

1, 2, 4, 5, 7, 9, 10

2, 3, 6

6, 7

• Ciência e tecnologia
• Diversidade cultural
• Educação ambiental

15. O Brasil depois da Constituinte de 1988

1, 2, 4, 5, 7, 8, 9, 10

1, 2, 3, 4, 5, 6

1, 2, 3, 7

• Diversidade cultural
• Educação em direitos humanos
• Vida familiar e social

Objetos de conhecimento e habilidades do 9º ano

UNIDADES TEMÁTICAS

OBJETOS DE CONHECIMENTO

HABILIDADES

CAPÍTULOS

O NASCIMENTO DA REPÚBLICA NO BRASIL E OS PROCESSOS HISTÓRICOS ATÉ A METADE DO SÉCULO XX

Experiências republicanas e práticas autoritárias: as tensões e disputas do mundo contemporâneo

A proclamação da República e seus primeiros desdobramentos

(EF09HI01) Descrever e contextualizar os principais aspectos sociais, culturais, econômicos e políticos da emergência da República no Brasil.

1, 2

(EF09HI02) Caracterizar e compreender os ciclos da história republicana, identificando particularidades da história local e regional até 1954.

1, 2, 7, 10

A questão da inserção dos negros no período republicano do pós-abolição

Os movimentos sociais e a imprensa negra; a cultura afro-brasileira como elemento de resistência e superação das discriminações

(EF09HI03) Identificar os mecanismos de inserção dos negros na sociedade brasileira pós-abolição e avaliar os seus resultados.

2

(EF09HI04) Discutir a importância da participação da população negra na formação econômica, política e social do Brasil.

2

Primeira República e suas características

Contestações e dinâmicas da vida cultural no Brasil entre 1900 e 1930

(EF09HI05) Identificar os processos de urbanização e modernização da sociedade brasileira e avaliar suas contradições e impactos na região em que vive.

2

O período varguista e suas contradições

A emergência da vida urbana e a segregação espacial

O trabalhismo e seu protagonismo político

(EF09HI06) Identificar e discutir o papel do trabalhismo como força política, social e cultural no Brasil, em diferentes escalas (nacional, regional, cidade, comunidade).

7, 10

A questão indígena durante a República (até 1964)

(EF09HI07) Identificar e explicar, em meio a lógicas de inclusão e exclusão, as pautas dos povos indígenas, no contexto republicano (até 1964), e das populações afrodescendentes.

1, 2, 7, 10

Anarquismo e protagonismo feminino

(EF09HI08) Identificar as transformações ocorridas no debate sobre as questões da diversidade no Brasil durante o século XX e compreender o significado das mudanças de abordagem em relação ao tema.

7

(EF09HI09) Relacionar as conquistas de direitos políticos, sociais e civis à atuação de movimentos sociais.

7

UNIDADES TEMÁTICAS

OBJETOS DE CONHECIMENTO

HABILIDADES

CAPÍTULOS

TOTALITARISMOS E CONFLITOS MUNDIAIS

O mundo em conflito: a Primeira Guerra Mundial
A questão da Palestina
A Revolução Russa
A crise capitalista de 1929

(EF09HI10) Identificar e relacionar as dinâmicas do capitalismo e suas crises, os grandes conflitos mundiais e os conflitos vivenciados na Europa.

3, 4, 5, 8

(EF09HI11) Identificar as especificidades e os desdobramentos mundiais da Revolução Russa e seu significado histórico.

4

(EF09HI12) Analisar a crise capitalista de 1929 e seus desdobramentos em relação à economia global.

5

A emergência do fascismo e do nazismo
A Segunda Guerra Mundial
Judeus e outras vítimas do holocausto

(EF09HI13) Descrever e contextualizar os processos da emergência do fascismo e do nazismo, a consolidação dos estados totalitários e as práticas de extermínio (como o holocausto).

5, 6

O colonialismo na África
As guerras mundiais, a crise do colonialismo e o advento dos nacionalismos africanos e asiáticos

(EF09HI14) Caracterizar e discutir as dinâmicas do colonialismo no continente africano e asiático e as lógicas de resistência das populações locais diante das questões internacionais.

3, 6, 9

A Organização das Nações Unidas (ONU) e a questão dos direitos humanos

(EF09HI15) Discutir as motivações que levaram à criação da Organização das Nações Unidas (ONU) no contexto do pós-guerra e os propósitos dessa organização.

6, 9

(EF09HI16) Relacionar a Carta dos Direitos Humanos ao processo de afirmação dos direitos fundamentais e de defesa da dignidade humana, valorizando as instituições voltadas para a defesa desses direitos e para a identificação dos agentes responsáveis por sua violação.

6, 11

MODERNIZAÇÃO, DITADURA CIVIL-MILITAR E REDEMOCRATIZAÇÃO: O BRASIL APÓS 1946

O Brasil da era JK e o ideal de uma nação moderna: a urbanização e seus desdobramentos em um país em transformação

(EF09HI17) Identificar e analisar processos sociais, econômicos, culturais e políticos do Brasil a partir de 1946.

10

(EF09HI18) Descrever e analisar as relações entre as transformações urbanas e seus impactos na cultura brasileira entre 1946 e 1964 e na produção das desigualdades regionais e sociais.

10

Os anos 1960: revolução cultural?
A ditadura civil-militar e os processos de resistência
As questões indígena e negra e a ditadura

(EF09HI19) Identificar e compreender o processo que resultou na ditadura civil-militar no Brasil e discutir a emergência de questões relacionadas à memória e à justiça sobre os casos de violação dos direitos humanos.

10, 11

(EF09HI20) Discutir os processos de resistência e as propostas de reorganização da sociedade brasileira durante a ditadura civil-militar.

11, 13

(EF09HI21) Identificar e relacionar as demandas indígenas e quilombolas como forma de contestação ao modelo desenvolvimentista da ditadura.

11, 13

UNIDADES TEMÁTICAS

OBJETOS DE CONHECIMENTO

HABILIDADES

CAPÍTULOS

MODERNIZAÇÃO, DITADURA CIVIL-MILITAR E REDEMOCRATIZAÇÃO: O BRASIL APÓS 1946

O processo de redemocratização
A Constituição de 1988 e a emancipação das cidadanias (analfabetos, indígenas, negros, jovens etc.)
A história recente do Brasil: transformações políticas, econômicas, sociais e culturais de 1989 aos dias atuais
Os protagonismos da sociedade civil e as alterações da sociedade brasileira
A questão da violência contra populações marginalizadas
O Brasil e suas relações internacionais na era da globalização

(EF09HI22) Discutir o papel da mobilização da sociedade brasileira do final do período ditatorial até a Constituição de 1988.

13

(EF09HI23) Identificar direitos civis, políticos e sociais expressos na Constituição de 1988 e relacioná-los à noção de cidadania e ao pacto da sociedade brasileira de combate a diversas formas de preconceito, como o racismo.

13, 15

(EF09HI24) Analisar as transformações políticas, econômicas, sociais e culturais de 1989 aos dias atuais, identificando questões prioritárias para a promoção da cidadania e dos valores democráticos.

15

(EF09HI25) Relacionar as transformações da sociedade brasileira aos protagonismos da sociedade civil após 1989.

13, 15

(EF09HI26) Discutir e analisar as causas da violência contra populações marginalizadas (negros, indígenas, mulheres, homossexuais, camponeses, pobres etc.) com vistas à tomada de consciência e à construção de uma cultura de paz, empatia e respeito às pessoas.

15

(EF09HI27) Relacionar aspectos das mudanças econômicas, culturais e sociais ocorridas no Brasil a partir da década de 1990 ao papel do País no cenário internacional na era da globalização.

15

A HISTÓRIA RECENTE

A Guerra Fria: confrontos de dois modelos políticos
A Revolução Chinesa e as tensões entre China e Rússia
A Revolução Cubana e as tensões entre Estados Unidos da América e Cuba

(EF09HI28) Identificar e analisar aspectos da
Guerra Fria, seus principais conflitos e as tensões geopolíticas no interior dos blocos liderados por soviéticos e estadunidenses.

8, 9, 10, 11, 12, 13, 14

As experiências ditatoriais na América Latina

(EF09HI29) Descrever e analisar as experiências ditatoriais na América Latina, seus procedimentos e vínculos com o poder, em nível nacional e internacional, e a atuação de movimentos de contestação às ditaduras.

11, 13

(EF09HI30) Comparar as características dos regimes ditatoriais latino-americanos, com especial atenção para a censura política, a opressão e o uso da força, bem como para as reformas econômicas e sociais e seus impactos.

11, 13

Os processos de descolonização na África e na Ásia

(EF09HI31) Descrever e avaliar os processos de descolonização na África e na Ásia.

8, 9, 12

O fim da Guerra Fria e o processo de globalização
Políticas econômicas na América Latina

(EF09HI32) Analisar mudanças e permanências associadas ao processo de globalização, considerando os argumentos dos movimentos críticos às políticas globais.

12, 14

(EF09HI33) Analisar as transformações nas relações políticas locais e globais geradas pelo desenvolvimento das tecnologias digitais de informação e comunicação.

14

(EF09HI34) Discutir as motivações da adoção de diferentes políticas econômicas na América
Latina, assim como seus impactos sociais nos países da região.

15

UNIDADES TEMÁTICAS

OBJETOS DE CONHECIMENTO

HABILIDADES

CAPÍTULOS

A HISTÓRIA RECENTE

Os conflitos do século XXI e a questão do terrorismo

Pluralidades e diversidades identitárias na atualidade

As pautas dos povos indígenas no século XXI e suas formas de inserção no debate local, regional, nacional e internacional

(EF09HI35) Analisar os aspectos relacionados ao fenômeno do terrorismo na contemporaneidade, incluindo os movimentos migratórios e os choques entre diferentes grupos e culturas.

14

(EF09HI36) Identificar e discutir as diversidades identitárias e seus significados históricos no início do século XXI, combatendo qualquer forma de preconceito e violência.

14, 15

3. Sugestões de cronograma

O planejamento de trabalho com as unidades e os capítulos do livro ao longo do ano letivo pode variar em função do calendário escolar adotado pela instituição de ensino. Para subsidiar o planejamento do professor, disponibilizamos possibilidades de organização bimestral, trimestral e semestral do livro.

CRONOGRAMA BIMESTRAL

1º bimestre

2º bimestre

3º bimestre

4º bimestre

Unidade 1

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Unidade 2

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Unidade 3

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Unidade 4

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

CRONOGRAMA TRIMESTRAL

1º trimestre

2º trimestre

3º trimestre

Unidade 1

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Unidade 2

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Unidade 3

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Unidade 4

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

CRONOGRAMA SEMESTRAL

1º semestre

2º semestre

Unidade 1

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Unidade 2

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Unidade 3

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Unidade 4

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

4. Textos de aprofundamento

A crise do Encilhamento

No trecho a seguir, o historiador Caio Prado Júnior aborda as origens do Encilhamento, a forte crise que se instaurou no Brasil no fim do século dezenove em razão da intensa especulação financeira.

“Os primeiros anos que se seguem imediatamente à proclamação da república serão dos mais graves da história das finanças brasileiras. A implantação do novo regime não encontrou oposição nem resistência aberta sérias. Mas a grande transformação política e administrativa que operou não se estabilizará e normalizará senão depois de muitos anos de lutas e agitações. Do império unitário o Brasil passou bruscamente com a república para uma federação largamente descentralizada que entregou às antigas províncias, agora estados, uma considerável autonomia administrativa, financeira e até política. reticências

Paralelamente abater-se-á sobre o país uma forte crise financeira. A origem dessa crise – embora complicando-se depois com outros fatores – está no funcionamento do sistema monetário e no sempre recorrente apelo a emissões incontroláveis e mais ou menos arbitrárias reticências. Destinando-se incialmente a atender às necessidades da circulação monetária em face da intensificação das transações e da vida econômica e financeira em geral, as emissões acabarão afinal desenvolvendo-se muito além de qualquer medida.

A falta de meio circulante suficiente já começara a se fazer sentir nos últimos anos do império. O progresso das atividades econômicas, muito acentuado nesse período, determinara uma relativa escassez de moeda que, por falta de um sistema organizado e normal de emissões que mantivesse automaticamente certo equilíbrio entre o volume monetário e as necessidades financeiras, tinha por isso de ser atendida, como já fôra em outras conjunturas semelhantes, por medidas de emergência e mais ou menos arbitrárias reticências. A carência de meio circulante ainda se agravara com a libertação dos escravos, transformados bruscamente em assalariados; calcula-se que nada menos que 50 mil contos anuais se tinham tornado necessários para esse novo pagamento de salários. Importância considerável para uma circulação total que no momento mal ultrapassava 200 mil.

Ainda outra circunstância levará o govêrno imperial a autorizar emissões, a necessidade de contentar uma classe importante como os antigos proprietários de escravos, profundamente atingidos pela abolição que se fizera sem nenhuma indenização. As novas emissões destinar-se-iam em grande parte a auxiliar com créditos a lavoura prejudicada pela libertação dos escravos.

A faculdade emissora concedida a vários bancos (emissões sobre lastro-ouro e títulos da dívida pública interna), não chegará, contudo, a ser utilizada, pois logo ocorre o golpe republicano. Mas o novo regime ia defrontar-se com uma situação financeira que não se modificara; e não podia por isso abandonar o projeto de emissão legado pelo império. Acresce que não seria prudente da parte de um regime que acabava de se instalar e que não sabia ainda ao certo nem como iria ser recebido no país, recusar uma medida ansiosamente esperada. Houve mesmo, a princípio, grandes temores, aliás infundados, de uma reação monárquica. Nestas condições o novo govêrno republicano não somente confirmou a faculdade emissora concedida pouco antes pelo império, mas ainda a ampliou consideravelmente.

reticências A mudança do regime, o efeito psicológico que produziu, determinarão um recrudescimento de atividades. Elas encontrarão no meio circulante em expansão o farto alimento; mas inversamente, estimulam aquela expansão pela pressão financeira que determinam. reticências

Sob a ação desse jorro emissor não tardará que da citada ativação dos negócios se passe rapidamente para a especulação pura. Começam a surgir em grande número novas empresas de toda ordem e finalidade. Eram bancos, firmas comerciais, companhias industriais, de estradas de ferro, toda sorte de negócios possíveis e impossíveis. reticências

Naturalmente a quase totalidade das novas empresas era fantasma e não tinha existência senão no papel. Organizavam-se apenas com a finalidade de emitir ações e despejá-las no mercado de títulos, onde passavam rapidamente de mão em mão em valorizações sucessivas. Chegaram a faltar nomes apropriados para designar novas sociedades e inventaram-se as mais extravagantes denominações. Ao lado de projetos irrealizáveis como estradas de ferro transcontinentais, grandes empresas de navegação, colonização de territórios os mais afastados e inacessíveis do país, surgem negócios de exequibilidade de todo disparatados. Ninguém se lembrava nunca de indagar da exequibilidade de uma empresa, das perspectivas do negócio. reticências

Está claro que tal situação não podia durar. Em fins de 1891 estoura a crise e rui o castelo de cartas levantado pela especulação.”

PRADO JÚNIOR, Caio. História econômica do Brasil. trigésima edição São Paulo: Brasiliense, 1984. página 218-220.

Greves operárias no início do século vinte

No trecho a seguir, Lilia Moritz Chuárquis e Heloisa Murgel Istárlin destacam a presença de ideias anarquistas entre os operários fabris imigrantes, as quais contribuíram para o fortalecimento das greves no início do século vinte.

“Dos anos 1910 em diante outro setor se agitaria: os operários do novo parque industrial, resultado bastante imediato da chegada de imigrantes europeus. E, se não foram os imigrantes os únicos nem os maiores responsáveis pelos movimentos grevistas, é certo que tiveram grande influência, sobretudo no que se refere à entrada do anarquismo no Brasil, a partir da década de 1890. Italianos, espanhóis, portugueses e muitos brasileiros aderiram ao movimento, e essa constituiria a mais importante corrente de organização e mobilização política dos operários por mais de trinta anos. reticências

A imigração italiana ajuda a entender a associação dos trabalhadores brasileiros com o anarquismo – fôrça política hegemônica no movimento operário italiano –, pelo menos em São Paulo. E, reza a boa tradição revolucionária, um anarquista italiano, ao imigrar, transformava-se num missionário dos ideais libertários. Os ideais desse grupo também desembarcaram na bagagem dos imigrantes espanhóis e portugueses, os quais assumiram um papel decisivo na orientação política do movimento operário que crescia igualmente no Rio de Janeiro e em Minas Gerais. Anarquista é aquele que se propõe a criar uma sociedade sem Estado, formada por comunidades autogeridas cujo cotidiano é orientado pelos princípios da liberdade, da livre experimentação, da solidariedade e da fraternidade. No Brasil, os anarquistas se organizaram entre os operários através de associações de luta e de reivindicações – voltadas para a propaganda, melhoria das condições de vida do trabalhador e do seu acesso à educação. Criaram diversas publicações reticências e utilizaram a greve como principal arma de mobilização e combate. Também se dividiram entre duas correntes. Os anarcossindicalistas predominaram em São Paulo e apostaram nas associações como principal espaço de atuação política. Já os anarcocomunistas acreditavam na insurreição como caminho de ação revolucionária. Todos, porém, estavam de acôrdo num ponto: apenas através da ação direta e autônoma dos operários seria possível alcançar a abolição do capitalismo e a instauração da anarquia.

Não por coincidência, o período de 1906 a 1908 foi marcado por um crescimento no número de greves. A classe operária reagia às péssimas condições de trabalho – não havia restrição de idade ou tempo máximo de jornada diária –, assim como lutava por melhores salários e pela criação de órgãos de representação, como sindicatos e partidos. Crianças trabalhavam nas fábricas a partir de cinco anos de idade, sendo que menores chegavam a constituir metade do número total de operários empregados. O censo industrial de 1919 também assinala a existência de largo contingente de mão de obra feminina. A presença de crianças e mulheres nas fábricas levava à diminuição do nível médio dos salários, enquanto a carestia aumentava nos anos de guerra.

A classe operária tornou-se um novo protagonista na vida pública do Brasil. Os operários se organizaram em sindicatos, federações sindicais e diferentes tipos de organizações, e rapidamente chegaram à criação de uma central sindical de orientação anarquista – a Confederação Operária do Brasil (cób), criada em 1906. Entre 1900 e 1920 estouraram cêrca de quatrocentas greves organizadas em torno da luta por melhores condições de trabalho e de vida (aumento de salário, proteção ao trabalhador, redução da jornada de trabalho, direito de organização) ou de natureza explicitamente política: greves contra a Primeira Guerra e em solidariedade às lutas internacionais dos operários. Em 1902 ocorreu no Rio de Janeiro a primeira manifestação grevista, nesse caso envolvendo uma fábrica de sapatos. Em 1903, também na capital federal, eclodiu a primeira greve geral multiprofissional, que se estendeu aos pintores, gráficos, chapeleiros e outros setores, sendo reprimida pela polícia. Em 1904, nova greve, coordenada por funcionários da Companhia Docas de Santos, e apoiada pelos gráficos de São Paulo e pelos marítimos do Rio de Janeiro. Em 1906, uma das greves ferroviárias de maior proporção estourou em São Paulo, motivada pelos abusos cotidianos sofridos pelos operários locais, e pela redução de salários. Em 1907, conheceu-se a primeira greve geral em São Paulo, pela defesa das oito horas de trabalho, difundindo-se o movimento para outras cidades do estado, como Santos, Ribeirão Preto e Campinas. A agitação tomou conta das indústrias de alimentação, da metalurgia, e alcançou sapateiros e gráficos, chegando a atingir 2 mil operários. No entanto, a despeito do claro crescimento do movimento grevista, num país de tradição clientelística e pouco afeito à esfera pública de representação, as greves eram alvo de repressão sistemática. Vários imigrantes foram expulsos do Brasil sob alegação de serem ‘anarquistas e baderneiros’, e muitos trabalhadores nacionais acabaram espancados e presos pela mesma razão.”

Chuárquis, Lilia Moritz; istárlin, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. página 334-337.

A Primeira Guerra na África

No texto a seguir, o historiador Lôrence Sond ráus discorre sobre os conflitos da Primeira Guerra Mundial na África, principalmente os que envolveram colônias alemãs e britânicas.

“A guerra na África Subsaariana concentrou-se nas quatro colônias alemãs: Togo, Camarões, Sudoeste Africano Alemão (atual Namíbia) e África Oriental Alemã (atual Tanzânia, menos Zanzibar, mais Ruanda e Burundi). Como as colônias do Pacífico, a defesa desses territórios era precária, o que os tornava vulneráveis a ataques a partir de terras Aliadas vizinhas. Desde o início, ficou claro que a Alemanha nada poderia fazer para salvá-los, deixando que seu destino fosse determinado pela velocidade e fôrça com que os Aliados decidissem atacá-los reticências.

A colônia do Togo, no oeste da África, era a única possessão alemã ultramarina autossuficiente, graças ao eficiente cultivo de cacau, algodão e café. Estreita faixa de terra que faz fronteira com a Costa do Ouro britânica (atual Gana) e o Daomé francês (hoje Benin), também era a mais vulnerável das colônias alemãs na África. O regimento da Costa do Ouro da Real fôrça de Fronteira da África Ocidental (érre dáblio a éfe éfe), sob comando do tenente-coronel F. C. Bráian, invadiu o Togo a partir do oeste em 7 de agosto, ação logo imitada por uma fôrça francesa que invadiu o território togolês a partir do Daomé, no leste. Os 1500 defensores (33 alemães e 1200 africanos) capitularam depois de apenas dezenove dias de luta. Camarões, 800 quilômetros ao leste, era bem maior e sua conquista foi mais custosa. A contribuição britânica inicial incluiu unidades da érre dáblio a éfe éfe originárias de Nigéria, Serra Leoa, Gâmbia e Costa do Ouro, sob o comando do general Chárles Dôbou, além de cruzadores da Marinha Real e mais de uma dúzia de embarcações fluviais da marinha da Nigéria, ao passo que a contribuição francesa incluiu um cruzador e uma fôrça de infantaria predominantemente senegalesa. Os cruzadores forneceram apôio da artilharia para os 4250 soldados Aliados (2400 britânicos, 1850 franceses) que tomaram a capital colonial, Douala, em 27 de setembro. Tropas Aliadas reticências logo atacaram a colônia de todos os lados, mas o contingente principal que tinha tomado Douala permaneceu junto ao litoral para defender suas conquistas caso os cruzadores de Spee [comandante da esquadra alemã, Maquissimílian fon Ichipí] aparecesse. As operações ficaram em suspenso até dezembro de 1914, quando notícias da derrota da esquadra alemã nas Ilhas Malvinas liberaram as tropas para lutar continente adentro, seguindo pela principal via férrea da colônia até Iaundê, outra importante cidade camaronesa. Um ataque inicial a Iaundê, no verão de 1915, fracassou, mas uma segunda ofensiva conseguiu tomar a cidade em 1º de janeiro de 1916. A essa altura, a fôrça Aliada em Camarões já aumentara, incluindo então quase 15 mil soldados (8 mil franceses, 6400 britânicos e 500 belgas) reticências.

Nesse ínterim, o Sudoeste Africano Alemão sobrevivia mais tempo do que deveria, devido a problemas internos na vizinha África do Sul, onde a maior fissura na população branca não se dava entre falantes de inglês e de africãs, mas entre os africâneres, provocando um racha entre os moderados, que tinham aceitado o jugo britânico, e os ‘velhos bôeres’, que não tinham. Em agosto de 1914, o primeiro-ministro Loáis Buetá, ex-general bôer que emergira como líder político dos africâneres moderados, assegurou a Londres que a África do Sul não só tinha meios de se defender sozinha, permitindo que a guarnição britânica partisse para a França, mas também se comprometia a invadir o vizinho Sudoeste Africano Alemão. Uma vez que, na ocasião, a esquadra de Spee ainda estava navegando livremente, os britânicos deram prioridade absoluta à destruição das estações de rádio sem fio alemãs em Suacopmúnd e na baía de Lünderitz reticências. fóra isso, a guerra teve um início lento para a fôrça de Defesa da União, liderada por Botha, porque os ‘velhos bôeres’ entre os oficiais sul-africanos viam o apuro em que estavam metidos os britânicos como uma oportunidade de ouro para reafirmar sua independência.

A rebelião africâner contra o govêrno de Buetá levou o nome do tenente-coronel S. G. Mártis, reticências comandante local das tropas sul-africanas na parte norte da Colônia do Cabo, cuja conspiração com os oficiais alemães do outro lado da fronteira acabou fazendo com que Buetá o demitisse, em 8 de outubro. Mártis partiu para a rebelião aberta no dia seguinte e, no dia 14, o primeiro-ministro declarou lei marcial. Com a ajuda de seu ministro da Defesa, reticências Buetá comandou a maioria leal do exército sul-africano em uma campanha breve e decisiva que esmagou a rebelião. reticências

Semanas depois da rendição da última fôrça rebelde, Buetá tinha mobilizado um exército sul-africano de 67 mil homens para invadir o Sudoeste Africano. Aproximadamente dois terços dessa fôrça entraram em ação na colônia alemã, onde enfrentaram uma vigorosa e obstinada resistência da fôrça de defesa do general Víquitor Fránque reticências. Em contraste com outros líderes de colônias alemãs na África, Fránque não estava em posição de complementar suas fôrças com muito soldados africanos. Pois a população local tinha sido significativamente reduzida uma década antes pelo genocídio dos ererós reticências. Depois que Botha tomou a capital colonial, véndû, em 12 de maio de 1915, Fránque recuou para o norte reticências, antes de capitular com seus dois mil soldados remanescentes em Coráb, oito dias depois.”

Sond ráus, Lôrence. A Primeira Guerra Mundial: história completa. São Paulo: Contexto, 2013. página 137-140.

O socialismo por decreto no mundo soviético

No trecho a seguir, o sociólogo Maurício trégtenbérg discute o papel da Oposição Operária no início da Revolução Russa, contrapondo-se à crescente burocracia dos bolcheviques que, na tentativa de impor o socialismo via decretos, descontentava os trabalhadores.

“Surge a Oposição Operária, formada por trabalhadores que participaram das revoluções de 1905 e 1917, tendo sua expressão teórica na obra de Alexandra Colantái, como reação ao período denominado comunismo de guerra (1919-20).

A grande crítica que faz ao govêrno é a da substituição da direção colegiada pela unipessoal. A Oposição Operária mostra que a direção unipessoal da fábrica constitui a encarnação da ideologia individualista característica da classe burguesa. A burguesia não crê na fôrça da coletividade, daí priorizar a direção da empresa nas mãos de um homem isolado, ‘livre’, da coletividade.

A Oposição Operária cresce. De Moscou a Petrogrado (atual São Petersburgo e ex-Leningrado), suas teses são adotadas na região do Don, dos Urais e da Sibéria.

Enquanto isso, o bolchevismo ligava à direção unipessoal da empresa, por um administrador nomeado pelo Estado, a utilização do método de têilor de organização do trabalho e o pagamento por produtividade individual. Enfatizava o estudo e o emprego do que, na sua opinião, havia de científico no teilorismo.

Os bolcheviques não percebiam que, com a importação do teilorismo, importavam também seu conteúdo repressivo: o desconhecimento do sujeito ou sua negação. Contudo, seja dito de passagem que o que se conheceu no mundo como método teilorista surgira na própria Rússia, com a criação da Escola Imperial Técnica de Moscou, em 1878 reticências. Ali se ensinava o que posteriormente se chamou ‘organização científica do trabalho’ ou teilorismo, e seus resultados foram apresentados na Exposição de Filadélfia, daí se difundindo às escolas norte-americanas. A utilização do teilorismo pelos bolcheviques, na verdade, foi uma readaptação do método ensinado pela Escola Imperial de Moscou, tendo como fim o arranco industrial.

Os proletários perderam a gestão das fábricas; em troca, Lênin ofereceu-lhes o direito de greve! Como se tivessem feito a Revolução Russa para conquistar algo tão limitado!

É muito difícil que os termos ‘administração científica’ (têilor) e ‘proletariado’ andem próximos, pois a ciência foi desenvolvida pela classe dominante e em seu benefício, compatível com sua dominação. Para definir o que é científico, a sociedade capitalista nomeia como tal os conhecimentos e capacidades suscetíveis de sistematização e incorporação na cultura acadêmica dominante, considerando não científicos conhecimentos que pertençam a uma cultura popular. reticências

Isso leva a Oposição Operária a condenar a utilização e a proeminência dada por Lênin aos ‘especialistas’ do antigo regime, que mantêm o espírito de subordinação, hierarquia, obediência passiva. Os bolcheviques procuram nos ‘especialistas’ que serviram ao capitalismo, nos ex-capitalistas, nos técnicos cuja iniciativa fôra limitada pelo regime anterior, a solução para os problemas que implica a criação de uma sociedade socialista.

Tudo isso constitui uma tentativa infantil de instituir o comunismo por decreto; onde se deve falar em ‘criar’, os bolcheviques falam em ‘prescrever’. O que a Oposição Operária criticava acerbamente era o fato de o partido não apelar aos trabalhadores urbanos e rurais, de não favorecer sua organização a partir do local de trabalho para resolver os problemas que se colocavam, mas recorrer aos ‘especialistas’ burgueses. Abriu-se uma brecha entre o bolchevismo e o proletariado.

Diferentemente de Lênin, que permitia a criatividade no plano econômico somente via Partido Bolchevique, a Oposição Operária manifestava sua descrença ante o fato de que ele mesmo dispersava a vanguarda através dos vários setores da burocracia do Estado, cuja atmosfera geral fundava-se na rotina. E eram esses setores que ele via como fonte da criatividade econômica!

Burocracia ou iniciativa das massas constitui a opção que separa a Oposição Operária dos líderes do partido. reticências

Os que estão na cúpula dos órgãos soviéticos acomodam-se e defendem ideologicamente a burocracia como um destino. Evidencia-se isso quando Trótisqui afirma que sofremos mais por assimilarmos o lado negativo, esquecendo o lado positivo da burocracia.

A Oposição Operária vê na burocracia a negação direta da iniciativa das massas. Isso tem reflexos no plano ideológico: qualquer nova iniciativa ou pensamento que não passe pela censura dos órgãos ‘dirigentes’ é vista como violação da disciplina do partido, um atentado às autoridades centrais, a quem cabe prescrever tudo. Os problemas não são resolvidos pela ação direta das classes ou grupos interessados, mas a decisão é tomada a partir do tôpo, por uma pessoa ou um comitê reduzidíssimo, com ausência completa dos interessados.

É o que argumentava Rosa Luxemburgo, criticando os bolcheviques quando pretendiam implantar o socialismo por decreto. Mostrava ela que, ao passo que a denominação do capitalismo se funda na ignorância das grandes massas, a construção do socialismo pressupõe maior iniciativa, liberdade de pensamento e ação dessas massas, pois é o caminho para a elevação do seu nível de consciência política.”

trégtenbérg, Maurício. A Revolução Russa. São Paulo: Editora Unésp, 2007. página 95-99.

O totalitarismo e as massas

No trecho a seguir, a filósofa Râna Árent analisa a adesão das massas ao discurso totalitário e aos líderes que o proferem, destacando que o esquecimento e a inconstância das massas não significam a cura da ilusão totalitária, mas podem indicar o exato oposto. Além disso, ela também discorre sobre a necessidade da fôrça numérica para a transformação de um movimento totalitário em um govêrno totalitário.

“Nada caracteriza melhor os movimentos totalitários em geral – e principalmente a fama de que desfrutam os seus líderes – do que a surpreendente facilidade com que são substituídos. Istálin conseguiu legitimar-se como herdeiro político de Lênin à custa de amargas lutas intrapartidárias e de vastas concessões à memória do antecessor. Já os sucessores de Istálin procuraram substituí-lo sem tais condescendências, embora ele houvesse permanecido no poder por trinta anos e dispusesse de uma máquina de propaganda, desconhecida ao tempo de Lênin, para imortalizar o seu nome. O mesmo se aplica a Rítler, que durante toda a vida exerceu um fascínio que supostamente cativava a todos, e que, depois de derrotado e morto, está hoje tão completamente esquecido que mal representa alguma coisa, mesmo entre os grupos neofascistas e neonazistas da Alemanha. Essa impermanência tem certamente algo a ver com a volubilidade das massas e da fama que as tem por base; mas seria talvez mais correto atribuí-la à essência dos movimentos totalitários, que só podem permanecer no poder enquanto estiverem em movimento e transmitirem movimento a tudo o que os rodeia. Assim, até certo ponto, essa impermanência é um testemunho lisonjeiro para os líderes mortos, pois significa que conseguiram contaminar os seus súditos com aquele vírus especificamente totalitário que se caracteriza, entre outras coisas, pela extraordinária adaptabilidade e falta de continuidade. Donde se conclui que pode ser errado presumir que a inconstância e o esquecimento das massas signifiquem estarem curadas da ilusão totalitária, vez por outra identificada com o culto a Rítler ou a Istálin: a verdade pode ser exatamente o oposto.

Seria um erro ainda mais grave esquecer, em face dessa impermanência, que os regimes totalitários, enquanto no poder, e os líderes totalitários, enquanto vivos, sempre ‘comandam e baseiam-se no apôio das massas’. A ascensão de Rítler ao poder foi legal dentro do sistema majoritário, e ele não poderia ter mantido a liderança de tão grande população, sobrevivido a tantas crises internas e externas, e enfrentado tantos perigos de lutas intrapartidárias, se não tivesse contado com a confiança das massas. Isso se aplica também a Istálin. Nem os julgamentos de Moscou nem a liquidação do grupo de Rum teriam sido possíveis se essas massas não tivessem apoiado Istálin e Rítler. A crença generalizada de que Rítler era simplesmente um agente dos industriais alemães e a de que Istálin só venceu a luta sucessória depois da morte de Lênin graças a uma conspiração sinistra são lendas que podem ser refutadas por muitos fatos e, acima de tudo, pela indiscutível popularidade dos dois líderes. Não se pode atribuir essa popularidade ao sucesso de uma propaganda magistral e mentirosa que conseguiu arrolar a ignorância e a estupidez. Pois a propaganda dos movimentos totalitários, que precede a instauração dos regimes totalitários e os acompanha, é invariavelmente tão franca quanto mentirosa, e os governantes totalitários em potencial geralmente iniciam suas carreiras vangloriando-se de crimes passados e planejando cuidadosamente os seus crimes futuros. Os nazistas ‘estavam convencidos de que o mal, em nosso tempo, tem uma atração mórbida’; os bolchevistas diziam não reconhecer os padrões morais comuns, e esta afirmação, feita dentro e fóra da Rússia, tornou-se um dos pilares da propaganda comunista; e a experiência demonstrou que o valor propagandístico do mal e o desprezo geral pelos padrões morais independem do interesse pessoal, que se supõe ser o fator psicológico mais poderoso na política.

A atração que o mal e o crime exercem sobre a mentalidade da ralé não é novidade. Para a ralé, os ‘atos de violência podiam ser perversos, mas eram sinal de esperteza’, mas o que é desconcertante no sucesso do totalitarismo é o verdadeiro altruísmo dos seus adeptos. É compreensível que as convicções de um nazista ou bolchevista não sejam abaladas por crimes cometidos contra os inimigos do movimento; mas o fato espantoso é que ele não vacila quando o monstro começa a devorar os próprios filhos, nem mesmo quando ele próprio se torna vítima da opressão, quando é incriminado ou condenado, quando é expulso do partido e enviado para um campo de

concentração ou de trabalhos forçados. Pelo contrário: para o assombro de todo o mundo civilizado, estará até disposto a colaborar com a própria condenação e tramar a própria sentença de morte, contanto que o seu státus como membro do movimento permaneça intacto. Seria ingênuo pensar que essa obstinada convicção, que sobrevive a todas as experiências reais e anula todo interesse pessoal, seja mera expressão de idealismo ardente. O idealismo, tolo ou heroico, nasce da decisão e da convicção individuais, mas forja-se na experiência. O fanatismo dos movimentos totalitários, ao contrário das demais fórmas de idealismo, desaparece no momento em que o movimento deixa em apuros os seus seguidores fanáticos, matando neles qualquer resto de convicção que possa ter sobrevivido ao colapso do próprio movimento. Mas, dentro da estrutura organizacional do movimento, enquanto ele permanece inteiro, os membros fanatizados são inatingíveis pela experiência e pelo argumento; a identificação com o movimento e o conformismo total parecem ter destruído a própria capacidade de sentir, mesmo que seja algo tão extremo como a tortura ou o medo da morte.

Os movimentos totalitários objetivam e conseguem organizar as massas – e não as classes, como o faziam os partidos de interesses dos Estados nacionais do continente europeu, nem os cidadãos com suas opiniões peculiares quanto à condução dos negócios públicos, como o fazem os partidos dos países anglo-saxões. Todos os grupos políticos dependem da fôrça numérica, mas não na escala dos movimentos totalitários, que dependem da fôrça bruta, a tal ponto que os regimes totalitários parecem impossíveis em países de população relativamente pequena, mesmo que outras condições lhes sejam favoráveis. Depois da Primeira Guerra Mundial, uma onda antidemocrática e pró-ditatorial de movimentos totalitários e semitotalitários varreu a Europa: da Itália disseminaram-se movimentos fascistas para quase todos os países da Europa central e oriental (os tchecos – mas não os eslovacos – foram uma das raras exceções); contudo, nem mesmo Mussolini, embora useiro da expressão ‘Estado totalitário’, tentou estabelecer um regime inteiramente totalitário, contentando-se com a ditadura unipartidária. Ditaduras não totalitárias semelhantes surgiram, antes da Segunda Guerra Mundial, na Romênia, na Polônia, nos Estados bálticos (Lituânia e Letônia), na Hungria, em Portugal e, mais tarde, na Espanha. Os nazistas, cujo instinto era infalível para discernir essas diferenças, costumavam comentar com desprezo as falhas dos seus aliados fascistas, ao passo que a genuína admiração que nutriam pelo regime bolchevista da Rússia (e pelo Partido Comunista da Alemanha) só era igualada e refreada por seu desprezo em relação às raças da Europa oriental. O único homem pelo qual Rítler sentia ‘respeito incondicional’ era ‘Istálin, o gênio’, e, embora no caso de Istálin e do regime soviético não possamos dispor (e provavelmente nunca venhamos a ter) a riqueza de documentos que encontramos na Alemanha nazista, sabemos, desde o discurso de Cruchév perante o Vigésimo Congresso do Partido Comunista, que também Istálin só confiava num homem, e que esse homem era Rítler.

Em todos esses países menores da Europa, movimentos totalitários precederam ditaduras não totalitárias, como se o totalitarismo fosse um objetivo demasiadamente ambicioso, e como se o tamanho do país forçasse os candidatos a governantes totalitários a enveredar pelo caminho mais familiar da ditadura de classe ou de partido. Na verdade, esses países simplesmente não dispunham de material humano em quantidade suficiente para permitir a existência de um domínio total – qualquer que fosse – e as elevadas perdas populacionais decorrentes da implantação de tal sistema. Sem muita possibilidade de conquistar territórios, os ditadores desses pequenos países eram obrigados à moderação, sem a qual corriam o risco de perder os poucos súditos de que dispunham. Por isso, também o nazismo, antes do início da guerra, ficou tão aquém do seu similar russo em matéria de coerência e crueldade, uma vez que nem sequer o povo alemão era suficientemente numeroso para permitir o completo desenvolvimento dessa nova fórma de govêrno. Somente se tivesse vencido a guerra, a Alemanha teria conhecido um govêrno totalitário completo; e podem-se avaliar e vislumbrar os sacrifícios a que isso teria levado não apenas as ‘raças inferiores’, mas os próprios alemães, através dos planos de Rítler que ficaram para a posteridade. De qualquer modo, foi só durante a guerra, depois que as conquistas do Leste forneceram grandes massas e tornaram possíveis os campos de extermínio, que a Alemanha pôde estabelecer um regime verdadeiramente totalitário. (O regime totalitário encontra ambiente assustadoramente favorável nas áreas de tradicional despotismo oriental como a Índia ou a China, onde existe material humano quase inesgotável para alimentar a máquina de poder e de destruição de homens que é o domínio total, e onde, além disso, o sentimento de superfluidade do homem da massa – um fenômeno inteiramente novo na Europa, resultado do desemprego em massa e do crescimento populacional dos últimos 150 anos – prevalece há séculos no desprezo pela vida humana.) A moderação ou métodos menos sangrentos de domínio não se deviam tanto ao receio dos governos de que pudesse haver rebelião popular: resultaram de uma ameaça muito mais séria: o despovoamento de seus próprios países. Somente onde há grandes massas supérfluas que podem ser sacrificadas sem resultados desastrosos de despovoamento é que se torna viável o govêrno totalitário, diferente do movimento totalitário.”

Árent, Râna. Origens do totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. página 434-438.

A Segunda Guerra Mundial na experiência de Érik Robsbaum

No trecho a seguir, o historiador britânico Érik Robsbaum analisa a Segunda Guerra sob a perspectiva de sua experiência pessoal como combatente, argumentando – sem desprezar o trabalho dos jovens historiadores – sobre a relevância dos relatos e experiências daqueles que vivenciaram o período.

“Se fôssemos escrever sobre a Segunda Guerra Mundial, na qual servi como militar sem nenhuma distinção, que nunca disparou um tiro por raiva, devo em algum sentido ver as coisas de modo diferente dos meus amigos, cuja experiência de guerra foi diferente – da do falecido E. P. tompison, por exemplo, que serviu como comandante de tanques na campanha da Itália, ou do africanista Bêisél Dêividsan, que combateu com os guerrilheiros na Voivodina e na Ligúria.

Se isso é assim para historiadores da mesma idade e antecedentes, a diferença entre gerações é suficiente para dividir profundamente os seres humanos. Quando digo a meus alunos nos Estados Unidos que consigo me lembrar do dia em Berlim em que Rítler se tornou chanceler da Alemanha, olham para mim como se tivesse dito que estava presente no Teatro Ford quando o presidente Lincon foi assassinado em 1865. Ambos os eventos são igualmente pré-históricos para eles. Mas para mim 30 de janeiro de 1933 é parte do passado que ainda é parte de meu presente. O aluno que voltava da escola para casa com sua irmã naquele dia e viu a manchete no jornal ainda está em algum lugar em mim. Ainda posso ver a cena, como num sonho. reticências

Os apaziguadores tinham uma razão cuja fôrça não foi reconhecida pelos jovens antifascistas dos anos 1930, porque os nossos fins não eram os de tchênberlen e Rálifaquis. Em seus próprios termos, que também eram os de tchârtchil – a preservação do Império Britânico –, tinham uma razão melhor que a de tchârtchil, exceto em um ponto. Como seu grande contemporâneo chárlis de Gûlle, sabia que a perda do senso de dignidade, orgulho e autorrespeito de um povo podia ser pior do que a perda de guerras e de impérios. Podemos constatar isso quando olhamos a Grã-Bretanha hoje.

No entanto, como a nossa geração sabe sem precisar consultar arquivos, os apaziguadores estavam enganados, e desta vez tchârtchil estava certo ao reconhecer que não seria possível um acôrdo com Rítler. Em termos de política nacional fazia sentido, na suposição de que a Alemanha de Rítler era uma ‘grande potência’ como outra qualquer, jogando o jôgo pelas regras testadas e cínicas da política de poder, como até Mussolini fazia. Mas não era. Nos anos 1930 quase todos acreditaram, em um momento ou outro, que tais acôrdos poderiam ser feitos, inclusive Istálin. A grandiosa aliança que acabou derrotando o Eixo passou a existir não porque os resistentes venceram os apaziguadores, mas porque a agressão alemã forçou os futuros aliados a se juntarem entre 1938 e o final de 1941. O que a Grã-Bretanha enfrentava em 1941 não era a escolha entre a vontade cega de combater sem a menor chance aparente de vitória e a busca de uma paz de compromisso ‘em condições razoáveis’, pois mesmo na época os antecedentes sugeriam que tal paz não era possível com a Alemanha de Rítler. O que os oferecia era, ou parecia ser, na melhor das hipóteses, uma versão ligeiramente mais digna do que a França de Pitán. Quaisquer que sejam as opiniões em contrário, descobertas nos arquivos, fala por si mesmo o fato de que tchârtchil manteve consigo o govêrno. Poucos julgavam que uma paz seria mais que um eufemismo para a dominação nazista.

Não pretendo sugerir que apenas aqueles que conseguem se lembrar de 1940 são capazes de chegar a essa conclusão. Porém, para um jovem historiador chegar a ela é necessário um esfôrço de imaginação, uma disposição em suspender crenças baseadas em sua experiência própria de vida, e um considerável trabalho de pesquisa. Para nós isso não é preciso. reticências

As discussões sobre alternativas contrafactuais não podem ser resolvidas por evidência, já que a evidência diz respeito ao que aconteceu, e situações hipotéticas não aconteceram. Essas pertencem à política ou à ideologia, e não à história. reticências

Por favor, não me interpretem mal. Não estou simplesmente fazendo uma defesa dos velhos historiadores do século vinte contra os jovens. Comecei minha carreira como jovem historiador entrevistando sobreviventes da Sociedade Fabiana pré-1914 a respeito de seu tempo, e a primeira lição que aprendi foi que nem mesmo valia a pena entrevistá-los, a menos que eu tivesse descoberto mais sobre o tema da entrevista do que poderiam se lembrar. A segunda lição foi que, no tocante a fatos verificáveis de modo independente, sua memória tendia a se enganar. A terceira lição foi que era inútil levá-los a mudar de ideia, já que esta havia se formado e fixado muito tempo antes. Historiadores que se encontram em seus vinte ou trinta anos sem dúvida dispõem dessa experiência imobilizada em suas idosas fontes, que devem, em princípio, incluir historiadores que são também cidadãos um tanto veteranos. Apesar disso, possuímos certas vantagens. Uma das principais, para

aqueles que se dispõem a escrever a história do século vinte, é o mero fato de saber, sem esfôrço especial, o quanto as coisas mudaram. Os últimos trinta ou quarenta anos constituem a era mais revolucionária da história escrita. Jamais o mundo, ou seja, a vida dos homens e mulheres que vivem no planeta, foi transformado de modo tão profundo, dramático e extraordinário em tão breve período. Isso é difícil de ser captado intuitivamente por gerações que não viram como era antes.”

róbisbáum, Eric J. Sobre História. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. página 246-247.

O que trouxe de novo o Estado Novo?

A historiadora Maria Helena Capelato, no texto a seguir, comenta como algumas das inovações implementadas por Getúlio Vargas durante o Estado Novo conquistaram classes mais populares, embora tenham rendido a elas alguns prejuízos.

“O advento do Estado Novo, fruto de um golpe apoiado por militares e pelas fôrças conservadoras da sociedade, não se originou de um movimento de massas nem se caracterizou pelo aspecto mobilizador, como ocorreu em outros países nesse período. Considerando o povo brasileiro inepto para a participação política (a grande massa de analfabetos servia de reforço para esse argumento), os ideólogos do poder, que organizaram o Estado pelo alto, tinham a preocupação de conquistar as elites, consideradas peças importantes na construção de um novo país. A proposta de consenso era mais dirigida a elas. No entanto, pouco a pouco, através de medidas que atendiam às reivindicações populares, os apelos para que dessem apôio ao govêrno foram frutificando: entre os trabalhadores, Getúlio Vargas acabou ganhando muitos adeptos. A novidade da política de massas consistia no fato de que esses atores foram chamados a estar presentes, ainda que sob contrôle, na cena política.

O discurso estado-novista valorizava os setores populares, invertendo uma fala que sempre imputou ao povo a responsabilidade dos males do país; a partir dos anos 30, as elites de outrora foram criticadas pelo seu distanciamento da ‘alma da nacionalidade’, deixando-se fascinar pelos exemplos alienígenas. Esse tipo de argumento justificava a intervenção do Estado na organização social, política e cultural: ele era apontado como a única entidade capaz de comandar a construção da identidade nacional. Elaborou-se, então, um projeto político-pedagógico para educar as massas.

Os getulistas acusaram os críticos do regime pela pretensão de fazer recuar o progresso, por quererem recuperar aspectos de um passado morto, por darem marcha à ré no tempo e sustarem o surto glorioso de uma evolução. Para contestar os oposicionistas, ainda salientaram: ‘O Brasil, mercê do govêrno Vargas, cresceu tanto em prestígio que se enquadra entre as seis grandes nações do mundo’.

Mas o enaltecimento dos feitos do Estado Novo não impediu a queda do regime. Ao perceberem que o processo de redemocratização era irreversível, os getulistas mudaram de tática e passaram a atribuir ao govêrno o mérito desse movimento. A imprensa governista afirmou que ‘reticências o magnânimo chefe, por um ato de generosidade, benevolência e clarividência, concedeu a democracia aos brasileiros’. Os opositores reconheciam que o chefe do govêrno promovera o progresso material dentro da ordem, mas não soubera conciliar a ordem com a liberdade. reticências

O regime caiu sem resistências. Mas a história mostraria que o derrotado foi o Estado Novo, e não seu presidente, que voltaria ao poder em 1951, escolhido pelo voto e com a preferência de amplos setores sociais, populares principalmente. Antes disso, Vargas mostrava fôrça política nas eleições de 1946, quando elegeu para a Presidência da República o seu candidato Eurico Gaspar Dutra, vencendo o candidato da oposição udenista Eduardo Gomes.

O Estado Novo se encerrou em 1945, mas a presença de Vargas na política foi bem mais longe. A era Vargas é sempre mencionada por admiradores e opositores como um momento especial da história brasileira. Para criticar ou elogiar, o varguismo continua sendo uma referência essencial para a compreensão da história da política brasileira. Não é por acaso que os historiadores têm revisitado, com tanto interesse, essa época, mas sobretudo o Estado Novo, que, apesar de exorcizado pelo seu aspecto claramente autoritário, foi o período em que ocorreram mudanças importantes como a Consolidação das Leis do Trabalho, considerada a maior herança do varguismo. Mas cabe esclarecer que, se, por um lado, a legislação social representou o atendimento a uma antiga reivindicação dos trabalhadores, o preço dessa conquista foi a perda de liberdade do movimento operário, que passou a ser controlado pelo Estado. reticências

No plano político, o autoritarismo, que sempre marcou presença na sociedade brasileira, foi reforçado nesse período. Foi introduzida no país uma nova cultura política, que transformou a cidadania numa peça do jôgo do poder. As liberdades relativas que existiam no período anterior foram extintas nesse momento em nome do progresso dentro da ordem.

O progresso material, sinônimo de desenvolvimento econômico, de fato ocorreu, demonstrando que a meta primeira do govêrno estado-novista foi atingida em parte. O Brasil, nessa época, deu um salto em termos de superação do ‘atraso’, mas os resultados não chegaram a beneficiar as classes populares como um todo, pois o desemprego era apontado como um dos problemas mais sérios do momento. Além disso, a alta do custo de vida e os baixos salários foram responsáveis pela insatisfação daqueles que o govêrno elegera como os principais beneficiários de sua política.

Levando em conta os aspectos positivos e negativos do regime de 1937, é possível concluir que as mudanças ocorridas nesse período foram de enorme importância para o futuro do país. Esta é a razão que explica o grande interesse dos historiadores atuais pelo tema.”

CAPELATO, Maria Helena. O Estado Novo: o que trouxe de novo. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia N. (organizador). O Brasil republicano. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2003. volume 2, página 137-140.

Estado Unidos e União Soviética na “era dos extremos”

No texto a seguir, o historiador Érik Robsbaum discute o clima de medo instaurado após a Segunda Guerra Mundial. Apesar da tensão de estar à beira de um conflito nuclear, róbisbáum argumenta ser difícil localizar um momento durante a Guerra Fria que tenha de fato colocado em risco a relativa paz conquistada após 1945.

“Os 45 anos que vão do lançamento das bombas atômicas até o fim da União Soviética não formam um período homogêneo único na história do mundo. reticências Apesar disso, a história desse período foi reunida sob um padrão único pela situação internacional peculiar que o dominou até a queda da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas: o constante confronto das duas superpotências que emergiram da Segunda Guerra Mundial na chamada ‘Guerra Fria’.

A Segunda Guerra Mundial mal terminara quando a humanidade mergulhou no que se pode encarar, razoavelmente, como uma Terceira Guerra Mundial, embora uma guerra muito peculiar. Pois, como observou o grande filósofo Tômas Róbes, ‘a guerra consiste não só na batalha, ou no ato de lutar, mas num período de tempo em que a vontade de disputar pela batalha é suficientemente conhecida’ reticências. A Guerra Fria entre Estados Unidos da América e União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, que dominou o cenário internacional na segunda metade do breve século vinte, foi sem dúvida um desses períodos. Gerações inteiras se criaram à sombra de batalhas nucleares globais que, acreditava-se firmemente, podiam estourar a qualquer momento, e devastar a humanidade. Na verdade, mesmo os que não acreditavam que qualquer um dos lados pretendia atacar o outro achavam difícil não ser pessimistas, pois a Lei de Murphy é uma das mais poderosas generalizações sobre as questões humanas (‘Se algo pode dar errado, mais cedo ou mais tarde vai dar’). À medida que o tempo passava, mais e mais coisas podiam dar errado, política e tecnologicamente, num confronto nuclear permanente baseado na suposição de que só o medo da ‘destruição mútua inevitável’ (adequadamente expresso na sigla Méd, das iniciais da expressão em inglês mutually assured destruction) impediria um lado ou outro de dar o sempre pronto sinal para o planejado suicídio da civilização. Não aconteceu, mas por cêrca de quarenta anos pareceu uma possibilidade diária.

A peculiaridade da Guerra Fria era a de que, em termos objetivos, não existia perigo iminente de guerra mundial. Mais que isso: apesar da retórica apocalíptica de ambos os lados, mas sobretudo do lado americano, os governos das duas superpotências aceitaram a distribuição global de fôrças no fim da Segunda Guerra Mundial, que equivalia a um equilíbrio de poder desigual mas não contestado em sua essência. A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas controlava uma parte do globo, ou sobre ela exercia predominante influência – a zona ocupada pelo Exército Vermelho e/ou outras fôrças armadas comunistas no término da guerra – e não tentava ampliá-la com o uso de fôrça militar. Os Estados Unidos da América exerciam contrôle e predominância sobre o resto do mundo capitalista, além do hemisfério norte e oceanos, assumindo o que restava da velha hegemonia imperial das antigas potências coloniais. Em troca, não intervinha na zona aceita de hegemonia soviética.

Na Europa, linhas de demarcação foram traçadas em 1943-45, tanto a partir de acôrdos em várias conferências de cúpula entre Rusevélt, tchârtchil e Istálin, quanto pelo fato de que só o Exército Vermelho podia derrotar a Alemanha. Havia indefinições, sobretudo acerca da Alemanha e da Áustria, as quais foram solucionadas pela divisão da Alemanha segundo as linhas das fôrças de ocupação orientais e ocidentais e a retirada de todos os ex-beligerantes da Áustria. Esta se tornou uma espécie de segunda Suíça – um pequeno país comprometido com a neutralidade, invejado por sua persistente prosperidade, e portanto descrito (corretamente) como ‘chato’. A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas aceitou com relutância Berlim Ocidental como um enclave dentro de seu território alemão, mas não estava preparada para lutar pela questão.

A situação fóra da Europa era menos definida, a não ser pelo Japão, onde os Estados Unidos da América desde o início estabeleceram uma ocupação completamente unilateral que excluía não só a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, mas qualquer outro cobeligerante. O problema é que o fim dos velhos impérios coloniais era previsível e, na verdade, em 1945, considerado iminente na Ásia, mas a futura orientação dos novos Estados pós-coloniais não estava nada clara. reticências foi nessa área que as duas superpotências continuaram a competir, por apôio e influência, durante toda a Guerra Fria, e por isso a maior zona de atrito entre elas, aquela onde o conflito armado era mais provável, e onde de fato irrompeu. Ao contrário do que ocorrera na Europa, nem mesmo os limites da área sob futuro contrôle comunista podiam ser previstos, quanto mais acertados de antemão por negociações, ainda que provisórias e ambíguas. Assim, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas não queria muito a tomada do poder pelos comunistas na China, mas ela se deu assim mesmo.

Contudo, mesmo no que depois veio a ser chamado de ‘Terceiro Mundo’, em poucos anos as condições para a estabilidade internacional começaram a surgir, quando ficou claro que a maioria dos novos Estados pós-coloniais, por menos que gostasse dos Estados Unidos da América e seu campo, não era comunista; com efeito: a maioria era anticomunista em sua política interna e ‘não alinhada’ (ou seja, fóra do campo soviético) nos assuntos internacionais. Em suma, o ‘campo comunista’ não deu sinais de expansão significativa entre a Revolução Chinesa e a década de 1970, quando a China estava fóra dele reticências.

De fato, a situação mundial se tornou razoavelmente estável pouco depois da guerra, e permaneceu assim até meados da década de 1970, quando o sistema internacional e as unidades que o compunham entraram em outro período de extensa crise política e econômica. Até então, as duas superpotências aceitavam a divisão desigual do mundo, faziam todo esfôrço para resolver disputas de demarcação sem um choque aberto entre suas fôrças armadas que pudesse levar a uma guerra e, ao contrário da ideologia e da retórica da Guerra Fria, trabalhavam com base na suposição de que a coexistência pacífica entre elas era possível a longo prazo. Na verdade, na hora da decisão, ambas confiavam na moderação uma da outra, mesmo nos momentos em que se achavam oficialmente à beira da guerra, ou mesmo já nela. Assim, durante a Guerra da Coreia de 1950-1953, em que os americanos se envolveram oficialmente, mas os russos não, Washington sabia que pelo menos 150 aviões chineses eram na verdade aviões soviéticos com pilotos soviéticos reticências. A informação foi mantida em segredo, porque se supunha, corretamente, que a última coisa que Moscou queria era guerra. Durante a crise dos mísseis cubanos de 1962, como agora sabemos reticências, a principal preocupação dos dois lados era impedir que gestos belicosos fossem interpretados como medidas efetivas para a guerra.

Até a década de 1970, esse acôrdo tácito de tratar a Guerra Fria como uma Paz Fria se manteve. A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas sabia (ou melhor, percebera), já em 1953, quando não houve reação aos tanques soviéticos que restabeleceram o contrôle diante de uma séria revolta operária na Alemanha Oriental, que os apelos americanos para ‘fazer retroceder’ o comunismo não passavam de histrionismo radiofônico. Daí em diante, como confirmou a revolução húngara de 1956, o Ocidente se manteria fóra da região de domínio soviético. A Guerra Fria que de fato tentou corresponder à sua retórica de luta pela supremacia ou aniquilação não era aquela em que decisões fundamentais eram tomadas pelos governos, mas a nebulosa disputa entre seus vários serviços secretos reconhecidos e não reconhecidos reticências. Contudo, a não ser em alguns dos países mais fracos do Terceiro Mundo, as operações da cá gê bê, cía e órgãos semelhantes eram triviais em termos de verdadeira política de poder, embora muitas vezes dramáticas.

Terá havido, nessas circunstâncias, verdadeiro perigo de guerra mundial em algum momento desse longo período de tensão – a não ser, claro, pelo tipo de acidente que inevitavelmente ameaça os que patinam muito tempo sobre gelo fino? Difícil dizer. Provavelmente o período mais explosivo foi aquele entre a enunciação formal da Doutrina Trúman, em março de 1947 (‘Creio que a política dos Estados Unidos deve ser a de apoiar os povos livres que resistem a tentativas de subjugação por minorias armadas ou por pressões de fóra’), e abril de 1951, quando o mesmo presidente americano demitiu o general Douglas Macártur, comandante das fôrças americanas na Guerra da Coreia, que levou sua ambição militar longe demais. Esse foi o período em que o medo americano de uma desintegração social ou revolução social nas partes não soviéticas da Eurásia não era de todo fantástico – afinal, em 1949 os comunistas assumiram o poder na China. Por outro lado, os Estados Unidos da América com quem a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas se defrontava tinham o monopólio das armas nucleares e multiplicavam declarações de anticomunismo militantes e agressivas, enquanto surgiam as primeiras fendas na solidez do bloco soviético com a saída da Iugoslávia de Tito (1948). Além disso, de 1949 em diante a China esteve sob um govêrno que não apenas mergulhou imediatamente numa grande guerra na Coreia, como – ao contrário de todos os outros governos – se dispunha de fato a enfrentar um holocausto nuclear e sobreviver. Qualquer coisa poderia acontecer.

Assim que a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas adquiriu armas nucleares – quatro anos depois de iroshíma no caso da bomba atômica (1949), nove meses depois dos Estados Unidos da América no caso da bomba de hidrogênio (1953) –, as duas superpotências claramente abandonaram a guerra como instrumento de política, pois isso equivalia a um pacto suicida. Não está muito claro se chegaram a considerar seriamente a possibilidade de uma

ação nuclear contra terceiros – os Estados Unidos da América na Coreia em 1951, e para salvar os franceses no Vietnã em 1954; a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas contra a China em 1969 –, mas de todo modo as armas não foram usadas. Contudo, ambos usaram a ameaça nuclear, quase com certeza sem intenção de cumpri-la, em algumas ocasiões: os Estados Unidos da América para acelerar as negociações de paz na Coreia e no Vietnã (1953, 1954), a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas para forçar a Grã-Bretanha e a França a retirar-se de Suez em 1956. Infelizmente, a própria certeza de que nenhuma das superpotências iria de fato querer apertar o botão nuclear tentava os dois lados a suar gestos nucleares para fim de negociação, ou (nos Estados Unidos da América) para fins de política interna, confiantes em que o outro tampouco queria a guerra. Essa confiança revelou-se justificada, mas ao custo de abalar os nervos de várias gerações. A crise dos mísseis cubanos de 1962, um exercício de fôrça desse tipo inteiramente supérfluo, por alguns dias deixou o mundo à beira de uma guerra desnecessária, e na verdade o susto trouxe à razão por algum tempo até mesmo os mais altos formuladores de decisões.”

róbisbáum, ériqui J. Era dos extremos: o breve século vinte (1914-1991). São Paulo: Companhia das Letras, 1995. página 223-227.

Desafios da África pós-colonial

O cientista político Ricardo Soares de Oliveira, no fragmento a seguir, analisa como os governos africanos enfrentaram a crise petrolífera e a recessão global da década de 1970. Nesse período, ruíram os pilares que serviram de sustento para muitos dos Estados africanos pós-coloniais, repercutindo gravemente na vida da população do continente nas décadas subsequentes.

“O fim da Guerra Fria foi um acontecimento importante para o continente africano. A maioria dos Estados africanos atingira a independência nos anos-chave do conflito entre as superpotências reticências. Não é, pois, surpreendente que tal alteração tenha constituído um desafio radical à ordem instituída. O impacto desta mudança estrutural do sistema internacional, e da liberalização na Europa do Leste em particular, sentiu-se em quase todo o continente africano. reticências

O sistema internacional da Guerra Fria foi um dos dois pilares essenciais da política africana das décadas de 1960 e 1970. O outro pilar imprescindível foi o caráter da economia internacional durante estes anos e os seus efeitos na vida dos Estados africanos. A África Subsaariana se beneficiou de uma conjuntura ideal durante quase trinta anos a partir do fim da segunda Guerra Mundial: o boom econômico ininterrupto nas sociedades industrializadas resultou em preços internacionais consistentemente altos das matérias-primas minerais e agrícolas que a África produzia. O resultado da expansão da base fiscal do Estado, aliada à breve, mas importante dedicação ‘desenvolvimentista’ das derradeiras administrações coloniais reticências e ao otimismo do nacionalismo africano, sagrou-se por uma série de tentativas de modernização das sociedades africanas por parte das lideranças pós-coloniais.

Muita tinta se gastou a discernir diferenças entre as estratégias ‘conservadoras’ (Quênia, Costa do Marfim) e as soluções ‘radicais’ (o Gana ou, mais tarde, os regimes ‘afro-comunistas’). Porém, uma análise retrospectiva demonstra que, se bem que existissem algumas diferenças, os regimes africanos pós-coloniais partilhavam características cruciais, incluindo, (1) o abandono rápido e fácil do pluralismo político e a adoção de sistemas políticos autoritários, (2) uma crença forte no papel do Estado em todas as áreas da economia e a multiplicação do número de funcionários públicos, de companhias estatais, e do envolvimento do Estado em áreas anteriormente dominadas pelo setor privado, e (3) a penetração das instituições públicas formais, pretensamente impessoais, por grupos de interesses informais e agendas patrimoniais que procuram controlar a distribuição de bens materiais e de privilégios políticos. Estas três dimensões, que eram partilhadas por praticamente todos os Estados na África, contêm um potencial bastante problemático. Mas no contexto prometedor aqui descrito, o státus internacional dos Estados africanos, e até algum crescimento econômico, foram viáveis desde que estas condições se mantivessem estáveis.

Os problemas sérios da África pós-colonial começam no momento exato em que o pilar econômico desta ordem de coisas implode. Em meados dos anos 1970, a crise petrolífera e a recessão que daí resulta iniciam um abalo brutal na economia mundial cujo resultado mais dramático é a ‘bifurcação de destinos do Terceiro Mundo’. Ao passo que vários Estados da Ásia Oriental, por exemplo, se adaptaram às novas condições com uma destreza invejável, ao ponto de superarem o problema da pobreza, os Estados africanos dependentes da exportação de matérias-primas e com recursos humanos não especializados foram devastados. Esta mudança sistêmica é o fator crucial que estrutura as três décadas subsequentes da vida africana. Mas uma linha de raciocínio inteiramente determinista não é suficiente para explicar a seriedade do declínio econômico dos Estados africanos. É inegável que um reverso de fortuna tão rápido teria desafiado as capacidades dos melhores decisores, mas as reações africanas foram tragicamente inapropriadas.

Os governantes africanos tiveram um papel preponderante na transformação de uma recessão (que atingiu todo o mundo, mas que mais cedo ou mais tarde quase todos os Estados fóra de África ultrapassaram) numa ‘crise permanente’ de proporções épicas que iria desfigurar o continente até ao fim do século [vinte]. A reação adequada à crise global, cujo impacto nas receitas dos Estados africanos era inteiramente previsível, teria de consistir em córtes orçamentais e numa melhor gestão da coisa pública reticências. No entanto, os líderes africanos continuaram a esbanjar o dinheiro que tinham na expectativa ingênua de que em breve as coisas iriam ‘regressar ao normal’. Ainda pior: quando os compromissos do Estado africano já não podiam ser cumpridos com os recursos disponíveis, os líderes africanos viraram-se para a banca internacional, agora carregada de petrodólares reciclados e, devido à crise econômica, impossibilitada de emprestar aos seus clientes habituais no Ocidente. Estas dívidas e os juros acumulados rapidamente se revelaram impossíveis de pagar, e no início da década de 1980 quase todos os países africanos estavam à beira da bancarrota.”

OLIVEIRA, Ricardo Soares de. A África desde o fim da Guerra Fria. Relações Internacionais, Lisboa, número 24, página 93-97, dezembro 2009. Disponível em: https://oeds.link/eG5M5f. Acesso em: 2 agosto 2022.

Jânio Quadros, o Congresso Nacional e o exército

No texto a seguir, o historiador Felipe Pereira Loureiro discute algumas das consequências das ações tomadas por Jânio Quadros para diminuir a legitimidade política do Congresso Nacional diante da opinião pública. Loureiro destaca, ainda, o fato de Jânio ter flertado, paralelamente, com oficiais do exército ligados às tentativas golpistas contra o govêrno anterior, de Juscelino cubishéqui.

“O estudo das relações entre o presidente Jânio Quadros e o Congresso Nacional permite-nos agora desenvolver algumas hipóteses. A afirmação de que Jânio teria renunciado com a crença de que o Legislativo exigiria seu retorno à Presidência com mais poderes, tal como alguns autores chegaram a defender, parece bastante discutível. Viu-se que Jânio atuou, em vários momentos, esvaziando as funções institucionais do Congresso e enfraquecendo a legitimidade deste junto à opinião pública. Mais do que isso: além de simbolizar, para muitos parlamentares, uma ameaça ao regime democrático, Jânio representava também um perigo para as próprias práticas políticas brasileiras, baseadas no clientelismo e no patrimonialismo. Supor, portanto, que Quadros planejava obter o apôio do Congresso Nacional para seu ‘golpe’ apenas pelo fato de que a Vice-Presidência encontrava-se nas mãos de João gulár, seria interpretar o ato da renúncia isoladamente de toda a história política de sua curta administração. reticências

Um retorno de Jânio ao poder, em novos termos, só seria possível no caso de o Congresso ter sido forçado a tal. O único que teria sido capaz de impor tal solução seria o exército. O flerte de Jânio para com os oficiais associados às malsucedidas tentativas golpistas contra a administração Jota Ka; a tentativa de centralização de comando dos Clubes Militares pelo presidente; o episódio da crise dos estudantes de Recife, que envolveu, de fato, uma manobra armada semelhante a um prelúdio golpista; e o ato da renúncia em um momento em que o vice-presidente, temido pelas alas mais conservadoras das fôrças armadas, estava fóra do país a mando do próprio Jânio constituem indícios que poderiam apoiar a expectativa de apôio do exército. Outras atitudes presidenciais, no entanto, vão em outra direção – por exemplo, a questão da Política Externa Independente, que causou discussões e divisões entre os militares. Caso tivesse interesse em usar as fôrças armadas como fórma de pressionar o Congresso a aceitá-lo com maiores poderes, por que Jânio arriscaria a unidade de seu plano forçando a defesa de uma política exterior que reconhecidamente provocaria divergências entre os oficiais? Não existe ainda, em nosso modo de ver, uma resposta adequada a essa pergunta. reticências

Afora esse aspecto, alguns dos meios utilizados por Jânio a fim de esvaziar politicamente o Congresso Nacional tiveram importantes consequências na administração posterior. Em primeiro lugar, o constante contraponto feito pelo presidente entre a participação popular direta (via referendo, por exemplo) e a participação popular mediante representação (Legislativo Federal) – qualificando a primeira como mais legítima – garantiria posteriormente maior base à atuação política dos movimentos da sociedade civil, em especial o dos trabalhadores. Lembre-se que, durante o govêrno gulár, algumas resoluções parlamentares seriam tomadas sob estrita pressão de grupos sociais, tais como, por exemplo, a da antecipação do plebiscito sobre o retorno do presidencialismo.

Em segundo lugar, alguns dos temas levantados por Jânio durante seu embate com os congressistas (como o das famosas ‘reformas de estrutura’) desencadearam fôrças políticas que o próprio presidente, talvez, não imaginasse. As reformas agrária e bancária, e a política de reatamento de relações comerciais e diplomáticas com países comunistas, levaram a uma divisão político-ideológica suprapartidária que polarizou o Parlamento (a dê pê e éfe pê êne), diminuindo espaços para

alianças políticas mais amplas entre os legisladores durante o govêrno gulár. Além disso, a discussão dessa agenda reformista tornou-se mais independente do Executivo a partir da administração Quadros. Isso quer dizer que, tivesse sido ou não gulár o futuro presidente do Brasil após a renúncia de Jânio, a pauta das ‘reformas de estrutura’ já estava posta e dificilmente poderia ser relegada a um segundo plano.

Por último, viu-se que o Parlamento, a fim de se defender das manobras janistas reticências, criou mecanismos de agilidade legislativa que foram importantes na aprovação de medidas durante o govêrno gulár reticências. Assim, apesar de toda polarização política e ideológica existente no Congresso nesse período reticências, foram votadas, entre 1961 e 1964, leis como a da Limitação da Remessa de Lucros, a do Antitruste e a do Código Nacional de Telecomunicações.

As evidências apresentadas neste artigo sugerem, portanto, que as relações entre o presidente Jânio e o Congresso Nacional tiveram implicações que ultrapassaram os sete meses da administração janista. Negligenciá-las, ou circunscrevê-las unicamente ao problema da renúncia, significa limitar a compreensão de importantes processos históricos subsequentes, que podem ajudar a esclarecer não apenas as características do govêrno gulár, mas, também, os fatores responsáveis pelo próprio golpe militar de 1964.”

LOUREIRO, Felipe Pereira. Varrendo a democracia: considerações sobre as relações políticas entre Jânio Quadros e o Congresso Nacional. Revista Brasileira de História, São Paulo, volume 29, número 57, página 204-206, 2009.

A diplomacia brasileira durante o regime militar

No texto a seguir, o historiador Francisco Carlos Teixeira da Silva discute a atuação da diplomacia brasileira durante a ditadura civil-militar, analisando o alinhamento automático do país com os Estados Unidos no contexto da Guerra Fria e a mudança da orientação de viés ideológico, adotada no início do regime, para uma atuação mais pragmática de desenvolvimento econômico e voltada à ampliação das matrizes energéticas brasileiras.

“A política externa brasileira sofreu imediato impacto com a supressão do Estado constitucional. Os militares exigiram o rompimento das relações diplomáticas com a União Soviética, o fechamento do Escritório da República Popular da China e a expulsão da representação diplomática cubana. Da mesma fórma, os centros de pensamento nacionalista e desenvolvimentista voltados para política externa reticências foram brutalmente fechados. Nas universidades, onde o debate sobre política externa havia se intensificado nos últimos dias do govêrno gulár, ocorreram prisões e expulsões de professores e alunos.

Deste modo, a Doutrina de Segurança Nacional, emanada da é ésse gê [Escola Superior de Guerra], tornou-se dominante. As necessidades de financiamento do desenvolvimento do Brasil deveriam ser buscadas, doravante, no bom relacionamento com os Estados Unidos, o que acabou acarretando um brutal endividamento do país. Da mesma fórma, o Brasil seria trazido de volta para o ‘mundo livre’, como ‘país cristão’. Contudo, uma constante pode ser identificada nas relações externas brasileiras antes e depois de 1964: a subordinação da diplomacia brasileira aos interesses e às necessidades do desenvolvimento econômico do país. Assim, após um surto inicial ideológico, surgiriam iniciativas visando à mundialização das relações externas do país em busca de novos mercados.

A disposição do novo regime em sinalizar sua guinada à direita na política externa expressou-se claramente na mudança da política frente a Cuba. Não só o Brasil rompeu relações com o regime de Fidel, como ainda aderiu ao bloqueio norte-americano contra a ilha. Brasília passou a identificar em Cuba a fonte de toda a agitação na América Latina. A nova política teve seu desafio maior quando os Estados Unidos, temendo uma ‘segunda Cuba’, decidiram intervir na República Dominicana, em 1965.

Após o desembarque dos fuzileiros navais, os americanos buscaram legitimar sua ação, conseguindo que a Organização dos Estados Americanos (ô ê á) autorizasse uma fôrça de ‘manutenção da paz’. O Brasil apoiou a proposição norte-americana – abandonando os princípios de não intervenção e de respeito à soberania dos Estados Americanos reticências e enviou um contingente de .1115 homens para compor a fôrça ‘interamericana’ naquele país.

Muito rapidamente, os empréstimos e a ajuda americana ao Brasil, que haviam cessado durante o govêrno gulár, voltaram a fluir para o país. Consolidava-se, assim, o novo alinhamento do país com o ‘mundo livre’.

Um general, embaixador em Washington, fortemente identificado com os Estados Unidos, Juracy Magalhães reticências, assumiu o Ministério do Exterior reticências propondo uma nova política externa baseada em três princípios: ‘unidade continental, solidariedade econômica continental e segurança

hemisférica’. Tratava-se claramente de alinhar as necessidades do desenvolvimento econômico com o militantismo da Guerra Fria, ao qual o Brasil voltava como aliado inconteste dos Estados Unidos – daí a máxima do chanceler: ‘O que é bom para os Estados Unidos, é bom para o Brasil’.

Coube a Juracy Magalhães a iniciativa de incrementar e aprofundar a presença brasileira na região do Rio da Prata, buscando melhor aproveitamento dos recursos hídricos aí existentes (nos rios Paraná-Paraguai) em negociações diretas com o Paraguai. Nessa direção, deram-se as longas e difíceis – algumas vezes extremamente ásperas – conversações. O tema central era o reticências projeto da Usina Hidrelétrica Binacional de Itaipu reticências. Embora em 1966 tenha-se chegado a um acôrdo comum, o tratado com o Paraguai acabou por gerar um clima de desconfiança com Buenos Aires, criando grave risco de enfrentamento entre os dois países ao final dos anos 1960 e no início dos 1970.

O retorno do interesse multissecular do Brasil pelo Rio da Prata advinha, diretamente, da adoção, na é ésse gê, das teorias geopolíticas de Golberí do Couto e Silva e de Teresinha de Castro, ambos com continuada docência naquela instituição. A nova política externa brasileira propunha a adoção de ações que contemplassem os ‘três círculos concêntricos’ dos interesses nacionais: região platina, América do Sul e Hemisfério Ocidental (ou seja, as Américas). reticências Tal concepção agradava imensamente aos Estados Unidos, por demais envolvido no conflito do Vietnã, e que via assim no Brasil uma espécie de ‘gendarme regional’ – papel das potências médias regionais que os Estados Unidos atribuíam a países como Irã, África do Sul, Tailândia, Turquia. Evidentemente, para os vizinhos sul-americanos brasileiros, emergia uma imagem muito negativa de um ‘subimperialismo brasileño’. A situação tornou-se ainda mais crítica, com grave prejuízo para a imagem do Brasil no continente sul-americano, quando Rítchar Níquisan declarou, em 1971, que ‘aonde for o Brasil, vai toda a América Latina’. Para os observadores internacionais e os diplomatas latino-americanos, parecia que Washington havia outorgado um mandato de guardião da região a Brasília. Mais tarde, a liberação de documentos dos regimes militares do Cone Sul viria comprovar a intervenção brasileira, fomentada por Washington, na deposição de Salvador alênde e a intensa participação na chamada Operação Condor.

Os dois governos militares subsequentes, do marechal Costa e Silva (1967-1969) e do general Emílio Médici (1969-1974), tiveram que lidar com as crescentes exigências comerciais de balanço de pagamentos e de mercados do país, mitigando o fervor ideológico dos primeiros anos do regime militar. Assim, logo no início do govêrno Costa e Silva reticências e já sob a influência do embaixador Azeredo da Silveira reticências, o país buscou uma posição de enfrentamento com os países industrializados, exigindo melhores condições de trocas internacionais.

Na Conferência de Argel, reticências Azeredo da Silveira procedeu a uma completa dessacralização da diplomacia brasileira, propondo a doutrina da ‘diplomacia da prosperidade’. Tratava-se de estreitar os laços econômicos mundiais, derrubar barreiras aduaneiras e liberar investimentos. O chanceler do Brasil, Mario guíbisson Barbosa reticências, assumiu um claro pragmatismo diplomático com a ‘doutrina do interesse nacional’, buscando, através das ‘brechas no sistema internacional propiciadas pela Guerra Fria’ reticências, tecer uma vasta rede de acôrdos bilaterais com os países emergentes, o mundo árabe e os potenciais novos mercados. O Brasil aprofundou uma tendência em curso desde o govêrno Jota Ka, de uma vigorosa política africana, assinando acôrdos de cooperação com vários países da África.

Azeredo da Silveira, por sua vez, assumira a chancelaria brasileira durante o mandato do presidente-general Ernesto Gaisel (1974-1979), quando a política externa distanciava-se plenamente de todo o conteúdo ideológico de tipo anticomunista e assumia seu aspecto de ‘pragmatismo responsável’. A nova doutrina definia as necessidades brasileiras – energia, comércio, financiamentos – numa conjuntura de grave crise internacional (Guerra do iôn kipúr e bloqueio do petróleo, em 1973). Novamente, o universalismo vinha marcar a diplomacia brasileira, com o reconhecimento do novo govêrno português oriundo da Revolução dos Cravos, das independências das ex-colônias lusas, restabelecimento das relações com a China Popular e íntimos laços com o mundo árabe (incluindo aí o voto ‘antissionista’ brasileiro na Organização das Nações Unidas).

Dois episódios associados, no âmbito da política do ‘pragmatismo responsável’, viriam a se constituir em forte prova para o itamarati. Tratava-se da condenação do Brasil por Washington pela prática da tortura no país e a questão do uso da energia nuclear. reticências

Para o Brasil, o sinal mais importante da nova política americana se deu quando, após inúmeros contatos secretos, Washington advertiu publicamente o general-presidente Ernesto Gaisel sobre a violação dos direitos humanos no Brasil. A resposta foi imediata: o general brasileiro denunciou os acôrdos de cooperação militar com os Estados Unidos.

As relações entre Brasília e Washington já estavam fortemente abaladas desde que o Brasil decidira desenvolver um vasto programa de usinas nucleares. Após alguns entendimentos iniciais com os Estados Unidos, em nome da não proliferação nuclear – o Brasil se negara a assinar o tê êne pê,

Tratado de Não Proliferação –, os Estados Unidos recusaram-se a prestar qualquer assistência no campo da energia nuclear e vetaram a venda de equipamentos sensíveis para Brasília. O país, então, voltou-se para a Alemanha Federal, com quem assinou, sob protestos de Washington, um amplo acôrdo de cooperação nuclear, origem das usinas brasileiras.

Contudo, os megaprojetos da Era Gaisel reticências começaram a devorar as últimas reservas do país. A longa depressão, óbvia a partir da guerra do iôn kipúr, de outubro de 1973, trazendo consigo o tremendo aumento dos preços do petróleo, tornara frágil a situação econômica da América Latina, muito especialmente do Brasil, que era um grande importador de petróleo. Ainda sem a descoberta de suas imensas reservas de petróleo e gás no offshore atlântico e sem o programa de biocombustíveis (etanol), o país era dependente do petróleo importado. Reside aí a explicação para as excelentes relações que Brasília entretinha com o Iraque (onde a Petrobras e grandes empreiteiras estavam estabelecidas), Líbia, Argélia e Emirados Árabes do golfo, trocando petróleo por alimentos e produtos industrializados e serviços.”

SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. O Brasil no mundo. In: REIS, Daniel Arão (coordenação). Modernização, ditadura e democracia: 1964-2010. Rio de Janeiro: Objetiva, 2014. volume 5, página 142-148. (Coleção História do Brasil nação: 1808-2010).

Movimentos de 1968

No trecho a seguir, o jornalista Marc Curlensqui investiga as conjunturas que fizeram de 1968 um ano de intensas revoltas populares ao redor do mundo, destacando o rechaço comum à Guerra do Vietnã e a novidade representada pela televisão.

“Nunca houve um ano como 1968 e é improvável que volte a haver. Numa ocasião em que nações e culturas ainda eram separadas e muito diferentes – e, em 1968, Polônia, França, Estados Unidos e México eram muito mais diferentes um do outro do que são hoje – ocorreu uma combustão espontânea de espíritos rebeldes no mundo inteiro.

Houve outros anos de revolução. 1848 foi um ano assim, mas, em comparação com 1968, seus acontecimentos limitaram-se à Europa, suas rebeliões limitaram-se a questões parecidas. Houve outros acontecimentos globais, o resultado de uma construção global de impérios. E houve aquele imenso e trágico acontecimento global, a Segunda Guerra Mundial. Único em 1968 foi o fato de que as pessoas rebelaram-se em torno de questões disparatadas e tiveram em comum apenas seu desejo de se rebelar, suas ideias sobre como fazer isso, uma sensação de alienação da ordem estabelecida e um profundo desagrado pelo autoritarismo, sob qualquer fórma. Onde havia comunismo, rebelaram-se contra o comunismo; onde havia capitalismo, voltaram-se contra isso. Os rebeldes rejeitaram a maioria das instituições, dos líderes políticos e dos partidos políticos.

Não foi planejado e não foi organizado. As rebeliões eram dirigidas por meio de encontros convocados apressadamente; algumas das mais importantes decisões foram tomadas no capricho de um momento. Os movimentos eram antiautoritários e, como tal, não tinham liderança, ou tinham líderes que negavam sê-lo. As ideologias raramente eram claras e havia acôrdo comum em torno de pouquíssimas questões. Em 1969, quando um júri de instrução federal indicou oito ativistas em conexão com as manifestações de 1968 em Chicago, Ábi Rófman, um dos oito, disse sobre o grupo: ‘Não conseguíamos entrar em acôrdo nem sobre o almoço’. E, embora a rebelião estivesse em toda parte, raramente essas fôrças se uniam ou, quando o faziam, como no caso dos movimentos pelos direitos civis, dos movimentos contra a guerra e dos movimentos feministas dos Estados Unidos, ou dos movimentos operário e estudantil, na França e na Itália, era uma aliança de conveniência temporária, rapidamente dissolvida.

Quatro fatores históricos fundiram-se para criar 1968: o exemplo do movimento pelos direitos civis que, na ocasião, era tão novo e original; uma geração que se sentia tão diferente e tão alienada a ponto de rejeitar todas as fórmas de autoridade; uma guerra tão universalmente odiada, no mundo inteiro, a ponto de fornecer uma causa para todos os rebeldes que buscavam uma; e tudo isso ocorrendo num momento em que a televisão amadurecia mas ainda era suficientemente nova para não ter sido ainda controlada, destilada e embalada do jeito como é hoje. Em 1968, o fenômeno de uma transmissão de outra parte do mundo feita no mesmo dia era, em si, uma nova maravilha tecnológica que prendia a atenção.

A guerra americana no Vietnã não era única e, certamente, não era mais repreensível do que inúmeras outras guerras, inclusive a guerra francesa no Vietnã, anterior a ela. Mas, dessa vez, era travada por uma nação com um poder global sem precedentes. Numa ocasião em que as colônias lutavam para se recriar como nações, quando a ‘luta anticolonialista’ tocava o idealismo das pessoas no mundo inteiro, ali estava uma terra fraca e frágil lutando pela independência, enquanto esse

novo tipo de entidade, conhecido como ‘superpotência’, despejava mais bombas não nucleares em seu pequeno território do que fôra despejado em toda a Ásia e Europa durante a Segunda Guerra Mundial. No auge da luta, em 1968, as fôrças militares americanas matavam toda semana o mesmo número de pessoas, ou mais, que morreram no 11 de setembro de 2001, no ataque ao World Trade Center. Embora houvesse uma tremenda fragmentação e partidarismo dentro dos movimentos dos Estados Unidos, França, Alemanha e México, todos concordavam – por causa do poder e prestígio dos Estados Unidos e da natureza brutal e claramente injusta da guerra americana no Vietnã – que eram contra a Guerra do Vietnã. Quando o movimento pelos direitos civis americanos dividiu-se, em 1968, entre os defensores da não violência e os defensores do Poder Negro, os dois lados puderam unir-se no acôrdo quanto à oposição à Guerra do Vietnã. Movimentos dissidentes do mundo inteiro puderam organizar-se simplesmente manifestando-se contra a guerra. reticências

1968 foi uma época de modernismo chocante, e modernismo sempre fascina os jovens e confunde os velhos mas, em retrospecto, foi uma época de inocência quase esquisita. Imaginem estudantes de Colúmbia, em Nova iórque, e estudantes da Universidade de Paris descobrindo, a distância, que suas experiências eram semelhantes e então se encontrando, aproximando-se cautelosamente uns dos outros, para descobrir o que, caso existisse alguma coisa, tinham em comum. Com pasmo e excitação, as pessoas descobriram que estavam usando as mesmas táticas em Praga, em Paris, em Roma, no México, em Nova iórque. Com novos instrumentos, como os satélites de comunicação e fitas de vídeo baratas, que podiam ser apagadas, a televisão tornava todos muito conscientes do que todo o resto estava fazendo e isso emocionava porque, pela primeira vez na experiência humana, os acontecimentos importantes e distantes do dia eram imediatos.”

márk kurlénski. 1968: o ano que abalou o mundo. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005. página 13-16.

Tancredo Neves e a articulação das elites

No texto a seguir, o sociólogo Florestan Fernandes analisa a candidatura de Tancredo Neves, a qual considera ter sido conciliatória e conservadora na defesa de uma transição segura e moderada para a democracia. Florestan destaca que, nesse período de abertura política, atendia-se sobretudo aos interesses das elites econômicas.

“A ditadura está desaparecendo. Todavia, ela conseguiu encaminhar sua programação político-militar de transição gradual, montada para servir aos interesses das classes dominantes. O que um brilhante jornalista chamou de ‘transição transada’ revela muito bem a essência do ‘pacto das elites’. Os estratos conservadores da burguesia lograram conseguir uma grande vitória, suprimindo do mapa histórico o movimento pelo sufrágio universal, legitimando o Colégio Eleitoral e construindo um govêrno de consenso que não é de consenso dos políticos profissionais com as massas pobres e oprimidas, mas de consenso entre todos os setores civis e militares – inclusive os do govêrno ditatorial – sobre o modo de usar a democratização do Estado para manter e consolidar o monopólio burguês-conservador do poder.

O essencial, nesse momento, consiste em definir o govêrno emergente nesse contexto político e histórico. Está se falando em Tancredo, na habilidade de Tancredo, em seus dotes de conciliador e de político profissional etcétera Tudo isso não vale nada. É puro despistamento político: uma maneira de manter a chaleira fóra do fogo. A constituição do ministério traça um perfil definitivo desse govêrno, de seus objetivos de médio e largo prazo e a natureza de sua trama política.

reticências O essencial está nisso: aproveitar as condições de liberdade política crescente para destruir essa política. O que não se logrou na ‘campanha pelas diretas’ deve ser tentado de novo. E não apenas em nome da convocação da Constituinte. A constituição é um fim e um meio. Não pode ser confundida com um fim em si e absorver toda a atividade política dos desfavorecidos e dos de baixo. Esses precisam conquistar novos recursos institucionais de auto-organização, de autodefesa e de luta política em todos os terrenos, inclusive no que diz respeito à elaboração da nova constituição.

Para fazermos isso, as classes trabalhadoras e destituídas terão de dissociar o govêrno de Tancredo Neves das condições históricas de sua origem política e de recusar as manipulações que estão sendo feitas no sentido de enfeudá-las a um ‘pacto social’ com as fôrças do govêrno. O único pacto social que interessa aos trabalhadores e aos oprimidos é o pacto social que passa pela aliança deles entre si e que leva a uma nova fórma de luta política pela democracia.

reticências Alguns analistas políticos sérios, como o professor Francisco Vefór, salientam o papel dos estratos liberais das classes dominantes no sentido de derrotar a ditadura. Essa explicação não é errada, pois ela busca uma compreensão global da cena histórica e das decisões políticas. Todavia, esses estratos liberais avançaram, na medida em que se viram dentro de um alçapão:

ou saíam rapidamente de dentro do barco minado da ditadura ou iam aos ares junto com ele. O movimento pelo sufrágio universal imediato – as ‘Diretas Já’ – mostra qual seria o seu destino se não tivesse uma rápida recaída em seus amores ao liberalismoreticências Por aí se patenteia o que há, como relação fundamental, entre o govêrno Tancredo Neves e o movimento de massa. Ele não é o seu representante político nem o ponto mais alto de uma conciliação de classes, na qual o ímpeto revolucionário das massas tivesse uma acolhida efetiva. Representa, de fato, uma bem-sucedida manobra para sair por dentro do movimento e pôr-lhe um bridão conservador.

O que nos resta fazer? Ficar chorando o leite derramado? Não! Agora é preciso aproveitar as novas condições de liberdade na luta política para impor por outros meios os objetivos que foram postos a escanteio pelos liberais conservadores...

O govêrno não só precisa ser cobrado, como se diz, ser posto diante das pressões da ‘esquerda do seu partido’ ou dos ‘políticos progressistas’ que o apoiam. As exigências são outras. Essa gente precisa agir com a mesma inteligência que os ‘liberais’ e os ‘conservadores’, tomando iniciativas políticas necessárias e ousadas. Não, naturalmente, para ‘encurralar Tancredo’ ou deixar seu govêrno em um impasse. Porém, para criar a alternativa verdadeira de uma transição democrática, que o govêrno terá de engolir queira ou não queira.”

FERNANDES, Florestan. Que tipo de república? São Paulo: Brasiliense, 1986. página 123-126.

O fim da Guerra Fria e o fim de uma era

O historiador Érik Robsbaum, no texto a seguir, analisa os atores do fim da Guerra Fria, associando-o ao fim de uma era. É ao ex-líder soviético micaíl gorbatchóv que se concede o grande mérito de não apenas cessar a corrida bélica nuclear como também de convencer o govêrno estadunidense a fazer o mesmo, para juntos darem fim à tensão que pairou no ar durante toda a Guerra Fria.

“A Guerra Fria acabou quando uma ou ambas superpotências reconheceram o sinistro absurdo da corrida nuclear, e quando uma acreditou na sinceridade do desejo da outra de acabar com a ameaça nuclear. Provavelmente era mais fácil para um líder soviético que para um americano tomar essa iniciativa, porque, ao contrário de Washington, Moscou jamais encarara a Guerra Fria como uma cruzada, talvez porque não precisasse levar em conta uma excitada opinião pública. Por outro lado, exatamente por isso, seria mais difícil para um líder soviético convencer o Ocidente de que falava sério. Desse modo, o mundo tem uma dívida enorme com micaíl gorbatchóv, que não apenas tomou essa iniciativa, como conseguiu, sozinho, convencer o govêrno americano e outros no Ocidente de que falava a verdade. Contudo, não vamos subestimar a contribuição do presidente Rêigan, cujo idealismo simplista rompeu o extraordinariamente denso anteparo de ideólogos, fanáticos, desesperados e guerreiros profissionais em torno dele para deixar-se convencer. Para fins práticos, a Guerra Fria terminou nas duas conferências de cúpula de Reicavíc (1986) e Washington (1987).

O fim da Guerra Fria implicou o fim do sistema soviético? Os dois fenômenos são historicamente separáveis, embora obviamente ligados. O socialismo do tipo soviético se pretendia uma alternativa global para o sistema mundial capitalista. Como o capitalismo não desmoronou, nem pareceu que ia desmoronar – embora nos perguntemos o que teria acontecido se todos os devedores socialistas e do Terceiro Mundo se houvessem unido em 1981 para deixar de pagar simultaneamente seus empréstimos ao Ocidente – as perspectivas do socialismo como alternativa global dependiam de sua capacidade de competir com a economia mundial capitalista, reformada após a Grande Depressão e a Segunda Guerra Mundial, e transformada pela revolução ‘pós-industrial’ nas comunicações e tecnologias de informação na década de 1970. Ficou claro, depois de 1960, que o socialismo estava ficando para trás em ritmo acelerado. Não era mais competitivo, na medida em que essa competição assumia a fórma de um confronto entre duas superpotências políticas, militares e econômicas, a inferioridade tornou-se ruinosa.

reticências O fim da Guerra Fria retirou de repente os esteios que sustentavam a estrutura internacional e, em medida ainda não avaliada, as estruturas dos sistemas políticos internos mundiais. E o que restou foi um mundo em desordem e colapso parcial, porque nada havia para substituí-los. A ideia, alimentada por pouco tempo pelos porta-vozes americanos, de que a velha ordem bipolar podia ser substituída por uma ‘nova ordem’ baseada na única superpotência restante, logo se mostrou irrealista. Não poderia haver retorno ao mundo de antes da Guerra Fria, porque coisas demais haviam mudado, coisas demais haviam desaparecido. Todos os marcos haviam caído, todos os mapas tinham de ser alterados. Políticos e economistas acostumados a um tipo de mundo até mesmo achavam difícil ou impossível avaliar a natureza dos problemas de outro tipo. Em 1947, os Estados Unidos da América haviam reconhecido a

necessidade de um imediato e gigantesco projeto para restaurar as economias europeias ocidentais, porque o suposto perigo para elas – o comunismo e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – era facilmente definido. As consequências econômicas e políticas do colapso da União Soviética e da Europa Oriental foram ainda mais dramáticas que os problemas da Europa Ocidental, e se revelariam de muito mais longo alcance.

Elas eram bastante previsíveis em fins da década de 1980, e até visíveis – mas nenhuma das muito ricas economias do capitalismo tratou essa crise iminente como uma emergência global a exigir ação urgente e maciça, porque suas consequências políticas não eram tão facilmente especificadas. Com a possível exceção da Alemanha Ocidental, reagiram preguiçosamente – e mesmo os alemães não compreenderam e subestimaram totalmente a natureza do problema, como se veria por seus apuros com a anexação da antiga República Democrática Alemã.

É provável que as consequências do fim da Guerra Fria teriam sido enormes de qualquer modo, mesmo que ele não coincidisse com uma grande crise na economia capitalista e com a crise final da União Soviética e seu sistema. Como o mundo do historiador é o que aconteceu, e não o que poderia ter acontecido se tudo fosse diferente, não precisamos levar em conta a possibilidade de outros roteiros. O fim da Guerra Fria provou ser não o fim de um conflito internacional, mas o fim de uma era: não só para o Oriente, mas para todo o mundo. Há momentos históricos que podem ser reconhecidos, mesmo entre contemporâneos, por assinalar o fim de uma era. Os anos por volta de 1990 foram uma dessas viradas seculares. Mas, embora todos pudessem ver que o antigo mudara, havia absoluta incerteza sobre a natureza e as perspectivas do novo. Só uma coisa parecia firme e irreversível entre essas incertezas: as mudanças fundamentais, extraordinárias, sem precedentes que a economia mundial, e consequentemente as sociedades humanas, tinham sofrido no período desde o início da Guerra Fria.”

róbisbáum, Eric J. Era dos extremos: o breve século vinte (1914-1991). São Paulo: Companhia das Letras, 1995. página 246-252.

O Plano Real

No texto a seguir, o historiador e brasilianista Tômas Quídmór explica alguns fatores que convergiram para o sucesso do Plano Real, indicando desde uma notável equipe econômica que encabeçou a iniciativa até condições propícias para consolidar a autoestima do brasileiro.

“Quando Fernando Henrique Cardoso foi designado ministro da Fazenda, o Brasil permanecia o único país latino-americano que não havia conseguido controlar a inflação e era conhecido como o campeão mundial em assinar acôrdos não cumpridos com o éfe ême í. O problema não era fundamentalmente de diagnóstico econômico, embora o tratamento da doença exigisse considerável sofisticação econômica, mas sim de liderança política. Os políticos sabiam que todos os planos de estabilização desde 1953 haviam produzido dores políticas de curto prazo, como quedas no salário real e encolhimento de crédito, criando uma recessão. Presidente após presidente havia recuado da estabilização: Getúlio Vargas, Juscelino cubishéqui, Jânio Quadros e José Sarney. Somente Castelo Branco, fortalecido por um regime autoritário, persistira na estabilização tempo suficiente para alcançar uma conclusão bem-sucedida.

Itamar Franco parecia tão pouco inclinado quanto seus predecessores a levar a cabo a estabilização. Ele entendia pouco de economia e demonstrava uma atitude impaciente em relação a medidas econômicas impopulares. A diferença entre o destino de seu plano de estabilização e as tentativas anteriores revelou-se em seu senso de oportunidade e em sua escolha do ministro da Fazenda. reticências Itamar recorreu a Fernando Henrique Cardoso, que reuniu uma notável equipe econômica.

A equipe de Fernando Henrique formulou uma estratégia complexa para combater a inflação. Primeiro, descartou qualquer tratamento de choque, como congelamento de preços ou salários. Segundo, delineou um orçamento equilibrado para 1994 que o Congresso aprovou. Terceiro, criou uma transição em dois estágios para uma nova moeda. O primeiro estágio, que começou em março de 1994, deveria durar quatro meses e envolvia a criação de uma nova unidade de valor, a u érre vê (Unidade Real de Valor), para a qual todos os valores prévios foram convertidos. Enquanto isto o cruzeiro continuava como moeda, criando assim um conjunto dual de preços. O objetivo aqui era forçar o público a parar de pensar nos valores da moeda que historicamente se havia desgastado tão rapidamente. Este deveria ser também o estágio para a diminuição da ‘inflação inercial’ (a inflação que se autossustentava, sem nenhuma nova pressão inflacionária) que, como todos os observadores concordavam, havia feito do aumento de preços um fenômeno autorreprodutor.

O segundo estágio, que começou em primeiro de julho, foi a introdução de uma nova moeda, o real. A escolha do nome era ambígua (podia se referir à realeza ou à realidade). No sentido de demonstrar o compromisso do govêrno com a estabilidade, foram introduzidas moedas metálicas. Logo os brasileiros estavam usando máquinas que aceitavam moedas, um fenômeno desconhecido no Brasil por uma geração.

Para reforçar esse avanço, o govêrno adotou uma taxa cambial brandamente sobrevalorizada e impôs altas taxas de juros reais. A primeira medida era para combater a inflação (com importações baratas) e a segunda era para evitar o tipo de boom descontrolado no consumo que havia ocorrido sob o Plano Cruzado. Também programada estava a eliminação gradual da indexação no decorrer do ano seguinte. Finalmente, permitiu-se que os trabalhadores negociassem aumentos salariais em u érre vês. Graças, em parte, à economia forte e a uma boa colheita no segundo semestre de 1994, os salários reais não caíam (como ocorrera durante praticamente todas as tentativas anteriores de estabilização), mas, ao contrário, mostraram aumento.

O Plano Real foi recebido inicialmente com muito ceticismo, pois, dadas as tentativas anteriores de estabilização no Brasil, as dúvidas eram certamente legítimas. Mas ambos os estágios funcionaram bem. O sucesso do segundo estágio – a transição para uma nova moeda, o real – foi particularmente notável, dada a enormidade do desafio. O sucesso foi tanto logístico (fornecer a nova moeda a milhares de bancos em um país imenso) como psicológico (conseguir que o público aceitasse mais uma nova fórma de moeda para suas transações). A moral dos brasileiros não poderia ter fornecido um contexto melhor. Exatamente quando o real estava sendo introduzido o país estava a caminho de conquistar um inaudito quarto campeonato na Copa Mundial de Futebol. Incrivelmente, o Brasil havia vencido o time dos Estados Unidos da América no dia quatro de julho de 1994. Poderia ter havido um melhor presente para a equipe de Fernando Henrique Cardoso?”

isquídimór, tômas E. Uma história do Brasil. São Paulo: Paz e Terra, 1998. página 310-312.

5. Sugestões de consulta

Livros

BOTELHO, André; Chuárquis, Lillia Moritz (organizador). Cidadania, um projeto em construção. São Paulo: Claro Enigma, 2012.

Esse livro reúne artigos escritos por diversos especialistas que tratam de temas fundamentais do Brasil contemporâneo, tais como o racismo, a desigualdade social, a questão de gênero e as intersecções entre a esfera pública e privada.

DRAIBE, Sônia. Rumos e metamorfoses: Estado e industrialização no Brasil (1930-1960). segunda edição Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2004.

O livro oferece um panorama do processo de industrialização brasileiro por meio de sólidas abordagens teórica e documental, destacando a ampla participação do Estado nesse processo.

Felítie, Renzo de. Explicar o fascismo. Lisboa: Edições 70, 1978.

Essa obra clássica apresenta uma revisão historiográfica sobre as análises produzidas sobre o fascismo até os anos 1970, com uma seção dedicada especialmente ao fascismo italiano.

FICO, Carlos. História do Brasil contemporâneo: da morte de Vargas aos dias atuais. São Paulo: Contexto, 2016.

Obra panorâmica, de linguagem acessível, que trata dos principais momentos da história brasileira recente, essenciais para compreender o Brasil contemporâneo.

Fuêntes, Carlos. Em 68: Paris, Praga e México. São Paulo: Rocco, 2008.

Publicado por ocasião dos 40 anos do Maio de 1968, o livro contém três ensaios escritos pelo prestigiado escritor mexicano, que foi testemunha ocular dos eventos de Paris, Praga e Cidade do México. Embora tenham sido escritos no calor do momento, os textos soam atuais por sua beleza e perspicácia.

GOMES, Ângela de Castro. Essa gente do Rioreticências Modernismo e nacionalismo. Rio de Janeiro: Editora da éfe gê vê, 2005.

Nesse estudo, a historiadora aborda o perfil dos intelectuais que pensaram o Brasil e a modernidade a partir do Rio de Janeiro, debatendo questões como identidade nacional, sociabilidade e modernismo.

Résssel, Istefâne. Indignai-vos! São Paulo: Lêia, 2011.

O livro foi escrito por um diplomata alemão naturalizado francês que participou da resistência francesa contra os nazistas. Ele resgata a sua própria indignação nos anos de 1930 e 1940, revelando a importância do engajamento e da militância contemporâneos, contra o desrespeito às liberdades, à alteridade, às injustiças e à perda de direitos.

ráuard, máicol. Primeira Guerra Mundial. Porto Alegre: Ele e Pê ême, 2010.

A obra oferece um panorama do mundo em 1914, analisando questões geopolíticas que levaram à Primeira Guerra Mundial, passando pelas principais batalhas e por episódios que marcaram o conflito, até a derrota da Tríplice Aliança.

Diúd, Tôni. Pós-guerra: uma história da Europa desde 1945. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007.

Nesse livro, Tôni Diúd analisa aspectos políticos, sociais, econômicos e culturais da história europeia desde o final da Segunda Guerra Mundial até o início do século vinte e um.

PARADA, Maurício. Formação do mundo contemporâneo: o século estilhaçado. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: púqui, 2014.

Obra panorâmica que busca compreender a história do século vinte como resultado das tensões entre o capitalismo e o socialismo, tendo como pano de fundo a construção da hegemonia econômica e política das elites estadunidenses.

PONS, Silvio. A revolução global: história do comunismo internacional: 1917-1991. Rio de Janeiro: Contraponto; Brasília, Distrito Federal: Fundação Astrojildo Pereira, 2014.

O autor, especialista no estudo do socialismo soviético e do movimento comunista internacional, realiza um balanço histórico sobre esses temas, desde a Revolução de Outubro até a dissolução da União Soviética.

PRADO, Maria Ligia; PELLEGRINO, Gabriela. História da América Latina. São Paulo: Contexto, 2014.

A obra apresenta a história da América Latina, desde a crise que levou à dissolução dos laços coloniais até aspectos essenciais do século vinte, como cultura e política contemporâneas e as ditaduras civil-militares.

RIBEIRO, Wagner Costa. A ordem ambiental internacional. São Paulo: Contexto, 2008.

O livro aborda a necessidade de discussões e atitudes multilaterais para alcançar a segurança ambiental. Com base nas convenções internacionais sobre o meio ambiente, procura-se avaliar se é possível garantir desenvolvimento sustentável por meio da regulação das ações humanas para impedir a calamidade climática que se avizinha.

Zizéc, Islavói. Às portas da revolução: escritos de Lenin de 1917. São Paulo: Boitempo, 2005.

Essa seleção de textos de Lênin apresenta aspectos até então silenciados do líder bolchevique, revelando sua ampla capacidade de estrategista político, a irreverência de seu pensamento político e econômico, bem como sua lucidez ao analisar a conjuntura antes, durante e após a revolução bolchevique. A seleção é acompanhada de prefácio, posfácio e notas do filósofo Islavói Zizéc.

Revistas e artigos

CORREIA, Sílvia Adriana Barbosa. Cem anos de historiografia da Primeira Guerra Mundial: entre história transnacional e política nacional. topói, Rio de Janeiro, volume 15, número 29, página 650-673, julho a dezembro 2014. Disponível em: https://oeds.link/SiGfUg. Acesso em: 2 agosto 2022.

O artigo divide a historiografia da Primeira Guerra Mundial em quatro gerações, começando com a que viveu e experimentou a guerra, passando pela história diplomática e militar (1920-1960) e pela história social da guerra (1960-1980), até chegar à viragem para a história cultural do conflito a partir dos anos de 1980.

Diófi, Diórdi. A Primavera Árabe no Norte de África: origens e perspectivas de futuro. Relações Internacionais, Lisboa,número 30, página 85-116, junho2011. Disponível em: https://oeds.link/LX0Ju2. Acesso em: 2 agosto 2022.

O texto, escrito no calor dos acontecimentos da Primavera Árabe, procura comparar os movimentos ocorridos no Egito e na Tunísia, levando em consideração, também, os processos de transformação da Líbia, do Iêmen e da Síria. Com base na perspectiva da história desses países, o autor projeta futuros distintos para os movimentos rebeldes de 2010.

UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL. Dossiê Segunda Guerra Mundial e o Brasil: 70 anos depois. Fronteiras: Revista Catarinense de História, Florianópolis, número 26, julho a dezembro 2015. Disponível em: https://oeds.link/N1bXA2. Acesso em: 2 agosto 2022.

O periódico, vinculado ao Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal da Fronteira Sul, articula-se em torno dos temas fronteiras, migrações e sociedades. Nesse número, busca-se analisar processos políticos, econômicos, sociais e culturais relacionados à participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial.

Sites

CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS (cê pê dóc-éfe gê vê). Disponível em: https://oeds.link/pyry0B. Acesso em: 2 agosto 2022.

O site do cê pê dóc, da Fundação Getúlio Vargas, reúne um vasto acervo documental, dicionários, artigos, exposições virtuais e um atlas de história do Brasil que constituem excelente material de apôio pedagógico.

MEMORIAL DA RESISTÊNCIA DE SÃO PAULO. Disponível em: https://oeds.link/py63T0. Acesso em: 2 agosto 2022.

Sediado no prédio onde, até 1983, funcionou o Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (deóps-São Paulo), o espaço é dedicado à preservação da memória da resistência ao autoritarismo e à ditadura no Brasil. O site da instituição disponibiliza o acesso a fontes documentais, iconográficas e bibliográficas, além de entrevistas e informações sobre os projetos desenvolvidos.

Filmes

Mulheres africanas: a rede invisível. Direção: Carlos Nascimbeni. Brasil, 2012, 80 minutos

O documentário de Carlos Nascimbeni mostra as lutas e conquistas de cinco mulheres que vivem no continente africano: Graça Machel, ativista política, Lima Báui, que ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 2011, Mama Sara Masari, Luisa Diogo, ex-primeira-ministra de Moçambique, e Nadine Gordiner, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura em 1991.

Cidadão quatro. Direção: Laura Poitras. Estados Unidos/Alemanha/Reino Unido, 2014, 114 minutos

Documentário que apresenta as longas conversas da diretora com éduard isnôuden, ex-administrador de sistemas da cía, que revelou diversos crimes praticados pelo govêrno dos Estados Unidos por meio de servidores de grandes empresas de tecnologia.

Podcast

Senta que lá vem história! episódio 11: O Orientalismo em foco na China contemporânea. Disponível em: https://oeds.link/nZooZG. Acesso em: 2 agosto 2022.

Vinculado à Universidade Federal da Paraíba (ú éfe pê bê), o podcast aborda diferentes temas da história. Nesse episódio, o entrevistado é Fernando Pureza, Professor de história do Oriente contemporâneo, do Departamento de História da ú éfe pê bê. Discute-se o conceito de Orientalismo, desenvolvido por éduard saíd, as relações da China com os Estados Unidos, a Guerra Sino-Japonesa, a Revolução Comunista e a crescente onda de xenofobia contra os chineses.